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QUEM QUEM é 2019 no Setor Segurador em Portugal 3 Vítor Norinha vnorinha@jornaleconomico.pt Falar de seguros em 2019 é abor-dar o tema dos desafios. Numa atividade que passou razoavel- mente bem pelas crises financeiras dos últimos 10 anos e que, ao contrário, de outros setores financeiros, ganhou cre- dibilidade, cresceu, melhorou a solvabi- lidade e ficou ainda mais imprescindível para a indústria e os cidadãos, tem pela frente alguns dos seus maiores desafios conhecidos. O setor está a preparar-se para as novas regras de contabilidade, a IFRS 17, e que é claramente o maior tema da indústria na atualidade. O que está em causa é a mensuração dos passivos relativos a contratos de seguros e que, pela sua complexidade tem vindo a ser adiada desde 2004. Na altura foi criado o normativo IFRS 4. Hoje trabalha-se no IFRS 17 para melhorar a informação contabilística e potenciar uma comparabilidade entre empresas de seguros que estão nas vá- rias geografias mundiais. Este trabalho é para implementar em 2021, mas com possível adiamento para 2022 por pro- posta do International Accounting Stan- dards Board. Recorde-se que a indústria já tinha feito grandes investimentos FICHA TÉCNICA EDITORIAL Novas regras contabilísticas e novos seguros Propriedade Megafin, Sociedade Editora SA Diretor Filipe Alves Diretor Adjunto Shrikesh Laxmidas Conteúdos Editoriais Vítor Norinha Área Comercial Cláudia Sousa (Diretora), Elsa Soares, Isabel Silva, Ana Catarino, Cristina Marques e Cláudia Robalo Fotografia Cristina Bernardo e Reuters Design e Paginação Rute Marcelino (coordenadora) e Fábio Gomes Impressão Jorge Fernandes Revista distribuída com O Jornal Económico Rua Vieira da Silva 45, 1350-342 Lisboa com a implementação do Solvência II que entrou em vigor no início de 2016. Mas o ano de 2019 para os seguros vai ficar marcado por mudanças paradigmá- ticas ao nível dos investimentos com os ativos a serem dotados de uma catego- rização em termos de efeito ambiental, social e de governance e cujo objetivo será mensurar perdas de valor em títulos ditos de “brown investments”, como em títulos ditos de “green investments”. Na base de todo o movimento está a nova economia “low carbon”. E do lado dos clientes está o tema da experiência, da facilidade de contratação de seguros, dos “millennials” e das grandes necessi- dades das empresas com temas como as alterações climáticas, desastres naturais, os cyber ataques e a exposição de riscos políticos e sociais que têm potencial devastador sobre as economias de países e, em particular, sobre empresas exporta- doras e/ou de grande consumo. E, claro, não podemos esquecer a digitalização e o bigdata com a provável entrada das grandes plataformas mundiais na distri- buição de seguros. O setor é muito regu- lado mas os seguradores estão ávidos de parcerias globais. Em Portugal, o ano ficará marcado a nível de regulação com o tema das associações mutualistas. O regulador já tinha criado o grupo de trabalho para preparar a Norma Regulamentar que identificava o tipo de informação que as associações mutualistas teriam de pres- tar. O projeto ficou concluído e foi apre- ciado. As associações mutualistas passam a ter indicações de como convergir com o regime de supervisão aplicável ao setor segurador e, em função da dimensão económica, terão um período transitório de adaptação até 12 anos. 4 P16 P32 P42 P6 06 EntrevistaJosé Almaça, o presidente da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões fala dos desafios complexos, da distribuição, das alterações climáticas e do tema das associações mutualistas. 16 EntrevistaO impacto nos resultados e nos dividendos dos seguradores à luz da futura norma contabilística IFRS 17 é o tema de fundo desenvolvido por Carla Sá Pereira, da EY. 32 FórumOs líderes do setor segurador estão presentes numa análise ao futuro do setor que será mais digital e onde existe o risco de entrada das grandes plataformas mundiais. Alterações climáticas, cyber risk, demografia e regulação são temas de discussão 46 DiretórioPara reter a informação essencial e os contactos da indústria de seguros em Portugal. ÍNDICE 5 Digitalizar e transformar O mercado de seguros em Portugal é cada vez mais digital. O recente trabalho da EY “European Insurance CRO Survey 2018” fala em transformação do setor. ANÁLISEPor Vítor Norinha O digital é um dos temas de fun-do para a indústria seguradora em 2019. Falamos de utilização do digital perante clientes, fornecedores e parceiros, a par da utilização do digital para a resiliência desta indústria. Refere Carla Sá Pereira da EY que as consulto- ras têm apoiado os clientes “na automa- tização e digitalização dos processos core desde a tarifação, subscrição, faturação e gestão das apólices ate à gestão de sinis- tros e os respetivos pagamentos”. Outro dos temas fortes para este ano está na adaptação às necessidades do se- tor para com as gerações de consumidores jovens. São os chamados produtos “pay per use” e que permitem às seguradoras adaptarem-se aos padrões de consumo e utilização dos clientes. Refere ainda a mesma fonte da EY que estes produtos poderão reduzir os custos com sinistros em cerca de 40% e os custos administra- tivos em 50% com pricing de apólices de forma ajustada, mas a disrupção está nas aplicações que captam o comportamen- to dos condutores e os dispositivos que registam a atividade física e que permi- tem identificar comportamentos e criar preçários adequados. Este é o mundo dos veículos autónomos, dos drones e da in- ternet of things. O resultado tem sido a evolução para seguros baseados na utili- zação como são os seguros “pay as you drive” no automóvel e o “pay as you live” nos seguros de vida e de saúde. José Galamba de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Segurado- res, realça na sua entrevista que as com- panhias já perceberam qual é o caminho e a melhor forma de dar resposta aos clien- tes. E a própria APS trilhou o caminho neste sentido e os exemplos mais recentes são a e-Segurnet, uma aplicação alter- nativa à versão em papel da declaração amigável para acidente automóvel; a par de uma outra iniciativa da APS e que é a participação eletrónica de acidente de trabalho, que permite a seguradora agir de forma mais rápida, fazendo intervir os prestadores de cuidados de saúde e regu- larizando a situação. Nada disto se faz sem as insurtechs, adianta o presidente da APS. Diz que a sua atuação “tem permitido melhorar os modelos de relacionamento e de negó- cio dos seguradores, na medida em que montam a operação (de forma) mais ágil e eficiente, e mais alinhada com as expe- tativas dos consumidores”. As insurtechs estão a trabalhar ao nível da subscrição, distribuição e gestão de sinistros. Mas são os novos seguros ligados a cyber ataques, catástrofes naturais e even- tos climáticos extremos provocados pelas alterações climáticas que levam a maiores desafios dos seguradores. A procura pre- cisa de se adaptar e já está a acontecer, sendo que a exposição a este tipo de risco não é apenas de pessoas mas alargado a cidades, regiões, países e multinacionais. Os seguradores podem nem sequer con- seguir oferecer soluções suficientes e que exigem a colaboração público-privada com entidades nacionais e internacionais. E a nível do setor Vida o tema está na demografia e na insustentabilidade das reformas, enquanto na distribuição o risco está na entrada no mercado das grandes plataformas como a Google e a Amazon e que embora tenha regras rígi- das a cumprir na Europa, têm capacidade de perceber o que os clientes precisam a partir do fenómeno BigTech. Claro que o setor diz já estar apostado na constan- te inovação tecnológica e a Ageas dá o exemplo de aplicação de tecnologia com a inteligência artificial na recuperação de acidentes ou na área da saúde com um projeto piloto de IA destinado à triagem médica e que atuará como umaferramen- ta de decisão clínica. Literacia e solvência A literacia dos consumidores é fundamen- tal para criar a consciência e o sentimento de que um contrato de seguro não é uma despesa supérflua, mas uma necessidade económica que permite estabilidade na vida e nos negócios. Todos os atores des- ta indústria são unânimes em considerar crítico a forma de como os consumidores devem abordar a necessidade de um se- guro e a relevância crescente de uma in- dústria que não registou as confusões do resto do setor financeiro. Diz Galamba de Oliveira: “Notamos uma maior conscien- cialização por parte dos portugueses em relação à importância de ter um seguro”. Por outro lado e para a indústria o de- safio está no trabalho de adaptação às novas regras de contabilidade, a IFRS 17, que implica ajustamentos em processos, sistemas, dados e pessoas. O objetivo des- tas novas regras à incrementar a transpa- rência e a comparabilidade das demons- trações financeiras entre seguradores. O tema do negócio oneroso vai obrigar a detalhe nas demonstrações financeiras para uma gestão racional subjacente à subscrição de contratos onerosos. O re- gime europeu Solvência II já tinha impli- cado alterações de oferta de produtos que consomem mais capital. 