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MARX E WEBER: UM PANORAMA DE SUAS PERSPECTIVAS SOBRE O CAPITALISMO

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÌRITO SANTO
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E ECONÔMICAS
DEPARTAMENTO DE DIREITO
MARX E WEBER:
UM PANORAMA DE SUAS PERSPECTIVAS SOBRE O CAPITALISMO
VITÓRIA/ES
2021
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÂO………………………………………………………………………...…3
2 DESENVOLVIMENTO…………………………………………………………………..4
2.1 Marx: A Exploração do Proletariado e a Acumulação de Capital………………….....4
2.2 Weber: A Religião Como Norteador Econômico……………………………………..6
3 REFERÊNCIAS……………………………………………………………………..….11
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1 INTRODUÇÃO
Desde seu surgimento, a sociedade capitalista passou por várias transformações, atravessando
períodos diversos através dos tempos e se reinventando, criando diversas formas diferentes de
capitalismo. A fase industrial do capitalismo foi a fase contemporânea à Marx e Weber, dois
grandes sociólogos que concentraram suas teorias em reflexões acerca desse fenômeno e seus
impactos sociais.
Cada autor analisou o capitalismo industrial a partir de uma ótica particular, de forma que
obteve estudos e conclusões diferentes. Enquanto Marx visualizou a sociedade capitalista a
partir de uma lógica de divisão de classes, Weber optou por fazer essa análise a partir de uma
ótica religiosa racional.
Nesse sentido, o objetivo deste ensaio é expor as características do modelo capitalista a partir
das noções dos dois teóricos supracitados, através do destacamento das discordâncias entre
cada uma de suas teorias, além da indicação de semelhanças e particularidades.
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2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Marx: A Exploração do Proletariado e a Acumulação de Capital
Karl Einrich Marx nasceu em Trier, na Prússia, em 1818. Foi um grande sociólogo e um
grande revolucionário, atuante na área da economia política. Seu pensamento foi influenciado
principalmente por três correntes de pensamento: a economia clássica inglesa, associada ao
utilitarismo; o socialismo francês, e idealismo filosófico de Friedrich Hegel, contrário a este
último filósofo em muitos aspectos de sua teoria, principalmente no que tange à compreensão
das relações jurídicas.
No Prefácio da obra Contribuição Para a Crítica da Economia Política, Marx afirma que “as
relações jurídicas, tal como formas de Estado, não podem ser compreendidas a partir de si
mesmas nem a partir do chamado desenvolvimento geral do espírito humano, mas
enraízam-se, isso sim, nas relações materiais da vida”. Nesse sentido, contrário a Hegel, Marx
não concordava que as relações jurídicas seriam compreendidas em si mesmas, mas sim
compreendidas a partir do entendimento da sociedade civil e das relações sociais,
especialmente na forma material de gestão de recursos.
Assim, Marx entende que “na produção social da sua vida os homens entram em determinadas
relações de produção, necessárias e independentes da sua vontade, que correspondem a uma
determinada etapa de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. A totalidade
destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a
qual se ergue uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas
formas da consciência social.”
A partir do modo de produção, portanto, seria possível perceber que a forma assumida por
uma sociedade está diretamente ligada à maneira como ela organiza sua vida material. O
Direito e o Estado seriam derivados desse sistema estrutural de relações de produção
econômica, sendo o modo de produção da vida material o que condiciona o processo da vida
dos homens, e não sua consciência.
Segundo Marx, as sociedades só podem existir e garantir sua sobrevivência a partir de sua
produção, sendo esta a expressão das forças transformadoras da sociedade e a dominação de
tais modos de produção o gerador principal de classes sociais e desigualdades econômicas.
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Analisando os modos de produção, Marx compreendeu que as organizações sociopolíticas e
as sociedades não se desenvolviam de forma voluntarista, evolucionista, em sua perspectiva
linear. Para ele, os fatos sociais se constituíam a partir da presença de forças antagônicas, de
grupos sociais que rotineiramente tramavam embates em busca da afirmação de seus poderes.
