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LEISHMANIOSE TEGUMENTAR -A leishmaniose tegumentar (LT) é uma doença infecciosa, não contagiosa, com evolução eminentemente crônica, que atinge exclusivamente a pele (tipo "botão do oriente") e, às vezes também mucosas (tipo mucocutânea); -Causada por protozoário do gênero Leishmania e transmitida ao homem pela picada de flebótomo fêmea infectado, que é o vetor da doença; Classificação: ● tegumentar oriental; ● tegumentar americana; ● tegumentar difusa; ● Brasil: predomina tegumentar americana e tegumentar difusa. EPIDEMIOLOGIA -Trata-se de um problema de saúde pública, já que se estima incidência anual de aproximadamente dois milhões de casos novos e 12 milhões de pessoas infectadas no mundo; -A leishmaniose ocupa o segundo lugar entre as protozooses transmitidas por vetores, superada apenas pela malária; -É uma doença de notificação compulsória, assim como a leishmaniose visceral. Há três perfis epidemiológicos fundamentais de transmissão: ● silvestre: quando o homem penetra na selva e é picado pelo flebótomo infectado; ● ocupacional ou lazer: a incidência é preponderante no adulto masculino que realiza atividades na floresta, como a derrubada de mata e comércio de madeira, abertura de estradas, agronegócio e ecoturismo; ● periurbana ou rural: a adaptação do vetor ao peridomicílio estabelece o ciclo biológico com participação do animal doméstico (cão e outros) ou não e, até mesmo, do homem como reservatório, nesse caso, a LT acomete pessoas de todas as idades e sexos indistintamente. ETIOPATOGENIA -As leishmanias apresentam duas formas no seu desenvolvimento: ● No homem e em animais parasitados, são organismos ovoides ou arredondados, com 2 a 4 mm de diâmetro, sem flagelo (formas amastigotas), com núcleo e cinetoplasto, encontrados nos infiltrados inflamatórios no interior dos macrófagos; ● Em vetores e culturas, são organismos flagelados (formas promastigotas) móveis, com tamanhos variáveis, exibindo núcleo, cinetoplasto, blefaroplasto e flagelo; -No Brasil, sete espécies são as principais responsáveis : L. (V.) braziliensis, L. (V.) guyanensis, L. (V.) lainsoni, L.(v.) shawi, L. (V.) naiffi, L. (V.) lindenberge L.(L.) amazonenses; -A transmissão da leishmaniose é feita por mosquitos flebotomíneos classificados em dois gêneros – Lutzomya e Psychodopygus, conhecidos no Brasil por birigui, mosquito-palha ou tatuquira; -Insetos, ao sugarem animais infectados, ingerem os parasitas; -Amazônia, os principais reservatórios são animais e mamíferos silvestres como roedores, marsupiais (gambá) e mamíferos desdentados, como o tamanduá e a preguiça; macaco, a preguiça, o quati e o tatu; -Em outras regiões do país, são também reservatórios animais domésticos infectados, como cães, cavalos e muares; -É possível que o homem infectado possa ser fonte de infecção; -As formas amastigotas são ingeridas pelos flebótomos de animais infectado e em alguns dias, evoluem no tubo digestivo para formas promastigotas;ao se nutrir de sangue, a fêmea do flebotomíneo inocula, no homem, as formas promastigotas infectantes, essas formas promastigotas são interiorizadas pelos macrófagos da pele e transformam-se rapidamente em amastigotas. LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA -Ocorre em todos os países latino-americanos, do México à Argentina, exceto no Chile e no Uruguai; relatada, eventualmente, no sul dos Estados Unidos (Texas); -Forma mais frequente é causada pela L. (V) braziliensis, produz lesões cutâneas e mucosas, designa-se leishmaniose cutâneo-mucosa e, entre leigos, úlcera de Bauru (na época de derrubadas de matas em Bauru) ou “ferida brava”; -No Brasil, a leishmaniose cutâneo-mucosa ocorre em surtos epidêmicos em regiões que estão sendo povoadas, quando, pela derrubada de matas; Clínica: -As formas clínicas da leishmaniose tegumentar americana constituem espectro no qual, em um polo, estão as formas cutânea ulcerada e a mucosa, grupo com forte resposta imunecelular; e, no outro, está a leishmaniose cutânea difusa, com ausência da imunidade celular, múltiplas lesões e grande número de parasitas; -Os fatores que determinam a posição no espectro dependem do perfil genético, da resposta imune do hospedeiro e da espécie e cepa da leishmania. -Período de incubação de 1 a 4 semanas, surge a lesão inicial – pápula eritematosa, única ou múltipla, localizada geralmente na região exposta do tegumento, que corresponde ao ponto de inoculação; -Adenopatia regional e linfangite; -Evoluindo, as lesões assumem