6 Quais os grandes momentos do setor segurador dos últimos cinco anos e quais os pontos fortes registados em 2018? Destaco, em primeiro lugar, a implemen- tação do regime solvência II, com a pro- dução de efeitos do novo regime jurídico de acesso e exercício da atividade segura- dora e resseguradora. Em segundo lugar, a reposição, nem sem- pre com a compreensão de todos os sta- keholders, do equilíbrio técnico no ramo de acidentes de trabalho, onde se verifi- cou no passado uma situação problemáti- ca resultante de práticas comerciais desa- justadas e agressivas lesivas dos interesses de segurados e beneficiários. O terceiro grande marco foi a sobrevivência da Tranquilidade e da Açoreana aos proces- sos de resolução do BES e do Banif, sem ne- cessidade de intervenção pública e com ple- na salvaguarda dos direitos dos tomadores de seguro, segurados e beneficiários. Julgo que é também de salientar o inte- resse de novos investidores no mercado segurador português, em particular de fundos de investimento internacionais e investidores originários da República Popular da China, um fenómeno que não seria expectável na década anterior. O tema da regulação nas associações mutualistas está definitivamente resolvido? Após a publicação do despacho dos mem- bros do Governo responsáveis pelas áreas das Finanças e da Segurança Social, que identificou as associações mutualistas a sujeitar ao regime transitório, a ASF cons- tituiu um grupo de trabalho para preparar a Norma Regulamentar que identifica o âmbito, a natureza e o formato da infor- mação a prestar pelas associações mutua- listas a esta Autoridade e, dessa forma, operacionalizar as suas competências de- correntes da aprovação do novo código das associações mutualistas. O projeto de norma regulamentar já está concluído e foi submetido, no dia 21 de março, à apreciação da Comissão de Acompanhamento do período de transi- ção, cuja constituição ocorreu no dia 19 de março. Esta norma regulamentar permitirá a re- colha e o exame de informação sobre as associações mutualistas, para que a ASF conheça a sua atividade, produtos e rede de distribuição. Tal informação é funda- mental para aferir quais os passos que de- vem ser dados pelas associações mutualis- tas com vista à convergência com o regime de supervisão aplicável ao setor segurador. Por outro lado, atendendo à publicação do Decreto-Lei n.º 37/2019, de 15 de março, o conselho de administração da ASF determinou os procedimentos com vista à verificação da adequação e registo das pessoas que dirigem efetivamente, fis- calizam ou são responsáveis por funções- chave das associações mutualistas. O Decreto-Lei n.º 59/2018, de 2 de agos- to, que aprovou o Código das Associações Mutualistas, estabeleceu um regime espe- cial para as associações mutualistas em função da sua dimensão económica, deter- minando a sua sujeição a regras específicas do setor segurador. Saliento o caráter ino- vador do regime agora previsto, estando consagrado para as associações mutualis- tas por ele abrangidas, a fim de assegurar uma adaptação gradual, um período tran- sitório de até 12 anos. Assim, estamos ape- nas no início de um processo, com o qual a ASF está profundamente empenhada. “Regime de distribuição de seguros tem prazos de produção de efeitos irrealistas” O futuro para os seguros tem desafios complexos, diz José Almaça, presidente da ASF. A distribuição de seguros e a nova diretiva para os fundos de pensões são temas quentes. As alterações climáticas estão a gerar movimentos a nível de sustainable finance. Por Vítor Norinha José Figueiredo Almaça, presidente da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de pensões (ASF) ENTREVISTA 7 Como avalia o seu mandato? Os agentes que atuam no setor segura- dor e de fundos de pensões - as empre- sas, os investidores e os consumidores - é que poderão fazer essa avaliação. Da mi- nha parte compete-me apenas dizer que dei o meu melhor e que pude contar com o apoio de uma equipa técnica – os tra- balhadores da ASF - de grande qualida- de e que em todos os momentos difíceis se revelaram à altura dos desafios. Foi uma grande honra trabalhar com estas pessoas. Quais os grandes desafios do setor segurador para 2019 e anos seguintes? O cyber risk e as alterações climáticas poderão ser o driver de novas ofertas? O futuro apresenta diversos desafios complexos para o setor. Da envolvente macroeconómica e dos mercados finan- ceiros, persistem os desafios associados ao ambiente prolongado de baixas taxas de juro, o risco de reversão dos preços dos ativos e o clima de acentuada tensão geopolítica. Para 2019 destacaria a implementação do regime jurídico da distribuição de se- guros, aprovado pela Lei n.º 7/2019, de 16 de janeiro. Este diploma foi aprovado com prazos de produção de efeitos irrea- listas, o que coloca dificuldades acresci- das aos operadores e ao supervisor, mas estou convencido que no final teremos um mercado mais ordenado e mais foca- do no consumidor. Contamos que, ainda em 2019, possa ser aprovado o diploma de transposição da Diretiva IORP II, o que suscitará impor- tantes desafios no setor dos fundos de pensões. As alterações climáticas, além de tende- rem a aumentar a frequência e a extremar a severidade dos eventos seguráveis, au- mentando assim os custos da sua proteção pelo setor segurador, são também propul- soras de uma mudança paradigmática ao nível dos investimentos. Atualmente decorrem iniciativas importantes a nível europeu e mundial, sobre “Sustainable fi- nance”, que visam dotar os ativos de uma categorização em termos do efeito am- biental, social e de “governance” gerado pela atividade dos respetivos emitentes. Esses efeitos pretendem mensurar tanto perdas de valor relevantes em títulos con- siderados como “Brown investments”, como a incerteza relativamente a “Green investments”, no propósito de transição para uma economia “low carbon”. No caso dos riscos cibernéticos, as em- presas de seguros têm de, por um lado, salvaguardar a integridade e a segurança das suas estruturas informáticas e da in- formação sensível sobre os consumidores em sua posse, e da qual dependem forte- mente. Por outro lado, numa ótica de ne- gócio, devem revelar adaptabilidade a, de uma forma sustentada, expandir a oferta de cobertura seguradora face a eventos desta natureza, fruto da sua procura cres- cente, em virtude do seu potencial disrup- tivo para a atividade económica. A questão da literacia financeira a envolver os vários reguladores já teve resultados palpáveis? Uma estratégia sustentada de educação financeira tem sempre de ser encarada no médio e longo prazo, já que o objeti- As alterações climáticas, além de tenderem aaumentar a frequência e a extremar a severidade dos eventos seguráveis, aumentando assim os custos da sua proteção pelo setor segurador, são também propulsoras de uma mudança paradigmática ao nível dos investimentos “ 8 vo é mudar atitudes e comportamentos. A estratégia dos reguladores nacionais assenta sobretudo na coordenação de es- forços e projetos de diferentes entidades, estimulando novos parceiros e poten- ciando, através deles, uma implementa- ção mais eficaz de cada um dos progra- mas delineados. Se pensarmos no projeto que temos com o Ministério da Educação, que tem como objetivo introduzir a educação fi- nanceira nos currículos escolares, é pos- sível, a meu ver, observar uma evolução muito significativa. Quando iniciámos a estratégia nas escolas, a temática da edu- cação financeira era relativamente des- conhecida. Havia até algum receio em abordar temas financeiros em ambiente escolar precisamente devido ao elevado desconhecimento das matérias. Atual- mente, a educação financeira é uma das componentes obrigatórias na disciplina de educação para a cidadania, temos centenas de professores no território na- cional com formação certificada nestas matérias, uma rede de escolas permanen- temente a trabalhar e manuais escolares que já cobrem praticamente todos os ci- clos de ensino. Isto não significa que não façamos fre- quentemente uma avaliação do nosso trabalho. Em 2015 conduzimos um in- quérito à literacia financeira da popula- ção portuguesa, que permitiu identificar áreas que requerem, no curto prazo, uma maior intervenção da nossa parte. Esta- mos, aliás, a trabalhar em novas ferra- mentas de diagnóstico que possibilitem um crescente alinhamento da nossa estra- tégia com as necessidades da população portuguesa a este nível. A perceção do risco pelos novos consumidores, caso dos “millennials” tem resposta da indústria? De um modo geral, a indústria segurado- ra tem bem identificada a necessidade de disponibilizar serviços que reflitam a evo- lução contínua dos riscos, bem como das exigências e necessidades dos consumi- dores, fruto, em particular, das diferentes faixas etárias e de como estas influenciam a perceção face à utilidade e aos custos dos produtos disponibilizados pelo setor. Este facto reflete-se tanto nas estratégias de marketing e comunicação, na gama de riscos para os quais começam a ser dispo- nibilizadas coberturas, como na lógica de funcionamento de alguns produtos e na maior customização associada. Por exem- plo, são desenhados produtos automóvel a funcionar numa lógica de “pay as you go”, que reforçam a perceção de custos proporcionais ao nível de utilização, bem como coberturas adaptadas à eletrifica- ção da mobilidade individual, ou, no caso dos seguros de saúde, o acesso a consul- tas de forma remota. Como se está o mercado a preparar para a digitalização e as novas formas de contratar seguros? A digitalização do processo de contra- tação de seguros é uma realidade antiga no nosso mercado, nós temos empresas de seguros focadas na contratação à distância (inicialmente por canal telefó- nico) desde os anos 90 do século passa- do, pelo que este processo não é novo. É relevante notar o papel dos mediado- res tradicionais no mercado não vida de distribuição de seguros se mantém preponderante atualmente, como nas últimas décadas e, no mercado Vida, é o canal bancário que mantém essa he- gemonia desde os anos 90. Na distribuição que impacto terão as grandes plataformas digitais como a Google e a Amazon? Estão obrigados à regulação europeia? Como serão regulados e controlados se fisicamente estão fora do espaço europeu? Caso as grandes plataformas digitais pre- tendam entrar na atividade de distribui- ção de seguros, elas terão de se conformar com a Diretiva sobre a distribuição de se- guros e sujeitar-se à supervisão por uma autoridade competente na UE. Importa notar que esta diretiva, trans- 9 posta pelo já referido