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Ana Luiza Bittencourt TEORIA DA CONSTITUIÇÃO Hermenêutica Constitucional - Hermenêutica: conjunto de métodos, sistemas e princípios destinados a promover a apuração do significado das normas jurídicas > ferramenta utilizada para retirar a interpretação do que está previsto na legislação - Conceito de interpretação: consiste em extrair o real significado e a exata abrangência da norma. Aplicação dos métodos da hermenêutica, sistemas e princípios. Para se interpretar a constituição precisa ser dentro de métodos já existentes > precisa de uma base. - Texto x norma: • O texto nada diz, tudo parte da interpretação; • O texto é o ponto de partida e a norma o ponto de chegada > depende do contexto que o texto está inserido e do contexto que será interpretado. Ex.: desenho – é proibido fumar > no local fechado não se pode fumar, porém em um lugar aberto pode. Interpretação da Constituição - Importância por ser o vértice da pirâmide normativa > tudo será interpretado conforme a constituição (e com sua essência) > não cabe divagações. - STF – guardião da Constituição. - Constituição aberta – EUA > possuem baixa densidade normativa = enxuta e extremamente principiológica > cabe muita interpretação // os Estados-membros têm muita autonomia - Constituição fechada – Brasil > possuem alta densidade normativa > possui muitas regras, porém é altamente interpretativa // os Estados-membros não têm muita autonomia - Interpretação por parte do cidadão (ex.: condomínio com o conflito de moradores antigos e novos – isonomia > princípio da igualdade // ex.: funcionário do INSS analisa e defere ou indefere concessão de aposentadoria conforme o que está previsto em lei) Mudanças na Constituição - Mutação constitucional: alteração da interpretação da lei sem que haja alguma mudança física do significante, mudando apenas o significado/o sentido > alteração não é feita no texto, mas na interpretação da norma. Ex.: o termo “casa” no art. 5º - Reforma constitucional: alteração física, da letra da lei Métodos de interpretação - Quanto às fontes: • Interpretação autêntica (do legislador) = o legislativo responsável pela elaboração da norma cria uma segunda norma para esclarecimento da norma originária. • Interpretação judiciária ou jurisprudencial (do juiz) = realizada a partir dos julgamentos realizados pelos diversos órgãos do Poder Judiciário. • Interpretação doutrinária (do doutrinador) = deriva dos doutrinadores e estudiosos do direito. Ex.: interpretação de um jurista em específico sobre aplicabilidade das normas e que foi aceita pelo STF - Quanto aos meios (Savigni): • Interpretação gramatical = consiste na análise do exato teor da lei (da exata forma que está escrito), extraindo o significado literal das palavras, de forma isolada. • Interpretação sistemática = considera que o ordenamento jurídico é formado por um complexo sistema de normas que se interligam > avalia a constituição como um sistema (no nosso caso, um sistema hierarquizado de normas = pirâmide de Kelsen = tudo tem de estar de acordo com a CF) = avalia todo nosso sistema. • Interpretação histórica = consiste na análise do processo de criação da norma > coisas do passado explicam a necessidade de alguns direitos na contemporaneidade (ex.: direito de ir e vir, proteção à família, autodeterminação dos povos, etc). • Interpretação analógica = consiste na busca dentro do sistema normativo, de normas previstas e aplicáveis a casos semelhantes > quando há lacunas nas leis (ou falta de uma lei específica para se moldar a um caso concreto) analogias podem ser utilizadas pelo juiz. • Interpretação teleológica = leva em consideração a finalidade da norma, por meio de uma avaliação valorativa. - Quanto aos resultados: • Interpretação declarativa = a interpretação é feita exatamente como prescrito ou declarado na lei. (Ex.: art. 1°) • Interpretação extensiva = a lei disse menos do que o legislador queria, há então uma extensão da interpretação. (Ex.: art. 5° > “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País” > então se for um turista, ele não tem direito à vida, à liberdade e etc? > essa não era a intenção do legislador > toda a CF é acolhedora, não seria da natureza dela passar essa ideia pelo caput do artigo 5°.) • Interpretação restritiva = a lei disse mais do que o legislador queria, há então uma restrição da interpretação. (Ex.: 29, X > se o prefeito desviou uma verba, vai ser o tribunal de justiça que vai processar ele? Não pode ser, pois isso é um crime federal.) – súmula 702 (A competência do tribunal de justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau). Princípios da interpretação constitucional - A partir do reconhecimento de que a proteção simultânea no ordenamento jurídico de diversificados direitos e