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Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão O que compõe uma anamnese? Para que se faça a anamnese perfeita, é preciso que se realize todas as suas partes, que são: identificação, queixa principal, história de doença atual (HDA), interrogatório sintomatológico (IS), antecedentes pessoais e familiares, hábitos de vida, condições socioeconômicas e culturais. Identificação A identificação é o perfil sociodemográfico do paciente que permite a interpretação de dados individuais e coletivos. Apresenta múltiplos interesses e o primeiro deles é de iniciar um relacionamento com paciente, começando por saber qual o seu nome. SÃO OBRIGATÓRIOS OS ITENS: ✓ Nome: Primeiro dado da identificação. Nunca é demais criticar o hábito de designar o paciente pelo número do leito ou pelo diagnóstico. “Paciente do leito 5” ou “aquele caso de cirrose hepática da enfermaria 7” são expressões que jamais devem ser usadas para caracterizar uma pessoa. ✓ Idade: Cada grupo etário tem sua própria doença, e bastaria essa assertiva para tornar clara a importância da idade. A todo momento, o raciocínio diagnóstico se apoia nesse dado, e quando se fala em “doenças próprias da infância”, está se consagrando o significado do fator idade no processo de adoecimento. Vale ressaltar que, no contexto da anamnese, a relação médico-paciente apresenta peculiaridades de acordo com as diferentes faixas etárias. ✓ Sexo/gênero: Não se falando nas diferenças fisiológicas, sempre importantes do ponto de vista clínico, há enfermidades que só ocorrem em determinado sexo. Exemplo clássico é a hemofilia, transmitida pelas mulheres, mas que só aparece nos homens. É óbvio que existem doenças específicas para cada sexo no que se refere aos órgãos sexuais. As doenças endócrinas adquirem muitas particularidades em função desse fator. A questão de gênero aponta para um processo de adoecimento diferenciado no homem e na mulher, ainda quando a doença é a mesma. ✓ Cor/etnia: Em nosso país, onde existe uma intensa mistura de etnias, é preferível o registro da cor da pele usando as nomenclaturas “cor branca”, “cor parda” ou “cor preta”. A influência da etnia no processo do adoecimento conta com muitos exemplos. O mais conhecido é o da anemia falciforme, uma alteração sanguínea específica dos negros, mas que, em virtude da miscigenação, pode ocorrer em pessoas de outra cor. Outro exemplo é a hipertensão arterial, que mostra comportamento evolutivo diferente nos pacientes negros: é mais frequente, mais grave, apresenta lesões Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão renais mais intensas e maior incidência de AVE. Em contrapartida, pessoas de cor branca estão mais predispostas aos cânceres de pele. ✓ Estado civil: Não só os aspectos sociais referentes ao estado civil podem ser úteis ao examinador. Aspectos médico- trabalhistas e periciais podem estar envolvidos, e o conhecimento do estado civil passa ser um dado valioso. ✓ Profissão: É um dado de crescente importância na prática médica, e tem relação com o próximo item. ✓ Local de trabalho: Não basta registrar ocupação atual. Faz- se necessário indagar sobre outras atividades já exercidas em épocas anteriores. Por isso, nos prontuários devem constar os itens profissão e local de trabalho na identificação e os itens ocupação atual e ocupações anteriores nos hábitos de vida. Em certas ocasiões, existe uma relação direta entre o trabalho do indivíduo e a doença que lhe acometeu. Enquadram- se nessa categoria as chamadas doenças profissionais e os acidentes de trabalho. Por exemplo, indivíduos que trabalham em pedreiras ou minas podem sofrer uma doença determinada por substâncias inaladas ao exercerem sua profissão, a pneumoconiose. O indivíduo que sofre uma fratura ao cair de um andaime é vítima de um acidente de trabalho. Em outras situações, ainda que a ocupação não seja diretamente relacionada com a doença, o ambiente no qual o trabalho é executado poderá envolver fatores que agravam uma afecção preexistente. Assim, são os locais empoeirados ou enfumaçados que agravam as enfermidades broncopulmonares, como asma brônquica, bronquite crônica e enfisema pulmonar. ✓ Naturalidade: Local onde o paciente nasceu. ✓ Procedência: Refere-se à residência anterior do paciente. Por exemplo, ao atender um paciente que mora em Goiânia, mas que anteriormente residiu em Belém, deve- se registrar a última localidade como a procedência. No caso de um executivo que reside em São Paulo e faz uma viagem