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PAPER A INFFLUENCIA DA CIENCIA NO DIREITO DA MULHERES E NO PATRIARCALISMO

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO 
ÉRIKA CERRI DOS SANTOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A INFLUÊNCIA DA CIÊNCIA NO FORTALECIMENTO DO PATRIARCADO E 
SEUS REFLEXOS NOS DIREITOS DAS MULHERES E NA SOCIEDADE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
VITÓRIA, 2020 
RESUMO 
Ao longo dos anos, os estereótipos de gênero e de sexo, baseados em ideais machistas e sexistas 
foram sendo enraizados na sociedade de modo a controlar a mulher e seu corpo, mantendo-a 
como responsável pelo lar e pela família. No âmbito legal, às mulheres foram negados direitos 
básicos durante toda a história da humanidade, principalmente devido a ideais sociais machistas 
baseados no patriarcado. Durante os séculos XIX e XX, a explosão de estudos na área da 
evolução, cabeceados por Charles Darwin deu início a uma maratona de pesquisas que 
buscavam comprovar a inferioridade da mulher com relação ao homem, dando forma aos ideais 
machistas e fortalecendo o patriarcalismo. Até hoje, após tantos anos, tais pesquisas 
influenciam a vida das mulheres, tanto socialmente, quanto juridicamente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
Em seu livro O Segundo Sexo, de 1949, Simone de Beauvoir ressalta: 
 
“A fim de provar a inferioridade da mulher, os antifeministas apelaram não somente 
para a religião, a filosofia e a teologia, como no passado, mas ainda para a ciência: 
biologia, psicologia experimental, etc.” 
 
Beauvoir é uma das filósofas mais importantes para a teoria feminista moderna e passou anos 
estudando valores patriarcais que desvalorizavam o papel da mulher na sociedade. Com essa 
afirmação, ela pôs em questão todos os estudos científicos que tinham como objetivo provar a 
inferioridade da mulher com relação ao homem. 
Ao longo da história, a Ciência foi utilizada para legitimar as ideias mais nefastas do homem. 
Estudos de frenologia e craniometria formaram a base da construção das teorias eugênicas e do 
Darwinismo Social que ganharam força no século XX e serviram de justificativa para o 
extermínio e para a dominação de povos negros, por exemplo. Esses e outros milhares estudos 
também foram utilizados para comparar homens e mulheres e marcaram o movimento chamado 
determinismo biológico, o qual era baseado na ideia de que comportamentos e desigualdades 
sociais poderiam ser explicadas pela biologia. 
O patriarcado é a construção social da sociedade centrada na figura do homem, sendo sua maior 
característica a dominação masculina sobre as mulheres. A partir da biologia, esse sistema 
social ganhou ainda mais força, uma vez que a inferioridade intelectual e física das mulheres 
seria uma justificativa para que as mulheres fossem assistidas pelos em todas as áreas de sua 
vida. 
O uso da Ciência, principalmente da Medicina e da biologia, para fortalecer o patriarcalismo e 
o machismo contou com o apoio de grandes cientistas, como Charles Darwin. Uma vez que a 
Ciência é tida como absoluta e irrefutável pela maioria das pessoas, as ideias e estudos 
publicados por grandes cientistas são rapidamente aceitas e correlacionadas aos ideais 
religiosos e sociais, principalmente na época de Darwin, quando a inferioridade da mulher era 
amplamente aceita no meio científico. Como consequência disso, as mulheres tiveram direitos 
negados durante toda a história, e até hoje ainda lutam por equidade de gênero. 
 
 
 
