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1 Luísa Soares SEMINÁRIO CASO 1: Maria Greco era uma mulher solteira de 23 anos que foi encaminhada para avaliação psiquiátrica por seu cardiologista. Nos dois meses anteriores, ela esteve no pronto-socorro quatro vezes devido a queixas agudas de palpitações, falta de ar, sudorese, tremores e medo de que estava prestes a morrer. Cada um desses eventos teve início rápido. Os sintomas chegaram ao ápice em minutos, deixando-a assustada, exausta e totalmente convencida de que havia recém tido um ataque cardíaco. As avaliações médicas realizadas logo após esses episódios revelaram achados normais nos exames físicos, sinais vitais, resultados laboratoriais, exames toxicológicos e eletrocardiogramas. A paciente relatou um total de cinco ataques dessa natureza nos três meses anteriores, sendo que o pânico ocorrera no trabalho, em casa e enquanto estava dirigindo. Ela desenvolveu um medo persistente de ter outros ataques, o que a levou a tirar vários dias de folga, a evitar exercícios, dirigir e beber café. Sua qualidade de sono decaiu, assim como seu humor. Passou a evitar relacionamentos sociais. Não aceitava a tranquilização oferecida por amigos e médicos, acreditando que os exames médicos resultavam negativos porque eram executados depois da resolução dos sintomas. Continuou a suspeitar que houvesse algo errado com seu coração e que, sem um diagnóstico preciso, morreria. Quando teve um ataque de pânico durante o sono, finalmente concordou em consultar com um psiquiatra. A sra. Greco negou história de transtornos psiquiátricos anteriores, exceto uma ocorrência de ansiedade durante a infância que havia sido diagnosticada como “fobia da escola”. A mãe da paciente havia cometido suicídio por meio de overdose quatro anos antes, com quadro de depressão maior recorrente. Durante a avaliação, a paciente estava morando com o pai e dois irmãos mais novos. Havia se formado no ensino médio, trabalhava como telefonista e não estava namorando ninguém. Suas histórias familiar e social, fora o ocorrido, não acrescentaram nada relevante. Durante o exame, a aparência da paciente era a de uma jovem ansiosa, cooperativa e coerente. Ele negou depressão, mas parecia receosa e estava preocupada em ter uma doença cardíaca. Negou sintomas psicóticos, confusão e qualquer tipo de pensamento suicida. Sua cognição estava preservada, o insight era limitado e o julgamento era bom. DIAGNÓSTICO Transtorno do pânico. • Ataques de pânico: surtos abruptos de medo e/ou desconforto que atingem o auge em alguns minutos e são acompanhados por sintomas físicos e/ou cognitivos. • Principal diagnóstico diferencial: síndromes clínicas, como infartos. • Critérios satisfeitos: o Seus ataques de pânico são recorrentes e ela satisfaz a exigência de 4/13 sintomas: palpitações, sudorese, tremores, sufocamento, dor no peito e medo persistente de morrer. o Impacto funcional: ela não apenas se preocupa constantemente em ter um ataque do coração (apesar dos exames médicos e das garantias frequentes de que isso não ocorrerá), mas também evita situações e atividades que possam desencadear outro ataque de pânico. o Tempo mínimo de sintomas: 1 mês (a sra. Greco apresenta sintomas há 2 meses). • Transtornos a serem considerados: o Transtorno de ansiedade de separação: história pregressa; o Depressão: averiguar pela história familiar. 2 Luísa Soares CASO 2 Nadine era uma menina de 15 anos cuja mãe a levou para uma avaliação psiquiátrica a fim de ajudá- la com a timidez que demonstrava há tempos. Embora Nadine inicialmente estivesse relutante em falar muito sobre si mesma, afirmou que se sentia constantemente tensa. Acrescentou que a ansiedade era “muito forte” há vários anos e que era frequentemente acompanhada por episódios de tontura e choro. De modo geral, não conseguia falar em nenhuma situação fora de casa ou durante as aulas. Recusava-se a sair de casa sozinha por medo de ser forçada a interagir com alguém. Ficava particularmente ansiosa na companhia de outros adolescentes, mas também havia se tornado “nervosa demais” para falar com vizinhos adultos que ela conhecia há anos. Disse que achava impossível entrar em uma lanchonete e fazer um pedido a um “estranho do outro lado do balcão” por medo de passar vexame. Também estava constantemente de prontidão, devido