Essas relações de força refletem, essencialmente, a forma como tais grupos ao longo da
história, determinavam os seus modos de produção.
Segundo Karl Marx, o surgimento do capitalismo e sua inserção nos modos de produção
modificaram profundamente a relação do homem com o trabalho. Os processos de
complexificação da sociedade industrial formaram novas especialidades e ocupações nas
linhas produtivas, aprofundando as divisões sociais do trabalho e tornando-as o princípio
estruturante da sociedade industrial. Começa-se, daí, a distinção mais aparente entre aqueles
que vendem sua força de trabalho daqueles que detêm os meios de produção, formando a
divisão social clássica de Marx: a divisão de classes. Nesse momento, a classe dominada e
explorada não é mais formada por escravos e servos, os trabalhadores agora são “livres”,
porém, continuam dependentes, agora do capital. (Marx, 1985). As relações de produção se
configuram entre trabalhadores assalariados e seus patrões, e não mais entre os trabalhadores
e suas terras ou instrumentos de trabalho. Essa mudança ganha força principalmente a partir
da produção do que Marx chama de mais-valia, valor que o proletário cria além do necessário
para a reprodução da força de trabalho, uma vez que o principal objetivo do burguês (patrão) é
a obtenção cada vez maior de lucros.
De acordo com Marx (1980, p. 206), “do ponto de vista social, a classe trabalhadora é,
portanto, mesmo fora do processo direto de trabalho, um acessório do capital, do mesmo
modo que o instrumento morto de trabalho. Mesmo seu consumo individual, dentro de certos
limites, é apenas um momento do processo de reprodução do capital”. Além disso, o
pressuposto da sociedade capitalista é que todos são livres e iguais, o que acarreta na
possibilidade de transformar a força de trabalho em mercadoria. E é isso que gera a
desigualdade econômica, uma vez que esse tipo de mercadoria não é equivalente às outras
formas de mercadoria, como explicado anteriormente. Nesse sentido, é essencial que a
ideologia da igualdade, que não era encontrada nas sociedades anteriores, fosse disseminada
na sociedade capitalista, de modo que a exploração do trabalhador fosse de certa forma
consentida. Dessa forma, a antiga diferença de classes existente entre servos e senhores
feudais foi substituída por uma exploração explícita entre proletários e burgueses.
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2.2 Weber: A Religião Como Norteador Econômico
Considerado um dos maiores pensadores do período moderno e precursor de muitas correntes
sociológicas, Maximilian Karl Emil Weber influenciou os âmbitos da economia, da filosofia,
das ciências políticas e do direito. Nascido em 1867 no reino prussiano, ele pode acompanhar
eventos pontuais da história da humanidade, bem como propagar suas impressões sobre o
mundo à sua volta.
Max dedicou boa parte da obra A ética protestante e o espírito do capitalismo para investigar
de que maneira as religiões, como o hinduísmo, o judaísmo e o confucionismo, orientavam as
pessoas em seu dia-a-dia, bem como nas práticas econômicas. No livro é relatado como a
prática puritana alterou os moldes do racionalismo econômico e a importância desta para o
surgimento do capitalismo. Weber destaca a migração da cultura do ócio para a cultura da
movimentação e reaplicação dos lucros, gerando acúmulo de capital, porém, em contraponto,
o sociólogo acreditava que o melhor do indivíduo surge quando em ócio, afirmando que, se o
esforço físico e mental é algo necessário para a evolução das sociedades, pouca é a diferença
entre o homem moderno e o homem arcaico.
Segundo ele, o empreendedor capitalista maximiza uma conduta religiosa de vida regrada e
trabalho, que em primeiríssimo lugar serve a Deus. O processo de racionalização promoveria
a separação do trabalhador dos meios de produção, dando espaço paraa burocracia regular a
vida social.