 
DESENVOLVIMENTO 
O PATRIARCALISMO: SURGIMENTO, CARACTERÍSTICAS E SUA INFLUÊNCIA NA 
SOCIEDADE E NO DIREITO DAS MULHERES 
A família é considerada o núcleo fundamental da sociedade, onde o indivíduo tem seu primeiro 
contato com o mundo e acesso à socialização primária. Essa instituição ganhou força durante a 
Roma Antiga, a partir da centralidade da figura paterna. Nesse modelo familiar a mulher, os 
filhos, os escravos e os vassalos eram todos subordinados ao poder do homem da casa. Esses 
são um dos primeiros indícios para a construção da sociedade patriarcal que atravessou gerações 
e que é predominante nos dias de hoje. 
Essa dominância masculina sobre as mulheres atribuiu maior valor social e econômico às 
atividades ditas masculinas enquanto as atividades consideradas femininas seguiram o caminho 
oposto, sendo desvalorizadas. Além disso, o patriarcado romano ainda abriu portas para o 
controle masculino sobre a sexualidade, a autonomia e o corpo feminino, além de estabelecer 
papéis de gênero sexuais e sociais. 
O sistema com a centralidade masculina é base de diversas sociedades, principalmente daquelas 
em que a religiosidade é um fator importante social e culturalmente. Como consequência disso, 
há a submissão das mulheres ao sistema patriarcal através de legislações e imposições sociais. 
Atualmente, ao redor o mundo, existem diversas legislações e sociedades consideradas 
machistas e misóginas, todas moldadas a partir desse modelo. Fatores como a valorização da 
virgindade feminina e da maternidade, bom como a construção da mulher como “dona de casa”, 
são comuns entre essas culturas. 
Sobre a vida das mulheres nos países fundamentalistas onde a desigualdade de gênero é muito 
grande, Tania Azevedo Garcia, psicóloga clínica, especialista em Gestalt-terapia e análise 
existencial, ressalta que: 
“É possível identificar como consequências comuns o fundamentalismo religioso, o 
atraso educacional e científico e, especialmente, maior desigualdade de gênero. Tanto 
da Bíblia, da Torá, quanto do Alcorão, muitas são as inserções que demarcam a 
condição da mulher. De frágil, delicada e vulnerável, ela se transforma em um ser 
ardil, malicioso e astuto.” 
 
Aponta, também: 
“Da literatura e filmes, muitos foram os relatos de condenações físicas, como o 
apedrejamento, e restrições como trabalho e formação escolar permitidos, vestimenta 
autorizada, restrições para dirigir ou viajar. (...) O mais cruel é que muitas mulheres 
defendem os preceitos que as mantêm aprisionadas, já que essa foi a linguagem que 
aprenderam. Elas acreditam que a submissão é fruto da frágil natureza feminina, 
quando, em verdade, trata-se de um preceito cultural.” 
 
Rosalyn Sussman Yalow, cientista que recebeu o prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 
1977, aponta que: 
“Ainda vivemos num mundo em que uma parcela significativa das pessoas, inclusive 
mulheres, acredita que a mulher pertence e quer pertencer exclusivamente ao lar; que 
a mulher não deveria aspirar a conquistar mais do que seus companheiros do sexo 
masculino.” 
 