novo do regime jurídico da distribuição de seguros, pre- vê expressamente a sua aplicabilidade à atividade de prestação de informação so- bre contratos de seguros em resposta aos critérios selecionados pelo consumidor através de plataformas digitais na Inter- net ou por outros meios de comunicação, quando o consumidor celebrar direta ou indiretamente um contrato de seguro no final do processo. Que implicações terá para as empresas de seguros, os respetivos acionistas e ainda para os distribuidores e tomadores de seguros as futuras regras contabilísticas para os contratos de seguros, a IFRS17? A IFRS 17, à imagem das restantes IAS/ IFRS já em vigor, tem como principais objetivos fornecer mais e melhor infor- mação aos leitores das demonstrações financeiras sobre a situação financeira da entidade em causa, além de maior com- parabilidade entre diferentes entidades. Neste sentido, acredita-se que o impacto da introdução da IFRS 17 para todos os agentes envolvidos será positiva, na me- dida em que poderão assim, ter um co- nhecimento mais rigoroso e aprofundado da realidade de todo o setor segurador. Qual a ligação entre as regras da IFRS 17 e as definidas pelo regime Solvência II? A IFRS 17 estabelece, em linha com o que já ocorre no atual regime de solvência, que os passivos relativos a contratos de seguros devem ser mensurados utilizan- do princípios de justo valor. Apesar de a forma de cálculo dos referidos passivos não ser totalmente idêntica, existem, ine- vitavelmente, pontos de contacto. Con- siderando o grande investimento que as empresas de seguros tiveram de efetuar aquando da implementação do Solvência II, é natural, e até desejável, que sejam aproveitadas todas as sinergias possíveis. O setor segurador português está suficientemente preparado para acomodar a IFRS 17? A entrada em vigor da IFRS 17 constitui, indiscutivelmente, um desafio de enorme magnitude para todas as empresas de se- guros. Neste sentido a ASF tem vindo a desenvolver iniciativas e a alocar recursos para pôr em marcha um plano de imple- mentação, dirigido ao mercado segurador nacional, deste normativo contabilístico, tendo como objetivo primordial garantir uma transição o mais suave possível. As novas regras de solvência e contabilísticas são suficientes para acautelar os desafios dos riscos políticos e sociais na Europa? A entrada em vigor a 1 de janeiro de 2016 do regime Solvência II foi o culminar de um trabalho conjunto de mais de uma dé- cada por parte dos reguladores europeus. A preocupação de que este regime respon- da adequadamente aos desafios existentes esteve presente desde o primeiro dia, e ain- da se mantém, através das revisões regula- res a que este regime é sujeito. Após mais de três anos de aplicação, podemos con- siderar que o mesmo tem sido um suces- so, contribuindo para um setor segurador mais robusto e com uma cultura de gestão baseada nos riscos mais vincada. No que respeita ao regime contabilístico, as regras definidas pelas IAS/IFRS são utilizadas num vasto número de países, presentes nos diferentes continentes. En- quanto outras matérias já se encontram regulamentadas e até estabilizadas há bas- tante tempo, a mensuração dos passivos relativos a contratos de seguros, talvez pela sua complexidade, tem vindo a ser adiada desde 2004 (data da publicação da primeira fase deste normativo através da IFRS 4). Neste sentido, e à imagem do que tem acontecido com as restantes IAS/ IFRS, acredita-se que a IFRS 17 dará um contributo fundamental para a melhoria da informação contabilística apresenta- da, permitindo inclusive uma maior com- parabilidade entre empresas de seguros presentes em diferentes latitudes. ENTREVISTA 10 11 Como evoluiu o setor segurador em 2018 e quais são as perspetivas para 2019 em termos de prémios? Durante o ano de 2018, o setor segurador manteve-se sólido e resiliente e continua a ser um importante contribuinte para a es- tabilidade e para o financiamento da eco- nomia. Representacerca de 7% do PIB, e num cenário de crescimento do PIB nos próximos anos, continuará a ter taxas de crescimento interessantes. As empresas de seguros continuam a demonstrar a sua capacidade para dar respostas céleres em situações extremas, – um quadro que se manterá no futuro mas que exigirá uma crescente capacidade de resposta face a um contexto de eventos extremos cada vez mais frequentes, como aqueles que assistimos durante os incêndios – a razão, afinal, para a sua existência: providenciar as condições para que as famílias e as empresas possam recuperar, mais rapida- mente, de situações de infortúnio. No que respeita ao volume de prémios, o crescimento global atingiu os 12%, sendo esta evolução muito marcada pela recu- peração do segmento Vida (mais 14,5%). No entanto, também o segmento Não Vida deu o seu contributo crescendo a um ritmo superior ao do ano passado (mais 7,5%, contra mais 6,9%, em 2017) sendo esta evolução particularmente expressiva em linhas de negócio importantes, como os Acidentes de Trabalho (13,5%), Doen- ça (7,4%) e mesmo Automóvel (6,8%). Quanto a 2019, de acordo com as mais recentes projeções do Banco de Portugal, prevê-se um crescimento real do PIB de 1,8%, uma ligeira desaceleração face a 2018 em linha com o abrandamento es- perado na área do euro, o que, conjuga- do com as restantes perspetivas macroe- conómicas de curto prazo, significa que os desafios de gestão técnica Vida e Não Vida transitarão de ano praticamente in- tactos. No ramo Vida, o desafio funda- mental será assegurar o desenvolvimento do negócio dentro de padrões razoáveis de acumulação de responsabilidades e re- quisitos de capital, ainda num contexto de baixas taxas de juro de médio e lon- go prazo. Em Não Vida, manter-se-á o desafio de melhorar as condições de ex- ploração de grandes ramos, como os de Acidentes de Trabalho e Automóvel, e de expandir a penetração de seguros não obrigatórios, como os de Saúde, Multir- riscos ou Responsabilidade Civil Geral. Perante os novos desafios da indústria que produtos novos poderão as seguradoras lançar em 2019? Existem de facto novas tendências que são novos desafios para o setor segura- dor. Tendências como o evoluir das tec- nologias digitais, mas também a própria evolução da sociedade em termos demo- “Digitalização é o caminho a seguir e de forma mais célere possível” O cliente atual exige respostas céleres das companhias, afirma Galamba de Oliveira, presidente APS. O gestor dá exemplos recentes de sucesso: a e-Segurnet, uma alternativa à versão em pepel da declaração amigável de acidente, e a participação eletrónica de acidentes de trabalho. Por Vítor Norinha José Galamba de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Seguradores ENTREVISTA gráficos e sociais que originam novas necessidades e expetativas dos consumi- dores (famílias e empresas), são fatores que levam a que a indústria desenvolva trabalho de forma permanentemente para dar resposta a estas novas realida- des, quer seja aperfeiçoando a oferta exis- tente, quer desenvolvendo novas ofertas para novos riscos, como por exemplo, no curto prazo, para os riscos cyber, ou no médio prazo para os riscos associados aos veículos autónomos. O tema do cyber risk e das alterações climáticas está a potenciar a criação de novas ofertas de seguros? Tal como referido, anteriormente, cyber riscos e alterações climáticas são novas realidades dos tempos atuais a que as seguradoras estão obviamente atentas. Cabe a cada seguradora individualmen- te definir as suas estratégias comerciais, no âmbito das quais se enquadra a pos- sibilidade do surgimento no mercado de novos produtos que respondam às novas necessidades. De referir ainda, que no contexto das al- terações climáticas, as seguradoras e as resseguradoras, estão comprometidas e diretamente envolvidas na luta contra as mudanças climáticas de várias maneiras: ajudando na prevenção e adaptação; par- ticipando e oferecendo expertise em parce- rias público-privadas; em caso de riscos na- 12 turais, compensando as perdas seguras; e, como um dos maiores investidores institu- cionais, fornecendo financiamento de longo prazo para a economia, investindo cada vez mais em ativos verdes e sustentáveis. O small data está a ser aproveitado pela indústria? E como é que este se está a preparar para a digitalização completa dos contratos? Como todos os setores de atividade que procuram acompanhar as novas ten- dências no que se refere à relação com o cliente, observamos o small data com particular interesse. As especificidades do setor segurador implicam o desafio per- manente de tentar compreender e definir as fronteiras do tratamento dos dados pessoais, que são críticos para a gestão dos contratos, desde a subscrição ao pa- gamento dos sinistros. Em relação à digitalização, as segurado- ras compreendem que este é o caminho a seguir e de forma mais célere possível, sob pena se perder a capacidade de resposta que o cliente atual exige. Refiro dois bons exemplos: o primeiro, a e-segurnet, uma aplicação que é uma alternativa à versão em papel da declaração amigável em caso de acidente. Esta app é uma das várias novidades que a APS tem apresentado no âmbito da sua estratégia de fomentar a digitalização do setor segurador; e o se- gundo exemplo, a participação eletrónica de acidente de trabalho, que é mais sim- ples e de rápida concretização, habilitan- do a seguradora a agir de forma célere, identificando rapidamente o trabalhador acidentado, fazendo intervir os prestado- res de cuidados de saúde e regularizando com o empregador os aspetos administra- tivos inerentes a estes processos. As insurtechs estão a ajudar a modificar o perfil de abordagem dos seguros pelas seguradoras? Há exemplos concretos de soluções que estejam ou venham a ser implementadas? Enquanto parceiras no desenvolvimento e implementação de soluções tecnológi- cas no mundo digital, as insurtechs