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Resumo Epistemologia – Texto 4 As condições históricas dos movimentos funcionalistas: A psicologia do século XIX que se produzia na Alemanha no final daquele século é total diferente ao nosso quadro atual. Trata-se de uma psicologia que: a) Devota-se à pesquisa pura, em contraste com o quadro recente que enfatiza o aspecto prático de intervenção nos mais diversos campos. b) Toma como objeto de estudo a nossa experiência comum no consciente, objeto suficientemente problematizado por correntes relevantes como a psicanálise e o behaviorismo;. c) Devota-se a este objeto através da suspeita de ilusão de nossa experiência comum, problema herdado da física e da filosofia no século XVII, sem buscar, naquele momento, qualquer forma de ajustamento dos indivíduos. d) Utiliza nesse exame da nossa experiência uma forma particular de introspecção controlada em que os sujeitos teriam que ser mentalmente sãos e treinados para fazer a descrição mais precisa dos elementos básicos dessa experiência comum, as sensações. e) Por conta da exigência do método, não estuda os sujeitos comuns (muito menos crianças, animais e loucos); estuda outros psicólogos devidamente treinados na profissão de fé da fisiologia para chegarem aos meandros da nossa experiência mais pura, mais ingênua. O funcionalismo foi um projeto de psicologia vigente nos Estados Unidos, por um tempo, mas logo o mesmo foi perdendo seu valor e dando lugar as novas correntes na psicologia para que tivéssemos a mesma como temos hoje. Este projeto se iniciou por conta de algumas forças históricas na época, dentre elas são: a) As necessidades políticas e administrativas decorrentes de um processo de modernização avançado próprio àquele país. b) As características do sistema universitário norte-americano no final do século XIX. Os primeiros psicólogos norte-americanos: Nesse processo, alguns psicólogos começam a se destacar em centros isolados e com diferentes relações com a matriz alemã. Um primeiro grupo representado pelo inglês Edward Titchener, na Universidade de Cornell, aportava nos Estados Unidos visando trazer a boa nova da psicologia alemã. Esse psicólogo será responsável pelo batismo da psicologia funcionalista em 1898, ao tentar diferenciá-la de sua psicologia, a estrutural, supostamente mais objetiva e oficial. Um segundo grupo composto por psicólogos genuinamente norte- americanos visando à obtenção da bênção institucional do seu papa (Wundt). Mas essa rígida formação não aplacou interesses diversos do modo germânico de produzir psicologia. Baldwin, por exemplo, tendo passado apenas um período breve em Leipzig, adotou o pensamento darwinista, voltando-o para temas como o desenvolvimento infantil. Cattel, mesmo tendo sido o primeiro assistente de Wundt, ao voltar para Columbia dedicou-se ao trabalho de aperfeiçoamento de medidas mentais para a classificação dos indivíduos, crucial para a constituição de testes mentais. Stanley Hall ao retornar para universidade de Clark promove a implantação de uma série de novas áreas como a psicologia da infância, adolescência e velhice, a psicologia da educação, o sexo e a religião. Funda revistas e associações, além de ser responsável pelo convite, em 1909, para a vinda de Sandor Ferenczi, Gustav Jung e Sigmund Freud para expor em linhas gerais a psicanálise. Um terceiro grupo de psicólogos, composto por William James e John Dewey, dispensa claramente as bênçãos da matriz germânica e implanta essa disciplina em território norte-americano a seu próprio modo, de forma mais sistemática. A psicologia e a filosofia de William James: Para fins didáticos é possível dividir a obra de James em dois momentos: um psicológico e um filosófico. O primeiro período tem como marco inicial a criação de um pequeno laboratório de psicologia, em 11875, na universidade de Harvard, ou ainda no mesmo ano, o seu primeiro curso de psicologia, sobre as relações entre a fisiologia e a psicologia. Nesse período o ponto culminante de sua produção teórica é, sem dúvida, a publicação de 1890, após 12 anos de elaboração minuciosa, de “os princípios da psicologia”. Nesse tratado de mais de mil páginas encontram-se as principais ideias de James sobre tópicos