Nota-se, portanto, que o enraizamento cultural do patriarcalismo é tão forte que as mulheres 
muitas vezes aceitam sua condição social e tomam isso como sua predestinação natural. Tal 
fator é mais contundente em alguns países orientais, mas nos países ditos ocidentais a realidade 
não é muito diferente, com destaque ao Brasil. 
Apesar de as leis direcionarem a sociedade, a igualdade material ainda não é uma realidade, o 
que é evidenciado por fatores como a violência doméstica, altos números de estupro e outros 
tipos de violência sexual, índices de assédio, diferença salarial e discriminação em várias 
esferas na sociedade, principalmente quando a liberdade sexual da mulher está envolvida. 
No Brasil, o modelo patriarcal de sociedade foi base para a construção de toda a legislação 
anterior à Constituição Federal de 1988. Apesar de esta determinar a igualdade de gênero entre 
homens e mulheres, nossa legislação e sociedade ainda estão impregnadas de valores e 
normativas patriarcalistas, os quais impedem que as mulheres exerçam plenamente seus 
direitos. 
No Brasil Colônia, a legislação vigente via a mulher como incapaz, conferindo aos homens uma 
posição hierárquica superior, de domínio e poder, sob o qual “castigos” e até “assassinatos em 
defesa da honra e da moral” era aceitos legalmente. 
 O primeiro Código Civil do Brasil, de 1916, foi a personificação dos valores patriarcais da 
sociedade do século XIX, conservadorae muito influenciada pela legislação canônica, 
valorizando a família dita tradicional. Segundo Maria Berenice Dias, esse Código foi o 
responsável pela consolidação da superioridade masculina, transformando a força física do 
homem em poder pessoal, dando-lhe o comando exclusivo da família. 
A superioridade masculina também foi institucionalizada através de outros institutos no Código 
Civil. Além do pátrio poder, que designava todo o poder de controlar a família ao homem, O 
Código Civil de 1916 ainda estabeleceu que a mulher passaria a ser considerada relativamente 
incapaz assim que se casasse, o que lhe impedia de, juridicamente, exercer arbitrariamente 
alguns direitos dos quais os homens gozavam na época. A mulher não podia exercer profissão 
ou negociar bens sem a autorização de seu cônjuge. 
O Código também designa a mulher como administradora do lar, o que significava que a mulher 
deveria assumir a condição de companheira e auxiliar nos trabalhos domésticos. Além disso, a 
valorização da virgindade feminina, defendida pelos ideais cristãos, também era fortalecida 
pelo Código. O homem poderia pedir a anulação do casamento caso a descobrisse que a mulher 
não fosse virgem após a oficialização do casamento, uma vez que a preservação da virgindade 
da mulher significava a honra do pai, do marido e da família da moça. 
Mais adiante, o Código Penal de 1940 se mostrou mais uma legislação característica de uma 
sociedade patriarcal. Ainda hoje, essa legislação ainda é a principal do país, na área criminal, e 
foi criada durante o período da Era Vargas. Um dos principais pontos questionáveis do texto 
original dessa legislação é o chamado “crime contra os costumes”, o qual não só reproduzia 
como também reforçava o embate machista da “mulher casta vs. a mulher promíscua”. 
O Código Penal também abordou a questão da virgindade feminina. Um de seus redatores, 
Nelson Hungria, afirmou que a mulher quando era deflorada perdia seu valor social, dessa 
forma, era cabível a anulação do casamento caso o marido descobrisse que ela fora deflorada 
antes do casamento. Hungria também defendia a impossibilidade do marido cometer crime de 
estupro contra a própria esposa, reforçando o ideal de que a mulher deveria estar sexualmente 
a disposição do marido a qualquer momento que este desejasse, sendo direito dele que a mulher 
tivesse conjunção carnal com ele, tendo em vista que era uma das obrigações do casamento. 
É importante ressaltar, ainda, a criminalização do aborto que até hoje assombra as mulheres do 
Brasil. 
A legislação brasileira e outras ao redor do mundo foram e ainda são, portanto, frutos de 
diversos ideias sociais culturalmente fundados a partir de ideais machistas e misóginos, 
prejudicando o acesso da mulher ao mercado de trabalho, limitando o alcance da mulher sobre 
sua própria vida jurídica e sobre seu próprio corpo. A ciência, ao contribuir para o 
fortalecimento do patriarcalismo, contribuiu também para a limitação dos direitos das mulheres 
ao longo da história de toda a humanidade. 
Atualmente, grande parte dos direitos femininos conquistados pela luta das mulheres ao longo 
dos anos estão sendo ameaçados devido à sombra desses estudos científicos de séculos atrás 
que até hoje exercem influência sobre a sociedade. 
 
A CÊNCIA E SEU PAPEL NO FORTALECIMENTO DO PATRIARCALISMO 
Em seu livro Inferior: How Science Got Women Wrong-and the New Research That's 
Rewriting the Story (Inferior: Como a Ciencia Errou sobre as Mulheres e as Novas Pesquisas 
que Estão Reescrevendo a História), Angela Saini pontuou diversos erros da ciência que 
prejudicaram as mulheres ao longo de toda a história da humanidade. Esses erros foram os 
responsáveis por basear diversas teorias que supostamente comprovavam a inferioridade da 
mulher com relação ao homem, as quais era amplamente defendidas por diversos cientistas 
famosos. 
Em um trecho do livro, Saini registra: 
“Há séculos, os cientistas influenciam aqueles que tomam decisões em questões 
importantes como direitos relacionados ao tema do aborto, a concessão do direito de 
voto às mulheres e aos métodos de ensino nas escolas. Eles moldam o que pensamos 
sobre a nossa mente, nosso corpo e nossos relacionamentos interpessoais. E, é claro, 
confiamos aos cientistas a missão de nos alimentar com fatos objetivos. Acreditamos 
que o que a ciência oferece é uma história livre de preconceitos. É a nossa história, 
partindo da própria aurora da evolução. Quando o assunto é mulher, uma grande parte 
dessa história está errada”. 
 
