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Curso de Bacharelado em Medicina Veterinária Disciplina de Clínica da Intoxicação e Plantas Tóxicas Professor: Juliano S. Gueretz Aluna: Gabriela Caillouel Intoxicação por Zantedeschia aethiopica (Copo-de-Leite) 1) Introdução Os relatos de intoxicação por plantas ornamentais envolvendo cães têm sido mais frequentes devido aos cães terem acesso a diferentes plantas em seu ambiente, principalmente em jardins, quintais ou sendo trazidas para o interior das residências pelos proprietários, sem o conhecimento do seu potencial tóxico (MILEWSKI & KHAN, 2006). É uma planta ornamental, tendo facilidade no seu cultivo, sendo muito vendida em floriculturas e apreciada em jardins. Devido a isso, é possível encontrar essa planta em quase todo o país por sua distribuição natural em locais com vasta presença de água. Sua floração acontece entre os meses de janeiro a agosto, mas quando bem cuidada, pode acontecer durante o ano todo. Estudos de Rocha et al. (2006) demonstram que o copo-de-leite (Zantedeschia aethiopica) apresenta idioblastos com cristais de oxalato de cálcio na lâmina foliar, pecíolo e espata, assim como de Oliveira & Pasin (2017) comprovaram que as begônias (Begonia sp.) apresentam oxalato de cálcio no caule. Relatos de Giese et al. (2015) identificaram intoxicação por comigo-ninguém-pode (Dieffenbachia picta Schott), onde foi possível comprovar lesões renais provocadas pelos cristais de oxalato de cálcio solúveis, lesões gastrointestinais provocadas pelos cristais de oxalato de cálcio insolúveis, e lesões hepáticas provocadas pelos próprios cristais de oxalato. Além disso, humanos também podem sofrer com a intoxicação, a ingestão e o contato podem causar sensação de queimação, edema (inchaço) de lábios, boca e língua, náuseas, vômitos, diarréia, salivação abundante, dificuldade de engolir e asfixia; o contato com os olhos pode provocar irritação e lesão da córnea.Os processos de intoxicação humana por diversos agentes tóxicos, inclusive plantas, têm se constituído como um grave problema de saúde pública, devido à falta de estratégias para o controle e prevenção das intoxicações. 2) Desenvolvimento A planta é originária da África do Sul, comum em lugares com abundância de água. Forma grandes extensões em deltas de rios, nas margens de lagos e outros lugares abundantes em água. É usada como ornamental em zonas de clima temperado, tropical e subtropical (apesar de preferir temperaturas um pouco mais baixas) devido às suas flores grandes e à facilidade com que se cultiva, sendo muito vendida em floriculturas, e apreciada em jardins. Devido a isso, é possível encontrar essa planta em quase todo o país, visto a oportunidade de adquiri-la em lojas especializadas em plantas e flores, além da sua distribuição natural em locais com vasta presença de água. Sua floração acontece entre os meses de janeiro a agosto, mas quando bem cuidada, pode acontecer durante o ano todo. Por diferença de pressão osmótica ou por estímulo mecânico sobre as folhas, ocorre a explosão dos idioblastos, ejetando as ráfides (feixes de minúsculos cristais) de oxalato de cálcio que penetram nas mucosas e induzem a liberação de histamina e outros mediadores inflamatórios, provocando dor e edema. Sua farmacocinética é muito variável, dependendo da espécie, da parte da planta que ocasionou a exposição, da época do ano, tipo de solo, etc. A planta inteira é tóxica, mas geralmente acontece com a ingestão de suas folhas, que provocam estomatite, sialorréia, vômito, eritema, edema nos lábios, língua e palato. Os sinais dessa intoxicação são alarmantes e necessitam de uma resposta imediata por parte do médico veterinário. Poucos minutos após o animal morder o material vegetal, há sinais claros de dor e irritação. O animal manifesta meneios da cabeça ao procurar água, visando aliviar a dor. Há salivação profunda, edema intenso da mucosa da faringe e das cordas vocais. Por esse processo inflamatório exuberante, o animal apresenta dispneia severa e, em casos mais graves, pode haver obstrução completa da faringe. O diagnóstico de intoxicação por Zantedeschia aethiopica é realizado através da história clínica e anamnese do paciente, buscando informações com o proprietário que possam direcionar o raciocínio do veterinário a fim de solucionar o caso. Exame físico completo, incluindo exame oral e ocular, pressão arterial, frequência cardíaca, temperatura corporal, oximetria de pulso, peso e reflexos, exame de urina e hemograma completo. O tratamento consiste no uso de anti-histamínicos. Não é recomendado o uso de fármacos eméticos e a lavagem gástrica. Recomenda-se, o uso de demulcentes, como o leite e o hidróxido de alumínio. O uso de protetores de mucosa, como o sucralfato, também é indicado. Se o animal