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1ª Edição |Fevereiro| 2014 Impressão em São Paulo/SP Dificuldades de aprendizagem e suas patologias Carla Virgínia Diegues Gomes Marquart e Luiz Carlos Ferro Catalogação elaborada por Glaucy dos Santos Silva - CRB8/6353 Coordenação Geral Nelson Boni Professor Responsável Carla Virgínia Diegues Gomes Marquart e Luiz Carlos Ferro Coordenação de Projetos Leandro Lousada Revisão Ortográfica Célia Ferreira Pinto Projeto Gráfico, Dia- gramação e Capa Ana Flávia Marcheti 1º Edição: Fevereiro de 2014 Impressão em São Paulo/SP Dificuldades de aprendizagem e suas patologias Sumário Unidade 3 3.1. O aprender e o processo de escolarização: as bases biológicas da compreensão 3.1.1. O que Maturana apresenta-nos como perspectiva do de- senvolvimento humano? 3.1.2. Dentro dessa perspectiva, a plenitude da condição huma- na advém apenas do nascimento? 3.1.3. Qual é a importância, então, de diagnosticar-se o não-aprender? 3.1.4. Considerando-se que os jovens vivem maior parte do tempo dentro das escolas, qual é a missão dessa instituição? 3.1.5. Quais são as causas mais frequentes para as dificuldades de aprendizagem e problemas escolares? 3.1.6. Como se processa o desenvolvimento da aprendizagem escolar numa criança com DA? 3.1.7. O que se entende por escola? 3.2. Teoria da psicologia cognitiva com base em Piaget, ampliada para abordagem psicopedagógica 3.2.1. Como se deu a Teoria de Piaget? 3.2.2. Como se dá o ato de assimilação? 3.2.3. E os processos de acomodação como são definidos por Piaget? 3.2.4. Qual a definição dada por Jean Piaget à noção de conservação? 3.2.5. Qual a importância do egocentrismo no processo de de- senvolvimento da criança? 7 3.2.6. O que é, e como ocorre a reversibilidade? 3.2.7. Como Piaget vê a vida afetiva no contexto cognitivo e pessoal- emocional? 3.3. Quadros das fases do desenvolvimento, segundo piaget 3.4. Roteiros de aplicação das provas operatórias 3.4.1. Provas de conservação (antecipação e reversibilidade) 3.4.2. Provas de ordenação (prever o que vem depois) 3.4.3. Provas de classificação 3.4.4. Descrição das Provas: Conservação 3.4.4.a Quantidade descontínua – pequenos conjuntos de ele- mentos (6/7 anos) 3.4.4.b Quantidade contínua - quantidade de matéria (6/7 anos) 3.4.4.c Quantidade contínua - quantidade de líquido (7/8 anos) 3.4.4.d Peso (8/9 anos) 3.4.4.e Comprimento (8/9 anos) 3.4.4.f Descrição das Provas: Ordenação 3.4.4.g Provas de Classificação 3.5. Um olhar ampliado para a teoria de plaget 3.5.1. Escutar e olhar 3.5.2. Deter-se nas fraturas do discurso e relacioná-las com o que aconteceu depois 3.5.3. Descobrir o “esquema de ação subjacente” 3.5.4. Buscar os esquemas de repetição de ação 3.5.5. Interpretar a operação, mais do que o conteúdo 3.6. Neurociência e o desenvolvimento cognitivo 3.6.1 Nesse sentido, qual é a importância de se entender o fun- cionamento do sistema nervoso de uma pessoa? 3.6.2. Quais são as principais funções do sistema nervoso? 51 57 3.6.3. Como a emoção interfere no processo de aprendizagem? 3.6.4. Por que precisamos de motivação para aprender? 3.6.5. Qual é a importância da atenção para que a aprendiza- gem ocorra? 3.6.6. Como favorecer a fixação de novos conhecimentos na memória dos alunos? 3.6.7. O que é plasticidade cerebral? Questões Gabarito Referências Unidade 3 Nesta terceira unidade, estudaremos o processo de aprendizagem sobre quatro aspectos: 3.1. O aprender e o processo de escolarização: as bases biológicas da compreensão humana 3.2. Teoria da Psicologia Cognitiva com base em Piaget, ampliada para a abordagem psicopedagógica 3.3. Quadros das fases do desenvolvimento segundo Piaget 3.4. Roteiros de aplicação das provas operatórias 3.5. Um olhar ampliado para a Teoria de Piaget 3.6. Neurociência e o desenvolvimento cognitivo 3.1. O APRENDER E O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO : AS BASES BIOLÓGICAS DA COMPREENSÃO HUMANA O fenômeno de aprender é “mudar com o mundo”. Trata-se de um processo dinâmico e aber- to, de mútuas adaptações entre organismos vivos e meio, sujeitos e ambientes. Essa concepção de aprender implica em trans- formações nas trocas recíprocas entre sistemas-indi- víduos - e ambiente - em que entra em jogo tanto a conservação das receptivas identidades dos organis- mos e do meio, quanto às suas alterações. É um processo de transformação em que o su- jeito aprendiz organiza-se com a cultura. Neste pro- cesso, as forças dos ambientes não determinam as condutas deste sujeito, mas exercem suas influências nas suas criações, fechando ou abrindo possibilida- des de construções. 