aspecto papulovesiculoso, papulopustuloso e papulocrostoso e, finalmente, formam úlceras. -Essas úlceras apresentam contornos circulares, bordas altas e infiltradas, em moldura de quadro, fundo com granulações grosseiras, cor vermelho-vivo, podendo estar recobertas por exsudato seroso ou seropurulento. -No mesmo doente, podem ocorrer lesões em várias fases evolutivas, eventualmente surgindo lesões-satélite (satelitose); -A lesão pode evoluir para cicatrização espontânea ou dar origem a placas vegetantes-verrucosas ou sarcóideas, infiltradas. -As lesões mucosas podem aparecer precocemente, porém geralmente surgem um ou dois anos após o início da infecção e decorrem, quase sempre, da disseminação hematogênica; -Há primeiro, eritema e discreta infiltração no septo nasal; depois, segue-se processo ulcerativo, que se desenvolve, acometendo a mucosa das faces laterais das asas do nariz e elementos contíguos; ocorrendo destruição do septo, o nariz tomba para a frente, constituindo o chamado “nariz de anta” ou tapir; (“nariz de anta” também tem na hanseníase e paracoco) -Na área adjacente, há edema e eritema e, pela inflamação secundária, hipertrofia nasal lembrando rinofima; o quadro, frequentemente, envolve o lábio superior e inferior, o palato, as gengivas, a língua, a faringe e a laringe. -Na cavidade oral, especialmente no palato, as lesões são ulcero vegetantes com granulações grosseiras, às vezes separadas por sulcos, que podem se entrecruzar formando a chamada “cruz da espundia” ou cruz de Escomel. -As leishmanias podem localizar-se no pavilhão auricular, causando perda tecidual. LEISHMANIOSE DISSEMINADA -Caracteriza-se por múltiplas lesões acneoides, em pelo menos duas regiões corporais, podendo surgir sintomas gerais, como calafrios, febre e mialgia durante o período de disseminação. -O quadro surge semanas após a lesão inicial ulcerada característica; lesões aumentam em número, podendo chegar a centenas, evoluindo para pápulas, nódulos e ulcerações, que coexistem; -O comprometimento das mucosas ocorre em 30% dos doentes; -Forma, descrita em imunodeprimidos, também é encontrada em doentes sem evidências de imunodepressão, provavelmente causada por cepas mais virulentas de L. (V) braziliensis. DIAGNÓSTICO -As bases para o diagnóstico são: procedência do doente, aspectos clínicos das lesões cutâneas tórpidas e das lesões mucocutâneas indolores com mínimos sinais de inflamação (ausência de exsudato purulento), ou cicatriz atrófica, ovalar ou circular, lisa e brilhante, com pigmentação salpicada no seu interior; essas cicatrizes muitas vezes denunciam o ponto de inoculação; Exames laboratoriais : -Pesquisa direta da leishmania; -Isolamento em cultivo in vitro (meios de cultivo NNNNeal,Novy, Nicolle e LIT - Liver Infusion Triptose); -Exame histopatológico; -Intradermorreação de Montenegro; -Imunofluorescência indireta; -Reação de fixação de complemento; -Reação em cadeia da polimerase (PCR); -Imuno-histoquímica. -Pesquisa direta da leishmania: o exame direto corado pelo Giemsa (material da borda da lesão) revela as formas amastigotas no interior dos macrófagos (parasita intracelular); é praticamente 100% positivo, nos casos recentes, e progressivamente negativo com a duração da lesão (macrófagos vão matando as formas mais superficiais). Dificilmente é positivo nas lesões mucosas; -Cultura e inoculação – feitas em meio de Novy-Mac-Neal-Nicolle (NNN), com pouco interesse para a diagnose, sendo empregadas em pesquisa; -Histopatológico – exibe um granuloma linfo-histioplasmocitário, com áreas ou faixas de célulasepitelioides, que são os centros claros ou clareiras. Há, em geral, grande número de plasmócitos que constituem pista para a diagnose histológica. -Em formas recentes, leishmanias podem ser encontradas pela HE (não é necessária a coloração pelo Giemsa); em lesões tardias, são raras, porém pesquisa cuidadosa e demorada possibilita o achado da leishmania. -Intradermorreação de Montenegro: 0,1 mL intradérmico com suspensão de 10 milhões de leptômonas por mL; a resposta positiva é obtida em 48 a 72 h; às vezes, perdurando por semanas. O teste pode ser feito ainda com frações antigênicas polissacarídica ou proteica de leishmania. O teste é altamente específico e muito sensível; permanece positivo para o resto da vida. É sempre negativo nas formas anérgicas e pode levar até 6 semanas para se tornar positivo o após o início das lesões; -Imunofluorescência indireta: o soro do doente tem anticorpos contra as leishmanias; títulos variam e passam a ter valor