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A FORÇA DO POVO: 
BRIZOLA 
E O RIO DE JANEIRO 
Copyright © Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro - ALERJ 
Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19.2 .1998 . 
É proibida a reprodução total C parcial, por quaisquer meios, 
sem a expressa anuência da editora. 
SUBOIRETORA GERAL DA ALER): Mayumi Sone 
COORDENAÇÃO DE PROJETOS ESPECIAIS: Arl indenor Pedro de Souza 
COORDENAÇÃO DO NÚCLEO DE MEMÓRIA POLíTICA 
CARIOCA E FLUMINENSE: Marieta de Moraes Ferreira 
COORDENAÇÃO DO VOLUME: Marieta de Moraes Ferreira 
PESQUISA E TEXTOS: Amér ica Freire, Carlos Eduardo Sarmento, 
Helena Bomeny, João Trajano Sento-Sé, Mari'eta de Moraes Ferrei ra, 
Marly Silva da Motta e Mônica Rodrigues 
EDiÇÃO DE TEXTO: Dora Rocha 
ESTAGIÁRIOS E AUXILIARES DE PESQUISA: Daniela Bacta, Lidiane Monteiro Ribeiro, 
Julia Oliveira Pedro de Souza, Jul iana Ribeiro de Oliveira, 
Roclrigo Tannus Moreira, Rosa Maria de Souza e Daniel Gigot de Sousa 
CAPA, PROJETO GRÁFICO E COMPOSiÇÃO: Leo Boechat 
CJP-Brasi l. Catalogação-oa-fonte 
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. 
B862 
A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro / Organizadora Marieta de Moraes 
Ferreira; Marieta de Moraes Ferreira . . . [et a!. ]. - Rio de Janeiro: Alcrj , 
C PDOC/FGV, 2008. 
228 p. il. 
Inclui bibliogralla 
ISBN 978-85-6021 3-02 -3 
1. Brizola, Leonel, 1922-2004.2. Rio de Janeiro (Eslado). 3. Histó-
ria polftica. 4. Brizol ismo. 5. Pop ulismo. I. ferreira, Mari eta de Moraes. 
C DD ,320.98 153 
CDU: 98 1.53 
A FORÇA DO POVO: 
BRIZOlA 
E O RIO DE JANEIRO 
Marieta de Moraes Ferreira 
organizadora 
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS 
CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA 
CONTEMPORÃNEA DO BRASIL - CPDOC 
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 
NÚCLEO DE MEMÓRIA POLÍTICA CARIOCA E FLUMINENSE 
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 
GILBERTO PALMARES 
2° Vice-Presidente 
JOSÉ CAMILO ZITO 
2 o Secretário 
AMANDO JOSÉ 
2° Suplente 
Mesa Diretora 
JORGE PICCIANI 
Presidente 
CORONEL JAIRO 
10 Vice-Presidente 
PEDRO FERNANDES 
3° Vice-Presidente 
GRAÇA MATOS 
10 Secretário 
JORGE MOREIRA DICA 
3° Secretário 
RENATA DO POSTO 
P Suplente 
PEDRO AUGUSTO 
3° Suplente 
GERSON BERGHER 
4° Vice-Presidente 
FABIO SILVA 
40 Secretário 
EDINO FONSECA 
4° Suplente 
Sumário 
Apresentação pág. 7 
O Núcleo de Memória Política Carioca e Fluminense pág. 9 
Introdução pág. 13 
1. Do Rio Grande do Sul à Guanabara 
Marieta de Moraes Ferreira pág.15 
2. Entre o carisma e a rotina: as eleições de 1982 
e o primeiro governo 
Carlos Eduardo Sarmento pág.43 
3. Imprensa: uma relação de amor e ódio 
Mônica Rodrigues pág.68 
4. Salvar pela escola: Programa Especial de Educação 
Helena Bomeny pág.95 
5. Novo sindicalismo e movimentos sociais 
Américo Freire pág.128 
6. O projeto político: a presidência da República 
Marly Motta pág.151 
7. A era do líder popular 
João Trajano Sento-Sé pág.182 
Memórias do brizolismo 
Depoimentos colhidos por Mônica Rodrigues pág.202 
Fontes e bibliografia pág.215 
Apresentação 
BRIZOLA ERA, como ele bem se definia, uma planta do deserto. Dizia 
que bastava uma gota de orvalho para mantê-lo vivo. Quem, como eu, teve a 
honra de conviver com esse líder extraordinário) aprendeu que a paixão pelo 
Brasil era a seiva que o alimentava. Brizola falava do futuro como se menino 
fosse. Pouco antes de morrer) estava em plena ativa, fazia planos sem cogitar 
que a morte estivesse, como ele dizia para tudo o que estava próximo, ('coste-
ando o alambrado". Sua partida foi tão surpreendente como lhe foi a vida, e o 
Brasil e a política ficam menores sem ele. 
A Assembléia Legislativa do Rio é, como dizemos, o lugar da memória 
do parlamento brasileiro, graças a iniciativas que recuperam a história polí-
tica do nosso povo. Na Alerj, fizemos exposições, sessões de homenagens a 
Brizola e agora este livro. E foi aqui, quando esta casa não sonhava nascer, 
quando o Rio era a capital da República e aqui funcionava a Câmara dos 
Deputados, que Brizola teve um de seus momentos políticos mais brilhantes, 
como deputado federal mais votado do país. 
Fui militante do PDT, liderei sua bancada nesta Assembléia Legislativa 
e fui seu representante numa época em que o brizolismo estava em plena as-
censão. Reconheço que, naquela época, o nível do debate político era outro, 
havia uma efervescência muito grande que empolgava tanto a nós quanto ao 
povo, que participava mais. Brizola, pela sua força indiscutível, pela bravura 
reconhecida por aliados e adversários, coerência e fervor na defesa das gran-
des causas nacionalistas e trabalhistas, nos liderava. Quem lhe fazia oposição 
tinha que ao mesmo tempo respeitar a sua biografia limpa. 