3.1.1. O que Maturana nos apresenta como pers- pectiva do desenvolvimento humano? “Processo pelo qual o sujeito em mudança, amplia suas perspectivas do meio ambiente, tornando-se mais capaz de interagir no mesmo, de reestruturá-lo ou de transpor as suas próprias condições.” Maturana (1996) ~~ ~ A concepção sobre “forças do meio”, leva em conta uma visão dinâmica do ambiente, numa abordagem ecossistêmica, em que o ato de ensinar e de aprender não são dois momentos recíprocos, como o dar e o receber, ou o educar e educar-se. Há, porém, coisas que não se podem ser ensinadas, mas, não obstante a essa impossibilidade, podem ser aprendidas. Temos, como alguns exemplos disso, ha- bilidades como jogar, pensar, sentir e humorizar. Entre alguém que ensina e alguém que aprende, abre-se um espaço de imprevisibilidade, de surpre- sa, de criação, de transformação e de construção de conhecimentos, porque os saberes, assim como os indivíduos, vivem um processo contínuo de cons- trução, numa sociedade que ainda não está pronta. 3.1.2. Dentro dessa perspectiva, a plenitude da condição humana advém apenas do nascimento? É por meio da aprendizagem, que nós humanos nos tornamos humanos. O filhote de ser humano se faz humano através da aprendizagem humana e este, portanto, sendo um dos nossos atributos fundamen- tais, constitui-se em nosso primeiro desafio. 3.1.3. Qual é a importância, então, de diagnosti- car-se o não-aprender? Até a terceira década da vida, os jovens passam mais tempo na escola do que em qualquer outra institui- ção, na presença de professores, colegas de aula. Nossa missão torna-se determinante rumo a um trabalho de cidadania ativa e de apoio à construção da autonomia. Nesse sentido, diagnosticar o fenômeno do não aprender como sintoma, consiste em encontrar sua funcionalidade, sua articulação na situação integrada pelo aluno. 3.1.4. Considerando-se que os jovens vivem maior parte do tempo dentro das escolas, qual é a missão dessa instituição? Consideremos que o papel da escola deveria ser o de desenvolver o potencial de cada um, respeitan- do as características individuais do aluno e sua forma de aprender, procurando reforçar os pontos fortes e auxiliando na superação dos pontos fracos. Evitaríamos, dessa forma, que as mais diversas mo- dalidades de dificuldades que as crianças apresentam em sua vida escolar, tornassem-nas excluídas no processo de aprendizagem, fazendo-as rotuladas e discriminadas. É preciso compreender que cada indivíduo cog- noscente tem um tempo e uma forma de aprender própria, mas, sem sombras de dúvida, chega-se à con- clusão que, independentemente, da via neurológica utilizada, o sucesso escolar de crianças com distúrbios de aprendizagem possa ser uma associação de fatores positivos que envolvam ambiente de estudo adequado + estímulo + motivação + organismo, possibilitando que o professor, na sua árdua tarefa de lidar com as mais diferentes adversidades, saiba que, antes de tudo, é necessário saber avaliar, distinguir e, principalmen- te, querer mudar suas estratégias de aula e adequá-las, respeitando cada criança e jovem estudante, em seu estado específico de desenvolvimento. 3.1.5. Quais são as causas mais frequentes para as di- ficuldades de aprendizagem e problemas escolares? 1. Escola 2. Fatores intelectuaisou cognitivos 3. Déficits físicos e ou sensoriais 4. Desenvolvimento da linguagem 5. Fatores afetivo-emocionais 6. Fatores ambientais (nutrição e saúde) 7. Diferenças culturais e ou sociais 8. Dislexia 9. Deficiência não verbal. 