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1 Alline Alvarez ANEMIAS CARENCIAIS Considera-se portador de anemia o indivíduo cuja concentração de hemoglobina é inferior a: 13 g/dL no homem adulto; 12 g/dL na mulher adulta; 12 g/dL em crianças entre seis e 14 anos de idade. 11 g/dL na mulher grávida; 11 g/dL em crianças entre seis meses e seis anos de idade; Anemia megaloblástica Ocorre devido deficiência de folato ou vitamina B12; Essa deficiência gera diminuição na síntese de DNA. Consequentemente, as alterações se estendem a outras linhagens hematopoéticas como leucócitos e plaquetas, e a outros locais com grande proliferação celular como intestino delgado, língua e útero; Atinge principalmente grávidas de classes mais pobres, idosos e alcoólatras, na forma clássica da anemia perniciosa. Manifestações clínicas: A deficiência da síntese de DNA afeta a divisão celular em outros tecidos em que há rápida multiplicação, principalmente nos epitélios do tubo digestivo, podendo causar: Diarreia, glossite (ardência, dor e aparência vermelha da língua, “língua careca”), queilite (As queilites podem se apresentar como descamação, erosão ou inchaço nos lábios.) e perda do apetite. Pode ser encontrada discreta a moderada esplenomegalia. A deficiência de vitamina B12 causa: degeneração do cordão posterior da medula espinhal, podendo causar parestesia em pés, pernas e tronco, seguida de distúrbios motores, principalmente dificuldades da marcha, redução da sensibilidade vibratória, comprometimento da sensibilidade postural, marcha atáxica, sinal de Romberg. (Deficiência de vitamina B12 causa diversos sintomas neurológicos) São também comuns as manifestações mentais como a depressão e os déficits de memória, disfunção cognitiva e demência, além de distúrbios psiquiátricos graves como alucinações, paranoias, esquizofrenia. A tríade de fraqueza, dor na língua e parestesias é clássica na deficiência de vitamina B12 mas os sintomas iniciais variam muito; 2 Alline Alvarez A deficiência de folatos não causa envolvimento do sistema nervoso, mas a deficiência durante a gravidez aumenta a incidência de defeitos de tubo neural em recém-nascidos. O tempo necessário para que a anemia se manifeste depende da magnitude dos depósitos e do grau de desequilíbrio. Assim, no caso da vitamina B12, os depósitos são habitualmente suficientes para manter a eritropoese por dois a cinco anos após haver cessado a absorção, enquanto que as reservas de folatos são suficientes apenas para três ou quatro meses. CAUSAS DE DEFICIÊNCIA DE VITAMINA B12: Dieta: A vitamina B12 existe primariamente em alimentos de origem animal, não sendo encontrada em frutas e vegetais. A deficiência de B12 somente ocorre em vegetarianos estritos após vários anos sem ingerir alimento de origem animal. 3 Alline Alvarez Absorção: A absorção de vitamina B12 ocorre predominantemente no íleo terminal e depende de uma glicoproteína produzida pelas células parietais da mucosa gástrica, chamada Fator Intrínseco. O tipo mais comum de deficiência de vitamina B12 é representado pela anemia perniciosa, doença de natureza provavelmente imunológica, em que ocorre atrofia e inflamação crônica da mucosa gástrica (gastrite atrófica), levando à ausência concomitante de fator intrínseco e da secreção de ácido clorídrico, com consequente má absorção da vitamina B12. O diagnóstico de anemia perniciosa implica a presença de anemia megaloblástica por carência de vitamina B12 associada à gastrite atrófica, demonstrada por exame anatomo-patológico obtido por biópsia endoscópica. Aparentemente a gastrite evolui por muitos anos (dez a trinta anos) antes do aparecimento dos sintomas clínicos da deficiência de vitamina B12. Doenças do íleo terminal como espru, doença celíaca, enterite regional e ressecção ileal podem comprometer a absorção da vitamina, assim como numerosas drogas (PAS, colchicina, colestiramina, metformina, neomicina). Causas raras de carência são a deficiência congênita de fator intrínseco, e o defeito ou ausência congênita de receptores para fator intrínseco nas células ileais (síndrome de Imerslund-Gräsbeck). Transporte e metabolismo. No plasma, a vitamina B12 é transportada conjugada a duas proteínas denominadas transcobalamina I e II. A maior parte da vitamina B12 do plasma (cerca de 80%) está