7 
8 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
Poucos políticos, nas seis últimas décadas, exerceram papel tão destaca-
do na vida pública brasileira quanto ele. Conseguiu ser uma referência para 
muitos que passaram por ele. Sem nenhum exagero, eu me animo a afirmar 
que Brizola, desde o retorno do exílio, além de promover o resgate de impor-
tantes ícones do trabalhismo, cassados e com os direitos políticos suspensos, 
como ele, soube criar, pela via democrática seguida pelo PDT, uma escola de 
formação de importantes lideranças que estão aí até hoje. 
Relembrar a história de vida de Leonel Brizola na Alerj é fazer com que 
as pessoas comuns, o povo, os estudantes, com quem Brizola gostava de se 
relacionar, não se esqueçam da sua memória. Essa é a nossa missão) como 
membros do parlamento e como amantes da boa política. 
DEPUTADO JORGE PICCIANI 
Presidente da Assembléia Legislativa 
do Estado do Rio de Janeiro 
o Núcleo de Memória Política 
Carioca e Fluminense 
EM MAIO DE 1997, foi firmado um convênio entre o Centro de Pesquisa 
e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fun-
dação Getulio Vargas e a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro 
(Alerj), com o objetivo de construir um centro permanente de produção in-
telectual e de referência documental sobre a história política contemporânea 
da cidade e do estado do Rio de Janeiro - o Núcleo de Memória Política 
Carioca e Fluminense. Durante a fase de implantação do Núcleo, de 1997 a 
1999, foram desenvolvidas duas linhas de ação interligadas. A primeira delas 
consistiu na divulgação para o grande público da história do Palácio Tiraden-
tes, centro da vida política do país entre as décadas de 1920 e 1950 e atual 
sede da Alerj. Para atingir esse objetivo, dois produtos foram preparados: uma 
exposição multimídia permanente instalada no próprio prédio da Assembléia, 
intitulada Palácio Tiradentes: lugar de memória do Parlamento brasileiro, e o 
CD-Rom Palácio Tiradentes, a casa do Poder Legislativo. 
A segunda linha de ação consistiu na publicação de um conjunto de 
livros de depoimentos e de análise sobre aspectos significativos da história 
política contemporânea carioca e fluminense. Duas coleções foram inicia-
das: Conversando sobre Política, destinada a divulgar depoimentos, e Perfil 
Político, destinada a registrar biografias de políticos filiados a diferentes cor-
rentes político-ideológicas e partidárias, que tiveram participação destacada 
no cenário carioca e fluminense nos últimos 50 anos. Foi lançado ainda um 
volume avulso, dedicado ao jornalismo político, que sempre desempenhou 
importante papel na dinâmica política do Rio de Janeiro. 
9 
10 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
Os cinco primeiros volumes da coleção Conversando sobre Política reú-
nem os depoimentos de José Gomes Talarico, Paulo Duque, Erasmo Martins 
Pedro, Célio Borja c, num único livro, os de Hamilton Xavier e Saramago 
Pinheiro. Na série Perfil Político foi publicado um livro sobre a trajetória 
política de Chagas Freitas, principal líder de uma corrente política de grande 
peso no Rio de Janeiro entre as décadas de 1960 e 1980. Finalmente, o volu-
me Crônica políticado Rio de Janeiro reuniu entrevistas com jornalistas que 
atuaram, e ainda atuam, em diferentes órgãos da imprensa da cidade, desde 
seus tempos de capital federal até os de capital do estado do Rio de Janeiro. 
Em junho de 1999, foi assinada a renovação do convênio entre o CPDOC 
e a Alerj para dar prosseguimento às atividades do Núcleo. Nesta segunda 
fase, decidiu-se preparar um conjunto de publicações com vistas a consolidar 
o trabalho até então realizado. Para dar continuidade à coleção Conversando 
sobre Política, foi escolhido o depoimento do desembargador Jorge Loretti, 
homem público que conhece como poucos os meandros da política fluminen-
se. Para divulgar a exposição Palácio Tiradentes: lugar de memória do Parla-
mento brasileiro, foi elaborado um catálogo que oferecerá a um público mais 
amplo um roteiro com textos e imagens referentes à história do palácio e da 
vida política do Rio de Janeiro. 
Nesta nova fase, decidiu-se também publicar livros relativos a um mo-
mento crítico da vida política do país e do Rio de Janeiro: as décadas de 1970 
e 1980, marcadas pelo desgaste do regime militar e pela luta democrática. No 
Rio de Janeiro, esses foram anos de profundas mudanças, causadas, entre ou-
tros fatores, pela fusão em 1975 do estado da Guanabara com o antigo estado 
do Rio. Três livros trataram desses temas. O primeiro, intitulado Vozes da 
oposição, reúne depoimentos de homens e mulheres que lutaram nos partidos 
políticos e nos parlamentos, mas também na sociedade civil, contra o regime 
militar. O segundo livro, A construção de um estado: a fusão em debate, con-
tém entrevistas com uma série de homens públicos que estiveram en1 posição 
de governo antes e depois da fusão. O terceiro, Um estado em questão: os 25 
anos do Rio de Janeiro, é uma coletânea de artigos assinados por especialistas, 
sobre aspectos de natureza política, social, econômica e cultural do estado do 
Rio de Janeiro no período 1975-2000. 
No ano de 2001, foi lançada uma nova coleção, com o objetivo de di-
vulgar trabalhos acadêmicos de interesse para o Núcleo: Estudos do Rio de 
Janeiro. Nela foram publicados três volumes sobre diferentes momentos da 
o Núcleo de Memória Política Carioca e Fluminense 11 
vida política carioca, a saber: Guerra de posições na metrópole: a Prefeitura e 
as empresas de ônibus no Rio de Janeiro (1906-1948), de Américo Freire; O Rio 
de Janeiro na era Pedro Ernesto, de Carlos Eduardo Sarmento; Rio de Janeiro: 
de cidade-capital a estado da Guanabara, de Marly Silva da Motta. Em 2003, 
mais um volume foi acrescentado à série: Paulo de Frontin, discursos parla-
mentares, organizado por Américo Freire. Em 2004, o depoimento de Pedro 
Fernandes veio somar-se à coleção Conversando sobre Política. 