3.1.6. Como se processa o desenvolvimento da aprendizagem escolar numa criança com DA (Dificuldade de Aprendizagem)? Numa criança com DA, o desenvolvimento se processa mais lentamente do que em outra criança da mesma faixa etária e livre dessa condição dife- renciada, especialmente, na área da atenção seletiva. Não se deve, porém, considerar essas crianças de- feituosas, deficientes ou permanentemente inaptas. Elas podem aprender! É preciso que o educador procure uma forma de ensino adequada a atender sua necessidade específica, e não procure ou aceite o caminho mais fácil: apontar algo que esteja errado na criança. É provável que seu método de ensino e a forma de aprendizagem da criança estejam em defasagem ou desencontro. Nem a criança, nem o professor de- vem ser responsabilizados por isso, mas o professor pode ser responsável se ele não tentar implementar uma estratégia, que ajude a contornar o impasse. 3.1.7. O que se entende por escola? Além da instituição escola, estão incluídos, nes- te item, os fatores intraescolares como inadequação de currículos, de programas, de sistemas de ava- liação, de métodos de ensino e de relacionamento professor-aluno. Vale salientar a necessidade de dife- renciar, com uma especial atenção, as crianças com dificuldades de aprendizagem das demais crianças com dificuldades escolares, que revelam a incompe- tência da instituição educacional, no desempenho de seu papel social. As dificuldades escolares, para serem solucio- nadas, não podem ser consideradas como problemas dos alunos. É comum vermos professores usando material de ensino desestimulante, desatualizado, totalmente desprovido de significado para muitas crianças, sem levar em consideração suas diferenças individuais. O aluno não se envolve no processo de ensino-aprendizagem e fica mais difícil a assimilação de conhecimentos. 3.2. TEORIA DA PSICOLOGIA COGNITIVA COM BASE EM PIAGETs, AMPLIADA PARA A ABORDAGEM PSICOPEDAGÓGICA Jean Piaget* (1896-1980) foi biólogo, psicólogo, filósofo, suíço, conhecido pelo seu trabalho pio- neiro no campo da inteligência infantil e uma das figuras mais notáveis no campo das ciências contemporânea do comportamento. Realizou pesquisas sobre o pensamento infantil. Uma de suas grandes preocupações era relacionada ao funcionamento das estruturas do pensamento lógico, intelectual da criança, em seu aspecto dinâmico e nos processos do conhecimento que a criança põe em ação. Para isto, desenvolveu um método clínico. Piaget queria evitar os inconvenientes da apli- cação de testes assim como as puras observações. Assim, emprega um método novo, clínico de con- versação livre com a criança, sobre um tema dirigido pelo interrogador que segue suas respostas pedindo que justifique, explique, diga por que, enfim, fazen- do com que a criança fale mais livremente. Para dominar este método, é necessário reu- nir algumas qualidades fundamentais: saber obser- var, deixar que a criança fale sem interrompê-la e ao mesmo tempo ter em mente alguma hipótese de trabalho. No decurso da utilização do método, foi construindo-se novas perspectivas, uma nova to- mada de consciência que culmina na verificação de sua inadequação e, gradativamente, passa-se de um método inicialmente verbal para um material cons- tituído de experiências com intervenções para justi- ficar as ações concretas efetuadas; da lógica infantil da linguagem para a lógica infantil na ação, sem que a linguagem seja excluída. Assim, foi se construindo o método clínico. 3.2.1. Como se deu a Teoria de Piaget? Na Teoria de Piaget, a compreensão de um ob- jeto de conhecimento aparece estreitamente ligada à capacidade de o sujeito reconstruir este objeto, por ter compreendido suas leis de composição. Piaget fala de uma compreensão ligada à transformação do objeto. No processo de construção do pensamento, o funcionamento intelectual, em seu aspecto dinâmico, caracteriza-se também pelos processos invariantes de assimilação e acomodação cognitiva, onde como duas faces da mesma moeda um completa o outro, gerando novas adaptações do indivíduo, no seu processo de construção de pensamento. Para Piaget “a cognição, assim como a digestão, é