No livro, Saini descreve diversas discussões cujo foco se concentra nas diferenças entre os 
sexos, as quais são frutos de pesquisas tendenciosas impregnadas de machismo e estigmas 
sociais. 
Um dos cientistas mais famosos que colaboraram para a construção do estigma da inferioridade 
feminina foi Charles Darwin, pai da Teoria da Evolução. Suas obras “A Origem das Espécies”, 
de 1859, e “A Descendência do Homem”, de 1861, explicavam como os seres humanos da 
atualidade poderiam ter evoluído a partir de outras formas de vida. Com esses estudos, Darwin 
conseguiu construir um legado astronômico na ciência mundial. 
Em “A Descendência do Homem”, Darwin registra: 
 
“O homem é mais poderoso em corpo e mente que a mulher, e no estado selvagem ele 
a mantém numa condição de servidão muito mais abjeta que o faz o macho de 
qualquer outro animal; portanto, não surpreende que ele tenha ganhado o poder de 
seleção.” 
 
Em uma carta escrita poucos meses antes de sua morte, endereçada a uma cientista que 
questionou seus ideais sobre a inferioridade feminina, Darwin escreveu: 
“Certamente acredito que as mulheres, conquanto, em geral, superiores aos homens 
[em] qualidades morais, são inferiores em termos intelectuais [...] e parece-me ser 
muito difícil, a partir das leis da hereditariedade (se eu as compreendo de forma 
correta), que elas se tornem intelectualmente iguais ao homem.” 
 
Além disso, Darwin ainda escreve que, para que superassem essa desigualdade intelectual, as 
mulheres teriam que se tornar provedoras da família, mas que tal decisão comprometeria a 
felicidade da família e a saúde da prole. Tais ideias são corroboradas pelo livro do autor “A 
Descendência do Homem”, no qual ele explica, a partir de fatores sexuais e evolutivos, como 
os homens se tornaram dominantes com relação as mulheres. 
É inegável, diante disso, que as ideias cientificas de Darwin sofriam a influência das crenças 
sociais da época: a imagem da mulher como intelectualmente inferior, mais casta e responsável 
pela esfera doméstica. Angela Saini, em seu livro, diz que: 
“Até mesmo ele, o pai da biologia evolutiva, era tão influenciado por uma cultura de 
sexismo que acreditava verdadeiramente que as mulheres era o sexo inferior.” 
 
É inegável, também, a influência que tais crenças geraram na legislação e nas futuras pesquisas 
científicas que vieram antes e após a publicação dos livros de Darwin. Até o século XIX, 
colocações como essa foram feitas por diversos cientistas e filósofos como 
Rousseau, Schopenhauer, Vogt, Nietzsche e Freud. 
No âmbito legal, tais concepções ditas cientificas geraram grandes impactos nos direitos das 
mulheres, principalmente com relação ao voto e à independência financeira. Em uma crítica às 
mulheres que lutavam pelo direito ao voto, os cientistas Patrick Geddes e John Arthur 
Thompson disseram que: 
“As diferenças podem ser maiores ou menores, mas, para eliminá-las, seria necessário 
que toda a evolução acontecesse novamente com base em um principio novo. O que 
foi decidido entre os protozoários pré-históricos não pode ser anulado por uma Lei do 
Parlamento”. 
 
A busca por comprovações científicas da inferioridade das mulheres com relação aos homens 
chegou até a craniometria: ciência que estuda as medições do crânio humano. 
No início dos anos 20, Helen Hamilton Garndener começou a fazer questionamentosà 
comunidade cientifica, a qual afirmava que o cérebro da mulher ser mais leve que os dos 
homens implicava que elas eram menos inteligentes. Em resposta, um célebre biólogo, George 
Romenes disse que: 
“Verificando que, em média, o cérebro das mulheres pesa cerca de 142 gramas a 
menos que o dos homens, por causas meramente anatômicas, deveríamos estar 
preparados para esperar por uma nítida inferioridade de capacidade intelectual nas 
primeiras.” 
 