Este volume, o segundo da série Perfil Político, é dedicado a Leonel 
Brizola. Composto de sete artigos, não pretende esgotar a biografia do líder 
trabalhista, e sim focalizar sua atuação no Estado da Guanabara, posterior-
mente estado Rio de Janeiro. 
O Núcleo de Memória Política Carioca e Fluminense tem uma página 
na internet, no endereço www.http://memoriapolitica.rj.gov.br. Nela, o usu-
ário poderá obter informações sobre todas as realizações do Núcleo, além de 
um conjunto de dados importantes sobre a política carioca e fluminense. 
A constituição do Núcleo de Memória Política Carioca e Fluminense 
foi possível graças à iniciativa da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do 
Rio de Janeiro, presidida na época pelo então deputado Sérgio Cabral Filho, 
e à acolhida da Fundação Getulio Vargas, então presidida por Jorge Oscar de 
Mello Flôres. Os atuais presidentes da Assembléia, Jorge Picciani, e da FGV, 
Carlos Ivan Simonsen Leal, assim como seus antecessores, têm dado todo o 
apoio às atividades do Núcleo. No CPDOC, as ex-diretoras Lucia Lippi Oli-
veira e Marieta de Moraes Ferreira acompanharam desde o início os esforços 
da equipe. O atual diretor, Celso Castro, assegurou os recursos humanos e 
materiais para o desenvolvimento das atividades. O gerente administrativo 
Felipe Rente enfrentou os meandros da execução do convênio com a Alerj 
com inigualável capacidade de trabalho. 
Desde março de 2003, a Coordenadoria de Projetos Especiais da Alerj, 
tendo à frente Arlindenor Pedro de Souza, é a responsável pelos projetos de-
senvolvidos em parceria com o CPDOC e tem demonstrado o mesmo empe-
nho que marcou a gestão da comissão anterior, composta, além de Arlindenor 
Pedro de Souza, por Sérgio Ruy Barbosa Guerra Martins, Lígia Marina de Sá 
Pires de Moraes, Marcos da Silva Neves e Aloysio Neves. Para a realização 
12 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
deste livro, foi fundamental a atuação de Mayumi Sone, subdiretora geral da 
Alerj. Os pesquisadores Américo Freire, Carlos Eduardo Sarmento, Marieta 
de Moraes Ferreira e Marly Motta, além de se revezarem na coordenação do 
Núcleo de Memória Política Carioca e Fluminense, foram responsáveis pela 
execução dos projetos no CPDOC. A pesquisadora Adelina Cruz é a encar-
regada do acompanhamento da homepage do Núcleo, e a editora Dora Rocha 
responde pela supervisão geral das publicações. 
MARIETA DE MORAES FERREIRA 
Coordenadora 
Introdução 
Poucos PERSONAGENS da história política brasileira tiveram uma tra-
jetória tão rica como Leonel Brizola. Deputado estadual e federal, prefeito, 
governador de dois estados diferentes, foi criador de movimentos, entidades 
e partidos políticos, líder de massas, enfim, um protagonista que marcou seu 
lugar nos principais eventos contemporâneos brasileiros e que tem gerado 
muitas polêmicas em torno das posições que assumiu. Com tudo isso, Brizola 
ainda é tema pouco explorado pela historiografia brasileira. Um levantamento 
ainda que preliminar sobre figura tão instigante indica um número pouco sig-
nificativo de títulos. Esses trabalhos em geral estão voltados ou para a análise 
de eventos ou conjunturas mais amplas, como o trabalhismo, o golpe militar, o 
processo de abertura política, ou para aspectos particulares de sua ação políti-
ca, mas não dão conta de desvendar os elementos centrais de sua biografia. 
Este livro, elaborado no âmbito do convênio entre a Alerj e o CPDOC-
FGV, integra-se ao esforço para ampliar os estudos sobre a história política 
brasileira contemporânea e contribuir para o melhor entendimento da trajetó-
ria do líder trabalhista Leonel Brizola. Nossa proposta não é, nem poderia ser, 
a de esgotar o assunto. Assim, não iremos explorar sua longa biografia, que se 
estende de 1922 a 2004, mas sim focalizar sua atuação no Rio de Janeiro, no 
período que vai de 1962, quando de sua eleição para deputado federal pelo 
estado da Guanabara, até sua última candidatura, ao Senado, em 2002, pelo 
estado do Rio de Janeiro. Também não pretendemos dissecar todos os aspec-
tos da carreira do líder pedetista no período mencionado, em especial seus 
dois mandatos à frente do Executivo fluminense (1983-1987 e 1991-1994), 
mas sim explorar alguns eixos de análise: seu ingresso na vida política do Rio, 
13 
14 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
visto como palco para a consolidação de sua liderança na esfera nacional; as 
eleições de 1982 e a afirmação do PDT no quadro partidário fluminense; as 
relações com a mídia e com os movimentos sociais; as políticas para a educa-
ção; o projeto de conquistar a presidência da República, e as características 
do líder popular. 
Reunindo um grupo de pesquisadores que têm fortes interesses nos 
estudos sobre a história política fluminense, este livro pretende também, em 
seus sete artigos, lançar luz sobre aspectos da cultura política do estado do 
Rio de Janeiro e sobre as ambigüidades da relação entre a nacionalização de 
suas lideranças e as demandas regionais e locais. 