de negócios para Recife, caso seja atendido em um hospital em Recife, sua procedência será São Paulo. Caso procure assistência médica logo depois de seu retorno a São Paulo, sua procedência será Recife. ✓ Residência: Anota-se o endereço da residência atual do paciente. As doenças infecciosas e parasitárias se distribuem pelo mundo em função de vários fatores, como climáticos, Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão hidrográficos e de altitude. Conhecer o local da residência é o primeiro passo nessa área. Além disso, deve-se lembrar de que os movimentos migratórios influem de modo decisivo na epidemiologia de muitas doenças infecciosas e parasitárias, como a doença de Chagas, a esquistossomose, a malária e a hidatidose. ✓ Nome da mãe: Anotar o nome da mãe do paciente é uma regra bastante comum na hospitais no sentido de diferenciar os pacientes de mesmo nome. ✓ Nome do responsável, cuidador ou acompanhante: O registro do nome do responsável, cuidador ou acompanhante de crianças, adolescentes, idosos, tutelados ou incapazes por problemas cognição, por exemplo, faz-se necessário para que se firme a relação da corresponsabilidade ética no processo de tratamento do paciente. ✓ Religião: A religião a qual o paciente se filia tem relevância no processo saúde-doença. Alguns dados bastante objetivos, como a proibição da hemotransfusão em testemunhas de Jeová e o não uso de carnes pelos fiéis da Igreja Adventista, têm uma repercussão importante no planejamento terapêutico. Outros dados mais subjetivos podem influenciar a relação médico-paciente, uma vez que o médico usa em sua fala a pauta científica, que muitas vezes pode se contrapor à pauta religiosa pela qual o paciente compreende o mundo em que vive. ✓ Filiação a órgãos/instituições previdenciárias e planos de saúde: Ter conhecimento desse fato facilita o encaminhamento para exames complementares, outros especialistas ou mesmo a hospitais, nos casos de internação. Queixa principal Registra-se a queixa principal ou o motivo que levou paciente a procurar um médico, repetindo, se possível, as expressões por ele utilizadas. É uma afirmação breve e espontânea, geralmente um sinal ou um sintoma, suscitador nas próprias palavras da pessoa, que descreve o motivo da consulta. Geralmente, é uma anotação entre aspas para indicar que se trata das palavras exatas do paciente. Não se deve aceitar “rótulos diagnósticos” referidos à queixa principal. Assim, se o paciente disser que problema é “pressão alta” ou “menopausa”, deve-se esclarecer o sintoma que ficou subentendido sob outra denominação, pois nem sempre existe uma correspondência entre a nomenclatura leiga e o significado exato do termo usado pelo paciente. Por isso, sempre se solicita a ele a tradução em linguagem corriqueira daquilo que sente. Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão ✓ Sugestões para obter a “queixa principal”: Qual o motivo da consulta? Por que o (a) senhor (a) me procurou? O que o (a) senhor (a) está sentindo? O que está incomodando? ✓ Exemplos de “queixaprincipal: Dor de ouvido Dor no peito há 2h Exame periódico para o trabalho História da doença atual (HDA) A história da doença atual (HDA) é um registro cronológico e detalhado do motivo que levou o paciente a procurar assistência médica, desde o seu início até a data atual. A HDA é a parte principal da anamnese e costuma ser a chave mestra para chegar ao diagnóstico. ✓ Sintoma-guia: Designa-se como sintoma-guia o sintoma ou sinal que permite recompor a história da doença atual com mais facilidade e precisão, por exemplo: a febre na malária, a dor epigástrica na úlcera péptica, as convulsões na epilepsia, o edema na síndrome nefrótica, a diarreia na colite ulcerativa. Contudo, isso não significa que haja sempre um único e constante sintoma- guia para cada enfermidade. Sintoma- guia não é necessariamente o mais antigo, mas tal atributo deve ser levado em conta. Não é obrigatório que seja a primeira queixa relatada pelo paciente, porém isso também não pode ser menosprezado. Nem é, tampouco de maneira sistemática, o sintoma mais realçado pelo paciente. Como orientação geral, o estudante deve escolher como sintoma-guia a queixa de mais longa duração, o sintoma mais salientado pelo paciente ou simplesmente começar pelo relato da “queixa principal”. O passo seguinte é determinar a época em que teve início aquele sintoma. A pergunta padrão pode ser: “Quando o senhor começou a sentir isso?”