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0 INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DA GRANDE FLORIANÓPOLIS – IESGF CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: ATIVIDADES PRÁTICAS SUPERVISIONADAS - APS PROF. RICARDO ESPÍNDOLA ÂNGELO ANTÔNIO SORAIRE - 32010001869 UILSON CHAVES - 32010001864 A RELAÇÃO DA FILOSOFIA COM O DIREITO São José 2021 1 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................2 2 DESENVOLVIMENTO........................................................................................................3 2.1 CONCEITUAÇÃO...............................................................................................................3 2.1.1 Filosofia.............................................................................................................................3 2.1.2 Direito................................................................................................................................3 2.1.3 Filosofia do Direito...........................................................................................................4 2.2 BREVE HISTÓRICO...........................................................................................................5 2.2.1 Filosofia do Direito na Idade Antiga..............................................................................5 2.2.1.1 Pré-Socráticos.................................................................................................................5 2.2.1.2 Sócrates...........................................................................................................................6 2.2.1.3 Platão...............................................................................................................................7 2.2.1.4 Aristóteles.......................................................................................................................8 2.2.2 Filosofia do Direito na Idade Média...............................................................................9 2.2.2.1 Cristianismo....................................................................................................................9 2.2.2.2 Santo Agostinho............................................................................................................10 2.2.2.3 São Tomás de Aquino...................................................................................................11 2.2.4 Filosofia do Direito na Idade Moderna........................................................................12 2.2.4.1 Jusnaturalismo Moderno...............................................................................................12 2.2.4.2 Contratualismo e Kant..................................................................................................14 2.2.5 Filosofia do Direito na Contemporaneidade................................................................15 2.2.5.1 Positivismo Jurídico......................................................................................................15 2.2.5.2 A Relação do Direito e a Democracia...........................................................................17 2.2.5.3 A Questão da Validade Jurídica....................................................................................18 2.2.5.4 A Questão da Justiça, Direito e Moral..........................................................................19 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................21 4 REFERÊNCIAS...................................................................................................................22 2 1 INTRODUÇÃO Este trabalho busca verificar a relação da Filosofia com o Direito, pois uma das ciências mais presentes na sociedade humana, sem dúvida, é o pensar filosófico, que, há muito, tem se inserido no âmbito jurídico, ao pesquisar, desenvolver, criticar e padronizar princípios e conceitos normativos e jurídicos. Entende-se que o Direito é universal, ou seja, em qualquer lugar do mundo onde existir o homem haverá a necessidade do Direito regulando a convivência e a vida social das pessoas e, justamente por essa universalidade do Direito, que se pode dizer que é suscetível de indagações filosóficas. Tendo em vista que a Filosofia enquanto Ciência acumula os saberes históricos e culturais da humanidade e vai procurando explicação para os conceitos e sentidos dos princípios jurídicos, pois essa é sua função, ao aplicador do direito cabe procurar conhecer as normas e aplicá-las com conhecimento da Filosofia. Por sua vez, para o universo jurídico, a Filosofia traz a inquietação para lidar com todo um processo de busca da verdade, para compreender, dentro do caso concreto, as respostas necessárias para satisfazer, não a vontade daquele que julga estar com a razão, mas encontrar, dentro do que foi apresentado, qual a verdadeira razão e tentar a melhor forma de aplicar a lei. Como se pode depreender do até aqui exposto, a Ciência Jurídica depende de conteúdos filosóficos. Tanto a interpretação do Direito como a forma de desenvolver do jurista têm fundamentos em alguma filosofia. Por isso, a Filosofia não pode ser afastada do Direito. Esse também é o entendimento de Oliveira (2012), ao salientar que o estudo do Direito fica incompleto se não alcança seu nível filosófico. Desse modo, na Filosofia do Direito, o questionamento que orienta a reflexão é o conjunto de especulações e suas consequentes indagações que tratam dos problemas jurídicos partindo de seus fundamentos, sem se preocupar com a ordem prática. 3 2 DESENVOLVIMENTO Este capítulo oferece uma visão geral da relação da Filosofia com o Direito. Dá-se conta de que percorrer esse caminho requer entender suas configurações históricas até os dias atuais, bem como compreender análises do conteúdo conceitual destes institutos. 2.1 CONCEITUAÇÃO 2.1.1 Filosofia De acordo com Cabral (2021, p. 1), o vocábulo Filosofia é composto de duas outras palavras, ambas de origem grega: “Filos, que significa amor, amizade, e Sofia, que se traduz como sabedoria ou conhecimento”. Com outras palavras, Menezes (2021, p. 1) define Filosofia como “amor ao conhecimento”. Tanto Cabral (2021) quanto Menezes (2021) atribuem a invenção da palavra Filosofia a Pitágoras de Samos (571 a.C. – 496 a.C.). Este, quando solicitado por um rei a demonstrar seu saber, disse-lhe que não era sábio, mas Filósofo, ou seja, amigo da sabedoria. Assim, pode-se depreender que a Filosofia é uma área do conhecimento que coloca em questão o próprio conhecimento, ou seja, estuda a existência humana e o saber por meio da análise racional. Em seu livro “Convite à Filosofia”, a autora Chauí (2006) escreve que esse saber tem a missão de duvidar das crenças costumeiras. Isso significa colocar em questão o senso comum. 