MARIETA DE MORAES FERREIRA 
Organizadora 
1. Do Rio Grande do Sul à Guanabara 
Marieta de Moraes Ferreira' 
Ao SE APROXIMAR o fim de seu mandato degovernador do Rio Grande 
Sul (1959-1963), Leonel Brizola deslocou sua atuação de seu estado natal 
para a Guanabara. Essa escolha, fundamental para sua carreira política, pode 
ser classificada como "um evento biográfico!!, 1 um momento crucial na traje-
tória de um indivíduo, em que ocorrem transformações que têm conseqüên-
cias relevantes para seu futuro. 
Para começar a entender esse evento, é preciso lembrar o que signi-
ficava a Guanabara no início da década de 1960. Tratava-se de um estado 
criado no ano de 1960, quando a cidade do Rio de Janeiro deixou de ser Dis-
trito Federal, por força da transferência da capital do país para Brasília. Sede 
da Colônia desde 1763, da Corte desde 1808, do Império desde 1822, e 
capital da República desde 1889, durante muito tempo o Rio foi o palco e a 
cmxa de ressonância dos empreendimentos culturais, científicos e políticos 
do país. Por isso, era visto como ('um espaço fundamentalmente nacionat, 
que permitia que políticos das mais variadas procedências, "independente-
mente de onde anteriormente vivessem e/ou atuassem politicamente", se 
destacassem como porta-vozes de questões de interesse geral da nação 2 
Ainda não foi nos primeiros anos de Brasília que o Rio teve sua posição ame-
açada. Portanto, a vinda de Brizola para o estado da Guanabara significou 
't Doutora em história, pesquisadora do CPDOC-FGV e professora do Departamento de His-
tória da UFRJ. 
1 Ver Levillan (2003: 141-184). Este conceíto foi desenvolvido por BonE & Zinn (2003). 
'Ver Silva (2005, 96). 
15 
16 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
exatamente a possibilidade de amplificar suas ações políticas, fazendo com 
que seu discurso conquista '>Se repercussão nacional e internacional. 
Na verdade, esse processo começou antes da transferência física de Bri-
zola. Em 1961, quando, ainda no Sul, defendeu a posse de João Goulart na 
presidência da República através da "cadeia da legalidade", Brizola deu um 
passo importante na escalada em direção à política nacional. Em 1962, quan-
do lançou sua candidatura a deputado federal pela Guanabara, na legenda 
do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), esse deslocamento começou a se 
concretizar. A construção de uma base política no Rio de Janeiro, que então 
se iniciou, teria efeitos duradouros, que sobreviveriam ao golpe militar de 
1964 e a 15 de anos de exílio, e permitiriam seu retorno em grande estilo à 
vida política nos anos 1980. Àquela altura, a Guanabara já não existia: era 
parte do estado do Rio de Janeiro resultante de sua fusão com o antigo Esta-
do do Rio em 1975. Brizola iria governar esse estado por duas vezes. Se não 
conseguiu chegar à presidência da República, isso não significa que não se 
tenha transformado num líder nacional. É da formação da base política que o 
conduziu a essa posição que este texto irá tratar. Antes, porém, será feito um 
breve resumo do cenário político do país e da trajetória de Brizola até deixar 
o governo gaúcho.' 
Credenciais: petebista e nacionalista 
Quando o desgaste da ditadura do Estado Novo se tornou evidente, em 1945, 
o presidente Getúlio Vargas procurou conduzir ele próprio o país em direção 
à democratização. Foram assim marcadas eleições e criados partidos políti-
cos. Concentrando a oposição ao governo) surgiu a União Democrática Na-
cional (UDN); reunindo os aliados de Vargas, formaram-se o Partido Social 
Democrático (PSD) e o PTB. Brizola, então com 23 anos, aluno da Escola 
de Engenharia da Universidade do Rio Grande do Sul, decidiu ingressar na 
política filiando-se ao PTB. 
Concebido pessoalmente por Vargas, o PTB tinha como objetivo ser 
um espaço de participação política para setores populares, afastando-os da 
3 As principais fontes deste resumo são os verbetes 'Brizola, Leonel' e 'Goulart, João' em DHBB. 
~ ... __ ._-------------------------------~ 
Do Rio Grande do Sul à Guanabara 17 
influência do Partido Comunista (PCB). O veículo primordial para sua or-
ganização foi o Ministério do Trabalho, que, pela influência que exercia nos 
sindicatos, atraiu os trabalhadores para o novo partido. Também as camadas 
populares urbanas eram visadas, e para atraí-las o PTB procurou capitalizar 
o prestígio adquirido por Vargas com a legislação social e trabalhista imple-
mentada durante o Estado Novo. Com esse ponto de partida, o PTB definiu 
seu programa e seus compromissos: defesa dos direitos dos trabalhadores, 
inclusive os rurais; ampliação e eficácia da Justiça do Trabalho; planificação e 
presença do Estado na gestão econômica, para garantir o desenvolvimento do 
país; melhor redistribuição da riqueza e extinção do latifúndio improdutivo; 
acesso à terra a todos que quisessem trabalhá-la. Ao ingressar no partido e 
nele ocupar diferentes posições, Brizola comprometeu-se com esse ideário e 
lutou de diferentes formas pra garantir o êxito dessas propostas. 