. Nem sempre o paciente consegue se lembrar de datas exatas, mas é indispensável estabelecer a época provável do início do sintoma. Afecções de longa duração e de começo insidioso com múltiplas manifestações causam maior dificuldade. Nesses casos mais complexos, é válido utilizar-se de certos artifícios, procurando relacionar o (s) sintoma (s) com eventos que não se esquecem (casamento, gravidez mudanças, acidentes). O terceiro passo consiste em investigar a maneira como evoluiu o sintoma. Muitas perguntas devem ser feitas, e cada sintoma tem suas características semiológicas. Constrói-se uma história clínica com base no modo como evoluem os sintomas. Concomitantemente com análise da evolução do sintoma-guia, o examinador estabelece as correlações e as inter-relações com outras queixas. A Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão análise do sintoma-guia e dos outros sintomas termina com a obtenção de informações sobre como eles estão no presente momento. Visto em conjunto esse esquema básico para confecção da anamnese, verifica-se que a meta almejada é obter uma história que tenha início, meio e fim. ✓ Análise de um sintoma: Para ajudar na análise de um sintoma, tem-se um esquema com alguns elementos essenciais para essa etapa: Início: deve ser caracterizada com relação à época de aparecimento, se foi de início súbito ou gradativo, se teve fator desencadeante ou não. Característica do sintoma: definir a localização, duração, intensidade, frequência, tipo, ou seja, características próprias a depender do sintoma. Fatores de melhora ou piora: definir quais fatores melhoram e pioram um sintoma, como fatores ambientais, posição, atividade física ou repouso, alimentos ou uso de medicamentos. Relação com outras queixas: registrar se existe alguma manifestação ou queixa que acompanha o sintoma, geralmente relacionado com o segmento anatômico ou funcional acometido pelo sintoma. Evolução: registrar o comportamento do sintoma ao longo do tempo, relatando modificações das características e influência de tratamentos efetuados. Situação atual: registrar como o sintoma está no momento da anamnese. Interrogatório sintomatológico Constitui um complemento da HDA. O interrogatório sintomatológico (IS) documenta a existência ou ausência de sintomas comuns relacionados com cada um dos principais sistemas corporais. A principal utilidade prática do interrogatório sintomatológico reside no fato de permitir ao médico levantar possibilidades e reconhecer enfermidades que não guardam relação com o quadro sintomatológico registrado na HDA. Por exemplo: o relato de um paciente conduziu ao diagnóstico de úlcera péptica, e no IS houve referência a edema dos membros inferiores. Esse sintoma pode despertar uma nova hipótese diagnóstica que vai culminar no encontro de uma cirrose. Além disso, é no interrogatório sintomatológico que se origina a suspeita diagnóstica mais importante. É comum um paciente não relatar um ou vários sintomas durante a elaboração da HDA. Simples esquecimento ou medo inconsciente de determinados diagnósticos podem levar o paciente a não se referir a padecimentos de valor crucial para chegar a um diagnóstico. Por isso, outra importante função do interrogatório sintomatológico é avaliar práticas de promoção à saúde. Enquanto se avalia o estado de saúde passado e presente de cada sistema corporal, aproveita-se para promover saúde, orientando e esclarecendo o paciente sobre maneiras de prevenir doenças e evitar riscos à saúde. Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão ✓ Sistematização do IS: Não é fácil sintetizar o interrogatório sintomatológico quando se tem como permanente preocupação uma visão global do paciente. Sem dúvida, a melhor maneira é levar em conta os segmentos do corpo. O domínio do método clínico exige um esforço especial nessa fase, porém a chave do problema está no exame do maior número possível de pacientes, seguindo-se a sistematização proposta a seguir: Sintomas gerais, como febre, astenia, alteração de peso. Pele e fâneros, como alteração da cor, textura, lesões. Cabeça e pescoço, abrangendo sintomas que acometem o crânio, face, olhos, ouvidos, nariz, cavidades paranasais, cavidade bucal e anexos, faringe, laringe, tireoide, paratireoide, vasos e linfonodos. Tórax, abrangendo mamas, traqueia, brônquios, pulmões, pleuras, diafragma, mediastino, coração, grandes vasos e esôfago. Abdome, abrangendo parede abdominal, estômago, intestino delgado, cólon, reto, ânus, fígado, vias biliares e pâncreas. Sistema geniturinário, abrangendo rins, vias urinárias e órgãos genitais. Sistema