ligada à transcobalamina I, que tem um turn-over muito lento, sendo essencialmente inacessível aos tecidos; por isso, deficiência congênita de transcobalamina I é associada a baixos níveis séricos de vitamina B12 ligada à transcobalamina, sem manifestações clínicas. Por outro lado, a pequena percentagem de vitamina B12 ligada a transcobalamina II tem um turn-over muito rápido, 4 Alline Alvarez e sua ausência congênita produz uma forma rara de anemia megaloblástica grave com níveis séricos de vitamina B12 normais. Outras causas: A gastrectomia total leva à carência de vitamina B12 em um prazo em torno de cinco anos, se o paciente não receber suplementação da vitamina por via parenteral para manter o depósito. A deficiência na gastrectomia parcial ou subtotal ocorre em torno de 10-40%, e o grau de deficiência depende do tipo de cirurgia. Pode haver associação com anemia ferropriva e com isso mascarar as alterações megaloblásticas. Pacientes com obesidade mórbida, tratada cirurgicamente com curto-circuito gástrico, também são candidatos à deficiência. Pessoas idosas são muito suscetíveis à deficiência de vitamina B12 devido à dissociação inadequada da cobalamina da proteína alimentar resultante de alterações gástricas com atrofia parcial da mucosa. Na “síndrome da alça cega” ocorre proliferação de bactérias que consomem a vitamina B12 em segmentos intestinais deixados fora do trânsito após cirurgia ou quando há divertículos intestinais mútiplos, fístulas ou hipomotilidade, casos em que a absorção da vitamina pode ser normalizada com o uso de antibióticos como a tetraciclina. CAUSAS DE DEFICIÊNCIA DE FOLATOS: A causa mais comum de carência de folatos é representada por dieta inadequada, por vezes associada a uma condição em que aumentam as necessidades diárias, habitualmente a gravidez ou o crescimento. A anemia megaloblástica da gravidez e a anemia megaloblástica do lactente são os dois tipos mais frequentes dessa deficiência. Outras causas comuns são alcoolismo, idade avançada, doenças intestinais associadas à má aborção, pobreza e desnutrição. As principais fontes de folato na alimentação são os vegetais frescos, fígado e frutas; o cozimento excessivo pode remover ou destruir grande porcentagem do folato dos alimentos; quando a dieta é carente, os níveis de folato sérico começam a cair em duas semanas e a anemia megaloblástica desenvolve-se após cerca de três a quatro meses; Absorção: A má absorção de folatos pode ser causada por doenças intestinais crônicas com diarreia, como a doença celíaca, o espru tropical e a enterite regional. Drogas como os anticonvulsivantes (difenil-hidantoínas, primidona, carbamazepina, fenobarbital) e álcool. 5 Alline Alvarez Transporte e metabolismo: Numerosas drogas inibem a di-hidrofolato redutase, como metotrexate (antineoplásico), pirimetamina e trimetoprim (em associação com sulfametoxazol). Doses elevadas ou prolongadas de pirimetamina e trimetoprim podem resultar em efeitos tóxicos, o que não ocorre no tratamento de infecções com as dosagens habituais. Aumento das necessidades: A demanda de ácido fólico aumenta em pessoas com intensa proliferação celular e a síntese de DNA, tais como: portadores de dermatites crônicas exfoliativas, anemias hemolíticas crônicas, neoplasias, gravidez e nos dois primeiros anos de vida. Excluindo a má nutrição em crianças, a causa mais comum de anemia megaloblástica é a deficiênciade folatos da gravidez, que ocorre em geral no 3º trimestre; Por ser um micronutriente crítico na neurogênese, recomenda-se que a suplementação com ácido fólico na dose de 1 mg/dia a partir do primeiro mês da gravidez, qualquer que seja o nível socioeconômico da paciente. Os portadores de anemia hemolítica crônica grave, principalmente as congênitas (talassemia, anemia falciforme, esferocitose hereditária), são propensos à depleção de folato em virtude da eritropoese estar aumentada em até dez vezes nesses pacientes. Erros inatos. Os erros inatos do metabolismo do folato são raros e compreendem a má absorção do folato, a deficiência de metilenotetraidrofolato e deficiência de glutamato formiminotransferase. Diagnóstico da anemia megaloblástica: Para o diagnóstico correto, em geral, três são as abordagens nesses pacientes: a primeira é reconhecer se a anemia megaloblástica está presente; a