organizada. Todo ato inteligente pressupõe algum tipo de estrutura intelectual, algum tipo de organiza- ção dentro da qual ocorre. A apreensão da realida- de sempre envolve relações múltiplas entre as ações cognitivas, os conceitos e os significados que as expri- mem”. (Flavell John; A Psicologia de desenvolvimen- to de Jean Piaget, pág. 46) 3.2.2. Como se dá o ato de assimilação? “O ato de assimilação é o fato primeiro, que engloba toda a necessidade funcional, a repetição, e esta a coordenação entre o sujeito e o objeto que anuncia a implicação e o julgamento”. (O nascimen- to da inteligência da criança, pág. 44. in Batro A., Dicionário terminológico de Jean Piaget) “Assimilar, tanto psicologicamente, como biolo- gicamente é reproduzir-se a si mesmo por intermédio do mundo exterior, é, portanto, transformar as per- cepções até torná-las idênticas ao próprio pensamen- to, isto é, aos esquemas anteriores. O julgamento e o raciocínio da criança 14246 in Batro A., Dicionário terminológico de Jean Piaget, a assimilação explica o fato primitivo, geralmente admitido como o mais ele- mentar da vida psíquica: a repetição.” (O nascimento da inteligência da criança, pág. 44, in Batro A., Dicio- nário terminológico de Jean Piaget) O conceito de esquema para Piaget pressupõe algum tipo de organização ou sistema estrutural no organismo. Um objeto quando assimilado a alguma coisa e acomodado, possui uma estrutura cognitiva de ações sequenciadas que acabam por constituir. Estes esquemas são rotulados por Piaget de acordo com a sequência de ação a que se referem, quan- do a criança o executa. No decorrer deste exercício, repetido, da ação, os esquemas transformam-se se modificando, continuadamente, ampliando, assim, o modo de assimilação dos objetos diferentes. 3.2.3. E os processos de acomodação, como são definidos por Piaget? A acomodação: “... refere-se a uma atividade: ainda que a modificação do esquema seja imposta pelas resistências do objeto, ela não é ditada apenas pelo objeto, mas antes pela reação do sujeito que tende a compor a resistência (seja pela reação ime- diata, ensaio e erro). Mas, em segundo lugar, se aco- modação é uma atividade em que consiste diferen- ciar um esquema de assimilação, com relação a está não é, senão uma atividade derivada ou secundária. As pressões das coisas tendem sempre, não a uma submissão passiva, mas a uma simples modificação da ação exercida sobre elas”. (A psicologia da inte- ligência pág. 14. In Batro, Dicionário terminológico, Jean Piaget, 1978) Os estudos de Jean Piaget, sobre os proces- sos cognitivos e o desenvolvimento da criança, têm como ponto de partida a noção de conservação, re- versibilidade e antecipação. 3.2.4. Qual a definição dada por Jean Piaget à noção de conservação? Para Piaget, a noção de conservação significa uma condição necessária para toda a atividade racio- nal, que implica na apreensão do que se mantém cons- tante ou não na compreensão de qualquer fenômeno. Para que um conhecimento possa ser elaborado faz-se necessário que seja captado e compreendido, segundo os aspectos que se mantêm constantes e os que não se mantêm. Isto é identificar na transforma- ção o que não se altera (a constância) e ou resgatar o todo, sem deixar de aprender, simultaneamente, as partes articuladas a esse todo. Esta noção de conservação está implícita na formação de conceitos, buscando a compreensão sobre o objeto e o mundo, no desenvolvimento da noção de quantidade e de número e das relações afe-tivas, quando o indivíduo supera o egocentrismo. 3.2.5. Qual a importância do egocentrismo no processo de desenvolvimento da criança? Egocentrismo é o aspecto central do pensa- mento infantil, que consiste em reduzir tudo a si, ao passo que chamamos de egocentrismo a indiferen- ciação entre o próprio ponto de vista e o dos outros. Um fenômeno inconsciente de perspectiva. Segundo o psicólogo, todas as crianças são ego- cêntricas, uma vez que as suas habilidades mentais não lhes permitem compreender que as restantes pessoas podem ter critérios e crenças diferentes dos delas, pois têm extrema dificuldade em colocar-se no lugar do outro, fato que as impede de estabelecer relações de reciprocidade. Tal pensamento, como in- dica seu nome, está “centrado no eu”. Uma criança começa a superar o egocentrismo, por volta dos 2, 3 anos aos 7, 8 anos. Para isso, é ne- cessário captar as variações e, simultaneamente, a per- manência, de um fenômeno e, assim, caracteriza-se a noção de conservação. A conservação desenvolve-se em função da reversibilidade e vice-versa. A noção de conservação garante o pensamento reversível e a re- versibilidade gera maior consistência à conservação. 