diagnóstico a partir de 1/80 e servir como controle de cura; Apesar da ocorrência da doença, o teste nem sempre tem resultado positivo; -Reação de fixação de complemento: é grupo-específica e de pouca sensibilidade, tendo, pois, pouco valor diagnóstico; -Reação em cadeia da polimerase (PCR): pode ser extremamente útil, sobretudo nos casos mucosos. É cada vez mais empregada especialmente para pesquisa. Atualmente podem ser empregadas: PCR por hibridização, PCR-RLP,PCR real time, PCR (G6PhD); -Imuno-histoquímica: utiliza anticorpos mono e policlonais, com maior precisão para descobrir parasitas. Diagnóstico diferencial: -Quando as lesões cutâneas são vegetantes verrucosas, constituem uma das etiologias da síndrome LECT (Leishmaniose, Esporotricose, Cromomicose e Tuberculose); -Outros: úlcera de estase, carcinoma espinocelular, sífilis terciária, úlcera tropical, vasculite; -Leishmânides: ectima, dermatofitose, hanseníase, granuloma anular, sarcoidose, miíase, reação à picada de inseto; -Lesões mucosas: paracoccidioidomicose, histoplasmose, -Rinoescleroma, vasculite, carcinoma espinocelular, bouba, goma sifilítica, lúpus vulgar. TRATAMENTO -Mais importantes: antimoniais, anfotericina B e pentamidina -Antimoniais – o antimonial atualmente empregado é a N-metil-glucamina (Glucantime®), pela maior atividade e menor toxicidade. É apresentado em ampolas de 5 mL, com 1,5 g do sal (425 mg de Sb pentavalente); deve ser administrado na dose de 15 mg de Sb/kg/dia, nas cutâneas, e de 20 mg de Sb/kg/dia, nas formas cutâneo-mucosas. As aplicações podem ser feitas via intramuscular (IM) profunda (bastante dolorosa) ou via intravenosa (IV) (preferencialmente em doente internado), gota a gota ou diluída em 10 mL de soro glicosado a 25%. O total de aplicações é 20 a 30, uma vez ao dia, podendo haver uma interrupção de acordo com as reações adversas. -Anfotericina B (Fungison® 50 mg/frasco) – indicada para formas resistentes à terapia antimonial. A técnica de administração é idêntica à da paracoccidioidomicose, por IV, diluída em soro glicosado a 5%, com 25 a 50 mg de hidrocortisona solúvel e administrada gota a gota, em um período de 6 a 8 horas. As aplicações podem ser diárias ou em dias alternados. Dosagem total entre 1.200 e 2.000 mg do antibiótico; -Anfotericina B lipossomal (AmBisome®) – o custo elevado limita o uso. É eficaz e tem menor toxicidade do que a anfotericina B, indicada para formas graves ou resistentes. -Pentamidina – isotionato de pentamidina (Pentacarinat ® 300 mg por ampola) – empregada como alternativa entre a glucamina e a anfotericina B. Tem sido usada com sucesso na leishmaniose cutânea pela L. guyanensis. É administrada na dose de 4 mg/kg de peso, total de três aplicações, IM, com intervalo de dois dias; -Sulfato de aminosidina ou Gabbromicina® Aminoglicosídio similar à paramomicina, na dose de 16 a 20 mg/kg/ dia IM, durante 20 dias. -Azitromicina: em esquemas VO, de 5OO mg/dia durante 3, S e 10 dias, ou de 1.000 mg/dia durante 2 dias. -Imidazólicos: sobretudo o Itraconazol é bastante eficaz, na dose de 100 mg/dia durante 2 meses, necessitando, eventualmente, de mais 1 mês. Fluconazol, na dose de 200 mg/dia, por 6 semanas, mostrou-se eficaz no tratamento de formas causadas por L. major. -Alopurinol: de 100 a 300 mg/dia, uso isolado ou associado ao antimónio pentavalente. -Miltefosine: trabalhos recentes mostram bons resultados com o emprego deste antineoplásico oral ; -Imiquimode: aplicado topicamente em conjunto com o Glucantime®,potencializa a ação deste. -Tratamento, se feito corretamente, leva à cura e cicatrização das lesões. EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO -Dependente da hipersensibliidade celular, a infecção; -Pode evoluir de maneira benigna, inclusive com cura clínica e, até mesmo, biológica, ou de maneira grave, provocando grandes devastações; -Do ponto de vista evolutivo, podemos classificar os casos em: ● forma abortiva sem cicatriz; ● forma abortiva com cicatriz; ● forma disseminada; ● forma anérgica difusa. PROFILAXIA -Combate aos animais reservatórios, supressão de fonte humana de infecção pelo tratamento, combate ao flebótomo doméstico ou semidoméstico, proteção do sadio por vários métodos (inseto-repelente, mosquiteiro, barreira animal, isto é, animais estabulados para atraírem flebótomos). -Recentemente, tem sido usada vacina composta de suspensão de formas promastigotas e BCG (Leishvacin®, MS), com resultados profiláticos e terapêuticos apreciáveis.
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