2.1.2 Direito O Direito é conceituado e definido de várias formas, por diversos autores. Segundo Gusmão (2002, p. 23), por exemplo, Direito é um "conjunto de normas executáveis coercitivamente, reconhecidas ou estabelecidas e aplicadas por órgãos institucionalizados". Já Kelsen (2002, p. 28) define Direito como "um conjunto de regras que possui o tipo de unidade que entendemos por sistema". Outro autor a quem se recorreu para essa definição é Nader (2003, p. 34), para quem o Direito é um "conjunto de normas de conduta social, imposto coercitivamente pelo Estado, para realização de segurança, segundo critérios de justiça". 4 Finaliza-se este tópico com o conceito e definição de Reale (2002, p. 14), que entende o Direito como uma "ordenação heterônoma, coercível e bilateral atributiva das relações de convivência, segundo uma integração normativa de fatos segundo valores". Em suma, o Direito tutela os valores que certa comunidade humana considera como imprescindíveis à sua existência,sendo, portanto, um elemento que possibilita a vida em sociedade, por configurar os princípios por ela estipulados, como conceito de justo e correto; responsável por pautar os frutos de uma vida organizada no eixo das reações e necessidades humanas. 2.1.3 Filosofia do Direito Segundo Leite (2016), necessário se faz entender a Filosofia do Direito como um desdobramento dos saberes filosóficos já estabelecidos, cabendo observar as maiores conquistas, as mesmas técnicas e até os mesmos métodos, e seguir cautelosamente os mesmos passos daquela à qual se vincula como matriz, inclusive por ser anterior e mais genérica. Essa autora conceitua Filosofia do Direito, como um: [...] saber crítico a respeito das construções jurídicas erigidas pela Ciência do Direito e pela própria práxis do Direito, buscando os fundamentos do Direito, seja para cientificar-se de sua natureza, seja para criticar a base de suas estruturas e do raciocínio jurídico, provocando as vezes, fissuras no construído que por sobre as mesmas se ergue. (LEITE, 2016, p. 4). Já na concepção de Mascaro (2012, p. 129), a Filosofia do Direito “é um ramo específico da filosofia geral e o máximo pensamento possível sobre o próprio direito”. Depreende-se, assim, que, para o Direito, a Filosofia se apresenta como importante instrumento na apreensão do sentido das normas jurídicas. Tal importância se constrói a partir de conceitos filosóficos que permitem ao jurista compreender sua própria atividade. Ela funciona como um processo, por intermédio do qual, sem negar ou contestar a validade da postura anterior, ressalta outro ângulo. Aparece como um aprender a pensar, ou seja, como um desenvolvimento da capacidade de questionar, de rejeitar como dado inequívoco a evidência imediata, pois o mais importante não é conhecer as respostas outrora apresentadas, mas tentar alcançar, por meio da reflexão e questionamento já propostos, uma nova resposta, submetê-las a novas indagações e, consequentemente, inserir-se no caminho de novas questões, buscando um exercício analítico-crítico do filosofar. 5 2.2 BREVE HISTÓRICO É importante ter em mente que discorrer sobre a Filosofia do Direito requer um esforço individual para entender ideias e práticas históricas e atuais comprometidas com a determinação do papel e da extensão do Direito. 2.2.1 Filosofia do Direito na Idade Antiga Conforme expressam Barros e Soares (2019), a Filosofia nasceu na Grécia antiga, aproximadamente no século VI a. C. e o primeiro filósofo de que se tem notícia é Tales de Mileto. Todas as coisas são feitas de água, teria dito Tales de Mileto. E assim começam a Filosofia e a Ciência. Tales e alguns de seus contemporâneos praticaram uma Filosofia voltada para o entendimento dos fenômenos naturais. Para esses autores, a procura por um elemento primordial se faz dentro de um contexto que leva em conta outros pressupostos, tais como a existência de uma lógica de causalidade inerente à ordem natural; o compromisso com o logos (razão informadora do discurso racional); a ideologia de que a ordem presente no cosmos era acessível à racionalidade humana. Levando-se em conta esse e os demais outros fatores, a humanidade, representada pelos gregos, abre um novo método de entender e interpretar a vida, a sociedade e o mundo. Surge, assim, o que posteriormente será chamado de Filosofia (BARROS; SOARES, 2019). 2.2.1.1 Pré-Socráticos Segundo Melo (2020), os pré-socráticos buscavam responder a algumas perguntas com inclinação para a physis, ou seja, para entender a origem das coisas, a composição da matéria e a ideia de universo, ao que Sócrates vai lhes definir depois como lunáticos encantados com os céus. Esse autor ainda argumenta que o período pré-socrático mostra sua grande riqueza cultural e intelectual, apesar de ser um período muito atrelado à ideia do mito e à religião. Todavia, consegue-se tirar grandes ideias e ensinamentos acerca do convívio social e do entendimento de justiça, além de servir de base para muitos filósofos importantes, como Aristóteles e Platão. De acordo com Porfírio (2021, p. 2), para facilitar os estudos, os historiadores da Filosofia agruparam os pré-socráticos em escolas, de acordo com as ideias de cada pensador. Estas são as principais escolas: 6 Escola Jônica: o pensamento fundado por Tales, que afirmava que a água seria o princípio de tudo, foi continuado por Anaximandro, que afirmava que a origem dava-se por um elemento infinito e indefinível, o que ele chamou de ápeiron. Outro expoente do pensamento jônico deu-se com o discípulo de Anaximandro, Anaxímenes, que postulou que o princípio de tudo ocorreu por meio de um elemento infinito, mas bem definido, o ar. Heráclito de Éfeso, outro jônico, afirmou ser o fogo a origem de tudo, o que daria à natureza um caráter transformador. Escola Pitagórica: Pitágoras de Samos, um grande matemático antigo, observou a presença das relações matemáticas em toda a natureza. Com base nos tamanhos, pesos, proporções, distâncias e valores variados, a natureza