segunda é distinguir entre as deficiências de vitamina B12 e folato; e a terceira é a determinação da causa. QUADRO CLÍNICO: As manifestações megaloblásticas das deficiências de vitamina B12 e de folatos são clinicamente indistinguíveis; a não ser pela história recente (ao redor de seis meses) na deficiência de folato e mais prolongada (três anos ou mais) na deficiência de vitamina B12. Além das manifestações de anemia (fraqueza, palidez, dispneia, claudicação intermitente) são importantes os sintomas gastrintestinais e as alterações da boca e língua. Graus variados de palidez, com pele cor de limão (combinação de palidez com leve icterícia) são comuns. Uma das manifestações clássicas da anemia perniciosa é a perda de papilas da língua, que fica lisa, brilhante e intensamente vermelha (“língua careca”). 6 Alline Alvarez Associação com outras carências vitamínicas pode mostrar queilite angular, dermatite, sangramento de mucosas, osteomalacia e infecções crônicas. Os casos mais graves são acompanhados de sinais de insuficiência cardíaca. De importância é o quadro neurológico que acompanha a deficiência de vitamina B12 e que auxilia na diferenciação. Queixas de outras doenças autoimunes devem orientar a atenção para anemia perniciosa. AVALIAÇÃO LABORATORIAL: Sangue periférico. Os principais achados são anemia macrocítica, leucopenia, trombocitopenia, acompanhados de anisocitose, macrocitose com macro-ovalócitos, poiquilocitose, e granulócitos polissegmentados. A contagem de reticulócitos é normal ou baixa. Em resumo, tem-se como manifestação uma pancitopenia associada à macrocitose. As principais alterações morfológicas no esfregaço do sangue periférico são: a) eritrócitos: macro-ovalócitos, poiquilocitose com esquistócitos, dacriócitos, corpúsculos de Howell-Jolly, anel de Cabot, eritroblastos, e até megaloblastos; b) granulócitos: hipersegmentação nuclear, com presença de neutrófilos polissegmentados reconhecidos por no mínimo 5% de neutrófilos com cinco lobos (regra dos 5) ou um neutrófilo com seis ou mais lobos c) leucócitos: leucopenia com neutropenia, podendo os leucócitos chegar até abaixo de 2.000/µL, embora seja rara a ocorrência de infecções graves; d) plaquetas: trombocitopenia com 30.000 a 100.000 plaquetas/µL Identificação da causa: A forma mais direta e simples, atualmente, de identificar a anemia perniciosa é a realização de endoscopia gástrica com biópsia nos pacientes em que se revela uma anemia megaloblástica com baixos 7 Alline Alvarez níveis de vitamina B12. Se houver sinais de gastrite atrófica, o diagnóstico provável é de anemia perniciosa. A pesquisa de anticorpos antifator intrínseco e anticélula parietal, e a ausência de produção de ácido clorídrico pelo estômago após estímulo máximo (acloridria) contribuem para confirmar o diagnóstico de anemia perniciosa. TRATAMENTO Tratamento da carência de vitamina B12: A anemia perniciosa deve ser tratada com vitamina B12 por via parenteral por toda a vida, uma vez que o defeito de absorção é irreversível. Pacientes idosos com atrofia gástrica e má absorção por dificuldade de dissociação da vitamina B12 do alimento e vegetarianos beneficiam-se preventivamente com doses orais da vitamina em torno de 50 µg/ dia (doses maiores podem ser usadas sem efeitos indesejáveis). Tratamento da carência de ácido fólico: O risco do tratamento com suplementação de ácido fólico é a possibilidade de haver resposta (parcial) em pacientes com anemia megaloblástica por deficiência de vitamina B12 casos, o quadro hematológico pode melhorar, mas a doença neurológica pode se exacerbar. Em muitos casos a causa da carência é autolimitada, como na gravidez e em prematuros; em outros, a carência de folatos de origem nutricional tem grande tendência a recair, como em alcoólatras e em pacientes com doença celíaca. Tratamento permanente é necessário em pacientes que têm doenças que aumentam o consumo de folatos, como anemias hemolíticas crônicas e pacientes submetidos à diálise. Anemia ferropriva FISIOPATOLOGIA E ETIOLOGIA: A maior parte dos cerca de 4 g de ferro do corpo humano adulto está incorporada à hemoglobina nos eritrócitos e a mioglobina nos músculos. O restante está principalmente nos depósitos de ferro do fígado e no interior dos macrófagos do sistema mononuclear fagocitário da medula óssea e do