têm sido uma peça fundamental nesta nova dinâmica. De facto, a sua atuação tem permitido melhorar os modelos de rela- cionamento e de negócio das seguradoras, na medida em que tornam a operação das seguradoras mais ágeis e eficientes, mais alinhadas com as expectativas dos con- sumidores. Nesta perspetiva, o setor tem assistido a um desenvolvimento muito in- teressante de novas formas de processar a informação que melhoram a sua capaci- dade de resposta quer nas várias fases da cadeia de valor: subscrição, distribuição e gestão de sinistros. O tema da literacia financeira foi uma das preocupações da APS. Já tem resultados concretos das várias iniciativas realizadas? A educação financeira constitui das prin- cipais linhas de atuação da APS, tendo em conta tanto o seu impacto social, como a sua importância para o próprio setor. Numa perspetiva social, tem um papel es- sencial pois uma sociedade mais informa- da conhece melhor as consequências das suas decisões financeiras – isto é, uma sociedade que toma decisões financeiras mais responsáveis. Em relação ao setor, é fundamental criar, nas pessoas e nas empresas, uma maior consciência do risco e da necessidade de poupança, através da educação financei- ra. Hoje observa-se que a população está mais consciente em relação aos vários fa- tores que devem influenciar as suas deci- sões de gestão e, em relação aos seguros, notamos uma maior consciencialização por parte dos portugueses em relação à importância de ter um seguro. O seguro não deve ser visto como um custo, mas 13 ENTREVISTA sim um investimento na sua segurança e dos seus bens. Mas há ainda um trabalho de longo pra- zo a fazer, que deve ser contínuo no tem- po, abragendo cada vez mais cidadãos e de forma cada vez mais tranversal. Nesse sentido alargámos o número de parcerias estratégicas à Fundação António Cuper- tino de Miranda e ao Junior Achievement Portugal, com o grande objetivo de che- gar a mais escolas e a mais níveis etários. Temos também assistidoa um incremen- to de solitações para os nossos materiais nesta área, por parte de bibliortecas e es- colas, que nos demostram que este nosso projeto de educação financeira tem valor. Dentro dos desafios para 2019 que implicações terá para o setor de seguros a aplicação das novas regras contabilís- ticas, o IFRS 17? De que forma os segu- radores se têm preparado para a nova realidade à luz destas novas exigências? Independentemente dos contornos finais que venha a assumir, podemos já afirmar que a nova norma internacional aplicá- vel à contabilização de contratos de se- guro (IFRS 17) vai introduzir alterações significativas ao nível das demostrações financeiras das empresas de seguros, al- terações estas que implicarão, certamen- te, uma reformulação das métricas e dos indicadores utilizados na gestão corrente das empresas de seguros. Neste contexto, estima-se que a IFRS 17 venha a ter profundos impactos ao nível dos recursos humanos, dos processos e dos sistemas o que, por si só, implicará avulta- dos investimentos e a que, para a maior parte das empresas, acrescerão os custos associadas à implementação simultânea da nova norma aplicável à contabilização de instrumentos financeiros (IFRS 9). O ano de 2019 será ainda um ano de intensas discussões técnicas e de conso- lidação dos conhecimentos sobre este tema. Neste âmbito, um destaque par- ticular para o facto de se aguardar que o International Accounting Standards Board (IASB) publique durante o segun- do trimestre de 2019 um Discussion Pa- per onde irá propor algumas alterações à norma, entre as quais o adiamento da sua data de entrada em vigor para 2022 (e não 2021 como atualmente previsto). Embora existam algumas incertezas em torno do texto final da norma e o hori- zonte temporal para a sua implementa- ção pareça ser relativamente dilatado, os impactos estimados desta no negócio segurador são de tal ordem que justificam ações concretas no imediato Assim sendo, estima-se um ano de 2019 particularmente ativo ao nível da prepa- ração e lançamento de projetos relacio- nados como de implementação da IFRS 17, não só ao nível das empresas, mas também projetos de natureza regulamen- tar uma vez que é necessário garantir um adequado ajustamento do plano de con- tas para empresas de seguros (PCES) e da legislação fiscal (nomeadamente do IRC) a esta nova realidade contabilística. A diretiva da Distribuição teve implementação fácil? Infelizmente não está a ser uma implemen- tação fácil porque nesta nova lei da distri- buição, a lei 7/2019, de 16 de janeiro, que transpõe a diretiva da Distribuição, o le- gislador entendeu estabelecer uma produ- ção de efeitos retroativos a 1 de outubro de 2018. Com esta decisão inviabilizou todos os períodos transitórios e de adap- tação que estavam previstos, gerando uma situação e enorme incerteza jurídica quan- to ao regime aplicável às situações em concreto. Trata-se, obviamente, de uma si- tuação que o decurso do tempo resolverá, mas que poderia e deveria ter sido evitada. O que é expetável esperar a nível de concentração do sector segurador e da eventual entrada de novos players no mercado nacional? Os movimentos de concentração do setor no contexto nacional vão continuar, até porque alguns grupos que têm participa- do neste processo ativamente já manifes- taram interesse em continuar a concen- trar. As mudanças acionistas que temos assistido têm também a vantagem de trazerem inovação, modernidade, ideias novas, estabilidade acionista e capital que não havia nalgumas seguradoras. As plataformas globais, tipo Amazon ou Google poderão entrar no negócio segurador? Sim, poderão entrar. Aliás num ou nou- tro mercado estão já a ser feitos pilotos. A indústria seguradora é uma indústria complexa e muito regulada e essa tem sido uma barreira à entrada deste tipo de plataformas. No curto-prazo vejo-as entrar mais facilmente na banca, em par- ticular, nos pagamentos e depois noutros segmentos financeiros, mas acabarão também por entrar nos seguros. Acredito também que essa entrada possa ser feita com parcerias com o próprio setor. 14 IFRS 17 é marco histórico na indústria As futuras regras contabilísticas dos seguros vão afetar, diretamente e indiretamente, todos os intervenientes no setor. Vão ser definidos novos produtos e outros serão descontinuados desde que tenham opções e garantias mais onerosas. Este impacto teve origem com Solvência II com a redução de oferta de produtos com garantias por serem penalizadores a nível de capital. Gonçalo Dias Carvalho PwC | Insurance Manager A IFRS 17 poderá contribuir para transformar a forma como o negócio segurador é gerido. As companhias de seguros terão de estimar a margem contratual para cada contrato, dotando os gestores com informação de gestão valiosa, para a correta tomada de decisões de negócio. A IFRS 17 trará uma maior transparência ao setor, contribuindo para preços mais adequados e seguradoras mais alinhadas, realçando a importância de uma sólida função de gestão de riscos. A IFRS 17 poderá contribuir para a transformação operacional da indústria e dos operadores. As áreas que poderão ser mais afetadas serão as de: subscrição, pricing, atuarial, gestão de risco e IT. Relativamente à última, haverá a necessidade de proceder- se a um desenvolvimento dos sistemas de informação da Companhia, com impacto na forma como os dados são armazenados e analisados. A implementação da IFRS 17 deverá, ainda, ser devidamente coordenada com a implementação da IFRS 9, Instrumentos Financeiros. O reconhecimento imediato dos contratos que são onerosos, ou seja, que não são rentáveis para as companhias, poderá ter impacto no design e pricing dos produtos comercializados pelas companhias, logo, Nuno Esteves KPMG A IFRS 17 é um importante marco para a indústria seguradora e a sua implementação terá implicações sobre os modelos de negócio e operativos dos seguradores. nos clientes finais e nos agentes/ mediadores, enquanto canal de distribuição. Por outro lada, a IFRS 17 baseia- se nos pilares da comparabilidade, transparência e contabilidade prospetiva, complementando o enquadramento regulatório de Solvência II. Existe uma base comum entre a IFRS 17 e a Solvência II, no respeitante à projeção de fluxos de caixa decorrentes de contratos de seguros e respetiva atualização para efeitos de determinação da “Best estimate”. No entanto, importa entender as principais áreas de diferença entre a IFRS 17 e Solvência II. Aquelas em que será necessário um maior desenvolvimento: ao nível dos impactos contabilístico, operacional e de négocio, nomeadamente, no reconhecimento da “Contratual Service Margin”, que não é mais que o lucro diferido resultante de um contrato de seguro, distribuído ao longo do período de cobertura, conceito que não existe em Solvência II. Importa ainda mencionar que os cálculos de Solvência II encontram-se prescritos por regulamentação, enquanto a IFRS 17 é baseada em princípios, o que resulta num maior nível de julgamento na sua aplicação, nomeadamente no método de cálculo do “Risk adjustment”, relativamente às responsabilidades a pagar, bem como na taxa de desconto a aplicar, para atualização de responsabilidades. Por outro lado, embora o foco no cliente tenha sido sempre proeminente na indústria seguradora, as seguradoras continuam a ser desafiadas relativamente às reais necessidades dos seus clientes. Os clientes querem mais escolha, flexibilidade, simplicidade e personalização no que compram, nos canais que usam e como interagem com as seguradoras. Historicamente, o relacionamento com os clientes tem sido limitado a renovação de apólices e pagamento de sinistros. Hoje em dia, os clientes têm maiores capacidades digitais, estando abertos a um relacionamento muito mais interativo com as seguradoras. Tal altera a forma de interação com os mesmos. Começam a surgir a parcerias com empresas InsurTech, por forma apermitir a criação de um serviço mais focado e personalizado. Sobre os desafios friso que há um desafio intemporal: a otimização de processos / forma de servir os clientes. Em 2019, a transformação operacional, embutindo uma forte componente tecnológica, constituirá certamente um desafio, não somente com o intuito de otimizar a performance operacional, melhorando a forma de chegar aos clientes, minimizando custos e incrementando o retorno nos capitais próprios, mas também numa perspetiva regulatória, de endosso dos requisitos em matérias de RGPD, AML, Solvência 2 ou de IFRS 17. Tempos desafiantes. Como sempre!... 