seria constituída pela própria Matemática. Segundo o filósofo, a origem de tudo seria, precisamente, o início de qualquer figura geométrica — o ponto e a ideia de unidade. Escola Eleata: os principais eleatas são Parmênides e Zenão, que formularam o princípio não com base em um elemento preciso, mas na imobilidade de todas as coisas que evidencia a essência de tudo. Segundo Parmênides, não havia criação e nem mudanças, mas uma essência eterna e imutável de tudo. A mudança que percebemos no mundo seria fruto do engano de nossos sentidos. Escola Pluralista: os principais pluralistas são Empédocles, Anaxágoras, Demócrito e Leucipo. Todos eles afirmavam não haver um único elemento causador de tudo, mas uma composição plural que originou o Universo. Para Empédocles, essa origem dava-se com base nos quatro elementos da natureza — terra, fogo, água e ar. Para Anaxágoras, a origem estava no que ele chamou de sementes, que seriam compostos que se aglutinariam ou seriam separados pela afinidade, por meio das forças naturais que ele chamou de amor e ódio. Leucipo e Demócrito, considerados os “pais” da Química, formularam os átomos como origem de tudo. A palavra átomo vem do grego antigo e significa indivisível. Os átomos seriam, segundo os pensadores, as menores partículas que se aglutinam, com partículas semelhantes a si mesmas, para formar os objetos do mundo. Depreende-se, desse modo, que o início de todo o conhecimento racional ocidental deu-se no período pré-socrático. As ideias dos pré-socráticos impulsionaram, por exemplo, as ciências da natureza, ao mostrarem que a resposta para as perguntas naturais não se encontra fora deste mundo, mas na própria natureza. Além da importância científica, há também uma importância histórica que valoriza o período Pré-Socrático devido à sua relevância para a constituição de toda a Filosofia posterior. 2.2.1.2 Sócrates Após a fase introdutória da Filosofia, surge no mundo grego a histórica figura de Sócrates que inaugura um período novo chamado de Período Clássico. Nesse período, aparece a figura de Sócrates em permanente oposição aos Sofistas, que exerciam a cidadania por meio do discurso. O conceito de justiça, para os sofistas, é igualado ao de lei. Justo é o que está na lei, o que foi dito pelo legislador. Segundo Bittar e Almeida (2010, p. 96): https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/quimica/o-que-e-atomo.htm https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/anaxagoras.htm https://brasilescola.uol.com.br/biografia/democrito-de-abdera.htm https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/parmenides.htm https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/pitagoras-1.htm https://brasilescola.uol.com.br/quimica/heraclito-filosofo-fogo.htmhttps://brasilescola.uol.com.br/filosofia/anaximenes.htm 7 Em outras palavras, a mesma inconstância da legalidade (o que é lei hoje poderá não ser amanhã) passa a ser aplicada à justiça (o que é justo hoje poderá não ser amanhã). Nada do que se pode dizer absoluto (imutável, perene, eterno, incontestável...) é aceito pela sofística. Está aberto campo para o relativismo da justiça. Na concepção de Yabiku (2011), Sócrates foi um opositor ferrenho aos sofistas e deixou uma marca indiscutível no modo de se pensar no Ocidente. Figura polêmica, por não ter deixado escritos, muitos dizem, inclusive, que ele não existiu, foi apenas um personagem que teria sido inventado por seus supostos alunos Platão e Xenofonte. Foi, então, principalmente por meio dos escritos desses dois, que o legado de Sócrates não pereceu. Convivendo na Era de Péricles (século V a.C.), de apogeu da Grécia, junto ao povo nas praças públicas (agorá), da cidade (pólis) de Atenas, Sócrates situou sua doutrina na natureza humana e seus desdobramentos ético-sociais. Via na prudência (phónesis) uma virtude essencial para a ordem social, visando a uma educação cidadã. Sobre o método de Sócrates, Chauí (2006, p. 311) argumenta: As perguntas socráticas terminavam sempre por revelar que os atenienses respondiam sem pensar no que diziam. Repetiam o que lhes fora ensinado desde a infância. Como cada um havia interpretado à sua maneira o que aprendera, era comum, quando um grupo conversava com o filósofo, uma pergunta receber respostas diferentes e contraditórias. Após certo tempo de conversa com Sócrates, um ateniense via-se diante de duas alternativas: ou zangar-se com a impertinência do filósofo perguntador e ir embora irritado, ou reconhecer que não sabia o que imaginava saber, dispondo-se a começar, na companhia de Sócrates, a busca filosófica da virtude e do bem. Sócrates desafiava a ordem vigente nos círculos sociais da sua época, pois questionava o relativismo dos sofistas, pregando uma verdade perene, que influenciaria sistemas filosóficos posteriores, como o platonismo, o aristotelismo e o estoicismo. Ademais, Sócrates pregava a irrestrita obediência à lei. O Direito – conjunto de leis, em termos simplistas – seria um instrumento de coesão social que levaria à realização do bem comum, entendido como o "desenvolvimento integral de todas as potencialidades humanas, alcançadas por meio do cultivo das virtudes", ensinam Bittar e Almeida (2010, p. 104). 2.2.1.3 Platão De acordo com Costa (2010), Platão (429-347 a.C.) foi discípulo de Sócrates, mestre de Aristóteles, e fundador da Academia, a primeira e mais duradoura universidade do mundo. 8 Sua influência foi de Alexandria a Cambridge, na teologia cristã, na cultura medieval e na Renascença. Para Platão, o mundo das ideias gerais refletia a doutrina de Parmênides, nos quais o ser é imóvel, enquanto o mundo sensível se espelhava em Heráclito, que afirmava a mutabilidade essencial do ser. Na vida terrena, se experimenta a mutabilidade; no Hades (além-vida), a permanência. Segundo Bittar e Almeida (2010, p. 121): "As almas cumprem seus ciclos num longo período de provas, durante o qual permanecem indo e vindo entre duas realidades". De acordo com Yabiku (2011), em "A República", Platão escreve que a justiça é a virtude do cidadão e do filósofo que tem predominância sobre as outras (sabedoria, coragem e temperança). É a justiça que ordena as virtudes que regem cada uma das três partes (ou potências) da alma humana, a racional (possibilita o conhecimento das ideias), a irrascibilidade (impulsos e afetos) e a concupiscente (necessidades mais elementares). A razão seria governada pela sabedoria ou prudência (sophia ou phrónesis), a irrascível pela coragem (andreia). Tanto a irrascibilidade e a concupisciência deveriam submeter-se à razão, por meio da temperança ou moderação (sophrosyne). 