manifestar dor, recomenda-se a administração de hipnoanalgésicos, como o butorfanol (em cães e gatos: 0,1 mg/kg por IV ou 0,4 mg/kg por vias intramuscular ou subcutânea). Para controlar a intoxicação por Zantedeschia aethiopica deve-se evitar o contato do animal com a planta tóxica, evitando seu cultivo no jardim e cuidando para que o animal não tenha contato com a mesma em ambientes onde costuma passear e que possam ter acesso a planta. Figura 1. Copo-de-Leite (Zantedeschia aethiopica) Relato Clínico Foi atendida na Clínica Veterinária da Uniderp, a paciente da espécie canina, fêmea, SRD (sem raça definida), três meses de idade, 1,45 kg, boa condição corporal, com histórico de êmese, diarreia, prurido anal, apatia, hipodipsia e disfagia. A tutora revelou que o animal tinha histórico de parorexia, ingestão de objetos e plantas (flores e folhas). Na noite anterior ao surgimento dos sinais clínicos havia ingerido uma planta na residência que não foi identificada. A proprietária citou algumas espécies das plantas que cultiva e, dentre elas, foram identificadas algumas tóxicas como a rosa do deserto (Adenium obesum), o copo de leite (Zantedeschia aethiopica) e a begônia (Begonia sp.). Durante exame físico foram identificadas as alterações: apatia, leve desidratação e mucosa oral hipocorada. Foram realizados os exames ultrassonográfico, hemograma, urinálise e análise bioquímica. O animal permaneceu internado para tratamento de suporte até melhora do quadro clínico. Diante dos resultados dos exames complementares e o paciente apresentar quadro clínico sugestivo de intoxicação por ingestão de planta, foram solicitados como auxílio diagnóstico: imagens de raio X e dosagem sanguínea de calcio, fósforo, PTH e PTH-rp. Estes exames foram recusados pela tutora devido ao alto custo. O exame ultrassonográfico revelou em alças intestinais: conteúdo luminal anecóico indicando enterite, no baço, esplenomegalia e hipoecogenicidade. Não foram encontradas alterações na tireoide e paratireoide. Pelo exame, foi constatada lesão renal que mostrou limite corticomedular alterado, córtex hipoecogênico, zona medular hiperecogênica indicando calcificação renal difusa bilateral (Figura 2). O diagnóstico foi de nefrocalcinose medular bilateral. No resultado do hemograma foram observadas as alterações: policitemia, intensa trombocitopenia, leve leucopenia, com neutropenia, eosinopenia e linfopenia. A análise do perfil bioquímico revelou aumento dos valores da enzima ALT, sendo o valor máximo 102 e a alteração elevada a 359. A urinálise revelou cristais de oxalato de cálcio, urobilinogênio e cetonas. Figura 2. Ultrassonografia renal mostrando aumento difuso da ecogenicidade medular bilateral compatível com nefrocalcinose Ocorreu uma associação positiva entre os sinais clínicos apresentados pelo animal do presente relato e a toxicidade, patogenia e sintomas causados por esta espécie vegetal. Diante do relato e das alterações identificadas pelos exames complementares, o diagnóstico do animal do presente estudo foi sugestivo de nefrocalcinose medular bilateral pela ingestão da espécie Zantedeschia aethiopica, planta tóxica que contém cristais de oxalato de cálcio em suasestruturas. 3) Considerações finais Em pequenos animais é difícil de ser diagnosticada a intoxicação, aguda ou crônica, causada por plantas e também estabelecer a associação entre os sintomas e a ingestão. O enriquecimento ambiental e a atividade física são de extrema importância para o bem-estar animal, evitando muitos comportamentos estereotipados como a parorexia vista neste caso. Um ambiente enriquecido com brinquedos, comida, ou qualquer objeto interessante para o animal, impede o estresse que precede este tipo de hábito, sendo, portanto, indicado para prevenção da ingestão acidental de plantas tóxicas. 4) Referências Teixeira, Leandro & Tostes, Raimundo & Franco Andrade, Silvia & Michiko, Sakate & Laurenti, Raquel. (2010). INTOXICAÇÃO EXPERIMENTAL POR Kalanchoe Blossfeldiana (CRASSULACEAE) EM CÃES. Ciência Animal Brasileira. 11. 10.5216/cab.v11i4.1872. Rocha, L. D., Pegorini, F. & Maranho, L. T. (2006). Organização estrutural e localização das estruturas tóxicas em comigo-ninguém-pode (Dieffenbachia picta (L.) Shott) e copo-de-leite (Zantedeschia aethiopica (L.) Spreng). Revista Unicenp de Biologia e Saúde, 254-63. Oliveira, R. R. & Pasin, L. A. A. P. (2017). Ocorrência de oxalato de cálcio em diferentes espécies vegetais de uso ornamental. Revista de Ciências Ambientais, 11(3):41-52. Giese, B. G., Flofres, V. H., Bernardes, L. G. S. Moura, L. S., Marinho, R. H. F. P. & Bittencourt, M. (2015). Intoxicação por ingestão recorrente de Dieffenbachia picta Schott (comigo-ninguém-pode) em um canino – relato de caso, Anclivepa.
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