Na época, a teoria da inferioridade intelectual da mulher, fortalecida pelos estudos científicos, 
foi base para a construção de legislações patriarcalistas que não consideravam a mulher capaz 
de cuidar de sua própria vida sem a assistência de um homem, seja ele seu pai, seu marido, ou 
seu tutor legal. 
Apenas em 1882 as mulheres do Reino Unido puderam ter propriedades e a plena capacidade 
legal de controlá-las. E em 1887, um terço das mulheres estadunidenses tinham o direito de 
https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/Filosofia/noticia/2016/08/o-filosofo-arthur-schopenhauer-ensina-como-nao-sofrer-por-amor.html
https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2016/06/4-reflexoes-que-vao-te-introduzir-ao-pensamento-de-nietzsche.html
https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2018/09/conheca-9-curiosidades-sobre-sigmund-freud-pai-da-psicanalise.html
ficar com a remuneração que recebiam de seu próprio trabalho. No Brasil, foi dado às mulheres 
o direito ao voto apenas na década de 30. 
Outra pesquisa do século XX sobre as mulheres que gerou grande debate foi a realizada pelos 
cientistas Russell Clark e Elaine Hatfield, cujo titulo é: “Gender Differences in Receptivity to 
Sexual Offers (As Diferenças de Gênero Com Relação à Receptividade a Ofertas Sexuais”. Tal 
estudo tinha como objetivo entender quais as diferenças entre ambos os gêneros quando as 
pessoas estão diante de uma oferta de sexo casual. No fim da pesquisa, a conclusão foi de que 
os homens eram naturalmente poligâmicos, enquanto as mulheres eram mais castas e seletivas, 
buscando o parceiro perfeito. Além dessa, a escrita por Robert Trivers no início de sua carreira, 
“Investimento Parental e Seleção Sexual”, também corroborou com um dos estigmas sociais 
mais latentes da sociedade: o homem tem um forte impulso e natureza em ser poligâmico. 
Trivers sugere, em sua pesquisa, que: 
“Em espécies em que há uma forte seleção para o cuidado parental masculino, é mais 
provável que uma estratégia mista seja o melhor caminho para os machos – ajudar 
uma única fêmea a cuidar da prole, embora sem rejeitar oportunidades de acasalar 
com outras fêmeas que ele não irá auxiliar” 
A ideia da mulher casta e do homem poligâmico, com desejos naturais em manter relações 
sexuais, foi um dos estigmas mais utilizados para controlar e manter as mulheres “controladas” 
em diversas sociedades, inclusive a brasileira, principalmente quando inserida no contexto 
conjugal. 
As Ordenações Filipinas permitiam que assassinatos feitos em nome da honra acontecessem e, 
na maior parte das vezes, tais assassinatos ocorriam contra mulheres que praticavam adultério. 
No Código Penal de 1890, não eram tidos por criminosos aqueles que cometessem os chamados 
“atos passionais”, crimes cometidos sob grande emoção. A inserção desse excludente criminal 
foi utilizada diversas vezes em casos de assassinato de mulheres, especialmente as que 
supostamente teriam cometido adultério. Já no Código Penal de 1940, a passionalidade não era 
mais tida como motivo para isenção da pena, mas a absolvição era concedida àqueles que 
declarassem o crime para “defender sua honra”, assim como nas Ordenações Filipinas. 
Pode-se concluir que tais legislações são reflexos de valores sociais imprimidos às mulheres de 
forma brutal: ou a mulher se mantinha fiel ao marido ou estaria sujeita ao castigo que ele poderia 
escolher ou não lhe impor. 
E além da desvantagem judicial, até hoje as mulheres ainda são julgadas socialmente caso 
tenham relações com mais de um parceiro. Denominações como “puta”, “marmita” e “vadia” 
são comumente utilizadas com o objetivo de inferiorizar as mulheres que tem maior liberdade 
sexual. 
Além das citadas, diversas outras pesquisas insistiram em encontrar diferenças biológicas entre 
homens e mulheres, inclusive comprovações cientificas que provassem alguns estereótipos de 
gênero como: meninos gostam de carrinhos e brinquedos mais dinâmicos enquanto meninas 
gostam de bonecas e brinquedos mais estáticos. A maioria delas, porém, já foi refutada pelas 
pesquisas atuais, o que não exclui o prejuízo e problemas causados às mulheres de todo o 
mundo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONCLUSÃO 
Em seu livro, A Mística Feminina, publicado em 19623, Betty Friedan diz: 
“As feministas haviam desconstruído a antiga imagem da mulher, mas não puderam 
apagar a hostilidade, o preconceito e a discriminação que ainda existiam”. 
Tal declaração se torna mais fundamentada quando se considera o fato de que a igualdade 
formal, escrita em leis, não garante às mulheres melhores condições de vida. Atualmente, as 
mulheres ainda são tidas como inferiores aos homens em diversas sociedades. 
Tal concepção, influenciada pela religião, pela ciência e pelas construções sociais continuam 
causando danos às mulheres de todo o mundo. O feticídio em países asiáticos, bem como a 
mutilação de meninas na África e o apedrejamento de mulheres nos países do Oriente Médio 
são fenômenos que acontecem atualmente, sem nenhum controle estatal apesar da grande 
comoção e revolta internacional. Além disso, as mulheres em algumas sociedades vivem sob 
uma falsa ideia de igualdade que também as prejudicam socialmente: são as mulheres que 
vivem sob a sombra de uma Constituição que lhes concebe a igualdade formal perante os 
homens, mas também sob um governo que pouco faz para que a igualdade material seja 
fornecida. 
No Brasil, leis como a Lei Maria da Penha foram grandes avanços e conquistas da população 
feminina. Entretanto, os números de violência doméstica e feminicídio continuam a crescer no 
país. Atualmente, a taxa de feminicídios em terras brasileiras é registrada como a 5ª mais alta 
do mundo, perdendo apenas para El Salvador, Guatemala, Colômbia e Rússia, e matando 48 
vezes mais mulheres que o Reino Unido. Durante o período da Covid-19, o número de mortes 
aumentou ainda mais, chegando a 22%, segundo dados publicados pelo Fórum Brasileiro de 
Segurança Pública. 
Em seu livro, quando relaciona acontecimentos atuais com os erros da ciência com relação às 
mulheres, Angela Saini conclui: 
“Talvez você pense que esses embates não tenham nada a ver com o excelso mundo 
da ciência. (...) Porém, se não levarmos em conta a profunda injustiça com que a 
ciência tratou as mulheres no passado, é impossível haver mais justiça no futuro.” 
 