Foi na legenda do PTB que Brizola se elegeu deputado estadual em 
1947. Em março de 1950, casou-se com Neuza Coulart, irmã de João Cou-
lart, então emergente líder petebista, e em outubro do mesmo ano foi reelei-
to. No início da nova legislatura, em 1951, assumiu a liderança da bancada 
trabalhista na Assembléia Legislativa gaúcha. Exerceu seu novo mandato por 
cerca de um ano, até ser nomeado, em 1952, secretário estadual de Obras 
do governo de Ernesto Dornelles. A despeito do desempenho limitado do 
PTB gaúcho nas eleições para as prefeituras municipais e para o Legislati-
vo em 1954, foi eleito deputado federaL Ao assumir sua cadeira na Câmara 
dos Deputados no início de 1955, teve seus primeiros embates com Carlos 
Lacerda, da UDN. Em outubro seguinte, foi eleito prefeito de Porto Alegre, 
estabelecendo como prioridade o atendimento das reivindicações das clas-
ses trabalhadoras - saneamento básico, criação de escolas e melhoria dos 
transportes coletivos. Seu bom desempenho à frente da prefeitura da capital 
gaúcha o credenciou para disputar com êxito o governo estadual, sempre na 
legenda do PTB, em outubro de 1958. Conquistou seus eleitores graças ao 
direcionamento de sua campanha para os setores populares, sendo eleito com 
55% dos votos e derrotando assim as forças udenistas e pessedistas4 
À frente do governo gaúcho, Brizola deu prioridade ao desenvolvimento 
industrial, baseado em investimentos do capital privado nacional e do governo 
4 Ver Bandeira (1979). 
li,1 
18 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
estadual. Nessa opção estava implícita a luta contra o capital estrangeiro. Fiel a 
essa orientação, em maio de 1959 encampou a Companhia de Energia Elétrica 
Rio-Grandense, filial da Arnerican and Foreign Power Company (Arnforp), tor-
nando-se a partir de então uma expressiva liderança da esquerda nacionalista 
brasileira. Em contrapartida, a medida gerou uma grave crise nas relações entre 
o Brasil e os Estados Unidos, que explodiria mais tarde, com toda a intensida-
de, no governo de João Goulart. 
Como governador, Brizola ampliou sua capacidade de ação, seja desen-
volvendo programas de dinamização para a economia gaúcha, seja criando 
projetos de políticas públicas voltadas para as camadas populares, ou ainda 
engajando-se em lutas de dimensões nacionais. Já na sucessão presidencial 
de 1960, discordando do PSD e de setores do PTB que estavam lançando a 
candidatura do general Henrique Lott, começou a planejar, em conjunto com 
lideranças sindicais, a organização de uma série de greves a serem deflagra-
das para pressionar o lançamento de um candidato popular e nacionalista. 
O projeto não foi adiante, e João Goulart acabou por apoiar o nome de Lott 
e por aceitar disputar a seu lado a vice-presidência. O resultado da eleição é 
conhecido: como não havia vinculação obrigatória, o petebista Goulart tor-
nou-se o vice-presidente de Jânio Quadros, eleito com o apoio da UDN. 
Com suas iniciativas, Brizola passou a ocupar paulatinamente espaços 
de destaque no PTB e na cena políticanacional, posicionando-se como um 
interlocutor reconhecido nas articulações e qualificando-se como uma lide-
rança emergente. Esse papel ficaria ainda mais claro a partir de 1961. 
Na "cadeia da legalidade" 
No dia 25 de agosto desse ano, quando Jânio Quadros renunciou à presi-
dência, teve início no país uma crise de grandes proporções. A Constituição 
de 1946, então em vigor, previa a investidura do vice-presidente, que se en-
contrava em viagem oficial à China. Entretanto, os ministros militares, com 
o apoio de importante parcela das Forças Armadas e de um grupo de civis 
visceralmente antigetulistas, vetaram a posse de João Goulart, alegando que 
ela significaria uma ameaça à ordem e às instituições. Nos dias seguintes, a 
conjuntura política nacional foi polarizada pela luta entre os partidários do 
veto e os defensores da legalidade, chegando a haver reais possibilidades de 
um confronto armado. 
Do Rio Grande do Sul à Guanabara 19 
Foi nesse contexto que o governador Brizola articulou o principal foco 
de resistência ao veto a Coulart, liderando no Rio Crande do Sul uma cam-
panha de alcance nacional. A ocupação das rádios Cuaíba e Farroupilha per-
mitiu ao governo gaúcho formar a "cadeia da legalidade", que integrou 104 
emissoras dos estados do Rio Crande do Sul, Santa Catarina e Paraná, e 
passou a transmitir os sucessivos discursos de Brizola exortando a população 
a se mobilizar em defesa da Constituição. Em discurso de 28 de agosto de 
1961, por exemplo, declarava ele em tom inflamado: 
"Não pretendemos nos submeter. Que nos esmaguem! Que nos destruam! 
Que nos chacinem, neste Palácio! Chacinado estará o Brasil com a imposição 
de uma ditadura contra a vontade de seu povo. Esta rádio será silenciada tanto 
aqui como nos transmissores. O certo, porém, é que não será silenciada sem 
balas. Tanto aqui como nos transmissores estamos guardados por fortes con-
tingentes da Brigada Militar."5 
Informado da extensão da crise, Coulart apressou a volta, chegando 
a Paris no dia 28 de agosto com a intenção de regressar imediatamente ao 
Brasil. Recebeu, porém, um telefonema da comissão executiva nacional do 
PTB, que lhe fez um apelo para adiar por dois dias o regresso, a fim de que 
lhe fossem enviadas notícias mais completas sobre a situação do país, uma 
vez que os ministros militares ameaçavam prendê-lo tão logo desembarcas-
se. No dia 29, o Congresso Nacional rejeitou o pedido de impedimento do 
vice-presidente e começou a discutir uma solução conciliatória, que consistia 
na implantação do sistema parlamentarista de governo. Insatisfeitos, no dia 
seguinte os ministros militares lançaram um manífesto no qual expunham as 
razões de sua oposição a Goulart. O documento acusava o vice-presidente de 
incentivar {'agitações nos meios sindicais" e de entregar postos-chave nos sin-
dicatos a "agentes do comunismo ínternacional", o que o tornava uma ameaça 
à segurança nacional e à manutenção da hierarquia nas Forças Armadas. 
Além disso, o manifesto ressaltava a admiração expressa por Coulart pelas 
comunas populares durante sua visita à China Popular. 
5 Sitc do PDT: http://vvw,v.pdt.org.brlpersonalidades/brizola_historia_l.asp (discurso de Brizo-
la), acesso em 5/2/2007. 