2.2.1.4 Aristóteles Aristóteles (384-322 a.C.) é autor da “Metafísica”, do “Organon” e de outras obras sobre física, metafísica, retórica, poética, moral e política. É considerado o gênio mais vasto da Antiguidade. Em Alexandria e na Roma Imperial, sua obra deu início ao avanço da ciência. No século XIII, seus escritos filosóficos, trazidos pelos mouros à Europa, fertilizaram a filosofia escolástica. Na volta ao redor do mundo que estamos a dar, esclarece Durant (1969), não encontraremos outro cérebro de maior influência no espírito da humanidade que o de Aristóteles. Foi discípulo de Platão por vinte anos e mestre de Alexandre Magno, por recomendação de seu pai Filipe da Macedônia. Fundou a escola filosófica conhecida como peripatética (em que se ensina passeando). Nas palavras de Durant (1969, p. 53): O seu sistema mostra-nos toda a natureza como um imenso esforço da matéria bruta para se elevar até ao ato puro, isto é, ao pensamento e à inteligência. É o gênio mais vasto da Antiguidade, abrangendo todas as ciências do seu tempo e muitas que não existiam. Na Idade Média, Aristóteles era o oráculo dos filósofos e dos teólogos escolásticos. 9 Conforme Pimentel e Maldaner (2005), a atividade filosófica, segundo Aristóteles, nasce da admiração. Os homens foram levados a filosofar sendo, primeiramente, abalados pelas dificuldades mais óbvias e foram progredindo pouco a pouco até resolverem problemas maiores. O filosofar deve estar destituído de conotação utilitária e interesseira. A Filosofia é a ciência das causas primeiras, é de todas as ciências a única que é livre, pois só ela existe por si. As outras ciências podem até ser mais necessárias que a filosofia, mas nenhuma se lhe assemelha em excelência. Ainda de acordo com Pimentel e Maldaner (2005), Aristóteles lançou as primeiras noções de Justiça, não como valor relacionado à generalidade das relações metaindividuais, como faziam os estudiosos de sua época, mas dentro de uma perspectiva puramente jurídica, isto é, considerando as ideias de justiça e equidade como fontes inspiradoras da lei e do direito. Foi o precursor de um conceito jurídico de Justiça, enfocando-a sob o contexto da “polis”, isto é, mencionando sua importância na estrutura da elaboração da lei e do direito necessário à vida natural do homem. Existe uma lei natural que dá caminho a tudo, sendo imutável, inderrogável e necessária. 2.2.2 Filosofia do Direito na Idade Média Encerrado o período áureo da Filosofia Grega, o grande movimento filosófico é a chamada Filosofia Medieval de caráter cristão. Conforme Pimentel e Maldaner (2005), a Idade Média é o longo período que vai de 476 (queda do império Romano do Ocidente) até 1453 (queda do Império Romano do Oriente, tomada de Constantinopla pelos Turcos- Otomanos). No período medieval, os únicos letrados eram os monges. Então, a temática da época estava relacionada à tentativa de conciliar a fé com a razão, como se abordará a seguir. 2.2.2.1 Cristianismo A característica mais marcante da Filosofia Medieval foi, em função da força da instituição religiosa cristã, o teocentrismo. No lugar do teocentrismo, adjetivo marcante do pensamento medieval, surge uma forte valorização do homem, que passa a ocupar o centro das atenções. E esse homem é dotado de uma Razão confiável o bastante para poder descartar toda e qualquer realidade que não se harmonizava com as ideias e com os valores encampados por essa Razão. (BARROS; SOARES, 2019). 10 Segundo Aranha e Martins (1993), o desejo de unidade de poder, de restauração da antiga ordem perdida se expressa na difusão do Cristianismo que representa, na Idade Média, o ideal de Estado Universal. Desde o final do Império Romano, quando o Cristianismo se tornara religião oficial do Império no ano 313, estabelece-se a ligação entre Estado e Igreja. A igreja legitima o poder do Estado,atribuindo-lhe uma origem divina. Na lição de Pimentel e Maldaner (2005), a fé popular nem sempre se manifestava nos termos pretendidos pela doutrina católica. Havia uma série de crenças e ações, denominadas heresias que se chocavam com os dogmas da Igreja. Para combater as heresias, o Papa Gregório IX criou, em 1231, os tribunais da inquisição, cuja missão era descobrir e julgar os heréticos. Os condenados pelo tribunal eram entregues às autoridades do Estado, que se encarregavam da execução das sentenças. As penas aplicadas iam desde o confisco de bens até a morte na fogueira. Os tribunais da inquisição atuaram em vários reinos cristãos: Itália, França, Alemanha, Portugal e, sobretudo, Espanha. Pressionada pelas monarquias católicas, a inquisição atuou no sentido de combater os movimentos contrários à ordem social dominante, desempenhando também papel de repressão social-política. Pimentel e Maldaner (2005) concluem, afirmando que o Cristianismo nunca foi reconhecido como filosofia, mas sim como uma mensagem de salvação. Com o passar do tempo, ele se tornou um fermento poderoso também para a renovação da filosofia, restituindo à razão a confiança em si mesma, isto é, na sua capacidade para resolver os problemas últimos que atormentam a alma humana. O Cristianismo dirigiu a filosofia para um caminho desimpedido e seguro. Como visto, na Idade Média, uma das mais fortes influências se deu com as influências eclesiásticas. Dentre elas, as mais importantes foram desencadeadas com Santo Agostinho e santo Tomas de Aquino, como se abordará na sequência. 2.2.2.2 Santo Agostinho Com o Cristianismo, Santo Agostinho criou uma doutrina para conciliar a filosofia grega, principalmente o pensamento de Platão. Segundo Pimentel e Maldaner (2005), em Santo Agostinho, os pressupostos da visão de justiça são teológicos mesclados com os escritos de Platão. O tema justiça para o filósofo identifica-se como a justiça humana e a justiça divina. A justiça pode ser dita como humana ou divina. Então, aquela é realizada entre os homens, são as decisões humanas na sociedade, 11 que tem como fonte primordial a lei dos homens; enquanto as leis divinas são imutáveis, perfeitas e infalíveis, sendo infinitamente justa e boa. As reflexões sobre o Direito e o Estado acham-se, fundamentalmente, na obra De Civitate Dei (A cidade de Deus). O Estado e o Direito foram criados por causa desta nova condição humana, uma vez que, para o filósofo, não há república sem ordem, não há ordem sem direito e não há direito sem justiça. Santo Agostinho se refere à justiça como elemento essencial do Direito: “onde não há verdadeira justiça não pode existir verdadeiro Direito”. (NADER, 2003, p.120). Conclui-se, por isso, que a política humana deve refletir os anseios da lei divina, e é nesse sentido que a teoria agostiniana define que, para a realização desses anseios divinos, deve haver a intervenção de um chefe que conduza as leis humanas sobre o prisma de uma lei divina, baseado nesse compromisso que nasce o Estado teocrático defendido pelo filósofo. 