O uso da ciência como forma de baseamento para ideias sexistas e patriarcalistas influenciou 
muito a forma como as mulheres vivem em sociedade hoje em dia. Influencia a forma como se 
vestem, como andam e como se comportam, mas, principalmente, influenciam os seus direitos. 
Desde Darwin até os cientistas atuais, as mulheres tentam buscar espaço na ciência, para mudar 
esse panorama. 
Dessa forma, podemos afirmar que: a ciência prejudicou e ainda pode prejudicar mais a vida 
da mulher em sociedade, e esse fato não pode ser desvinculado das construções políticas, sociais 
e legislativas do Brasil ou de qualquer outra sociedade. 
Uma vez que os mitos sobre a mulher sejam esclarecidos, a noção de inferioridade diminuirá 
drasticamente, especialmente no âmbito dos direitos da mulher. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
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Rewritingthe Story. Beacon Press, 2017. p. 15, 29, 32. 
 
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OLIVEIRA, Sheila. Uma mulher é morta a cada nove horas durante a pandemia no Brasil, 
Brasil de Fato, 2020. Seção: Direitos Humanos. Disponível em: 
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Engels, F. El origem de la familia, de la propiedad privada e del Estado. Buenos Aires: 
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https://diariodocomercio.com.br/livre/a-condicao-da-mulher-no-oriente-medio-o-que-tem-isso-a-ver-conosco
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https://emporiododireito.com.br/leitura/leis-civis-e-penais-machistas-do-seculo-xx-e-a-obra-homens-traidos
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HIRSCH, F. José; GIORGI C. Fernanda. A mulher e a legislação brasileira, Migalhas, 2014. 
Disponível em: < https://migalhas.uol.com.br/depeso/196838/a-mulher-e-a-legislacao-
brasileira >. Acesso em: 3 nov. 2020 
 
 
 
https://migalhas.uol.com.br/depeso/196838/a-mulher-e-a-legislacao-brasileira
https://migalhas.uol.com.br/depeso/196838/a-mulher-e-a-legislacao-brasileira

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