15 FORum DOS CONSuLTORES Ainda que se estimem diferentes impactos para vida e não vida, a IFRS 17 afectará, directa ou indirectamente, os diferentes intervenientes do sector. Para os accionistas, as implicações que os novos modelos de mensuração de responsabilidades e de reconhecimento do revenue terão sobre os resultados anuais da companhia, poderão trazer maior volatilidade dos resultados, comparativamente com o modelo actual. Para os distribuidores, os princípios de identificação e reconhecimento de custos de aquisição, em conjugação com os limites contratuais (contract boundary anual ou plurianual), poderão ter impacto sobre o actual modelo de distribuição e remuneração da rede. No caso dos clientes, poderão existir implicações a nível da revisão de produtos, condições, coberturas, opções e garantias e respectivos modelos de pricing disponibilizados pelas seguradoras. Ainda que estes exemplos ilustrem algumas das implicações que o normativo terá para os intervenientes do sector, a boa notícia é que o mercado segurador está já a iniciar os projectos com vista à implementação do normativo a 1 de Janeiro de 2022, permitindo este período, por um lado, aumentar o conhecimento, compreensão e atempada formação dos diferentes intervenientes e, por outro, estabelecer planos e acções que permitam a suave transição para o novo normativo contabilístico de contratos de seguro. A IFRS 17 e o Solvência II são normativos com objectivos, dimensões a âmbito geográfico diferentes. Enquanto a IFRS 17 estabelece um normativo contabilístico para contratos de seguro, o Solvência II estabelece a framework de gestão de risco para o sector segurador europeu. Não obstante da diferença conceptual, os normativos partilham de princípios de mensuração de natureza económica comuns levando a que os trabalhos e investimentos já realizados no contexto do Solvência II sejam o ponto de partida para a implementação dos modelos de mensuração da IFRS 17. Os normativos estabelecem que os contratos de seguro são mensurados tendo por base a projecção de cash flows futuros, o desconto de cash flows e o ajustamento de risco. A IFRS 17 tem, adicionalmente, uma componente de margem de serviço contratual (CSM) no âmbito do LRC (liability for remaining coverage). A similaridade dos “blocos” de mensuração não implica porém que os modelos sejam iguais. Para além de diferentes níveis de prescrição de requisitos, existem diferenças entre os modelos que terão de ser identificadas, compreendidas e devidamente endereçadas (i.e. despesas directamente atribuíveis). Em termos práticos, e para além da referida ligação dos princípios de mensuração entre os normativos, a implementação da IFRS 17 terá outras implicações práticas sobre o Solvência II. As já referidas alterações do actual modelo de negócio e operativo poderão ter impacto sobre os actuais requisitos de capital (i.e. uma alteração de produtos realizada para efeitos contabilísticos poderá ter implicação sobre os fundos próprios e os requisitos de capital para efeitos de Solvência II). Outra importante alteração introduzida pela IFRS 17 prende-se com as implicações sobre o actual processo de planeamento e orçamentação e consequentemente sobre o processo de ORSA (Own Risk and Solvency Assessment) estabelecido pelo Solvência II e visto por muitos como um dos elementos chave do regime de Solvência II. O ORSA assenta sobre uma visão prospectiva da estratégia e do negócio, reflectido num orçamento plurianual, que deverá seguir principios de IFRS 17 já para os anos de 2022. Apesar da diferença conceptual dos normativos a IFRS 17 e o Solvência II, existem significativos pontos de ligação, sendo esta uma importante dimensão no processo de análise e implementação do novo normativo de contratos de seguro. Ao nível da digitalização, deve continuar o esforço de automatização de operações e melhoria dos mecanismos de interação com parceiros e clientes. Neste contexto, a melhoria da experiência de cliente deve continuar na agenda de praticamente todas as empresas de seguros e acreditamos que ao longo dos próximos anos continuar a trazer mudanças significativas, através não apenas de uma oferta mais personalizada e adequada às preferências de cada cliente, mas também da melhoria de toda a experiência tanto a nível comercial (de promoção e venda de seguros), como a nível do serviço prestado (gestão de sinistros). A nível da contratação, existirá um aumento crescente da utilização de plataformas digitais, com o aumento da importância dos assistentes de vendas virtuais (virtual sales assistant), com a possibilidade de venda de produtos de complexidade crescente, através da utilização de tecnologia de inteligência artificial. Por outro lado 2019 continuará a ser um ano com uma forte componente regulatória, nomeadamente com a preparação para a implementação das novas normas contabilísticas (norma IFRS17 e IFRS9), o reforço da implementação de mecanismos de proteção de dados (GDPR) e no reforço dos mecanismos de distribuição de seguros (IDD). A nível de negócio, continuará a existir um reforço da melhoria da experiência de cliente e parceiros e uma melhoria da eficiência das operações. Também a nível de informação e dados, haverá uma tendência para reforço das capacidades de análise e modelação, com o objetivo de tirar melhor partida do maior volume de informação disponível, tanto a nível interno (e.g.: processos de decisão) como externo (desenvolvimento e comercialização de produtos). Adicionalmente deverá continuar a assistir- se a movimentos de consolidação do sector, com a concretização de operações de fusões e aquisições com o objetivo de maximizar a eficiência operativa e otimizar a gestão de risco e capital. 16 Que implicações terá para os seguradores, os respetivos acionistas e ainda para os distribuidores e clientes as futuras regras contabilísticas, o IFRS 17? As implicações para os seguradores são numerosas e começam com o esforço de implementação, que se tem sentido em di- versos níveis nas entidades. A implemen- tação da IFRS 17 implica ajustamentos em processos, sistemas, dados e pessoas. A forma como vai ser reconhecido o lu- cro ao longo do período de cobertura dos contratos altera-se. A IFRS 17 tem como objetivo possibi- litar um incremento da transparência e da comparabilidade das demonstrações financeiras entre seguradores. Neste con- texto, destaco as obrigações de divulga- ção ao nível do chamado “negócio onero- so”: dado o nível de detalhe que deve ser apresentado nas demonstrações financei- ras, a gestão terá de fundamentar o racio- nal subjacente à subscrição de contratos onerosos ou de alterar a sua estratégia. Assistimos a algumas alterações nos produtos disponibilizados após a en- trada em vigor do regime europeu “Sol- vência II”, em particular dos produtos que consomem mais capital. Antecipa- se que o mesmo possa acontecer com a implementação da IFRS 17. O Paper 04-03 do European Financial Repor- ting Advisory Group, na sequência da reunião do Board de 3 setembro do ano passado, detalha o impacto potencial não só no pricing dos produtos, mas também no seu desenho, com o conse- quente impacto para os clientes. Por sua vez, a forma como os resultados vão ser reconhecidos ao longo do perío-do de cobertura dos contratos vai ser diferente, o que tem impacto ao nível dos resultados apurados e, consequen- temente, na distribuição de dividendos aos acionistas. Por último, embora não identifique im- plicações diretas para os distribuidores, julgo que, tendo em conta as alterações ao nível do reconhecimento dos lucros e eventuais alterações no pricing e dese- nho dos produtos, os distribuidores terão também de se ajustar a estas possíveis al- terações. Vão ser necessárias alterações de fundo para o retalho e na relação com os clientes finais? Com a implementação da IFRS 17 é es- perado, como referi, alguns ajustamentos “IFRS 17 terá impacto nos resultados e nos dividendos dos seguradores” As futuras regras contabilísticas decorrentes da IFRS 17 serão “um grande desafio para os seguradores encontrarem um equilíbrio entre o desenho de produtos simples e a necessidade de apresentar produtos adequados às necessidades específicas”, afirma Carla Sá Pereira, associate partner da EY. Por Vítor Norinha Carla Sá Pereira, associate partner da EY ENTREVISTA 17 aos produtos disponibilizados. Será um grande desafio para os seguradores en- contrarem um equilíbrio entre, por um lado, o desenho de produtos mais sim- ples, cuja mensuração no âmbito da IFRS 17 seja mais linear e também mais fácil de explicar aos clientes, e, por outro, a necessidade de apresentar produtos com- pletos e adequados às suas necessidades específicas. Qual a ligação entre as futuras regras do IFRS 17 e as obrigações em matérias de capital impostas por Solvência II? A IFRS 17, norma internacional, estabe- lece o regime contabilístico das empresas e substituirá o atual plano de contas para as empresas de seguros (PCES) em vigor em Portugal. A norma introduz novas regras para o reconhecimento, a mensu- ração, a apresentação e a divulgação dos contratos de seguro. É com base nesta norma que passarão a ser apurados os resultados dos seguradores. Por sua vez, o regime “Solvência II” está focado na gestão do risco. É