tais como: hábito, atenção, fluxo de pensamento, self. Na perspectiva jamesiana, o que um organismo é, ou deixa de ser, decorre das funções que exerce e das interações com um dado ambiente. O self: Em sua concepção o self não é algo como uma esfera polida, com um espaço interior no qual cabem coisas, e mergulhada em um mundo que a delimita externamente. O eu, afirma James, é apenas “o nome de uma posição”, uma espécie de perspectiva individual privilegiada a partir da qual o mundo é medido em suas distâncias. Em segundo lugar James concebe tais distâncias em função das ações individuais sobre o ambiente, onde o indivíduo age é o aqui e agora, contraposto ao momento de uma ação passada ou de uma ação que ainda acontecerá. Em razão disso, James constrói uma noção de self caracterizada por uma certa fluidez, sem limites estabelecidos previamente e com as referências básicas de tempo e espaço definidas em função das ações das quais esse mesmo self é autor. O self não existe como uma estrutura com certa organização psíquica, antes de suas ações, ele passa a existir em função de suas ações sobre o ambiente. Para James a consciência tem como propriedades básicas os seguintes conceitos: 1. A personalidade 2. O seu aspecto mutante 3. A continuidade 4. A referência aos objetos 5. O seu aspecto seletivo O hábito: Sobre o hábito há três tópicos principais: primeiro, o destaque dado à sua base física ou neurofisiológica e sua participação tanto nos limites do aprendizado de novos hábitos como na modificação de hábitos antigos; segundo, a apresentação do hábito como uma versão possível das ações adaptativas de um organismo em referência a um meio, ou seja, a ênfase sobre os aspectos funcionais do hábito; terceiro, a possibilidade de alteração dos hábitos pela ação voluntária e os efeitos ético-morais a ela correspondentes. É na filosofia de James, e mais especificamente, no seu pragmatismo que a orientação funcionalista ganha força. Sobre o pragmatismo, este seria “primeiramente um método, e em segundo lugar, uma teoria genética do que se entende por verdade”. Para James o método pragmatista representava o estudo das modificações na experiência trazida pelas teorias, em especial as metafisicas e religiosas. Para James a teoria da verdade, ou o segundo sentido para o termo pragmatismo, é tida como consequência natural do seu primeiro sentido, enquanto método. Se o método pragmático une o significado à conduta, a teoria pragmática de verdade implica a boa conduta em seu sentido adaptativo. A relação entre o pragmatismo e o funcionalismo é de pura semelhança. Seriam, pois, duas faces de uma mesma moeda: o pragmatismo seria o funcionalismo filosófico, assim como o funcionalismo seria o pragmatismo psicológico. Como não há verdade prévia, mas apenas efeitos da verdade, deve-se tomar a experiência consciente a partir de seus processos e efeitos. É dessa maneira que ela passa a ser considerada a partir da sua função em duplo sentido: enquanto um processo dinâmico (um ato) e como processo orgânico dotado de finalidade adaptativa. Ainda que o objeto da psicologia se assemelhe bastante psicologia alemã, a experiência passa a ser vista a partir de uma nova questão, através de métodos diversificados que fogem da monotonia da introspecção controlada e regulada por um novo modelo de cunho estritamente darwinista. Essa guinada é crucial na história da psicologia porque encara o sujeito da experiência, avalizado pela psicologia clássica como sujeito dos errosou das ilusões do conhecimento em um corpo vivo. Com isso, a relação da consciência com o mundo passa a ser de adaptação e não mais de adequação. As escolas de Chicago e Columbia: Neste momento podemos nos deparar como o movimento funcionalista norte-americano deu uma feição mais organizada e sistemática ao projeto da psicologia enquanto ciência e técnica de adaptação. Os princípios funcionais se convertem em escolas no final do século XIX, e justamente em duas das mais novas universidades americanas: Chicago e Columbia. A primeira com Dewey, Angell e Carr; e a segunda com Thorndike e Woodworth. Nessas escolas marca-se o que poderíamos designar como orientação funcionalista propriamente dita. A escola de Chicago (Dewey, Angel e Carr): A