baço. O SRE é responsável por fagocitar células senescentes, catabolizar Hemoglobina (Hb) para restaurar o ferro e devolvê-lo à transferrina para nova utilização. Uma pequena quantidade de ferro circula no plasma ligada à transferrina; (a outra parte está principalmente na hemoglobina e em proteínas) 8 Alline Alvarez O balanço de ferro no organismo é regulado a partir da absorção intestinal. Como não existe uma via fisiológica de excreção de ferro, essa regulação é crítica. Anemia ferropriva é bastante frequente em recém-nascidos, crianças, adolescentes e mulheres em idade fértil, gestantes e lactantes. Além de esses grupos apresentarem incremento na necessidade de ferro, sua ingestão média diária de ferro está abaixo da recomendada, mesmo em países desenvolvidos, em diferentes levantamentos populacionais. O ferro dietético consiste de ferro heme e não heme. Ferro heme está presente em alimentos de origem animal e tem excelente biodisponibilidade para absorção intestinal; o ferro não heme é encontrado em produtos de origem vegetal e tem baixa biodisponibilidade. Assim, indivíduos que consomem produtos animais têm menor risco de desenvolvimento de anemia ferropriva que vegetarianos. Anemia ferropriva é o distúrbio do ferro mais frequente em adultos e está associada à perda crônica de sangue, tanto por hipermenorreia ou menorragia (sítio mais frequente em mulheres em idade fértil), quanto pelo trato gastrointestinal (sítio mais frequente em homens e mulheres pós-menopausa). Cada mL de sangue perdido resulta em redução de cerca de 0,5 mg de ferro. 9 Alline Alvarez MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Deficiência de ferro está associada à alteração do desenvolvimento motor e cognitivo em crianças, redução da produtividade no trabalho e problemas comportamentais, cognitivos e de aprendizado em adultos. Em gestantes, aumenta o risco de prematuridade, baixo peso, sendo responsável por 18% das complicações no parto e morbidade materna. As queixas costumam ser leves, pois a anemia se instala de maneira insidiosa, gerando adaptação, e há pacientes completamente assintomáticos. Pode-se observar palidez cutaneomucosa, fadiga, baixa tolerância ao exercício, redução do desempenho muscular, perversão alimentar ou pica (desejo e consumo de substâncias não nutritivas como gelo, terra, sabão, argila), baqueteamento digital e coiloníquia (unhas em forma de colher), atrofia das papilas linguais, estomatite angular e disfagia (formação de membranas esofágicasou síndrome de Plummer-Vinson). Diagnóstico: Feito por meio de exame laboratorial A presença de eritrócitos microcíticos e hipocrômicos é uma condição indispensável; Os exames laboratoriais iniciais consistem na determinação dos níveis de hemoglobina, do volume corpuscular médio, da concentração de hemoglobina corpuscular e do número de reticulócitos. Frequentemente se observa hipocromia, microcitose, aumento do índice de Anisocitose Eritrocítica (RDW) (tamanho desigual de hemácias) e plaquetose, além da presença de anisocitose, poiquilocitose (formato anormal), hemácias em charuto, eliptócitos e reticulocitopenia ao exame microscópico. O nível sérico de ferritina é o indicador mais confiável, menos invasivo e com melhor relação custo-benefício. A dosagem da ferritina sérica está diretamente relacionada com a concentração de ferritina intracelular e, portanto, com o estoque corporal total. Deficiência de ferro é a única condição que gera ferritina sérica muito reduzida, o que torna a hipoferritinemia bastante específica deste diagnóstico. No entanto, valores normais ou elevados de ferritina não excluem a presença de DF, pois a ferritina é uma proteína de fase aguda, tendo 10 Alline Alvarez sua concentração sérica aumentada na presença de inflamação, infecção, doença hepática e malignidade, mesmo na presença de DF grave. Ferro sérico é a fração do ferro corporal que circula primariamente ligado à transferrina, e encontra-se reduzido na DF. Varia com o ritmo circadiano e a alimentação e, por isso, a coleta de sangue para sua dosagem deve ter horário e jejum padronizados. Está também reduzido na presença de inflamação, não devendo, desta forma, ser utilizado isoladamente para avaliação de DF. (DF é deficiência de ferro) Os níveis de transferrina e de ferro ligado à transferrina podem