3.2.6. O que é como ocorre a reversibilidade? Chamamos de reversibilidade a capacidade de executar uma mesma ação em dois sentidos, mas ten- do consciência de que se trata de uma, apenas. A reversibilidade ocorre quando a criança percebe o inverso, o contrário, o oposto e, simul- taneamente, as suas identidades no mesmo todo. A reversibilidade permite olhar e perceber a comple- mentaridade e identidade do todo, caracterizando o pensamento relativo. A partir desta evolução do pensamento lógico com a noção da conservação e da reversibilidade me- rece atenção, nesse processo, a noção de antecipação, que acontece quando a pessoa que tem noção de con- servação, consegue a partir de um dado, objeto, ação ou fenômeno, prever o que veio antes, e o que vem depois, utilizando o raciocínio dedutivo, antecipando assim, as sensações ou sentimentos e evoluindo para previsões imaginárias, que podem culminar para de- duções de causa e efeito. A criança, à medida que evolui vai-se ajustando à realidade circundante, e superando de modo cada vez mais eficaz, as múltiplas situações com que se con- fronta, desde o nascimento até a maturidade. Em resumo, vemos que o objeto vai se cons- truindo aos poucos, e a criança necessita de estímu- los e motivação para superar o seu desenvolvimento, e desta forma, torna-se necessário que experiencie e tenha tempo suficiente para interiorizar a experiên- cia antes de prosseguir para o estágio seguinte, assim como uma estreita relação entre o afeto e a aprendiza- gem, que embora não tenha sido a principal preocu- pação de Piaget, não nega sua importância. 3.2.7. Como Piaget vê a vida afetiva no contexto cognitivo e pessoal- emocional? Piaget vê as reações cognitivas e pessoais/emo- cionais como interdependentes em seu funcionamen- to. A vida afetiva, assim, como a vida intelectual, é uma adaptação contínua, uma vez que “os sentimen- tos expressam o interesse e o valor atribuídos às ações que têm sua estrutura proporcionada pela inteligên- cia”. (Flavell, John; A psicologia do desenvolvimento de Piaget; pág. 80). Como evolui o desenvolvimento do pensamento lógico, intelectual, desde o nascimento até a maturida- de, segundo estudos de Piaget? 3.3. QUADROS DAS FASES DO DESENVOLVIMENTO, SEGUNDO PIAGET Os quadros, abaixo, dão uma ideia das fases do desenvolvimento, segundo estudos de Piaget, com uma descrição do desenvolvimento intelectual, desde o nascimento até a maturidade. Apresentaremos, inicialmente, as características mais gerais e fundamentais dos primeiros anos de vida com as evoluções mais especializadas da fase sen- sória- motora, que termina com a descrição do pen- samento pré-operacional. Continuamos, abrangendo a construção das operações concretas nos anos inter- mediários da infância, até, finalmente, chegarmos à descrição das operações formais da adolescência. Sensório–motor Sensorial e fisiológico ocorre através dos reflexos e dos esquemas como, por exemplo, sugar, sugar os mamilos, realizar o reconhecimento de vozes, figuras familiares, a percepção de objetos que desaparecem etc. Pré-Operatório Surgimento da função simbólica que é a condição básica para o desenvolvimento da linguagem, consegue perceber algumas propriedades básicas das classes, mas não são capazes de concentrar a atenção em mais de uma dimensão, pois a percepção é centrada em um dos aspectos ou em uma comparação com os pares, e existe uma generalização do objeto como, por exemplo, tudo que tem rabo é gato! Ainda, não percebe o que permanece. Operações formais O adolescente é