bens propicia um ambiente favorável às possíveis tensões entre os distintos interesses, foram consagrados diversos princípios e métodos voltados à interpretação do texto constitucional e da legislação infraconstitucional que a ele se subordina. - O objetivo é resguardar a Supremacia da Constituição. Razões: • 1 – Organizar os mandamentos principiológicos aplicáveis às leis, de forma que estas sejam compreendidas sob a ótica da Constituição. • 2 – Conciliar os aparentes confrontos que eventualmente surgem entre os variados desígnios que são tutelados pela Carta Maior, ofertando soluções capazes de conferir maior eficácia e efetividade ao conjunto normativo constitucional > essa tensão entre direitos vai acontecer a todo momento. Princípio da Supremacia da Constituição - Em função da constituição ocupar o ápice da estrutura normativa em nosso ordenamento, todas as demais normas e atos do Poder Público somente serão considerados válidos quando em conformidade com ela. - Segundo Oswaldo Luiz Palu: “de fato, o princípio da supremacia constitucional constitui o alicerce em que se assenta o edifício do moderno Direito Público. Normas constitucionais põem- se acima das demais normas jurídicas (hierarquia) e essa preeminência é que vai constituir superioridade da Constituição”. - Em decorrência da supremacia da constituição e da higidez de seu texto, é possível questionar a constitucionalidade dos diplomas infraconstitucionais (e das emendas constitucionais) por intermédio do controle de constitucionalidade. Princípio da interpretação conforme a Constituição - Esse princípio não é utilizado para a interpretação das próprias normas constitucionais, mas da legislação infraconstitucional. - É um princípio que prestigia o ideal da presunção relativa de constitucionalidade das leis e opera a favor da conservação da norma legal, que não deve ser extirpada do ordenamento se a ela resta um sentido que se coaduna com a constituição > se a legislação está com defeito cabe aos juristas saber se essa lei sobrevive ao confrontá-la com a constituição (se consegue salvar algo dessa lei) > a legislação precisa estar conforme/de acordo com a constituição > ela consegue se adaptar ao ordenamento jurídico? - Segundo José Joaquim Gomes Canotilho: “a interpretação conforme a constituição só é legítima quando existe um espaço de decisão (espaço de interpretação) aberto a várias propostas interpretativas, umas em conformidade com a constituição e que devem ser preferidas, e outras em desconformidade com ela.” - Regras para a utilização deste princípio: • Se o texto do dispositivo não tolera interpretações múltiplas, não há que se falar em interpretação conforme. Segundo o STF, a interpretação conforme só é utilizável quando a norma admite uma que compatibilize com a constituição. • Não são aceitáveis violações à literalidade do texto, afinal o intérprete encontra seu limite de atuação no perímetro que envolve as possibilidadeshermenêuticas do texto, não podendo, jamais, atuar como legislador positivo (o legislador ordinário é aquele que cria as leis, enquanto o legislador positivo é aquele que diz a lei mesmo quando ela ainda não existe, quando há uma brecha, quando algum ponto não teve seu entendimento pacificado). O intérprete também não pode ferir a finalidade pretendida pelo legislador > o intérprete deve estar sempre conectado com a intenção do legislador. Principio da presunção de constitucionalidade das leis - Como os poderes públicos extraem suas competências da constituição, por consequência presume-se que eles agem estritamente em consonância com esta. Isso confere às normas produzidas pelo poder legislativo a presunção de serem constitucionais, de terem sido engendradas em conformidade com o que prescreve a Carta Maior. Importante destacar que essa presunção é apenas relativa, isto é, admite prova em contrário, o que autoriza que as normas (infra ou EC) submetem-se ao controle de constitucionalidade, para assegurar a supremacia da Constituição. Princípio da unidade da constituição - Tem por objetivo conferir um caráter ordenado e sistematizado para as disposições constitucionais, permitindo que o texto da Carta Maior seja compreendido como um todo unitário e harmônico, desprovido de antinomias reais. - Muito mais que um conjunto caótico de normas desconectadas e esparsas, o texto constitucional é um agrupamento de preceitos integrados, alinhavados pelo ideal de unidade. - Este princípio ganha importância quando estamos perante o texto constitucional de uma sociedade democrática e plural (tal qual a nossa carta de 1988), cuja redação final não vê como produto de um estável e pacífico acordo, mas sim de pequenas concessões e instáveis e frágeis consensos. Diante das disposições normativas diferenciadas, tendo em vista as inúmeras ideias