2.2.2.3 São Tomás de Aquino O problema das relações entre fé e razão é também a temática central do pensamento de São Tomás de Aquino. Foi estudioso e admirador de Aristóteles e promoveu a conciliação entre a doutrina aristotélica e o Cristianismo. Conforme Pimentel e Maldaner (2005), em sua obra “Suma Teológica”, São Tomás de Aquino expõe sua doutrina básica no estudo do que significava a justiça como problema ligado à ação humana. No que se diz respeito à natureza humana, São Tomás definia que o homem é composto de corpo e de alma, sendo aquele o material para o aperfeiçoamento da alma que é criado por Deus, aperfeiçoamento esse que se dá porque a alma animal pode ser sensitiva ou intelectual, e que é na atividade intelectual do homem que esse particulariza e diferencia sua alma. Para ele, a Filosofia deveria subordinar-se à revelação, que é critério único de verdade. São Tomás definiu o termo justiça mesclado no conceito de ética, afirmando, assim, com base nas influências aristotélicas, que justiça é uma vontade perene de dar a cada pessoa o que é seu. Caracterizando a justiça como igualdade de pessoas, exteriorizada no comportamento delas em poder discernirem o que é seu e o que não é. Segundo Nader (1997, p. 124), São Tomás de Aquino aceitava que o direito é objeto da justiça, ou seja, não se pode confundir direito e justiça, porque são diferentes seus conceitos e inspirações, mas o direito busca a realização da justiça, que, por sua vez, é o efeito da lei. Tomás de Aquino distinguiu quatro espécies de lei: a eterna, a natural, a divina e a humana. A lei eterna era a própria razão divina no governo do universo, e como Deus nada 12 concebia temporariamente, a lei seria eterna. Todas as leis humanas derivam da lei eterna. A lei humana teria natureza de lei apenas quando se conformasse a razão reta e quando se afastasse não seria lei, mas violência. 2.2.4 Filosofia do Direito na Idade Moderna Na Idade Moderna, é de se ressaltar a importância do Renascimento neste período. A Renascença atingiu o campo da Política e também o campo Jurídico. Na Idade Média, por exemplo, o Direito era concebido como ordem fundada em uma lei natural vinculada a Deus, enquanto que o Estado, por sua dependência ao Direito, também se apoiava neste princípio. A Modernidade inverteu esta ordem de subordinação. A partir da concepção de Estado fundado na razão desenvolveu-se a ideia do Direito Natural baseado no homem e não na origem divina. A despeito do Direito Natural, na concepção de Nader (2003, p. 131): [...] já não seria identificado com a natureza cósmica, como fizeram os estóicos e os romanos, nem imaginado como produto da vontade divina. A valorização da pessoa humana, que se registrou com a Renascença, atingiu o âmbito da Filosofia Jurídica, quando então o Direito Natural passou a ser reconhecido como emanação da natureza humana. São quatro os pontos fundamentais dessa escola: 1º) o reconhecimento de que a natureza humana seria fonte do Direito Natural; 2º) a admissão da existência humana, em épocas remotas, do estado de natureza; 3º) o contrato social como origem da sociedade; 4º) a existência de direitos naturais inatos. Depreende-se, assim, que o Direito Natural, ou Jusnaturalismo, supõe a existência de um direito universal, estabelecido pela natureza. Seu fundamento é o da lei natural, e não o da lei humana, que rege os acordos e contratos sociais. 2.2.4.1 Jusnaturalismo Moderno De acordo com Fassò (1998), o Jusnaturalismo é uma doutrina segundo a qual existe e pode ser conhecido um "direito natural" (ius naturale), ou seja, um sistema de normas de conduta intersubjetiva diverso do sistema constituído pelas normas fixadas pelo Estado (direito positivo). Este direito natural tem validade em si, é anterior e superior ao direito positivo e, em caso de conflito, é ele que deve prevalecer. O Jusnaturalismo é, por isso, uma doutrina antitética à do "positivismo jurídico", segundo a qual só há um direito, o estabelecido pelo Estado, cuja validade independe de qualquer referência a valores éticos. Às vezes o 13 termo é reservado, por antonomásia, a doutrinas que possuem algumas características específicas comuns, de que se falará a seguir, e que defenderam as mesmas teses nos séculos XVII e XVIII: tanto que se gerou a opinião errônea de que a doutrina do direito natural teve a sua origem apenas nesse período. Ainda na visão de com Fassò (1998), na realidade, a doutrina tomística da lei natural não fazia senão repetir, embora inserindo-a em moldes teológicos, a doutrina estóico- ciceroniana da lei "verdadeira" enquanto racional. E, mesmo que um lugar-comum historiográfico demasiado difuso afirme ocontrário, vai prevalecendo hoje a opinião de que o Jusnaturalismo moderno (que assumiu, principalmente no século XVIII, características acentuadamente laicas e, no campo político, liberais) procede, em grande parte, da doutrina estóico-ciceroniana do direito natural, propagada justamente graças à acolhida que lhe dispensou o tomismo. Isso se deu, sobretudo, na medida em que a corrente tomista se opôs energicamente, a partir do século XIV, mas principalmente no século XVI, no tempo da Reforma, ao voluntarismo teológico inspirado nas teses de Guilherme de Occam, que punha como fonte primeira de toda norma de conduta e como fonte de legitimidade da autoridade política a vontade divina e, consequentemente, a Sagrada Escritura. O autor continua afirmando que, entre o voluntarismo e o Jusnaturalismo de inspiração tomística, os teólogos juristas espanhóis do século XVI (entre eles, o maior de todos, Francisco Suárez), que trataram amplamente do direito natural, tentaram, em geral, uma mediação. (FASSÒ, 1998). Para Fassò (1998), está muito estendida a opinião de que entre o Jusnaturalismo antigo-medieval e o Jusnaturalismo moderno existe uma profunda oposição: o primeiro constituiria uma teoria do direito natural como norma objetiva, enquanto que o segundo seria exclusivamente uma teoria de direitos subjetivos, de faculdades. Na realidade, entre o Jusnaturalismo antigo, medieval e moderno não existe qualquer fratura, existe antes uma substancial continuidade. É certo, no entanto, que o Jusnaturalismo moderno ressalta fortemente o aspecto subjetivo do direito natural, ou seja, os direitos inatos, deixando obumbrado seu correspondente aspecto objetivo, o da norma, em que haviam geralmente insistido os jusnaturalistas antigos e medievais. 