não ser indicadores confiáveis da carência de ferro. Exame de determinação do ferro corável da medula óssea é considerado o “padrão-ouro” dos exames para o diagnóstico da deficiência de ferro, contudo, raramente é necessário quantificar as reservas de ferro total da medula óssea para diagnosticar a anemia ferropriva, exceto quando há algum outro fator complicador. ETIOPATOGENIA Devemos distinguir: a) anemia verdadeira, caracterizada pela redução da massa eritrocitária, ou seja, do volume total de hemácias no organismo; b) anemia relativa ou por diluição, quando há aumento do volume plasmático, sem correspondente aumento das hemácias. O exemplo mais comum de anemia relativa é a hemodiluição, que ocorre durante a gravidez. No entanto, como a hemodiluição não provoca quedas acentuadas da hemoglobina nem sintomatologia, níveis de hemoglobina inferiores a 11-10,5 g/dL devem ser causados por uma das formas de anemia desencadeadas ou agravadas pela gravidez, como carências de ferro ou folato, ou β-talassemia heterozigótica. Excluídas as raras situações de hemodiluição, a queda da concentração de hemoglobina reflete uma verdadeira redução da massa de eritrócitos. 11 Alline Alvarez Manifestações clínicas: Todas as manifestações clínicas da anemia decorrem da redução da capacidade de transporte de oxigênio do sangue e consequente menor oxigenação dos tecidos. Numerosos mecanismos fisiológicos atuam no sentido de compensar a reduzida capacidade de transporte de oxigênio e, desta forma, minimizar a hipóxia tissular. Sintomas ocasionados pela hipóxia: Os sintomas principais são: cefaleia, vertigens, tonturas, lipotimia, zumbidos, fraqueza muscular, cãibras, claudicação intermitente e angina. Mecanismos compensatórios: a) aumento do débito cardíaco; b) redução da resistência vascular sistêmica global; c) redistribuição do fluxo sanguíneo para os diferentes tecidos; 12 Alline Alvarez d) diminuição da afinidade da hemoglobina pelo oxigênio Como resultado do aumento do débito cardíaco, da redistribuição do fluxo sanguíneo (privilegiando tecidos e órgãos mais sensíveis à hipóxia), ocorrem manifestações clínicas como palidez cutaneomucosa (vasocontrição periférica), taquicardia, aumento da diferencial de pressão, sopros no precórdio, sopro arterial ou venoso no pescoço, choque da ponta impulsivo, e dispneia de esforço. O aparelho cardiovascular, e em especial o coração, podem sustentar por tempo prolongado os mecanismos compensatórios. No entanto, quando a capacidade de compensação é excedida, seja porque a anemia é acentuada ou estabelece-se rapidamente ou, ainda, em consequência de uma lesão cardíaca prévia, instala-se um quadro de insuficiência cardíaca com cardiomegalia, estase jugular, edema periférico, hepatomegalia, congestão pulmonar e dispneia de decúbito. A redução da afinidade da hemoglobina pelo oxigênio é um importante mecanismo compensatório nas anemias, e deve-se ao aumento da concentração intraeritrocitária de 2,3-difosfoglicerato (2,3-DPG) que fixa- se à molécula de hemoglobina desoxigenada, dificultando sua ligação com o oxigênio. A diminuição da afinidade leva a maior liberação de oxigênio nos tecidos. Outras manifestações: Algumas manifestações clínicas observadas em pacientes anêmicos são sinais e sintomas de uma doença subjacente que conduziu à anemia. Por exemplo, as principais queixas de um paciente que desenvolve anemia ferropriva em consequência da hemorragia crônica de uma úlcera péptica podem estar relacionados com a úlcera: dispepsia, pirose e dor epigástrica. Além disso, há manifestações que podem acompanhar alguns tipos particulares de anemias, estando ausentes em outras, tais como: manifestações hemorrágicas e infecções na anemia aplástica ou leucemias agudas; esplenomegalia e linfonodomegalia em leucemias e linfomas; icterícia e esplenomegalia nas anemias hemolíticas; parestesias e outras manifestações neurológicas na anemia perniciosa; dores ósseas, fraturas sob trauma mínimo, e síndrome de compressão de medula espinhal em mieloma múltiplo ou metástases carcinomatosas; Os diferentes mecanismos que causam anemia podem ser agrupados em: Perdas sanguíneas agudas (hemorragia aguda); Menor produção de eritrócitos; Diminuição da sobrevida dos eritrócitos; Hemorragia aguda: 13 Alline Alvarez As causas mais frequentes são: acidentes, cirurgias, hemorragias no tubo gastrointestinal, especialmente por úlcera péptica ou ruptura de varizes esofagianas, e hemorragia genital. Podem-se reconhecer vários períodos evolutivos da perda sanguínea aguda: Nas primeiras horas após a hemorragia, a dosagem de hemoglobina ou o hematócrito não refletem o volume de sangue perdido, pois há perda proporcional de plasma e de hemácias. A avaliação da gravidade da anemia deve ser feita com base em sinais clínicos, como frequência cardíaca, pressão arterial, palidez cutaneomucosa, sudorese e temperatura das extremidades, estado de consciência e fluxo urinário. Após a hemorragia, mecanismos hormonais (renina-aldosterona, hormônio antidiurético) provocam retenção de água e de eletrólitos, recompondo o volume circulante. Só então ocorre diluição das hemácias, e a dosagem de hemoglobina (ou o hematócrito) diminui progressivamente para estabilizar-se em novo nível 48 a 72 horas depois do episódio de hemorragia. Como consequência da hipóxia renal, há aumento da eritropoetina, que estimula a medula óssea a aumentar sua produção nos dias subsequentes, até que a hemoglobina retorne aos níveis anteriores. No período de produção acelerada, a partir do 3, 5º dia ocorre elevação do número de reticulócitos. A síntese da hemoglobina para repor o sangue perdido é feita à custa de mobilização do ferro dos depósitos; para 100 mL de hemácias produzidas o organismo utiliza cerca de 100 mg de ferro dos depósitos. Anemias por menor produção de hemácias: A maioria dos casos de anemia resultada produção insuficiente de eritrócitos pela medula óssea. Nesses casos, a porcentagem de reticulócitos está diminuída ou normal; A menor produção de eritrócitos pode ser resultante de um distúrbio da diferenciação eritroide, da proliferação dos eritroblastos na medula óssea ou de sua maturação. A infiltração ou substituição da medula óssea por um tecido anormal também pode comprometer a produção de outras células mieloides. Assim, nas leucemias agudas ocorre acúmulo de células neoplásicas do tecido hematopoético na medula óssea, com redução das células mieloides normais. De maneira similar aos casos de aplasia da medula óssea, as principais manifestações clínicas decorrem do comprometimento das três séries mieloides: anemia, infecções e manifestações hemorrágicas. Outras situações em que ocorre infiltração ou substituição da medula óssea são representadas pelas 14 Alline Alvarez leucemias crônicas, mieloma múltiplo, mielofibrose e metástases carcinomatosas. O defeito pode afetar de maneira isolada ou predominantemente a série vermelha: a manifestação clínica principal será a anemia, como aplasia pura da série vermelha, as insuficiências endócrinas, como o hipotireoidismo e o hipopituitarismo, e a insuficiência renal, na qual ocorre menor produção de eritropoetina consequente à lesão do parênquima renal. As infecções, em especial as viroses, são causas frequentes de anemia; anemia é uma manifestação particularmente comum na infecção por HIV, e as hepatites estão associadas à ocorrência de anemia aplástica. Distúrbios da multiplicação celular Os folatos e a vitamina B12 são essenciais para a síntese do DNA, e as deficiências desses nutrientes têm como consequência um retardo ou bloqueio da síntese de DNA, levando a um defeito da multiplicação celular e da maturação nuclear, enquanto a síntese de RNA e das proteínas não está comprometida. As anemias resultantes da carência de vitamina B12 ou de folatos são coletivamente conhecidas por anemias megaloblásticas, e caracterizam- se por acentuada hiperplasia eritroide da medula óssea, baixa liberação de reticulócitos, e hemácias de volume aumentado (macrocitose e hipercromia) Distúrbios da maturação: Cada eritrócito contém cerca de 30 pg de hemoglobina, representando mais de 95% do peso seco da célula. Por isso, quando a quantidade de hemoglobina sintetizada por célula é menor, formam-se hemácias com volume menor do que o normal. São, portanto, anemias microcíticas e hipocrômicas. Os principais defeitos que podem levar a uma hemoglobinização deficiente são: a) a carência de ferro; b) as talassemias; c) as anemias sideroblásticas. A maior parte do ferro corporal encontra-se nas hemácias como parte da hemoglobina. Na carência de ferro os depósitos esgotam-se, e o ritmo