capaz de chegar a conclusões hipotéticas com possibilidades de explicar um fenômeno, algo abstrato e com alternativas saindo das limitações da experimentação. Os múltiplos aspectos de um fenômeno são tratados simul- taneamente, distinguindo o real do que é possível na resolução de um problema, o que exige muita flexibilidade, ao lidar com o todo e com as partes. Tanto as crianças como os adolescentes vivem no presente, mas ao contrário da criança, está cheio de ideias que transcendem a situação imediata, com planos para o futuro. Operações concretas Aqui, a criança já consegue realizar a descentração do objeto, indo além do foco isolado das propriedades perceptivas, assim como a reversibilidade parcial e as relações que irão culminar nas noções de conservação. Ocorrem às relações para classificação e seriação concretas. No campo afetivo, consegue superar egocentrismo com o olhar para si e para o outro, mantendo um diálogo complementar como, por exemplo: uma massa de modelar, eu transformo em bola ou cobra, e a quantidade permanece constante ou em duas fileiras de moedas, uma mais afastada que a outra (não se ilude), olha para a quantidade de moedas. A reversibilidade completa ocorre na fase seguinte. 3.4. ROTEIROS DE APLICAÇÃO DAS PROVAS OPERATÓRIAS A seguir, apresentaremos os roteiros de apli- cação das Provas Operatórias de Piaget, organiza- dos pelas professoras e psicopedagogas Anita Lilian Zuppo Abed e Eloisa Q. Fagali. Essas provas pos- sibilitam que se conheçam o funcionamento e o de- senvolvimento das funções lógicas do sujeito. Este material dá suporte para o trabalho psicopedagógico na investigação do nível cognitivo, que a criança se encontra, e se existe alguma defasagem que possa justificar uma dificuldade de aprendizagem. Deve ser aplicado com um olhar ampliado pelo psicopeda- gogo que possua conhecimento e prática do mesmo, para que seja garantida sua eficácia. 3.4.1. Provas de conservação (antecipação e reversibilidade) A- Quantidade descontínua – pequenos conjuntos de elementos (6/7 anos). B- Quantidade contínua- quantidade de matéria (6/7 anos). C- Quantidade contínua- quantidade líquida (7/8 anos). D- Peso (8/9 anos). E- Comprimento (8/9 anos). 3.4.2. Provas de ordenação (prever o que vem depois) A- Seriação (6/7 anos). B- Co-seriação (7/8 anos). 3.4.3. Provas de classificação A- Mudança de critério (7 anos). B- Inclusão de classes (7/8 anos). C- Intersecção de classes (10/11 anos). 3.4.4. Descrição das Provas: Conservação 3.4.4.a - Quantidade descontínua – pequenos conjuntos de elementos (6/7 anos). Material: sete fichas vermelhas e sete fichas azuis. Atividade: • Fazer uma fileira com sete fichas azuis e sete fichas vermelhas paralelas. Perguntas: O que você pode-me dizer sobre estas fichas? Escolha uma cor que você gosta mais? Existe a mesma quantidade de fichas nas duas fileiras? • Escolher uma das fileiras e espaçá-las. Perguntas: E agora, existe a mesma quantidade de fichas? Eu tenho mais, menos ou a mesma quantidade de fichas que você? Você pode me explicar a sua resposta? Se esta linha é mais comprida, será que a quantidadede fichas é maior? • Retomar o pareamento das duas fileiras de fichas. Perguntas: E, agora, você acha que temos a mesma quantidade ou uma tem mais ou menos? Como você sabe? Outra garota da sua idade disse-me que uma das filei- ras tinha menos quantidade. Será que ela está certa? 3.4.4.b - Quantidade contínua - quantidade de matéria (6/7 anos) Material: duas massinhas de modelar de co- res diferentes. Atividade: • Fazer duas bolinhas iguais. Perguntas: O que você pode-me dizer sobre este material? Escolha uma cor que você gosta mais? As duas são do mesmo tamanho? Você acha que as duas têm a mesma quantidade de massa? • Transformar uma delas achatando-a. O que você pode-me dizer sobre este material? Escolha uma cor que você gosta mais? As duas são do mesmo tamanho? Você acha que as duas têm a mesma quantidade de massa? • Transformar a massa alargando-a. O que você pode-me dizer sobre este material? Escolha uma cor que você gosta mais? As duas são do mesmo tamanho? Você acha que as duas têm a mesma quantidade de massa? Outra garota da sua idade disse-me que uma das filei- ras tinha menos quantidade. Será que ela está certa? • Transformar uma delas partindo-a em pedaços. O que você pode-me dizer sobre este material? Escolha uma cor que você gosta mais? As duas são do mesmo tamanho? Você acha que as duas têm a mesma quantidade de massa? Outra garota da sua idade disse-me que uma das filei- ras tinha menos quantidade. Será que ela está certa? 