14 2.2.4.2 Contratualismo e Kant Toda filosofia política kantiana se ampara nos princípios fundantes do estado civil. Como fonte basilar de seu pensamento, o filósofo elabora uma teoria contratualista fundadora de um estado jurídico. De acordo com Rossi (2006, p. 192), a utilização do conceito de estado de natureza na filosofia kantiana assume duas dimensões fundamentais, em especial: como ideário crítico social, e como justificativa para o advento de um estado civil. No primeiro critério, Kant critica algumas dinâmicas sociais típicas de seu momento histórico. No segundo critério, Kant assimila o conceito de guerra no estado de natureza, implicando, necessariamente, o advento de um estado civil jurídico capaz de inibir tal revolta. Para firmar a importância de tal passagem, Kant utiliza o direito privado como fundamento legitimador para a saída do estado de natureza. Assim, o direito público existe para garantir as prerrogativas existentes anteriormente, evitando um constante estado de alerta numa guerra de todos contra todos. A saída do estado de natureza para uma sociedade civil regida pelo poder público através da coação pela lei é consequência direta de ponderações racionais. Para isso, vale ressaltar que uma comunidade civil é um ambiente jurídico, logo, regido pelo direito. Assim, Kant demonstra que qualquer sociedade baseada no direito deve, necessariamente, basear-se num critério universal pelo qual reconheça aquilo que é justo ou injusto, no entanto, tal critério deve ter como fonte a razão, buscando estabelecer uma base para qualquer produção jurídica possível. Segundo Bobbio (2000, p. 199), Kant formula a existência de um pacto social para firmar a passagem do homem do estado de natureza para o estado civil. Assim, surge o contrato social ou contrato original, como o autor prefere chamar. Diferentemente das teses de filósofos como Hobbes, Locke e Rousseau, Kant argumenta a existência do contrato num conceito racional que justifica o Estado. Pode-se depreender que, por ser uma ideia da razão, um conceito a priori normativo, o contrato serve como um imperativo categórico cujo fim é a legitimação de uma sociedade jurídica. Por fim, Bobbio (2000, p. 200) ressalta que, para Kant, o contrato original não é um dado histórico, mas sim um ideal da razão. Assim, não há a necessidade da existência empírica para provar a eficácia do pacto, por ser uma simples ideia da razão, e é fundamentado num consenso. 15 2.2.5 Filosofia do Direito na Contemporaneidade Na Filosofia Contemporânea, diferente do que se verifica nos momentos anteriores, não se pode estabelecer uma linha temática que a perpassa. O Período Contemporâneo se caracteriza por uma pluralidade de interesses e indagações que fazem com que a Filosofia só possa ser compreendida à luz das correntes ou escolas dentro das quais se manifestam os pensamentos e os pensadores. Cada Escola ou Corrente filosófica tem seu objeto, suas metodologias, suas convicções, seus pontos de partida, suas conclusões. Nos dizeres de Incontri e Bigheto (2008, p. 406): Uma das principais características de toda a Filosofia do século XX é a desconfiança nos grandes sistemas de pensamento que pretendem dar conta de toda a realidade, como eram o idealismo alemão e o materialismo histórico de Marx. A Filosofia se tornou mais recatada em suas intenções [...]. Por isso, ela se tornou multifacetada, com tendências particulares e difíceis de serem mapeadas. Uma das égides presentes na sociedade humana, na contemporaneidade, é o pensar filosófico, que há muito tem se voltado para a seara jurídica, ao estudar, criticar e padronizar princípios, conceitos e procedimentos sociais, normativos e jurídicos. A aplicação filosófica no Direito almeja, sobretudo, interagir com este, mediante uma abordagem analítica, sob a ótica filosófica, dos principais elementos que o integram e de que ele se reveste em sua lide social. A importância disto encontra fulcro magno, no fato de que, na contemporaneidade, o Direito ser algo absolutamente valorizado, sendo que a Justiça representa o ideal de toda e qualquer sociedade humana pós-moderna. 2.2.5.1 Positivismo Jurídico No início do século XIX, com o surgimento da codificação e as mudanças do pensamento jus-racionalista, que não mais conseguia retratar as necessidades de alteração da sociedade que o homem buscava realizar por intermédio do Direito, evoluiu-se para o sistema jurídico denominado Positivismo Jurídico. A partir de então, todo o sistema jurídico tem sido regulado por essa Doutrina, que, com diversas alterações estruturais, foi se moldando às realidades sociais, consolidando-se, e permanece vigente até os dias atuais. De acordo com Kaufmann e Hassemer (2002, p. 85), os ideais iluministas, com a invocação da racionalidade do pensamento humano, fazem chegar à concepção dos Estados Modernos, estes concebidos perante a noção dos contratos sociais realizados pelos homens, a fim de estabelecer uma ordem social maior, com direitos e deveres recíprocos, na busca do 16 bem social. Para tal, os filósofos desse período buscaram fundamentar um direito natural racionalista, ou seja, motivado pela vontade de estabelecer uma ordem jurídica com caráter universal, válida para todos os homens e para todos os tempos, tal qual a imutável razão humana, sendo que tais tentativas restaram em alguns poucos, muito abstratos, princípios fundamentais do direito. Esse foi o pensamento do jusnaturalismo, pré-positivismo, responsáveis pelo início do pensamento racional motivador da codificação. Conforme Bobbio (1995, p. 119), pela forma como a sociedade havia se organizado, dá-se um impulso histórico pela legislação, em que a lei vem a tornar-se fonte exclusiva ou absolutamente