de síntese de hemoglobina é comprometido. Nos adultos normais, cerca de 97% da hemoglobina é do tipo HbA, uma proteína composta de dois pares de cadeias polipeptídicas denominadas α e β. A síntese dos dois tipos de globinas é codificada por genes independentes, e em condições normais é equilibrada, ou seja, são produzidas quantidades equivalentes de cadeias α e β. As talassemias são doenças hereditárias em que a síntese de globinas é desequilibrada; a redução do ritmo de síntese acarreta uma diminuição da quantidade total de moléculas completas de hemoglobina por hemácia (o que provoca hipocromia), e também um acúmulo da cadeia cuja síntese não está afetada, que causa a lesão e destruição das hemácias e eritroblastos. Por isso, as 15 Alline Alvarez talassemias são anemias microcíticas hipocrômicas e, ao mesmo tempo, exibem um componente de eritropoese ineficaz e um componente hemolítico. Anemias por destruição de hemácias: As hemácias humanas têm vida média de 120 dias a partir da saída do reticulócito da medula óssea para o sangue circulante. A redução da vida das hemácias em circulação produz uma síndrome hemolítica que pode levar à anemia. Em condições normais, as hemácias são destruídas no interior de macrófagos, em órgãos como o fígado, o baço e a medula óssea. Nas anemias hemolíticas, a hemólise exacerbada pode ser intravascular ou, mais frequentemente, hemólise extravascular. Nas anemias hemolíticas a produção de hemácias pela medula óssea está aumentada, mas o aumento não é suficiente para compensar a acentuada redução de sua sobrevida. As principais manifestações clínicas e laboratoriais compreendem: Consequências do aumento do catabolismo da hemoglobina, como elevação de bilirrubina indireta (não conjugada), icterícia, hepatomegalia e esplenomegalia, litíase biliar. Consequências da hiperplasia mieloide e da produção aumentada de eritrócitos: número elevado de reticulócitos, presença de células imaturas (eritroblastos) em circulação, alterações esqueléticas. Por exemplo, a queda brusca de hemoglobina associada a uma hemólise aguda pode resultar em sintomatologia muito intensa, com fraqueza, tontura e taquicardia, insuficiência renal aguda, enquanto que uma anemia hemolítica crônica pode ser oligossintomática. O ferro livre é extremamente tóxico em razão de sua capacidade de catalisar a formação de radicais livres, que causam dano celular. A transferrina é a principal proteína associada ao ferro plasmático circulante, e a ferritina é a principal proteína associada ao ferro armazenado no interior das células, tanto no citoplasma quanto nas mitocôndrias. O controle da absorção do ferro pelas células das criptas duodenais é crucial, uma vez que não há um mecanismo fisiológico regulável para a excreção do ferro. Como consequência, a ingestão excessiva de ferro pode levar a uma sobrecarga de ferro deletéria com concomitante lesão de órgãos (Cap. 212). O ferro não hêmico da dieta é dissolvido em parte pelo pH baixo do conteúdo estomacal. Um deles é modulado pela ingestão alimentar; portanto, a capacidade absortiva do duodeno é diminuída após um grande afluxo de ferro alimentar. Um segundo mecanismo regulador modula a capacidade de absorção do ferro com base nos depósitos totais de ferro do organismo. 16 Alline Alvarez Por fim, o chamado regulador eritropoiético modula a capacidade de absorção dos enterócitos com base na quantidade de ferro necessária para a eritropoiese. Um aumento paradoxal na absorção de ferro através desse mecanismo ocorre em certos tipos de anemia caracterizada por destruição predominantemente intramedular de células eritroides (causando a eritropoiese ineficaz): anemia sideroblástica, talassemias Uma vez no interior da célula absortiva intestinal, o ferro é armazenado ligado à ferritina. O ferro plasmático circulante está ligado à proteína transportadora de ferro transferrina. O complexo transferrina-ferro é então captado pelos precursores eritroides via receptor de transferrina. A alta densidade de receptores de transferrina presente na superfície dos precursores eritroides garante a captação preferencial do ferro por essas células e explica por que a eritropoiese prossegue normalmente até que ocorra uma deficiência crítica de ferro ligado à transferrina
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