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Livro - Fundamentos e Metodologia do Ensino da Lingua Portuguesa
FACULESTE
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é assim um processador de linguagens: de acordo com o momento, com as intenções, com a pessoa com quem se fala, muda-se a linguagem” (FARACO; TEZZA, 2003, p. 25). Diante dessa discussão, considera-se que os modos diferentes de falar acontecem porque a Língua Portuguesa, como qualquer outra língua, tem caráter dinâmico, em outras palavras, está sempre em transformação. Pelos usos diferenciados ao longo do tempo e nos mais diversos grupos sociais, as línguas passam a existir como um conjunto de falares diferentes ou dialetos, cada qual apresentando suas peculiaridades com relação a alguns aspectos linguísticos. Assim, para Possenti (1996, p. 10), impor a um grupo social os valores de outro grupo, dado que a língua padrão é de fato o dialeto dos grupos sociais mais favorecidos, tor- nar seu ensino obrigatório para os grupos sociais menos favorecidos, como se fosse o único dialeto válido, seria uma violência cultural. Também Massini-Cagliari, na obra O texto na alfabetização (2001), coloca que o ensino da norma culta, por si só, não assume um caráter dis- criminador dos outros dialetos da língua. Entretanto, o desconhecimento da norma culta pode funcionar como um fator gerador de discriminação, pois esta não é somente um dialeto da língua, mas é um modo de falar prestigioso. Por esse motivo, é de fundamental importância que a norma culta seja apre- sentada aos falantes da língua, principalmente aos de dialetos estigmatizados. É importante que ela seja mostrada como um dialeto real da língua, que tem estruturas e usos específicos, e não a partir de regras e exercícios que não ensinam nem descrevem a verdadeira estrutura linguística dessa variedade da língua, como ocorre na gramática normativa escolar. Na sala de aula, sugere-se que o professor trabalhe prioritariamente com atividades em que o aluno possa fazer ações com a linguagem, jogando com interlocutores, levando o outro em consideração no momento de tecer o seu discurso, para adequá-lo a ele e à situação no processo de interlocução. É o domínio da linguagem que deve ser priorizado. Fundamentos e Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa – 14 – Da teoria para a prática Uma sugestão de trabalho com a variação linguística em sala de aula é a comparação entre as linguagens, para uma busca de maior compreensão da natureza do processo de ensino da língua materna, visando especialmente chamar a atenção para a necessidade de a escola assumir a existência de tipos de língua falada e de contemplar estas variações, levando em conta a lingua- gem apresentada pelo aluno. Um exemplo é o confronto das músicas Drama de Angélica e O divórcio vem aí, ambas da dupla sertaneja Alvarenga e Ran- chinho (2000). A primeira apresenta a norma culta; já segunda, a variante caipira – exemplificando a questão abordada de que o uso das variedades ocorre em diferentes circunstâncias: O Drama de Angélica Ouve meu cântico quase sem ritmo Que a voz de um tísico magro esquelético... Poesia épica em forma esdrúxula Feita sem métrica com rima rápida... Amei Angélica mulher anêmica De cores pálidas e gestos tímidos... Era maligna e tinha ímpetos De fazer cócegas no meu esôfago... Em noite frígida fomos ao Lírico Ouvir o músico pianista célebre... Soprava o zéfiro ventinho úmido Então Angélica ficou asmática... Fomos ao médico de muita clínica Com muita prática e preço módico... Depois do inquérito descobre o clínico O mal atávico mal sifilítico... – 15 – Conceitos e Princípios Básicos para o Ensino da Língua Portuguesa (...) O Divórcio Vem Aí Falado: “Êta mundo véio, hein, cumpadre? É... Violinha boa, essa, hein? Ah... Especiar memo, hein Especiar de boa, cumpadre Ô cumpadre, Ahn? Sabe de uma notícia? Ahn? Tão dizendo que o divórcio vem aí... Uai, o que