o atual regi- me prudencial que, entre outros, estabe- lece os requisitos de capital de solvência para cada tipologia de risco a que os se- guradores estão expostos. Em termos conceptuais existem muitas semelhanças entre os dois regimes. Am- bos pretendem ser market consistent e algumas rúbricas dos respetivos balan- ços são estabelecidas através do valor atual dos cash-flows futuros esperados. No entanto, tendo objetivos distintos, os dois regimes têm diversas diferenças e, consequentemente, conduzem à obtenção de valores diferentes. A forma como são reconhecidos os lucros e perdas ao longo do prazo de cobertura dos contratos de seguro é crítica para a IFRS 17 enquan- to no “Solvência II” o lucro esperado dos contratos encontra-se implicitamente re- fletido nos fundos próprios (capital) dos seguradores. Foi grande o esforço de adaptação para o “Solvência II” e os seguradores ainda se encontram a melhorar os procedimentos e processos no sentido quer de melhoria dos cálculos quer de acelerar os processos e reporte, antecipando o fim do regime transitório relativo ao prazo de reporte. A identificação de sinergias e o tentar alavancar o que já foi desenvolvido para a implementação do “Solvência II” é um tema a ter em consideração em todos os programas de implementação da IFRS 17. O setor segurador português está suficientemente preparado para acomodar o IFRS 17? O recente adiamento de 1 ano da data de implementação foi genericamente bem recebido pelo setor, ainda que alguns ope- radores tivessem defendido um prazo de adiamento de dois anos. Como já referi, a adoção de uma Nor- ma contabilística como a IFRS 17 traz impactos em dados, processos, sistemas e pessoas. São várias as áreas dos segu- radores que são implicadas, e que terão de acompanhar a implementação e seus impactos (contabilidade, financeira, atua- rial, IT). Este tempo adicional irá ajudar os se- guradores a estabelecer os processos de reporte, sistemas tecnológicos, estruturas de governance e os dataflows necessários para os exigentes requisitos da norma ao nível dos dados. Assim, apesar de a data final de implemen- tação e os requisitos finais não estarem ainda fechados, com alguns temas ainda em discussão, o momentum de prepara- ção para a norma não deve ser perdido. Com a implementação da IFRS 17 é esperado algum ajustamento aos produtos disponibilizados. Será um grande desafio para os seguradores “ 18 No final do dia, a IFRS 17 é muito mais do que obter os valores corretos: pode, e deve, ser a oportunidade para reequacio- nar os processos e acelerá-los, melhorar a documentação e a qualidade dos dados e repensar os sistemas tecnológicos. Efetivamente, na EY ajudamos vários clientes a nível mundial que têm aprovei- tado para realizar programas de trans- formação que vão muito além do mero cumprimento regulamentar. São vários os estágios atuais de prepa- ração dos seguradores a operar em Por- tugal. Temos clientes onde iniciámos os trabalhos de mobilização e formação em junho de 2017 e outros em que estamos na fase de avaliação de impactos opera- cionais e financeiros. Os que continuam com os seus progra- mas de implementação terão mais tempo para os dry-runs, com produção de resul- tados em paralelo, que permitirão fazer os necessários ajustamentos em tempo oportuno. Da experiência que tivemos aquando da implementação da IFRS 9, o tempo despendido na fase de dry-runs foi essencial para os clientes que os consegui- ram realizar. Como já mencionei, a IFRS 17 visa possi- bilitar uma maior transparência e compa- rabilidade dos resultados dos operadores. No entanto, sendo uma norma baseada em princípios, será aplicada uma elevada componente de julgamento profissional, pelo que o papel do atuário e do auditor é mais uma vez essencial. Assim, e à semelhança do que se verificou no “Solvência II”, a criação de mecanis- mos de governance que envolvam a opi- nião formal dos atuários (quer internos quer dos auditores) irá aumentar a cre- dibilidade das demonstrações financeiras preparadas em IFRS 17, pelo que o seu papel é de inegável importância. Em Portugal todos os seguradores estão a utilizar para efeitos de apuramento dos seus requisitos de capital de solvência a fórmula standard, que foi calibrada para uma “Empresa de Seguros Europeia média” “ 19 As novas regras contabilísticas e de solvabilidade são suficientes para acautelar os desafios dos riscos políticos e sociais na Europa? O regime de solvência que se encontra em vigor desde início de 2016 veio impor uma gestão focada e baseada nos riscos. Em Portugal todas os seguradores estão a utilizar para efeitos de apuramento dos seus requisitos de capital de solvência a fórmula standard, que foi calibrada para uma “Empresa de Seguros Europeia mé- dia”. Este modelo pode estar mais ou menos adequado aos riscos específico de cada empresa de seguros. Em complemento ao apuramento dos requisitos de capital de solvência, o “Sol- vência II” definiu a obrigatoriedade de le- var a cabo um processo de auto-avaliação interno dos riscos e da solvência, o ORSA (own risk and solvency assessment). No processo do ORSA, considerado por muitos como o “coração” do “Solvência II, muitos riscos para além dos definidos na regulamentação são avaliados e men- surados pelos seguradores. São desenha- dos cenários de stress, sendo avaliados os seus impactos na situação de solvência, a curto e médio prazo. Muitos desses ce- nários de stress acomodam já riscos po- líticos e sociais que não estão explicita- mente considerados na fórmula standard de apuramento do requisito de capital. A mensuração e avaliação destes riscos é preponderante numa ótica de gestão efe- tiva de capital e pode conduzir à necessi- dade de criação de um modelo interno, ainda que apenas parcial, que capture so- mente os riscos aos quais as empresas de seguros estão efetivamente expostas. Assim, entendido oORSA como muito mais que um mero exercício regulamen- tar, também este pode, e deve, constituir uma ferramenta de gestão essencial para o acompanhamento dos riscos críticos para cada empresa de seguros. Como se está o mercado a preparar para a digitalização e as novas formas de contratar seguros? Vemos já várias formas de digitalização e não apenas na contratação. Existem diversos exemplos de que o setor está a adaptar-se à realidade digital. Por exem- plo, a app e-Segurnet da APS, que permi- te uma alternativa à versão em papel da Declaração Amigável de Acidente Auto- móvel, facilitando a geolocalização e a utilização de fotos das circunstâncias do acidente. Existem ainda outros exemplos como a participação eletrónica de aci- dente de trabalho, mais recente. Alguns seguradores também desenvolveram apps específicas que oferecem alguns serviços aos seus clientes: encontramos vários exemplos no seguro de saúde e no seguro automóvel. O mercado está atento e a adaptar-se à digitalização. Como sublinha o recente estudo da EY – European Insurance CRO Survey 2018 – “A digitalização é mais do ENTREVISTA que tecnologia, é uma transformação”. Para além da utilização do digital no contacto com o cliente, fornecedores e parceiros dos seguradores procuram tam- bém melhorar a sua resiliência operacio- nal com o digital. Vemos e temos apoiado os nossos clientes na automatização e digitalização dos processos core, desde a tarifação, subscrição, faturação e gestão das apólices até à gestão de sinistros e aos respetivos pagamentos. Esta transforma- ção procura simplificar os processos, ace- lerá-los, reduzir os seus custos e libertar recursos para outras tarefas que necessi- tam de kown-how especializado. Estão os seguradores e o retalho preparados para o mercado “pay per use”? O sector está a adaptar-se às necessida- des que decorrem da existência de con- sumidores millennial, geração X ou Y, em particular, à procura de produtos mais flexíveis e personalizados. Os produtos “pay per use” dão aos segu- radores a oportunidade de desenharem seguros adaptados aos padrões de con- sumo e utilização dos clientes. Estima-se que a utilização daquele tipo de produtos reduza os custos com sinistros em 40% e os custos administrativos em 50%, isto para além dos custos de aquisição, per- mitindo fazer o pricing das apólices de forma mais efetiva. Por outro lado, a sociedade tem assistido ao surgimento de novas tecnologias a um ritmo quase alucinante. Veículos autóno- mos, drones, Internet of Things, aplica- ções que captam o comportamento dos condutores ou dispositivos que registam a atividade física, só para citar as mais relevantes, estão a alterar o nosso dia-a- dia de uma forma que nem Júlio Verne imaginaria. Esta evolução tecnológica tem permitido a implementação de seguros baseados na utilização como é o caso dos seguros “pay as you drive” no seguro automóvel ou “pay as you live” no seguro de vida e de saúde. 