hemolinfopoético, como hemorragias, icterícia. Sistema endócrino, abrangendo hipotálamo, e hipófise, tireoide, paratireoides, suprarrenais e gônadas. Coluna vertebral, ossos, articulações e extremidades, como dor, rigidez deformidades. Músculos, como fraqueza, atrofia, dor. Artérias, veias, linfáticos e microcirculação, como edemas, dor. Sistema nervoso, como dor, convulsão amnésia. Exame psíquico e avaliação das condições emocionais, como memória, inteligência, consciência, comportamento. Antecedentes pessoais Considera-se avaliação do estado de saúde passado e presente do paciente, conhecendo fatores pessoais e familiares que influenciam seu processo saúde-doença. Em crianças e indivíduos de baixa idade, a análise dos antecedentes pessoais costuma ser feita com mais facilidade do que em outras faixas etárias. Às vezes, uma hipótese diagnóstica leva o examinador a uma indagação mais minuciosa de algum aspecto da vida pregressa. Por exemplo: ao encontrar- se uma cardiopatia congênita, investiga-se é possível ocorrência de rubéola na mãe durante o primeiro trimestre da gravidez. O interesse dessa indagação é por saber-se que essa virose costuma causar defeitos Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão congênitos em elevada proporção dos casos. Os passos a serem seguidos abrangem os antecedentes fisiológicos e antecedentes patológicos. ✓ Antecedentes pessoais fisiológicos: A avaliação dos antecedentes pessoais fisiológicos inclui os seguintes itens: Gestação e nascimento: como decorreu a gravidez, usode medicamentos ou radiações sofridas pela genitora, viroses contraídas durante a gestação, condições de parto, estado da criança ao nascer, ordem de nascimento, número de irmãos. Desenvolvimento psicomotor e neural: dentição, engatinhar e andar, fala, desenvolvimento físico, controle dos esfíncteres, aproveitamento escolar. Desenvolvimento sexual: puberdade, menarca, sexarca, menopausa, orientação sexual. ✓ Antecedentes pessoais patológicos: A avaliação dos antecedentes pessoais patológicos compreende os seguintes itens: Doenças sofridas pelo paciente: infância (sarampo, varicela, caxumba), vida adulta (pneumonia, hepatite, malária). Alergia: alimentos, medicamentos e outras substâncias (eczemas, urticária, asma). Cirurgias e outras intervenções: data, tipo de cirurgia, diagnóstico. Traumatismo: detalhes do acidente. Transfusão sanguínea: número de transfusões, quando ocorreu, onde e por quê. História obstétrica: número de gestações, número de partos, número de abortos, número de prematuros, número de cesarianas. Caso o paciente seja do sexo masculino, indaga-se o número de filhos, enfatizando-se a importância da maternidade. Vacinas: quais, época da aplicação. Medicamentos em uso: qual, posologia, motivo, quem prescreveu. Antecedentes familiares Os antecedentes começam com a menção ao estado de saúde (quando vivos) dos pais e irmãos do paciente. Se for casado, inclui-se o cônjuge e, se tiver filhos, estes são referidos. Não se esquecer dos avós, tios e primos paternos e maternos do paciente. Se tiver algum doente na família, esclarecer a natureza da enfermidade. Em caso de falecimento, indagar a causa do óbito e a idade em que ocorreu. Pergunta-se sistematicamente sobre a existência de enxaqueca, diabetes, tuberculose, hipertensão arterial, câncer, doenças alérgicas, doença arterial coronária, acidente vascular cerebral, dislipidemias, úlcera péptica, colelitíase e varizes, que são as doenças com caráter familiar mais comuns. Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão Quando o paciente é portador de uma doença de caráter hereditário (hemofilia, anemia falciforme, erros metabólicos), torna-se imprescindível um levantamento genealógico mais rigoroso, e, nesse caso, recorre-se às técnicas de investigação genética. Hábitos e estilo de vida Este item, muito amplo e heterogêneo, documenta hábitos e estilo de vida do paciente e está desdobrado nos seguintes tópicos: ✓ Alimentação: Toma-se como referência o que seria alimentação adequada para aquela pessoa em função da idade, do sexo e do trabalho desempenhado. Induz-se o paciente a discriminar sua alimentação habitual, especificando o tipo e a quantidade dos alimentos ingeridos. Devemos questionar principalmente sobre o consumo de alimentos à base de carboidratos, proteínas, gorduras, fibras, bem como de água e outros líquidos. Assim procedendo, o examinador poderá fazer uma avaliação quantitativa e qualitativa, ambas com interesse médico. ✓ Ocupação atual e ocupações