A burocracia, por sua vez, através do aparelho burocrático, impõe às pessoas a lógica da
dominação, fortalecida com base nos critérios de impessoalidade. Na organização burocrática,
as atividades dos funcionários se desenvolvem em uma base regular, com deveres oficiais
determinados por níveis de autoridade delimitados por uma hierarquia de funções. As regras
se encontram registradas por escrito (códigos, estatutos), e o recrutamento se faz por
demonstração de competência especializada, em exames de caráter competitivo ou por
apresentação de diplomas e certificados. A profissão, se bem exercida nos parâmetros de
racionalidade e eficiência, permite progressão na carreira. Há, portanto, uma separação
notável entre funcionário e meio de produção, não sendo esta última atributo do indivíduo, e
sim apenas exercida temporalmente pelo funcionário (Weber, 1991).
A essência do capitalismo seria, então, a racionalização das regras de troca, incluindo a troca
da força de trabalho por salários. Segundo ele, o capitalismo teria sofrido grande influência
da ética potestante em seu surgimento, uma vez que a Reforma Protestante, com sua
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racionalidade, teria permitido que um conjunto grande de pessoas seguisse a ética da ordem e
do trabalho, tornando o ganho de dinheiro o objetivo principal da vida do homem. O que o
puritanismo proporcionou para a mudança do panorama mundial foi a ascensão da força de
trabalho e, com isso, surge um dos principais pilares do capitalismo: a possibilidade de trocar
produtividade por salário.
Esse comportamento, que era exclusivo de monges e pessoas extremamente religiosas,
tornou-se um comportamento geral. É o fenômeno que Weber chama de “ascetismo
intramundano”.
Weber também destaca a exaltação de uma conduta metódica. O protestantismo levaria as
pessoas a trabalharem por uma vida mais regrada e disciplinada, sem ostentação. A ascese
deveria ser compreendida como um planejamento racional orientado por Deus para garantir a
salvação.
Weber argumenta que a secularização do homem predestinado à salvação foi o principal
incentivo para que os fiéis e os religiosos praticassem o acúmulo de riquezas. Agora os
cidadãos eram reconhecidos pelo próprio Deus, cresceu o sentimento de validação que
justifica a mudança comportamento frente ao capital, para explicar esse fenômeno, o
sociólogo falava da “teodicéia da felicidade”, na qual o homem, não importa seu estado
emocional, econômico ou de espírito, tem sempre a necessidade de justificar suas ações. Essa
conduta não permitia mais que os fiéis comprassem sua salvação, pelo contrário, deveriam se
mostrar dignos da divindade através do trabalho. Suceder em sua profissão tornou-se um ato
divino, enquanto a inércia, a falta de vontade e ambição seriam práticas que enfraquecem a
crença em Deus, estão mais próximos da salvação aqueles que produzem.
Em linhas gerais, o desenvolvimento capitalista para Weber é compreendido como parte de
um processo de racionalização diante dos conflitos presentes na sociedade; e a burocratização,
neste processo, tem um papel central como regulador e instrumento de poder nas mais
diversas instituições.
No artigo Origem do Capitalismo: Uma Comparação Entre as Abordagens de Max Weber e
Wener Sombart, o professor Glaudionor Gomes Barbosa destaca que Weber não tratou o
capitalismo como um fenômeno plural ao estabelecer relações entre ele e as culturas definidas
religiosamente. Nesse sentido, uma vez que Weber apenas considerou o protestantismo como
norteador adequado para a transição a uma mentalidade capitalista e deixou de considerar
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fatores econômicos propriamente ditos, ressalta o professor que pode-se citar três realidades
que contradizem a tese weberiana.
A primeira delas é a realidade encontrada em regiões puramente católicas, como Veneza e
Bélgica, onde o protestantismo não alcançou de maneira significativa e mesmo assim o
capitalismo se instaurou de maneira consistente. Glaudionor cita também a questão do
subdesenvolvimento da região de Genebra de Calvino e a desvalorização da ética protestante
na Colônia Presbiteriana da Escócia.
Importante, além disso, ressaltar a existência de diversas sociedades desenvolvidas
economicamente antes da reforma protestante (Sombart, 1993). É uma contrapartida à ideia
de Weber de que a evolução econômica seria derivada da ética protestante.