20 Assim, o sector está a adaptar-se e a ava- liar o impacto das novas tecnologias, com a identificação dos seus pontos fortes e procurando associar-se a empresas que possam ajudar a criar uma oferta digital de produtos e prémios personalizados para os clientes. Estão os atuais clientes preparados em termos de literacia financeira para as novas realidades dos seguros? O Conselho Nacional de Supervisores Fi- nanceiros, no qual estão representadas as três Autoridades de Supervisão do setor financeiro, tem desenvolvido um esforço digno de registo no âmbito da literacia fi- nanceira, através de iniciativas integradas no Plano Nacional de Formação Finan- ceira que visam não somente o consumi- dor em geral mas os alunos do nosso sis- tema escolar, desde muito cedo, e os seus professores, isto para além de iniciativas dirigidas a públicos-alvo mais específicos, através da celebração de protocolos com Sindicatos, Ordens e com diversas entida- des oficiais. Muito já foi feito desde a implementação do Plano, há quase 10 anos, mas ainda há um caminho a percorrer, também no que se refere aos seguros. De acordo com os relatórios de avaliação disponíveis ao público, verificam-se ainda algumas di- ficuldades na interpretação de conceitos menos elaborados como “franquia” ou “período de carência”, ou da relação en- tre a “franquia” e o “prémio”, pelo que as novas realidades que refere, pelas suas es- pecificidades, poderão trazer a necessida- de de ações de sensibilização específicas. Na distribuição que impacto terão as grandes plataformas digitais como a Google e a Amazon? De acordo com vários seguradores, as plataformas GAFA (Google, Apple, Fa- cebook e Amazon) podem ser grandes concorrentes. Efetivamente, têm inegável acesso a dados e algoritmos ágeis que po- deriam também ser utilizados na distri- buição de seguros. Ainda assim, o negócio segurador é com- plexo e altamente regulamentado. Por exemplo, a Diretiva da Distribuição de Seguros (DDS) aplica-se a produtos co- mercializados na União Europeia, pelo que, para levar a cabo a sua atividade, torna-se necessário que os “distribuido- res” sejam registados num Estado mem- bro da União Europeia, o que implica, devido à aplicação da Diretiva, que, in- dependentemente dos aspetos operacio- nais envolvidos, os requisitos de conduta sejam semelhantes aos observados pelos operadores ditos “mais tradicionais”. Não obstante, e uma vez ultrapassadas (sanadas) as questões regulamentares, es- tas plataformas têm vantagens no sentido que têm ao seu dispor o acesso privilegia- do ao cliente que já sublinhei. Estão obrigados à regulação europeia? Como serão regulados e controlados se fisicamente estão fora do espaço europeu? Como referi, genericamente não existirão diferenças relevantes, pelo que o cumpri- mento das regras europeias não será pos- to em causa no caso das plataformas, des- de que registadas num Estado membro da União Europeia. Os produtos têm de ser concebidos e distri- buídos por uma entidade regulamentada, registada num Estado membro, pelo que são desenhados localmente e distribuídos no ter- ritório comunitário através, por exemplo, do regime de Livre Prestação de Serviços. Se os produtos forem também distribuí- dos fora da União Europeia, aplicar-se-á a legislação relativa à distribuição em vi- gor no país de destino, aquele em que o risco se situa. Para além disso, espera-se que a regula- mentação da União Europeia vá no sen- tido de que não releva o que se pretende que o negócio seja, pois, prevalecendo a substância sobre a forma, o que deve pre- dominar é a regulamentação do setor em que a atividade é efetivamente exercida. Assim, as plataformas terão de se confor- mar com as regras aplicáveis ao setor se- gurador, na linha do que atrás mencionei, com todas as consequências daí decorren- tes, como as relacionadas com o exercício da supervisão. As plataformas GAFA (Google, Apple, Facebook e Amazon) podem ser grandes concorrentes. Têm inegável acesso a dados e algoritmos ágeis que poderiam também ser utilizados na distribuição de seguros “ 21 ENTREVISTA Quais os grandes desafios do setor segurador para 2019? Desde a envolvente situação económica e política, à necessidade do setor de ino- var e de investir em tecnologia, passando pela centralidade no cliente e emergência de novos riscos e à pressão regulamentar, são diversos os desafios (mas também as oportunidades) para o setor, não só em 2019 mas também a mais longo prazo. O primeiro desafio está relacionado com a envolvente económica e política, em especial a primeira. Como os ciclos eco- nómicos induzem uma maior ou menor procura de seguros, a evolução a que te- mos assistido tem provocado alguma ins- tabilidade nos últimos anos no volume de prémios emitidos de seguro direto, alter- nando fases de crescimento e de redução, ainda que se registe um crescimento nos últimos 2 anos. Em consequência, a taxa de penetração dos seguros em Portugal é agora de 6%, valor ligeiramenteabaixo da média Euro- peia, e mesmo inferior aos valores regista- dos no nosso país há 4 ou 5 anos. Como para tantos outros sectores, a ino- vação é também crítica para o sector se- gurador. Temos observado uma acelera- ção da disrupção por empresas startups, em particular insurtech e fintech. Veri- fica-se uma procura por modelos mais simplificados e ágeis, e centrados no cliente, desburocratizando os processos (também para os mediadores), mas con- tinuando a fazer uma correta avaliação dos riscos no sentido de manter os seus níveis de serviço, a sua reputação e a sua sustentabilidade. Aliada à inovação tem-se verificado, igualmente, o investimento em tecnolo- gias que permitam acelerar os tempos de resposta a uma sociedade cada vez mais exigente, com uma atempada e adequada resposta à atual procura de seguros. Assistimos a uma crescente uti- lização de data analytics, robotic pro- cess automation e inteligência artificial. Como também já sublinhei, as expecta- tivas dos clientes face aos produtos de seguros que adquirem tem-se transforma- do: os millennials, com os seus smartpho- nes sempre à mão, querem poder fazer transações em qualquer altura, em qual- quer lugar e de forma rápida e simples. A adaptação a essas necessidades da forma mais eficiente e rentável é outro desafio para o setor. A centralidade no cliente decorre não so- mente da existência de clientes cada vez mais informados e exigentes, que preten- dem um produto que corresponda às suas efetivas necessidades, mas também das possibilidades que a tecnologia coloca ao nosso dispor, permitindo uma aproxi- mação quase individualizada ao perfil de risco de cada cliente. Ainda relacionado com a revolução tec- nológica, vemos que os riscos seguros estão a assumir novas formas e, mui- tas delas, também mais complexas. Por exemplo, se por um lado os automóveis estão cada vez mais seguros, os custos da reparação em caso de sinistros, dada a so- fisticação dos veículos, são maiores. Por outro lado, no mundo atual, com a crescente recolha e armazenamento de dados em grandes quantidades, que só são possíveis devido às novas tecnologias, o ciber risco continua a aumentar, fazen- do com que o ciber security e, consequen- temente, o ciber seguro, assumam papéis cada vez mais relevantes. Por fim, mas não menos desafiante e im- pactante é a regulamentação. O ano de 2019 será dedicado aos programas de implementação da IFRS 17 que, como re- feri, têm impacto em diversas áreas dos seguradores. O sector terá ainda de estar atento às exigências da DDS e da trans- posição da 4.ª Diretiva da prevenção ao Branqueamento de Capitais (que fixa já os requisitos essenciais, mesmo não tendo ainda sido emitido normativo específico), à implementação dos planos de remedia- ção do Regulamento Geral de Proteção de Dados e às alterações que se anteci- pam ao “Solvência II”, tanto ao nível dos cálculos como do recálculo da dedução transitória aplicável às provisões técni- cas, não perdendo de vista os prazos cada vez mais exigentes de reporte. 22 Quais os grandes desafios do setor segurador para 2019 e dos mediadores em particular? Desde logo a adaptação e con- formação às regras da nova Lei da Distri- buição de Seguros (LDS), e a consequente formação de todos os mediadores tendo em vista um, cada vez maior, profissionalismo da nossa classe. Por último aponto o “mun- do digital” como caminho inexorável para o futuro. Como se está o mercado a preparar-se para a digitalização e as novas formas de contratar seguros? A mediação profissional de seguros pro- fissional, que representamos, ao contrário do que muitos pensam é ávida de conhe- cimento e de evolução. Pretendo dizer que para nós o digital não é encarado como uma ameaça, mas sim como um desafio. Naturalmente, como em tudo na vida, haverá alguma selecção natural nos me- diadores mais antigos e conservadores, é humano, mas no final o digital será apenas mais uma etapa no caminho do futuro. Estão os mediadores e o retalho prepara- dos para o mercado “pay per use”? “Pay per use” é ainda, em 2019, uma forma de ficção. Sempre que leio alguns artigos sobre esta forma de fruição de automóveis, e consequentes seguros associados, o verbo imaginar está sempre presente. Lembro que os seguros, e a mediação de seguros, não se confinam ao ramo automóvel, sobre a qual esta nova forma de contratação de seguros, por enquanto, parece circunscrever-se. Po- rém, todos sabemos que daqui a 20 anos “A mediação de seguros é ávida de conhecimento e de evolução” Para os mediadores o digital é um desafio, afirma David Pereira, presidente da direção da APROSE (Associação Nacional de Agentes e Corretores de Seguros). Entretanto, a concentração de carteiras levou ao desaparecimento de 1250 mediadores em 2018. Por Vítor Norinha David Pereira, presidente da direção da APROSE ENTREVISTA seguros, apoiado muito em pequenas empresas familiares, é para manter ou assistir-se-á a concentrações? Até no modelo actual da mediação de segu- ros haverá, obrigatoriamente, uma grande evolução, pelo que o conceito de empresa familiar na mediação tenderá a desapare- cer. Neste momento já se assiste a alguma concentração de interesses e de carteiras de seguros na mediação. Em finais de 2017 os mediadores de seguros eram 20.258. Passado um ano, em finais de 2018, já só eram 18.999. Desapareceram mais de 1250 mediadores em apenas um ano fruto da concentração de carteiras. Acreditamos que esta concentração, nos próximos anos, será exponencial, como forma evolutiva para atingir uma maior dimensão e grandeza, a fim de fazer face aos grandes desafios que o futuro nos reserva e alguns dos quais já aqui foram abordados. As regras contabilísticas IFRS 17 terão impacto nas empresas de mediação ou são apenas aplicáveis aos seguradores? Neste mundo global em que vivemos e em que todos somos permeáveis uns aos outros, no caso mediadores e segurado- ras, não poderemos dizer, nem acreditar, que as novas regras contabilísticas do IFRS 17 a implementar