primeira característica dessa psicologia é a sua assistematicidade. Certamente isso facilitou a sua difusão e a delimitação de modo mais amplo da psicologia como ciência e técnica de adaptação. Esse caráter assistemático é reconhecido por seus próprios membros. As razões para o caráter assistemático do funcionalismo vão além da reação a uma psicologia em moldes germânicos, extremamente sistematizada. Ela reflete também os interesses diversificados de seus membros na propagação dessa nova forma de psicologia. O seu caráter eclético pode se dever também à sua vinculação com o pensamento pragmatista. Neste opera-se uma recusa a tudo que se possa ser caracterizado como sistema estático ou fechado. Deve-se destacar o exame da noção de função através de seu duplo aspecto: como processo vital e como sentido adaptativo: 1. Quanto ao primeiro sentido, se noção de função se refere ao estudo das relações contingentes entre um ato e a sua estrutura, ou uma causa e seu efeito, o funcionalismo constitui uma psicologia explicativa e não apenas descritiva dos elementos mentais. Ou seja, o funcionalismo não se ocupa com a listagem dos átomos mentais, como fazia a psicologia clássica alemã. Se a função última da consciência é a adaptação, são as funções e não os elementos mentais que devem ser alvo de investigação. 2. Sobre o segundo sentido, função aqui é vista como utilidade promovida em uma situação adaptativa. Se a noção de adaptação se associa às de ajustamento e de equilíbrio, a de função representa utilidade, a finalidade biológica cumprida por este equilíbrio. Ela põe o funcionalismo em contato direto com o evolucionismo biológico, diferenciando-o da psicologia clássica alemã. Enquanto esta buscava avaliar o ajustamento da nossa experiência aos objetos experimentados, o funcionalismo intenta estudar a adaptação do organismo a seu meio ambiente através da sua experiência. A consciência como instância adaptadora é vista não somente como adaptada, mas inclusive como adaptante. A escola de Columbia (Thorndike e Woodworth): A escola de Columbia, por sua vez, toma a adaptação em sentido mais comportamental e aconrada em aspectos motivacionais. Thorndike, em seus experimentos sobre a inteligência animal, não supõe mais a solução dos problemas governada por uma consciência selecionadora de respostas, mas um conjunto casual de respostas que são selecionadas por seus efeitos de satisfação. Esta é a sua clássica lei do efeito. Ao substituir a consciência pelo acaso, não apenas adequa o seu modelo darwinista, como abre caminho para o behaviorismo. Aqui o ajuste do organismo ao meio se realiza através de um conjunto de mecanismos casuais, mecânicos e passíveis de controle, concedendo, portanto, pelos poderes psicológicos, enquanto engenheiros de conduta. Contudo isso não implica a adoção de um modelo estímulo – resposta. Woodworth valorizando o a importância do organismo propõe um modelo E-O-R. A adaptação é de nível ontogenético, ligado ao processo individual. Deste modo a adaptação deixa de expressar uma relação de sobrevivência em um meio e passa a significar uma melhor vivência neste, tornando-se um conceito qualitativo. Essa melhor vivência não se refere apenas a um meio físico, mas antes de tudo a um meio social. Estar adaptado é antes de tudo estar ajustado às demandas do meio social, sejam elas quais forem. Portanto, a ideia original de função, como utilidade promovida para sobrevivência do organismo, é transportada para um contexto psicossocial. A psicologia funcional não se interessa apenas pelo estudo da adaptação. Ela deseja igualmente se transformar num instrumento de adaptação. E isto ocorre mais uma vez graças à postura pragmatista, na qual o valor de um conhecimento está calcado em suas consequências práticas. É desta forma que não apenas o conhecimento comum deve se mostrar vital, mas principalmente o do psicólogo. Só que a utilidade buscada não diz respeito ao indivíduo, mas à sociedade como um todo. Portanto, o meio social não é apenas regulador, mas também finalidade de adaptação. A adaptação psicológica visa, então, ajustar a sociedade a si própria, através do manejo de indivíduos, principalmente os desadaptados.
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