20 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
Ao mesmo tempo em que os ministros militares reiteravam sua posição, 
as forças favoráveis à posse do vice-presidente ampliavam sua articulação e 
ganhavam novas adesões. Ainda no dia 30, os governadores do Paraná, Ney 
Braga, e de Goiás, Mauro Borges, aderiram ao movimento pela legalidade, 
declarando-se dispostos a usar armas contra as forças que se opunham à pos-
se de Goular!. O mesmo fez o general Machado Lopes, comandante do IH 
Exército, com sede no Rio Grande do Sul, ao anunciar oficialmente, através 
da "cadeia da legalidade", que aderira ao movimento. Os demais comandan-
tes regionais inclinaram-se a acompanhar essa posição. O apoio à posse de 
Goulart também crescia entre estudantes, intelectuais e sindicatos de traba-
lhadores, que deflagraram várias greves. A situação política se radicalizava. 
No mesmo dia 30, o ministro da Guerra nomeou o general Osvaldo Cordeiro 
de Farias para o comando do III Exército, destituindo Machado Lopes. En-
quanto Brizola conclamava a população gaúcha a defender o Rio Grande do 
Sul, Machado Lopes advertia que, se Cordeiro de Farias desembarcasse em 
Porto Alegre, seria preso. A dissensão no Rio Grande do Sul colocou o país 
sob ameaça de guerra civil. 
Enquanto isso, Goulart aproximava-se do território brasileiro, fazendo 
uma primeira escala em Nova York no dia 30 de agosto. Nessa cidade, con-
cedeu entrevista à imprensa em que declarou que seguiria para a Argentina 
e chegaria ao Brasil pelo Rio Grande do Sul. Impedido de desembarcar em 
Buenos Aires, viu-se obrigado a rumar para Montevidéu. Na capital uru-
guaia, reuniu-se com Tancredo Neves e Hugo de Faria, que haviam recebido 
a missão de convencê-lo a aceitar o regime parlamentarista de governo, con-
dição para a retirada do veto dos ministros militares. Mesmo contando com 
o apoio de setores que rejeitavam essa fórmula conciliatória e defendiam sua 
posse dentro do regime presidencialista, Goulart aceitou a proposta a fim de 
encerrar, sem derramamento de sangue, a crise que inquietava o país. Em 10 
de setembro, desembarcou em Porto Alegre, onde foi recebido com enorme 
manifestação popular. No dia seguinte, o Congresso aprovou, por 253 votos 
contra 55, a Emenda Constitucional n° 4, que instituiu o parlamentarismo, 
limitando os poderes presidenciais. A seguir foi divulgado um comunicado 
que afirmava que as Forças Armadas acatavam a forma parlamentarista de 
governo e davam total garantia ao desembarque de Goulart em Brasília, bem 
como à sua investidura na presidência. 
Do Rio Grande do Sul à Guanabara 21 
Uma vez em Brasília, Goulart não quis ser empossado logo no dia se-
guinte, pois, segundo suas próprias palavras, desejava se inteirar melhor dos 
acontecimentos e se recuperar das duras críticas feitas por alguns de seus 
familiares por ter aceito tomar posse nas condições impostas. Referia-se a 
ninguém menos que Brizola, que havia feito declarações contundentes contra 
sua postura conciliadora. 
O desenrolar desses acontecimentos, do dia 25 de agosto até 7 de se-
tembro, quando João Goulart foi empossado na presidência da República, 
colocou Brizola no centro das atenções, projetando seu nome para além da 
esfera estadual e transformando-o de fato numa liderança nacional. 
No governo parlamentarista 
Ao assumir a presidência, João Goulart procurou desarmar seus opositores 
ampliando a base política do governo. Sem abrir mão de sua relação com 
setores de esquerda, buscou o apoio do centro, praticando uma política de 
conciliação baseada no diálogo com os diversos partidos representados no 
Congresso. Coerente com essa orientação, o primeiro gabinete parlamen-
tarista, chamado de ((união nacional", foi composto por uma representação 
equilibrada da maioria dos partidos, sob a chefia do pessedista Tancredo 
Neves. Mais uma vez, desde os primeiros momentos, essa política de con-
ciliação teve em Brizola um crítico radical. Na sua avaliação, Goulart já se 
havia equivocado ao aceitar a emenda parlamentarista e assumir o governo 
com suas atribuições reduzidas. Por isso mesmo, durante toda a vigência do 
parlamentarismo, Brizola iria lutar pela realização do plebiscito previsto na 
Emenda Constitucional n° 4 e pelo retorno ao presidencialismo. 
Além de buscar a conciliação, Goulart tinha um programa de governo 
que colocava como pontos centrais reajustes salariais periódicos compatíveis 
com os índices inflacionários, uma política externa independente, a naciona-
lização de algumas subsidiárias estrangeiras, e as chamadas reformas de base 
(agrária, bancária, administrativa, fiscal, eleitoral e urbana). As reformas que 
o PTB já levantara como bandeira desde1958 pareciam finalmente próximas 
de uma implementação. E Brizola se colocava como um líder disposto a ace-
lerar o processo de mudanças na sociedade brasileira. 
Os objetivos de Goulart, inicialmente formulados de modo genérico, 
foram sendo delineados mais claramente através de sua atuação no governo. 
22 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
o presidente reafirmava a necessidade de mudanças no país, na esperança 
de que o Congresso solucionasse problemas como os da reforma agrária, do 
abuso do poder econômico e da disciplina do capital estrangeiro. No que diz 
respeito especificamente à reforma agrária, em novembro de 1961 Goulart 
destacou a necessidade de alterar o princípio constitucional que exigia inde-
nização prévia em dinheiro pelas terras desapropriadas. A seu ver, o pagamen-
to das terras poderia ser feito em títulos da dívida pública. Esse ponto de vista 
não era porém compartilhado pelos nomes mais significativos de seu ministé-
rio, o que demonstrava a precariedade da política de alianças sobre a qual se 
baseava o governo, e as dificuldades enfrentadas na busca de um consenso. 