a partir de 2021, só atingirão as seguradoras. De alguma maneira seremos tocados por essas novas regras que, à partida, visam uma maior clareza e transparência da actividade se- guradora. Se assim for quem acabará por sair beneficiado serão todos os envolvi- dos atividade seguradora e, por conse- quência, também os nossos clientes. nada no mundo será como hoje. Nem no mundo nem nas suas múltiplas actividades Nem nas seguradoras nem na mediação de seguros. Todos evoluirão, uns e outros. Na distribuição que impacto terão as grandes plataformas digitais como a Google e a Amazon? Também esta pergunta, por enquanto, me remete para a ficção. Sabemos, como já dissemos, que a evolução não pára e que o futuro está ao virar da próxima esqui- na. Mas isto é tão verdade para a Google ou Amazon como para as seguradoras ou para os mediadores. Queremos com isto dizer que ao longo da história do homem e das atividades humanas sempre o velho foi substituído pelo novo. Era assim há mil anos como o é nos dias de hoje. O segre- do foi sempre o mesmo, a adaptação dos “players” às realidades dos novos tempos. A mediação de seguros não será a exceção. O atual modelo de mediação nos 23 24 A SPS Advogados tem uma larga expe- riência profissional em Seguros, tendo, ao longo dos anos, desenvolvido áreas diferenciadas de actividade, em resposta às exigências do sector. Embora o mercado segurador se tenha assente, durante largas décadas, sobre os ramos obrigatórios de acidentes de traba- lho e automóvel, nos últimos anos tem-se verificado uma diversificação do mercado com a entrada crescente de novos produtos, designadamente de responsabilidade civil, vida, acidentes pessoais, saúde, financeiros, proteção de dados, cibernéticos, etc. O Departamento de Seguros da SPS Advogados tem acompanhado de per- to a evolução do mercado, sendo estru- turado em torno de uma forte prática, quer em matéria de contencioso civilquer em matéria de contencioso penal e contra-ordenacional, sustentado em to- dos os ramos de seguro, vida e não vida. Esta experiência permite-nos uma defesa de antecipação e prevenção de conflitos, aplicada quer na preparação da apólice de seguro, quer no aconselhamento do cliente à adaptação de regras de supervi- são, quer, em parceria com o cliente, na regularização de reclamações judiciais e extrajudiciaias. Nesse sentido temos desenvolvido uma área de contencioso especializado naqui- lo que sabemos serem os pontos críticos O direito ao serviço dos seguros CArlA AzEvEDO GOmEs Sócia do bom sucesso das acções movidas por e contra as seguradoras: n Um enfoque muito particular na prova a produzir perante a entidade que julga; n Uma manutenção de laços de comuni- cação muito intensos com os clientes os quais, na fase de gestão pré-contenciosa dos sinistros, obtêm muita informação essencial ao mérito da acção; n Uma clara consciência do preconceito com que, habitualmente, as seguradoras são olhadas por quem julga, o que obriga a esforço probatório redobrado; n Uma preocupação permanente com o retorno da informação aos clientes para efeitos de provisionamento dos sinistros. A circunstância de a SPS Advogados co- laborar há mais de 25 anos com várias Companhias de Seguros, criou, ao longo deste tempo, equipas especialmente vo- cacionadas e especializadas nos vários segmentos de actividade contenciosa de seguros, nomeadamente em matéria de responsabilidade civil - quer no ramo au- tomóvel, quer nos ramos gerais (condo- mínio, multirriscos, obras e montagens, transportes e mercadorias, exploração, animais, actividades, etc) quer nos ra- mos profissionais (advogados, médicos, Toc’s e Roc’s, notários, agentes de exe- cução) – vida, saúde, relações com me- diadores, imobiliário, acidentes pessoais, produtos financeiros / fundos de pensões e acidentes de trabalho. Do mesmo modo a SPS Advogados tem vasta e cimentada experiência em maté- ria de resolução alternativa de litígios. Ao mesmo tempo, a SPS Advogados criou uma área própria de consultadoria, na elaboração e/ou validação dos muitos documentos contratuais que a legislação actual exige, com a plena consciência de que tal acompanhamento deverá ser se- cundado pela concepção e implementa- ção de práticas e procedimentos de con- tratação, atentas as exigências legais que se colocam por reporte à informação a prestar ao consumidor. Finalmente, salienta-se na SPS Advogados um desenvolvimento recentemente imple- mentado na área da regulação e supervi- são: face a um incremento dos níveis de PEDrO mAltA DA sIlvEIrA Sócio fundador Consultoria Juridica 25 supervisão, tem havido uma preocupação de, nesta área específica, e na busca de so- luções jurídicas adequadas, desenvolver continuamente mecanismos de diálogo e interacção com as entidades de supervisão. Na área da atividade Seguradora, em as- suntos relacionados com riscos cobertos em território português, a SPS Advogados representa várias seguradoras sediadas em Portugal e no estrangeiro, nomeada- mente em França, Luxemburgo, Alema- nha, Inglaterra, Espanha, ou Itália, Sendo uma das áreas do direito de maior desenvolvimento na actividade da SPS Advogados, o seu Departamento de Se- guros, sediado em Lisboa, conta com um total de 18 (dezoito) advogados [(2 (dois) sócios, 10 (dez) advogados associados e 6 (seis) advogados estagiários)]. Esse Departamento garante, ainda, uma cobertura nacional, no continente e Ilhas, através de parcerias com escri- tórios locais, (Aveiro, Porto, Vila Nova de Famalicão, Peso da Régua e Braga, Funchal, Açores e Madeira), permitindo uma assessoria com acompanhamento em todo o território português. A SPS Advogados tem presente que o fu- turo do mercado dos Seguros e a trans- formação deste sector está no desenvol- vimento galopante das novas tecnologias: riscos cibernéticos, inteligência artificial, blockchain, internet of things, condução autónoma, robótica, sistemas analíticos, telemática, etc. Estas tecnologias e respetivos riscos, já começam a ser uma nova realidade, com efeitos directos neste sector, tais como a desmaterialização, automatização, faci- litador de requisitos legais, sinalização imediata das áreas de maior risco, etc. Com as inovações tecnológicas e a IA, o mercado segurador vai adoptar os smart contacts e muitos serviços serão substituí- dos ou alterados, mesmo na área contra- tual. Daí que a SPS Advogados, conscien- te do aumento do potencial infindável de novos serviços e de novas ferramentas, encontra-se na linha da frente e motivada em manter o seu nível de desenvolvimen- to e crescimento, antecipando e solucio- nando as necessidades do cliente. 26 GAstãO tAvEIrA CEO da i2S Se por um lado, os processos internos não mudaram muito na generalidade das segu- radoras —em termos de distribuição, de contacto com o cliente, de processos inter- nos—; por outro, os clientes são cada vez mais exigentes —a nível de informação, da qualidade de serviços, da rapidez de respos- ta, da conveniência. As expectativas subi- ram muito nas últimas décadas devido às mudanças nas outras indústrias e à chegada de novas gerações de consumidores, que mostram pouca tolerância à burocracia que ainda caracteriza muitas atividades nos seguros. Surgem também novas ofer- tas de Insurtech no mercado, com modelos de negócio muito mais próximos do clien- te e que podem ser disruptivos para as se- guradoras instaladas. As seguradoras po- dem e devem responder a estes desafios; a tecnologia cria muitas possibilidades para melhorar, acelerar, digitalizar e mesmo au- tomatizar muitos processos. Constatamos que grande parte das seguradoras traba- lham com sistemas legados, desenvolvidos à medida, ao longo de muitos anos, e com gerações tecnológicas distintas e difíceis de integrar. Isto resulta em custos muito ele- vados. Grande parte do orçamento é con- sumido apenas para manter os sistemas e acrescentar os mínimos, em termos de pe- quenos ajustes aos produtos e em questões regulatórias. Do orçamento de Sistemas de Informação resta pouco para verdadei- ra inovação com impacto no cliente, nas vendas e na rendibilidade. Inovação como sinónimo de crescimento A i2S tem mais de 30 anos de atividade, sempre focada na área de seguros. Fizemos mais de 50 implementações, com 100% de taxa de sucesso. Temos uma experiência única em termos de migrações, que é um tema muito complexo em seguros. Ao lon- go dos anos, realizámos mais de 30 migra- ções de carteira. Desenvolvemos ferramen- tas próprias para facilitar estes processos de migração. Muitas das maiores segura- doras em Portugal utilizam a nossa solu- ção core, número que continua a aumen- tar todos os anos. A nossa solução está a operar em oito países. Investimos, por ano, 10 000 pessoas * dia em inovação. Contamos com cerca de 250 profissionais especializados em seguros. Investimos per- manentemente em formação interna e ex- terna, em termos de negócio de seguros e de tecnologia. Com a experiência de mais de 30 anos dedicada exclusivamente aos seguros, a i2S tem um know-how difícil de igualar a nível ibérico. Temos vindo, desde há alguns anos, a investir em novas ferramentas tecnológicas que nos colocam numa posição ímpar. O que propomos às seguradoras é único: modernizar e digi- talizar os seus sistemas, assegurando que podem gerir os seus produtos e processos, sem necessidade de investimento constante na mudança de aplicativos e integrações, de cada vez que lançam um novo produto ou que alteram um processo. Know-how e tecnologia superiores A peça central (o cérebro) das soluções i2S é o nosso módulo i2S Configurator, que é onde se definem os produtos, as regras (co- berturas, tarifas, regras de aceitação, etc.). Este módulo tem um Motor de Regras - que foi sendo desenvolvido ao longo dos anos e incorpora o nosso know-how – o qual comanda todos os sistemas. Quando se lança um novo produto, ou se alteram
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