à necessidade de evitar a possibilidade de ser atacada, uma estratégia que realmente funcionava apenas quando estava sozinha em casa. Nadine tentou esconder sua ansiedade incapacitante dos pais, geralmente falando para eles que “simplesmente não tinha vontade” de sair. Sentindo-se aprisionada e incompetente, Nadine disse que contemplava o suicídio “o tempo todo”. Ela sempre havia sido “tímida” e alvo de gozações durante o recreio desde que havia iniciado o jardim de infância. As gozações viraram bullying manifesto quando ela chegou à 8a série. Durante dois anos difíceis, diariamente, os pares de Nadine se voltavam para ela “como uma alcateia de lobos rosnando”, chamando-a de “idiota”, “feia” e “louca”. Não raro, um deles a olhava nos olhos e dizia que seria melhor se ela se matasse. Uma menina (a líder da turma, que também havia sido sua amiga no primário) bateu nela uma vez, deixando-a com um olho roxo. Nadine não revidou. O evento foi testemunhado por um vizinho adulto que o relatou à mãe de Nadine. Quando a mãe a perguntou sobre o incidente, ela negou, afirmando que havia “caído” na rua. No entanto, mencionou para a mãe “casualmente” que gostaria de trocar de colégio, mas o modo como fez o comentário foi tão inusitado que, no momento, sua mãe simplesmente desaconselhou a mudança. Nadine continuou sofrendo, chorando até dormir na maioria das noites. Cheia de esperanças, Nadine foi transferida para uma escola de ensino médio especializada em artes. Embora o bullying tivesse parado, seus sintomas de ansiedade se agravaram. Ela se sentia ainda mais incapacitada de ir a locais públicos e cada vez mais envergonhada de sua incapacidade de desenvolver o tipo de independência típica de uma menina de 15 anos. Ela afirmou que havia começado a passar fins de semana inteiros “aprisionada” em casa e que tinha medo até mesmo de ir à praça local para ler sozinha. Tinha pesadelos todas as noites com os perpetradores do bullying de sua antiga escola. Sua preocupação com suicídio aumentou. Seus pais pensavam que ela naturalmente deixaria de ser tímida com a idade, buscando auxílio psiquiátrico somente depoisde um professor perceber que sua ansiedade e seu isolamento social a estavam impedindo de participar das atividades extracurriculares e obter as notas necessárias para que fosse aceita em uma boa universidade. Nadine descreveu sua mãe como uma pessoa que fala alto, excitável, agressiva e “um pouco assustadora”. Seu pai era um advogado tributarista bem- sucedido que passava muito tempo no trabalho. Descreveu- o como tímido em situações sociais (“ele é assim como eu”). Afirmou, ainda, que ela e o pai, às vezes, diziam brincando que o objetivo da noite era evitar que sua mãe ficasse furiosa, e acrescentou que “nunca quis ser parecida com a mãe”. DIAGNÓSTICO Transtorno de ansiedade social (fobia social) grave. Transtorno de estresse pós-traumático moderado. Agorafobia grave. 3 Luísa Soares TRANSTORNO DE ANSIEDADE SOCIAL • Nadine tem comportamento tímido subjacente → mais propensa a sofrer bullying diário. o Pode levar adolescentes propensos à ansiedade e já em grupo de alto risco a ficarem traumatizados. A intensidade dos sintomas de ansiedade e o isolamento social podem se combinar para aumentar o risco de pensamentos e comportamentos suicidas. • Nadine apresenta ansiedade acentuada e excessiva em relação a diversas situações sociais. o Medo de passar vergonha → comportamento evitativo. ▪ Evitava situações sociais que provocavam ansiedade. AGORAFOBIA • A ansiedade aumentougradativamente → Nadine começou a entrar em pânico até quando tentava sair de casa sozinha. o Desenvolveu incapacidade de realizar atividades simples por conta; TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO • Experiência intensa e prolongada de bullying → traumática para crianças. o Criança isolada e passando por um período vulnerável de desenvolvimento. • Critérios clínicos: o Intrusão (pesadelos); o Esquiva (fuga dos colegas); o Alterações negativas na cognição e no humor (opiniões negativas sobre si mesma); o Alterações de excitabilidade e reatividade (sempre de prontidão); ATENÇÃO! Alguns desses sintomas também estão relacionados à fobia social de Nadine – transtornos comórbidos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DSM-5, American Psychiatric Association, 2014.