A realização de uma reforma agrária colocava problemas de difícil so-
lução, como o de definir que tipo de reforma deveria ser feita: a quem be-
neficiaria e em que nível, em detrimento de que forças sociais e políticas. 
Era preciso saber também quais os instrumentos jurídicos disponíveis para 
executá-la, e que alianças fazer para tornar seus custos sociais viáveis. Com 
o objetivo de melhor responder a essas questões, o governo encarregou o 
ministro da Agricultura de organizar um grupo de trabalho para elaborar um 
anteprojeto. O grupo atendeu à orientação conciliadora do gabinete, discu-
tindo soluções alternativas àquela proposta pelo presidente, que era apoiada 
pelas forças de esquerda. Essas discussões, no cômputo final, mostraram-se 
pouco frutíferas. 
Nesse contexto de dificuldades para o avanço das propostas reformis-
tas, Brizola articularia, em 1962, a Frente de Mobilização Popular (FMP), 
com a finalidade de congregar as forças políticas antiimperialistas e pró-re-
formas. 6 O governador gaúcho reuniu representantes de organizações como 
o recém-criado Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), órgão não-oficial 
de coordenação do movimento sindical, o Pacto de Unidade e Ação (PUA), a 
União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Brasileira dos Estudantes 
Secundaristas (UBES), além de parlamentares da Frente Parlamentar Na-
cionalista (FPN) e líderes de entidades camponesas e feministas. Ao men-
cionar os objetivos do movimento, afirmou que o povo desejava <llibertar-se 
dos seus espoliadores, da miséria e do atraso, do latifúndio e da exploração"? 
6 Ver verbete 'Frente de l\iIobilização Popular' em DHBB. 
7 Última Hora, 22 de março de 1962, p. 4. 
Do Rio Grande do Sul à Guanabara 2J 
Com iniciativas dessa natureza, Brizola conquistava cada vez mais espaços 
na política nacional e assumia a liderança das forças radicais de esquerda. 
Outro tema que colocou Brizola no centro dos acontecimentos foi o do 
controle do capital estrangeiro no país. Em outubro de 1961, o Ministério 
das Minas e Energia apresentou a proposta de cancelar todas as conces-
sões de jazidas de ferro feitas ilegalmente ao grupo norte-americano Hanna 
Company. Esse contexto de acirramento das lutas nacionalistas estimularia 
ainda mais o governador do Rio Grande do Sul a avançar com sua política dc 
nacionalização, efetivando a desapropriação, em fevereiro de 1962, dos bens 
da Companhia Telefônica do estado, subsidiária da firma norte-americana 
International Telephone & Telegraph (ITT). Esse fato repercutiu na impren-
sa nacional e internacional, intensificando o debate em torno da nacionaliza-
ção das concessionárias de serviço público. Com essas iniciativas, Brizola se 
capacitava a competir com Goulart na liderança das forças de esquerda e das 
lideranças sindicais, e mesmo dentro do PTB. 
Nessa primeira fase do governo Goulart, destacou-se também a nova 
orientação dada à política externa brasileira. Assim, em novembro de 1961, o 
Brasil restabeleceu relações diplomáticas com a União Soviética, interrompi-
das desde 1947, no governo Dutra. A justificativa para a medida eram as am-
plas possibilidades representadas pelo mercado soviético para as exportações 
brasileiras. Ainda de acordo com essa orientação, o governo Goulart rechaçou 
as sanções contra Cuba propostas pelos Estados Unidos, assim como os pre-
parativos para a intervenção armada naquele país sob a cobertura da Orga-
nização dos Estados Americanos (OEA). Na Conferência de Punta dei Este, 
realizada entre 22 e 31 de janeiro de 1962, o chanceler brasileiro San Tiago 
Dantas defendeu a neutralidade em relação a Cuba, enfrentando a oposição 
dos Estados Unidos, que procuravam impor suas pretensões aos países da 
América Latina. 
A posição do governo brasileiro, ainda que apoiada por significativos 
setores sociais, criou uma situação de desentendimento com \iVashington, 
dificultando as relações entre os dois países. Em março de 1962, novamente 
coerente com a Iinlia adotada na política externa, a delegação brasileira en-
viada a Genebra para participar da Conferência de Desarmamento definiu a 
posição do Brasil como dc potência não-alinliada, desvinculada de qualquer 
bloco político-militar. Brizola se manifestou favoravelmente à política externa 
24 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
independente, mas novamente discordou da política oficial brasileira de con-
ciliar com os Estados Unidos na condução da questão cubana, por ocasião da 
visita do presidente João Goulart àquele país em abril de 1962. 
Ao findar o primeiro semestre de 1962, o gabinete Tancredo Neves, que 
se caracterizava por uma prática política de compromisso e de tentativa de 
união nacional, perdeu a razão de ser. Diante dos obstáculos enfrentados para 
pôr em prática seu programa de governo e para superar as graves dificuldades 
econômicas que enfrentava, Goulart começou uma campanha pelo retorno 
ao presidencialismo, alegando a necessidade de ter um Executivo forte. A 
pretexto de atender à exigência legal de desincompatibilização para concorrer 
às eleições de outubro de 1962, no dia 26 de junho todos os membros do 
gabinete pediram demissão. 
Na campanha do plebiscito 
A renúncia de Tancredo Neves e a indicação feita por Goulart do nome de 
San Tiago Dantas para o cargo de primeiro-ministro fizeram eclodir nova 
crise. O ex-chanceler era apoiado pelos setores nacionalistas e de esquerda do 
Congresso e pelo movimento sindical, mas as bancadas do PSD e da UDN 
se uniram para vetar sua indicação) em virtude exatamente de seu desempe-
nho à frente do Ministério das Relações Exteriores. Pressionado pelas forças 
conservadoras, Goulart indicou então o pessedista Auro de Moura Andrade, 
presidente do Senado, que teve seu nome aprovado no dia 3 de julho de 1962. 
Apenas o PTB votou contra essa indicação. 