Nesse sentido, as ideias de Weber seriam insuficientes para explicar o fenômeno do
capitalismo.
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3 CONCLUSÃO
A partir da análise das características do capitalismo apresentado pelos dois autores,
percebe-se que estes sustentam suas ideias sobre fundamentos e conceitos distintos.
Entretanto, é possível apontar certos pontos de convergência.
O ponto mais notável é o objeto de estudo dos dois teóricos: a sociedade capitalista. Ambos
tinham como objetivo explicar de que forma essa sociedade havia se formado e se estruturado
da forma que aconteceu e quais são os seus efeitos na sociedade em geral.
A forma como eles explicaram todos esses fatores e os resultados obtidos através de suas
pesquisas, porém, é o principal ponto diferenciador, como explicado. Juan Marsal (2004),
entretanto, aponta:
Ao chegar a esse ponto, é preciso notar as diferenças fundamentais com
Marx. Não devemos enganar-nos com quaisquer semelhanças
terminológicas e metodológicas parciais. O desacordo entre Weber e Marx é
de fins, não de meios. Muitas vezes coincidirão na análise, mas há um ponto
em que a indiferença é essencial: para Marx o capitalismo era irracional e
indesejável, para Weber o capitalismo era a forma universal de
modernização e a expressão mais alta da racionalização do homem
ocidental.
Para Marx, a sociedade capitalista era marcada pela luta de classes e pela constante
exploração e alienação do trabalhador, limitando sua verdadeira liberdade. A liberdade do
homem dada pelo direito era enganosa e permitia a legitimação da exploração do trabalhador.
Weber, em contrapartida, que eram as burocracias e a racionalização que a restringiam
efetivamente. Os trabalhadores teriam perdido o controle da sua força de trabalho devido a
constante racionalização da produção.
Weber argumenta que em uma sociedade capitalista o indivíduo se junta às estruturas
organizadas e organizações que são postas em prática para garantir uma estrutura eficiente
para garantir o melhor lucro. Ao aderir a essas organizações, o indivíduo perde sua
individualidade e se isola e se perde no funcionalismo e, portanto, se torna alienado.
Contrário a Marx, Weber situa na própria sociedade os elementos formadores do capitalismo,
enquanto para Marx a sociedade e sua estrutura são reflexos da base econômica.
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Outra diferença importante entre ambos os teóricos é que Weber não conseguia pensar no
capitalismo apenas como uma luta de classes, uma vez que ele abrange muitos outros
elementos, como a burocracia e a lógica da dominação. Para ele, a libertação da sociedade
seria impossível, uma vez que a burocracia e a dominação a prenderiam em uma “gaiola de
ferro”.
Marx, entretanto, era bem mais otimista. Segundo ele, era sim possível que mudanças fossem
feitas. Entretanto, estas só seriam possíveis através de uma revolução que instituísse uma
social-democracia.
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3 REFERÊNCIAS
BARBOSA, Glaudionor Gomes. Origem do Capitalismo: Uma Comparação Entre as
Abordagens de Max Weber e Wener Sombart. 2011
MARX, Karl. Prefácio. In: MARX, Karl. Contribuição à crítica da economia política.
Traduzido por Maria Helena Barreiro Alves. São Paulo: Martins Fontes, 1997. pp. 23- 29.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. Traduzido por Pietro
Nassetti. São Paulo: Editora Martin Claret, 2006.
MARSAL, Juan. Porque Weber? In WEBER, Max. Ciência e política. Duas vocações.
Traduzido por Jean Melville. São Paulo: Editora Martin Claret, 2004. pp. 13-24.
SANT’ANNA, Silvio O livro do século In: WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do
capitalismo. Traduzidopor Pietro Nassetti. São Paulo: Editora Martin Claret, 2002. pp. 11-20.
WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. Traduzido por Pietro Nassetti.
São Paulo: Editora Martin Claret, 2002.

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