anteriores: Na identificação do paciente, deve-se abordar esse aspecto. Naquela ocasião, foi feito o registro puro e simples da profissão. Aqui pretende-se ir mais adiante, obtendo informações sobre a natureza do trabalho desempenhado, com que substâncias entra em contato, quais as características do meio ambiente e qual o grau de ajustamento ao trabalho. Desse modo, vê-se que os portadores de asma brônquica terão sua doença agravada se trabalharem em ambiente enfumaçado, empoeirado ou se tiverem de manipular inseticidas, pelos de animais, penas de aves, plumas de algodão ou de lã, livros velhos e outros materiais reconhecidamente capazes de agir como antígenos ou irritante das vias respiratórias. ✓ Atividades físicas: Devemos questionar qual o tipo de exercício físico o paciente realiza (natação, futebol, caminhada, etc), frequência (diariamente, 3 vezes por semana, etc), duração (por 30 minutos, por uma hora) e tempo que pratica (há 1 ano, há 3 meses). Uma classificação prática é a que se designa: pessoas sedentárias; pessoas que exercem atividades físicas moderadas; pessoas que exercem atividades físicas intensas e constantes; pessoas que exercem atividades físicas ocasionais. ✓ Hábitos: Alguns hábitos são ocultados pelos pacientes e até pelos próprios familiares. A investigação deste item exige habilidade, discrição e perspicácia. Uma afirmativa ou uma negativa sem explicações por parte do Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão paciente não significa necessariamente a verdade. Deve-se investigar sistematicamente o uso de tabaco, bebidas alcoólicas, anabolizantes, anfetaminas e drogas ilícitas. ✓ Consumo de tabaco: O consumo de tabaco, socialmente aceito, não costuma ser negado pelos pacientes, exceto quando tenha sido proibido de fumar. Os efeitos nocivos do tabaco são indiscutíveis: câncer de boca, faringe, laringe, pulmão e bexiga, afecções broncopulmonares, afecções cardiovasculares, disfunções sexuais masculinas, baixo peso fetal, intoxicação do recém-nascido em aleitamento materno, entre outros. Diante disso, nenhuma anamnese está completa se não se investigar esse hábito, registrando-se tipo (cigarro, cachimbo, charuto, cigarro de palha), quantidade, frequência, duração do vício e abstinência (já tentou parar de fumar). ✓ Consumo de bebidas alcoólicas: A ingestão de bebidas alcoólicas também é socialmente aceita, mas muitas vezes é omitida ou minimizada por parte dos pacientes. Que o álcool tem efeitos graves sobre o fígado, cérebro, nervos, pâncreas e coração não se discute. O próprio etilismo, em si, uma doença de fundo psicossocial, deve ser colocado entre as enfermidades importantes e mais difundidas atualmente. Não se deve deixar de perguntar sobre o tipo de bebida (cerveja, vinho, licor, vodca, whisky, cachaça, etc), a quantidade habitualmente ingerida, a frequência, a duração do vício e abstinência (se já tentou parar de beber). Para facilitar a avaliação do hábito de consumir bebidas alcoólicas e/ou do grau de dependência do paciente ao consumo de álcool, pode-se fazer uso da sistematização: pessoas abstêmias, ou seja, não consomem definitivamente nenhum tipo de bebida alcoólica; consumo ocasional, em quantidades moderadas; consumo ocasional, em grande quantidade, chegando a estado de embriaguez; consumo frequente em quantidade moderada; consumo diário em pequena quantidade; consumo diário em quantidade para determinar a embriaguez; consumo diário em quantidade exagerada, chegando o paciente a avançado estado de embriaguez. ✓ Uso de anabolizantes e anfetaminas: Uso de anabolizantes por jovens frequentadores de academia de ginástica tornou-se hoje uma preocupação, pois tais substâncias levam à dependência e estão correlacionadas com doenças cardíacas, renais, hepáticas, endócrinas e neurológicas. A utilização de anfetaminas, de maneira indiscriminada, leva à dependência química e, comparadamente, causa prejuízos à saúde. Alguns sedativos Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão (barbitúricos, morfina, benzodiazepínicos) também causam dependência química e devem ser sempre investigados. ✓ Consumo de drogas ilícitas: As drogas ilícitas incluem maconha, cocaína, heroína, ecstasy, LCD, crack, chá de cogumelo, inalantes (cola de sapateiro, lança-perfume). O uso dessas substâncias ocorre em escala crescente em todos os grupos socioeconômicos, principalmente entre adolescentes. O hábito de frequentar festas rave pode estar associado ao uso abusivo de drogas ilícitas. Não deixar de questionar sobre o