durante a sua criação (dogmática), a solução é reconhecer um sentido global para a constituição, de modo que todos os diversos componentes do tecido social, enquanto intérpretes, se empenham na difícil (mas possível) tarefa de composição de interesses. - Em decorrência desse princípio interpretativo, pode-se afirmar que não há hierarquia normativa, tampouco subordinação entre as normas constitucionais – eventuais conflitos entre as normas originárias serão, pois, sanadas por meio da tarefa hermenêutica. - É nesse sentido que no direito pátrio é inviável a declaração de inconstitucionalidade de uma norma constitucional originária em face de outra > contra norma originária não existe nenhuma tentativa de declará-la inconstitucional > causaria tumulto. Princípio da força normativa - Idealizado por Konrad Hesse, preceitua ser função do intérprete sempre “valorizar as soluções que possibilitem a atualização normativa, a eficácia e a permanência da constituição” > nenhuma norma pode ir contra a constituição > ela vai ao encontro da constituição. - Deve o intérprete priorizar a interpretação que dê concretude à normatividade constitucional, jamais negando-lhe eficácia > a constituição será o marco temporal. Princípio do efeito integrador - Como a finalidade primordial da constituição é ordenar a vida em sociedade, integrando-a a um Estado formalmente constituído, todas as suas normas devem ser interpretadas de maneira a prestigiar a unidade política instaurada pelo documento constitucional. - Na interpretação da constituição deve-se buscar a leitura que reforce o ideal de que a constituição é um agrupamento normativo único, composto por normas conectadas, que devem ser lidas de maneira a reforçar e a reafirmar a integração política e social engendrada pela Constituição. - A doutrina sustenta que o efeito integrador não passa de uma aplicação do princípio da unidade da constituição e, pois, da interpretação sistemática, em conjunto com a força normativa da constituição, uma vez que “o efeito integrador nada mais seria do que ‘dar efetividade ótima’ (força normativa) à unidade político-constitucional (unidade da constituição). Princípio da concordância prática ou harmonização - Tal qual o princípio da unidade constitucional, o da concordância prática também visa solver eventuais desacertos entre as normas constitucionais. - Enquanto o primeiro, no entanto, é manejado em abstrato, envolvendo normas que dissociadas das ocorrências fáticas já se põem em rota de colisão, o último atua perante conflitos específicos, que somente se pronunciam diante de um caso concreto. - Exemplo: direitos à liberdade de informação e à privacidade. Inicialmente não guardam entre si qualquer tensão visível, mas em determinadas situações esses princípios vão se chocar > ex.: caso Cicarelli. - Esse princípio consiste numa recomendação para que o aplicador das normas constitucionais, em se deparando com situações de concorrência entre bens constitucionalmente protegidos, adote a solução que otimize a realização de todos eles e ao mesmo tempo não acarrete a negação de nenhum. Princípio da máxima efetividade ou da eficiência (intervenção efetiva) - Doutrinariamente aponta-se que a definição desse postulado é muito semelhante à do princípio anterior: o que os diferencia é a circunstância de o princípio da força normativa se referir à constituição globalmente considerada e do da máxima efetividade relacionar-se, sobretudo, aos direitos fundamentais. - Esse princípio da máxima efetividade (ou da eficácia) apresenta-se, pois, como um apelo, para que seja realizada a interpretação dos direitos e garantias fundamentais de modo a alcançar a maior efetividade possível, de maneira a otimizar a norma e dela extrair todo o seu potencial protetivo. Princípio da conformidade funcional ou justeza - A tarefa da constituição é fixar a estrutura política organizacional do Estado, estabelecendo as atribuições dos Poderes. Manter intacto o panorama de competências tal qual formatado na carta maior é imprescindível à própria continuidade do projeto constitucional > não adianta organizar de forma legislativa e não ter o direito aplicado na prática > essa organização precisa funcionar. - É nesse contexto que esse princípio objetiva que os órgãos encarregados de realizar a interpretação constitucional cheguem a um resultado que subverta ou perturbe o esquema organizatório funcional estabelecido pela Constituição, sob pena de usurpação de competências. - Exemplo: art. 52, X da CF/88 > transforma a atribuição do Senado Federal – de suspender a execução da lei declarada inconstitucional pelo STF, ampliando os efeitos da decisão de “inter partes” para “erga omnes” – em competência do STF, restando ao Senado, tão somente a tarefa de conferir publicidade à decisão emanada da Corte.