prevalente, do Direito, o que culmina na Codificação e, após isso, por sua vez, no nascimento da Doutrina do Positivismo Jurídico. Ainda na concepção de Bobbio (1995, p. 26), o Positivismo Jurídico pode serintitulado como a doutrina segundo a qual não existe outro Direito que não o positivado, aquele imposto pelo Estado, pelo Legislador. Toda a doutrina Positivista se funda em noções diferenciadas do modo como o Direito é visto, entendido e idealizado. Teve por principal objetivo a transformação do Direito em uma ciência, entendendo ser necessário para tanto uma consideração sistemática e científica de suas fontes, entendimentos e regras, de forma a tornar o seu estudo formal e concatenado, com o intuito de retratar melhor a clareza e a segurança jurídica, objetivos que entendiam essenciais do Direito. Nesse sentido, Bobbio (1995, p. 131) estabelece sete pontos fundamentais para caracterizar esse pensamento jurídico, sendo que os mesmos retratam o método, a teoria e a ideologia desta corrente, definidos como: o direito é tido como um fato e não como um valor; o direito é representado pela coação que pode aplicar; a fonte maior do direito é a lei; a norma jurídica caracteriza-se pela imperatividade; o ordenamento jurídico é completo e coerente; preza pela interpretação mecânica do direito; determina a obediência absoluta à lei. Ressalta-se, contudo, que estas são as características basilares do positivismo jurídico clássico, o qual foi se alterando com o tempo, de modo que nem todas as formas de positivismo jurídico apresentam tais acepções. 17 2.2.5.2 A Relação do Direito e a Democracia Segundo Bobbio (1987), historicamente, a ideia de Estado, no Ocidente, desenvolveu- se em duas etapas: primeiramente, com a concepção de Estado de Direito e, posteriormente, do Estado que, além de ser de direito, é democrático. Para Costa (2006, p. 112), a expressão “Estado de Direito” foi utilizada pela primeira vez por J. W. Placidus, em meados de 1798, na Alemanha. Essa expressão passou a resumir o fenômeno político e jurídico vivido na Europa após o advento das revoluções burguesas e da consequente queda do Absolutismo estatal durante o final do século 18. Tal fenômeno caracterizou-se, em particular, pelo fim dos privilégios oriundos do Estado absolutista e pelo estabelecimento de limites legais ao exercício do poder estatal. Por conseguinte, a partir desse período, foi assimilada a compreensão da necessidade de se instituir um ordenamento jurídico pautado na repartição das funções estatais e na garantia igualitária dos direitos do homem. Bobbio (1987, p. 33) parte da premissa de que é preciso não confundir Estado de Direito e Democracia, embora um juízo sobre a segunda deva levar em conta a existência ou não do primeiro. O Estado de Direito define qual o melhor modo de governo, o das leis ou o dos homens. Já a Democracia se questiona sobre qual a melhor forma de governo. “O critério de avaliação e de escolha” é o número de governantes: se for um, temos a monarquia; se forem poucos, a aristocracia e, se forem muitos, a democracia. Por outro lado, a cada uma das três formas opõe-se uma forma má: a monarquia pode transformar-se em tirania; a aristocracia na oligarquia e a democracia na oclocracia (ou governo da ralé), o que leva à conclusão de que “para formular um juízo sobre a melhor forma de governo é preciso considerar não só quais e quantos são os governantes, mas também qual é o seu modo de governar”, isto é, como os governantes governam. Ainda de acordo com Bobbio (1986, p. 156), o Estado de Direito considera que o “governo da lei” compreende duas situações com significados diferentes, embora implicadas reciprocamente, cada uma com seus defensores. O “primado da lei” como instrumento principal de dominação, prerrogativa máxima do poder soberano opõe Hobbes, Rousseau e Hegel aos “fautores do governo da lei”. Um governo poderá exercer o poder “segundo leis preestabelecidas” (governo sub lege) e/ou o governo poderá exercê-lo “mediante leis, ou melhor, através da emanação (se não exclusiva, ao menos predominante) de normas gerais e abstratas” (governo per leges). 18 Para Bobbio (1986, p. 170), a natureza da relação entre Estado de Direito e Democracia (que emprega a força da persuasão) é, na atualidade, tão íntima, que o primeiro “celebra” o triunfo da Democracia. Resumindo, a Democracia é “um conjunto de regras […] para a solução dos conflitos sem derramamento de sangue.” Sendo “o bom governo democrático” aquele que respeita rigorosamente as regras, donde se conclui, “tranqüilamente, que a democracia é o governo das leis por excelência”. 2.2.5.3 A Questão da Validade Jurídica Segundo Dimoulis (2006), no Direito, o vocábulo “validade” refere-se à qualidade da norma que efetivamente faz parte de um ordenamento jurídico em determinado momento. Em outras palavras, dizer que uma norma é válida significa dizer que ela, de fato, faz parte de um ordenamento jurídico naquele momento. Esse esclarecimento se faz necessário, uma vez que uma norma inválida é o mesmo que dizer ser ela uma norma inexistente como norma jurídica, ou seja, não está presente no Ordenamento Jurídico. Assim, uma norma jurídica válida o é por existir num sistema e ter sido posta nesse sistema pelo órgão competente e de acordo com as regras exigidas no sistema (que são os critérios para fazer da linguagem competente, jurídica). Nesse sentido, de acordo com Dimoulis (2006, p. 114), para que a norma jurídica ingresse no ordenamento jurídico vigente, ela deve respeitar os procedimentos estabelecidos para a sua criação, assim como as demais condições fixadas pelo sistema jurídico. As condições mais importantes que devem ser respeitadas para que uma regra seja considerada válida, são: a competência conferida a uma autoridade ou pessoa para a criação de certa espécie de normas; o procedimento de edição (tramitação regular, maiorias, prazos, registros, formas de publicidade, etc.); os limites temporais e espaciais de validade; as regras que permitem resolver casos de incompatibilidade entre o conteúdo das normas (antinomias jurídicas). Já na concepção de Alexy (2011, p. 104), para que uma norma seja considerada juridicamente válida é necessário que ela: Seja promulgada por um órgão competente para tanto; Esteja de acordo com a forma prevista pela lei; 19 Não infrinja um direito superior, ou seja, seja estabelecida de acordo com o ordenamento jurídico. Do exposto, depreende-se que a validade é encarada, tradicionalmente, sob o enfoque de legitimidade do órgão editor da norma e sua competência. A explicação sobre todo o celeuma existente em torno da validade da norma jurídica é brilhantemente exposta: o Direito, como fenômeno cultural (feito pelo e para o homem). Assim, a validade de uma norma jurídica, sua particular existência, é sempre estabelecida pela norma superior. 