Enquanto o nome de Aura de Moura Andrade era homologado pelo 
Congresso, os líderes sindicais Dante Pelacani, Domingos Álvares e Luís 
Tenório de Lima se reuniam em São Paulo com dirigentes dos sindicatos 
filiados à Federação dos Metalúrgicos e ao Fórum Sindical de Debates para 
preparar uma greve geral em todo o país, em desagravo a San Tiago Dantas e 
em apoio ao presidente Goulart. Seu objetivo era também obter um gabinete 
e um primeiro-ministro favoráveis ao programa de reformas. Diante de tantas 
pressões, e da recusa do presidente em aceitar o gabinete que propunha, Aura 
de Moura Andrade acabou por renunciar. 
Em 10 de julho, finalmente, Goulart indicou o pessedista gaúcho Bro-
chado da Rocha, ex-secretário de Justiça do governo Brizola. Aprovado pelo 
Do Rio Grande do Sul à Guanabara 25 
Congresso, o novo primeiro-ministro prometeu antecipar para dezembro de 
1962 a realização do plebiscito que decidiria sobre a continuidade do regi-
me parlamentarista,previsto anteriormente para o início de 1965. Um dos 
líderes do movimento em favor da volta ao presidencialismo, Brizola apoiou 
essa decisão. 
No gabinete Brochado da Rocha, o PTB adquiriu maior participação no 
poder. Ainda que pertencente aos quadros do PSD, o novo primeiro-ministro 
tinha ligações com os petebistas. Tinha também desempenhado importante 
papel na encampação da subsidiária da ITT no Rio Grande do Sul, o que lhe 
dava prestígio nos meios nacionalistas. Mais próximo do PTB e dos grupos 
de esquerda, o novo gabinete pretendia obter poderes especiais para legislar 
sobre as reformas, além de conseguir a restauração do presidencialismo.8 
Em agosto, Brochado da Rocha cumpriu sua promessa, apresentando 
projeto que fixava a data do plebiscito em dezembro de 1962. Os udenistas, 
liderados por Carlos Lacerda, então governador da Guanabara (1961-1965), 
atacaram a proposta, acusando Goulart de estar comprometido com os co-
munistas. Brizola liderava os setores esquerdistas, ameaçando o Congresso 
com intervenção armada caso este não apoiasse a realização do plebiscito 
em dezembro. 
Outra iniciativa de Brochado da Rocha, ainda no mês de agosto, foi 
solicitar oficialmente que o Congresso delegasse poderes ao governo para 
legislar sobre temas como o monopólio da importação de petróleo e deri-
vados, o comércio de minérios e materiais nucleares, o controle da moeda 
e do crédito, o Estatuto do Trabalhador Rural, os arrendamentos rurais, a 
desapropriação por interesse social e a criação de um órgão executor da 
política de reforma agrária. Essa delegação de poderes tinha a intenção 
explícita de acelerar a execução de medidas em lento processo de discussão 
nas duas casas do Congresso e, de outro lado, induzir o Poder Legislativo 
a encaminhar ele próprio as medidas prioritárias, se quisesse evitar que o 
Executivo o fizesse em regime de urgência. Enquanto os empresários pau-
listas e grande parte dos parlamentares se manifestaram contra a delegação 
de poderes requerida pelo primeiro-ministro, o CGT comprometeu-se a 
B Ver verbete 'Partido Trabalhista Brasileiro' em DHBB. 
I",' 
'" 
" 
26 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro 
defender o programa do novo gabinete e a trabalhar pela volta ao regime 
presidencialista, sob a condição de que fossem atendidas suas reivindica-
ções fundamentais, como a revogação da Lei de Segurança Nacional, a 
concessão de 100% de aumento no salário mínimo e a implementação das 
reformas de base. O CGT reivindicava ainda a realização do plebiscito no 
dia 7 de outubro de 1962, data fixada para as eleições legislativas, sob pena 
de deflagrar uma greve geral no mês seguinte. 
A despeito dos esforços de Brizola e do PTB para sustentar as iniciativas 
de Brochado da Rocha, em 14 de setembro, não tendo conseguido que o Con-
gresso aprovasse seu projeto, o primeiro-lninistro renunciou. No dia seguinte 
o CGT decretou uma greve geral, recebendo o apoio de setores militares na-
cionalistas, Diante desse quadro, o Congresso cedeu às pressões e em 15 de 
setembro aprovou a Lei Complementar nO 2, que estabeleceu a realização do 
plebiscito em 6 de janeiro de 1963. Goulart obteve permissão para constituir 
imediatamente um conselho de ministros provisório, sem autorização prévia 
do Congresso, e encarregou Hermes Lima de organizar, como primeiro-mi-
nistro, o gabinete que vigoraria até 6 de janeiro. Vencida a campanha pela 
antecipação do plebiscito e organizado o ministério, Goulart iria lançar-se à 
campanha pelo retorno ao presidencialismo, para a qual contou, mais uma 
vez, com a ajuda de Brizola. 
Paralelamente a esses movimentos, desenrolavam-se os preparativos 
para as eleições de outubro de 1962, quando seriam renovados parte do Sena-
do, a Câmara dos Deputados, as Assembléias Legislativas estaduais, as Câ-
maras Municipais e parte dos governos estaduais e municipais. As eleições 
de 1962 tinham um significado especial, pois representavam a possibilidade 
de o governo ampliar sua base de sustentação no Congresso e assim reunir os 
recursos políticos necessários para dar encaminhamento às reformas de base 
pela via constitucional. Nesse contexto, a luta pelo voto tornou-se acirrada. 
Tentando sustar o avanço dos candidatos de esquerda e vinculados ao esque-
ma de sustentação do governo Goulart, as forças oposicionistas articularam, 
através do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad), que havia sido 
fundado em 1959 com o objetivo de combater a propagação do comunismo 
no Brasil, toda uma rede de financiamento para seus candidatos. Em contra-
partida, o governo e as forças de esquerda envidaram esforços para neutrali-
zar a ação dos grupos conservadores.

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