é divórcio, cumpadre? Num sabe o que é divórcio, rapaz? Não! Divórcio é ansim mais ou menos, né, pre exempre Vancê casa cuma mulher, mais vancê vai, num gosta dessa mulher, né, então vancê larga dela e casa co outra, depois então vancê pre exempre num gostô mais dessa outra, vancê larga dessa e casa co outra E ansim por endiante (...) Síntese A linguagem é uma característica humana universal, enquanto a língua é grupal, de um povo, usada para que haja interação entre os indivíduos. Já Fundamentos e Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa – 16 – a fala é a realização concreta da língua feita por um indivíduo em particular. Observe o esquema a seguir. Linguagem Língua Fala Qualquer língua falada por qualquer comunidade exibe sempre varia- ção. Pode-se afirmar que nenhuma língua se apresenta como entidade homo- gênea. Língua e variação são inseparáveis, e essa diversidade da língua não deve ser encarada como um problema, mas como uma qualidade constitutiva do fenômeno linguístico. Os falantes adquirem as variedades linguísticas pró- prias da sua região, classe social etc. Atividades 1. Sobre a abordagem acerca dos conceitos de linguagem, língua e fala, relacione os itens a seguir: (1) Linguagem (2) Língua (3) Fala ( ) Ação individual, com características particulares. ( ) Ato de vontade e inteligência. – 17 – Conceitos e Princípios Básicos para o Ensino da Língua Portuguesa ( ) Instituição social de caráter abstrato. ( ) Sistema de sinais convencionais que nos permite realizar atos de comunicação. ( ) Manifestação grupal. ( ) Faculdade da espécie humana. Marque a sequência correta: a) 3, 3, 2, 1, 2, 1. b) 1, 1, 2, 2, 3, 1. c) 2, 3, 1, 1, 2, 3. d) 1, 2, 3, 1, 3, 2. 2. Dadas as diferenças dialetais e dado que sabemos, hoje, por menor que seja nossa formação, que tais variedades correspondem a distin- tas gramáticas, como agir no ensino? 3. Suponha um aluno dirigindo-se ao colega de classe nestes ter- mos: “venho respeitosamente solicitar-lhe que se digne a empres- tar-me o livro”. A atitude desse aluno se assemelha à atitude do indivíduo que: a) comparece ao baile de gala trajando smoking; b) vai à audiência com uma autoridade de terno e gravata; c) vai à praia de terno e gravata; d) veste terno e gravata para ir falar na Câmara dos Deputados; e) vai ao Maracanã de chinelo e bermuda. Atividades complementares Diário O diário é um gênero textual que tem o próprio escritor como desti- natário, tendo uma linguagem informal. A palavra “diário” (do latim dia- rium) está relacionada com o termo dia. Os diários podem ser importantes Fundamentos e Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa – 18 – documentos históricos de testemunho de uma época, como por exemplo, o famoso Diário de Anne Frank, em que a autora adolescente e judia relata os dias em que passou escondida, na Holanda, durante o período do holocausto. Vamos ler um fragmento de texto retirado do livro Diário de Anne Frank: Domingo, 14 de junho de 1942 Vou começar a partir do momento em que ganhei você, quando o vi na mesa, no meio dos meus outros presentes de aniversário. (Eu estava junto quando você foi comprado, e com isso eu não contava.) Na sexta-feira, 12 de junho, acordei às seis horas, o que não é de espantar; afinal, era meu aniversário. Mas não me dei- xam levantar a essa hora; por isso, tive de controlar minha curiosidade até quinze para as sete. Quando não dava mais para esperar, fui até a sala de jantar, onde Moortje (a gata) me deu as boas-vindas, esfregando-se em minhas pernas. Pouco depois das sete horas, fui ver papai e mamãe e, depois, fui à sala abrir meus presentes, e você foi o primeiro que vi, talvez um dos meus melhores presentes. (...) Observa-se no gênero diário que os tempos verbais estão, em sua maio- ria, no pretérito perfeito (ganhei, vi, acordei, tive, deu, fui, etc.). As marcas temporais mostram um momento passado: “na sexta-feira”, “pouco depois”, o que