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o Homem que perdeu o charme- análise Critica

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Yan Dias Barboza 
Análise Crítica do artigo: "O Homem que Perdeu o Charme" 
 
O artigo de Mattos, Saboya e Araújo (2002) nos traz o caso de um médico de 39 anos 
que foi encaminhado para avaliação neuropsicológica em busca de sequelas 
cognitivas por conta de um TCE sofrido 9 anos antes em decorrência de um acidente 
automobilístico. As sequelas informadas foram anosmia (perda de olfato) e ligeira 
diminuição do campo visual esquerdo. Conforme consta no documento, o sujeito 
consumia Cannabis esporadicamente e cocaína com menor frequência, desde antes 
do acidente. Contudo, foram observadas mudanças de comportamento nas relações 
interpessoais, no desempenho profissional e na auto regulação de afetos, emoções 
e motivação. Antes considerado uma pessoa inteligente e extrovertida, era visto agora 
como uma pessoa “chata”, sua conversa perdeu a graça e sua capacidade de tomar 
iniciativa e abordar mulheres desapareceu, o que antes era uma característica 
marcante em sua personalidade. 
Outras caraterísticas como a irritabilidade, comportamento explosivo e o aumento da 
frequência em que se masturbava foram observadas pelos seus familiares, que 
afirmaram também que após o acidente, o paciente descuidou de sua aparência, 
ganhou peso e começou a andar malvestido. Quando perguntado a respeito, limitava-
se a sorrir e dizer que “estavam inventando coisas”, não se importava com isso ou 
com a falta de atividade laborativa e social que se manifestou em sua vida depois de 
ter passado pela neurocirurgia de correção da fratura do crânio e retirada de tecido 
necrosado. 
Em exame neurológico feito à época não foi constatado nenhum problema além da 
anosmia, contudo na bateria de testes neuropsicológicos foi evidenciado déficit na 
aquisição de material novo (curva de aprendizagem achatada), além de desempenho 
baixo em relação à memória de reconhecimento visual, desempenho de memória 
global incompatível com o QI e atenção comprometida em mais de uma ocasião. 
É comum, na literatura, nos depararmos com conclusões equivocadas de médicos 
em casos de TCE sem déficits neurológicos motores ou sensoriais, que consideram 
sintomas cognitivos-comportamentais como simulações ou “neuroses”. Em muitos 
casos não há acompanhamento posterior da equipe médica, investigação ou até 
mesmo uma advertência aos familiares quanto a possibilidade de disfunção cognitiva 
pós-traumática. Contudo, neste caso fica evidente a existência de tal quadro. O 
comprometimento funcional sócio-ocupacional do paciente e todos os sintomas 
apresentados apontam para uma síndrome disexecutiva: a pré-frontal dorsolateral ou 
síndrome do lobo frontal. Esta síndrome pode ser caracterizada a partir da 
observação de dois grupos de sintoma. 
O primeiro grupo de sintomas gira em torno da diminuição do senso ético e autocrítica, 
falta de preocupação com o futuro, indiferença afetiva, irritabilidade e euforia. Além 
disso, a perseveração, impulsividade e comportamentos de imitação e utilização 
também estão presentes. Podemos observas este grupo de sintomas no paciente 
quando a família relata a implicância e brigas do paciente com os sobrinhos 
pequenos, o comportamento explosivo inédito, a falta de cuidado com a aparência e 
a diminuição drástica da interação social e atividade sexual, antes intensas. O 
segundo grupo de sintomas diz respeito à apatia, indiferença, lentidão e automatismo 
nas respostas, além de déficit de atenção e dismnésia, que é a dificuldade de 
recuperar o material memorizado. Vimos que na bateria de testes realizada na 
avaliação neuropsicológica foram sinalizadas estas mesmas dificuldades de memória 
e atenção, além da queixa espontânea do paciente, que relatou dificuldade para 
manter-se concentrado por muito tempo, se considerar mais repetitivo que o habitual 
e com dificuldade na tomada de decisões. Todos os sintomas somados com a perda 
de insight nos mostram o comprometimento de funções executivas. 
A partir deste caso, pode-se concluir a importância de uma investigação específica 
para sintomas disexecutivos, mesmo em traumatismos cranioencefálicos que não 
apresentam sequela motoras, senso perceptivas ou diminuição da capacidade 
cognitiva global. Discrepância entre QI verbal e não-verbal, comprometimento da 
destreza motora, modificação das habilidades comunicacionais e o comprometimento 
da capacidade de percepção das emoções do interlocutor são sinais que podem ser 
observados a partir de uma anamnese mais atenciosa e através de uma avaliação 
neuropsicológica completa, que muitas vezes é imprescindível para compreender a 
verdadeira profundidade das consequências de um TCE, por isso este caso é um 
ótimo modelo de como a neuropsicologia é importante para o prognóstico e qualidade 
de vida das pessoas acometidas por este tipo de trauma.

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