2.2.5.4 A Questão da Justiça, Direito e Moral De acordo com o Jornal Estado de Direito (2016), Direito e Justiça são fenômenos paralelos, que podem entrecruzar-se e, frequentemente, o fazem e devem fazê-lo, mas não se confundem. A Justiça é tema fundamental da Filosofia e um permanente desafio para os estudiosos. Por sua vez, a finalidade do Direito é buscar, de forma constante e permanente, a justiça. Essa é, de fato, a verdadeira luta pelo Direito. A Justiça deve ser vista como um valor, como realidade axiológica. A filosofia do século XX encontrou nos valores um objeto de meditação e passou a vê-los de forma sistemática, o que não ocorrera anteriormente. Como se entende do exposto, Direito e Justiça não se confundem. O campo da Justiça é muito mais amplo. Embora o Direito deva buscar sempre a Justiça, esta o transcende. É essencial que o ordenamento, o Direito enfim, seja justo. Acquaviva (2000, p. 51) diferencia-os da seguinte forma: É necessário compreender que o direito subjetivo é uma faculdade ou um poder moral essencialmente vinculado ao justo objetivo, e depende deste. É indispensávelter presente que no Estado não reside a fonte única das normas de direito, pois há na sociedade política, em correlação com os grupos ou corpos intermediários que a constituem, uma pluralidade de ordenamentos jurídicos. Ora, o justo objetivo é inerente à ordem natural, por isso a lei só é justa se conforme a essa mesma ordem. E os direitos subjetivos fundam-se na própria natureza humana, na dignidade pessoal do homem, na liberdade do ser racional, no seu destino transcendente e eterno. Consequentemente só poderá haver Estado de Direito desde que haja respeito ao direito natural, respeito à ordem superior, à vontade dos detentores do poder e dos que fazem a lei. Então, o Estado de Direito, na plenitude do seu significado, será um Estado de Justiça. Há, por outro lado, valores próprios do Direito e da Justiça, como, por exemplo, a Moral. Segundo o Jornal Estado de Direito (2016), a Moralidade se coloca ao lado da Ética, da Justiça e do Direito. Moralidade é, na verdade, a ética de um grupo, de um povo. Não pode 20 haver Direito se não houver conduta ética aceitável por parte das instituições e dos respectivos governantes. Por sua vez, Alexy (2011) também considera que o Direito e a Justiça estão estritamente vinculados aos preceitos morais vigentes em determinada sociedade. Em outras palavras, o Direito não possui somente uma “dimensão real” (normas criadas pelo legislador). Possui, também, uma “dimensão ideal” que lhe dá sentido enquanto conjunto de normas que objetivam satisfazer às exigências da Justiça. Finalizando, tem-se Brito (2016), que salienta que a moral é a parte da Filosofia que estuda os costumes, para assinalar o que é honesto e virtuoso, segundo os ditames da consciência e os princípios da humanidade. A moral, assim tem âmbito mais amplo que o Direito, escapando à ação desde muitas de suas regras, imposto ao homem como deveres. Na forma adjetiva qualifica tudo que concerne à moral. Diz-se também ética, que é a ciência da moral. A moral é o objeto da ética substanciado em regras de comportamento fixadas. Contando com a adesão dos obrigados, ela é o encontro da consciência com a regra moral. 21 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao se verificar a relação da Filosofia com o Direito, no decorrer do estudo, restou claro que a importância da Filosofia no Direito decorre do fato de este ser um recurso humano empregado na lide com humanos, e, como a Filosofia se debruça à análise das capacidades e pensamentos humanos, extraindo deles sua essência, pode-se, por meio desta dicotomia, alcançar uma especulação reflexiva, cuja aplicação na seara jurídica, além de possibilitar a compreensão acerca desta e de suas origens, permite que esta evolua. Não é por menos que os sistemas filosóficos se pronunciam, nos assuntos jurídicos, reiteradas vezes no decorrer dos séculos. Notou-se que o pensar filosófico sofreu grandes mudanças no transcorrer do tempo, aperfeiçoando-se e se tornando mais complexo, completo e disciplinado. Assim como o Direito, se complementando, sem, contudo, se extinguirem as vertentes anteriores. Ao se aplicar a Filosofia à prática Jurídica e ao Direito, percebe-se que este se torna mais condizente com o pensar e com o proceder humano, sendo, por conseguinte, mais justo e aceitável, posto que a Filosofia esteja intimamente ligada à sabedoria, à ética, à moral, e ao comportamento. Mediante a aplicação filosófica, não raro, se obtém o Justo sem se recorrer às leis ou à jurisprudência, podendo ser ela considerada próxima a um parecer doutrinário, embora se diferencie dele, por não se obter pronto, mas ser dialeticamente construído. 22 4 REFERÊNCIAS ALEXY, Robert. Conceito e Validade do Direito. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando – Introdução à Filosofia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993. ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Teoria Geral do Estado. 2. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2000. 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Acesso em: 08 mai. 2021. 25 26 27 1 INTRODUÇÃO 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 CONCEITUAÇÃO 2.1.1 Filosofia 2.1.2 Direito 2.1.3 Filosofia do Direito 2.2 BREVE HISTÓRICO 2.2.1 Filosofia do Direito na Idade Antiga 2.2.1.1 Pré-Socráticos 2.2.1.2 Sócrates 2.2.1.3 Platão 2.2.1.4 Aristóteles 2.2.2 Filosofia do Direito na Idade Média 2.2.2.1 Cristianismo 2.2.2.2 Santo Agostinho 2.2.2.3 São Tomás de Aquino 2.2.4 Filosofia do Direito na Idade Moderna 2.2.4.1 Jusnaturalismo Moderno 2.2.4.2 Contratualismo e Kant 2.2.5 Filosofia do Direito na Contemporaneidade 2.2.5.1 Positivismo Jurídico 2.2.5.2 A Relação do Direito e a Democracia 2.2.5.3 A Questão da Validade Jurídica 2.2.5.4 A Questão da Justiça, Direito e Moral 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS 4 REFERÊNCIAS
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