tipo de droga, quantidade habitualmenteingerida, frequência, duração do vicio e abstinência. A investigação clínica de um paciente que usa drogas ilícitas não é fácil. Há necessidade de tato e perspicácia, e o profissional deve integrar informações provenientes de todas as fontes disponíveis, principalmente de familiares. Condições socioeconômicas e culturais As condições socioeconômicas e culturais avaliam a situação financeira, vínculos afetivos familiares, filiação religiosa e crenças espirituais do paciente, bem como condições de moradia e grau de escolaridade. ✓ Habitação: Na zona rural, pela sua precariedade, as casas comportam-se como abrigos ideais para numerosos reservatórios e transmissores de doenças infecciosas e parasitárias. Como exemplo, pode-se citar a doença de Chagas. Os triatomíneos (barbeiros) encontram na “cafua” ou “casa de pau a pique” seu habitat ideal, o que faz dessa parasitose importante endemia de várias regiões brasileiras. Na zona urbana, a diversidade de habitação é um fator importante. Por outro lado, as favelas e áreas de invasão propiciam o surgimento de doenças infectoparasitárias devido à ausência de saneamento básico, proximidade de rios poluídos, ineficácia na coleta de lixo e confinamento de várias pessoas em pequenos cômodos habitacionais. Por outro lado, casas ou apartamentos de alto luxo podem manter, por exemplo, em suas piscinas e jardins, criadouros do mosquito Aedes aegypti, dificultando o controle da dengue. Neste item, é importante questionar sobre as condições de moradia: se mora em casa ou apartamento; se a casa é feita de alvenaria ou não; qual a quantidade de cômodos; se conta com saneamento básico (água tratada e rede de esgoto), com coleta regular de lixo; se abriga animais domésticos, entre outros. Indaga-se também sobre o contato com pessoas ou animais doentes. A poluição do ar, a poluição sonora e visual, os desmatamentos e as queimadas, as alterações climáticas, as inundações, os temporais e os terremotos, todos são fatores relevantes Semiologia Como fazer a anamnese perfeita (parte 2) Juliana Simão na análise da habitação, podendo propiciar o surgimento de várias doenças. ✓ Condições socioeconômicas: Os primeiros elementos estão contidos na própria identificação do paciente, outros são coletados no decorrer da anamnese. Se houver necessidade de mais informações, indagar sobre rendimento mensal, situação profissional, se há dependência econômica de parentes ou instituição. Todo profissional precisa conhecer as possibilidades econômicas de seu paciente, principalmente sua capacidade financeira para comprar medicamentos. É obrigação do profissional compatibilizar sua prescrição aos rendimentos do paciente. A maior parte das doenças crônicas exige uso contínuo de um ou mais medicamentos. No Brasil, atualmente, há distribuição gratuita de medicamentos para pacientes crônicos e cabe ao profissional de saúde conhecer a lista desses remédios para prescrevê-los quando for necessário. Uma das mais frequentes causas de abandono do tratamento é a incapacidade de adquirir remédios ou alimentos especiais. ✓ Condições culturais: É importante destacar que as condições culturais não se restringem ao grau de escolaridade, mas abrangem a religiosidade, as tradições, as crenças, os mitos, a medicina popular, os comportamentos e hábitos alimentares. Tais condições culturais devem ser respeitadas em seu contexto. Quanto à escolaridade, é importante saber se o paciente é analfabeto ou alfabetizado. Vale ressaltar se o paciente completou o ensino fundamental, ensino médio ou se tem nível superior (graduação e pós- graduação). Tais informações são fundamentais na compreensão do processo saúde-doença. Partir de algo simples, como o grau de escolaridade (alfabetizado ou não), é a maneira mais prática de abordar esse aspecto da anamnese. Todavia, é o conjunto de dados de dados vistos e ouvidos que permitirá uma avaliação mais abrangente. ✓ Vida conjugal e relacionamento familiar: Investiga-se o relacionamento entre pais e filhos, entre irmãos e entre cônjuges. Esse tópico é onde a dificuldade atinge o seu máximo, pois os pacientes adotam uma maior reserva a respeito de sua vida íntima e de suas relações familiares. Por isso, deve-se reconhecer esse obstáculo, preparando-se intelectual e psicologicamente, para, em época oportuna e nos momentos exatos, levar a anamnese até os mais recônditos e bem guardados escaninhos da vida pessoal e familiar do paciente.
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