3.4.4.c - Quantidade contínua – quantidade de líquido (7/8 anos) Material: 2 frascos idênticos. 1 frasco fino e alto. 1 frasco baixo e largo. 4 frascos menores. líquido (pode ser colorido). 2 frascos com líquido, de três diferentes. Atividade: • Colocar o líquido nos frascos iguais. Perguntas: O que você pode-me dizer sobre este material? Qual destas cores você gosta? Todos os frascos são do mesmo tamanho? Você acha que todos os frascos têm a mesma quan- tidade de líquido? E agora? O que você pode-me dizer sobre este material? Você acha que algo mudou? O quê? Todos os frascos são do mesmo tamanho? Como você sabe? Você acha que todos os frascos têm a mesma quan- tidade de líquido? Como você sabe? Outra garota da sua idade disse-me que um dos fras- cos tinha menos quantidade de líquido. Será que ela está certa? 3.4.4.d - Peso (8/9 anos) Material: Pode-se utilizar uma pequena balança. Uma pequena quantidade de massa de modelar. Atividade: • Fazer duas bolinhas iguais e colocá-las na balança. Perguntas: O que você pode-me dizer sobre este material? Escolha uma cor que você gosta mais? As duas são do mesmo tamanho? Você acha que as duas têm a mesma quantidade de massa? As duas bolinhas têm o mesmo peso? Os dois são do mesmo tamanho? Se este material fosse uma estrada e você estivesse de carro passeando, qual dos dois caminhos você esco- lheria para percorrer? Qual caminho você acha que chegaria mais rápido? Como você sabe? Outra garota da sua idade disse-me o contrário. Será que ela está certa? 3.4.4.f - Descrição das Provas: Ordenação • Seriação (6/7 anos). Material: 10 bastões de madeira de tamanhos diferentes. Atividade: Coloque na ordem do maior para o menor, ou do menor para o maior. Observação da Atividade: Observe como a criança monta a série, se utiliza o pa- reamento (um a um), ou relacionam-se as partes com o todo, se utiliza uma base, suporte ou eixo de simetria. • Co-seriação (7/8 anos). Material: flores ou vasos de diferentes tamanhos seriados simultaneamente. Atividade: Seriar dois conjuntos simultaneamente, colocando na or- dem do maior para o menor, ou do menor para o maior. Observação da Atividade: Observe como a criança monta a série: se utiliza o pa- reamento (um a um), ou relacionam-se as partes com o todo, se utiliza uma base, suporte ou eixo de simetria. Atividade: - Reúna em grupos o que pode ficar junto. - Coloque junto o que combina. - Arrume de outra maneira. - Faça o menor número possível de grupos. Perguntas: Por que estão juntos? Que nome você daria a cada grupo? • Inclusão de classes (7/8 anos). Material: um ramalhete com 10 margaridas ou rosas, por exemplo. Atividade: Reunir as margaridas e as rosas em um ramalhete. Segurá-las nas mãos. Perguntas: Neste ramalhete, há mais margaridas ou mais flores? Como você sabe? • Intersecção de classes (10/11 anos). Material: Uma base com dois círculos entrelaçados. 5 fichas redondas vermelhas. 5 fichas redondas azuis. 5 fichas quadradas azuis. Atividade: Montar as fichas nos círculos de modo que fiquem as azuis de um lado do círculo, as vermelhas do ou- tro, e algumas azuis na intersecção dos dois círculos. Perguntas: Quero que você nomeie as fichas e fale-me as suas características? Porque você acha que pusemos essas fichas no meio? Há mais fichas azuis ou vermelhas? Há mais fichas quadradas ou redondas? Como você sabe? Mostre-me? 3.5. UM OLHAR AMPLIADO PARA A TEORIA DE PIAGET A Psicopedagogia parte dos estudos de Piaget, fazendo uma releitura do pensamento lógico para uma visão pluralista sobre as diferentes formas de pensar, o que possibilita o profissional psicopedago- go compreender as dificuldades de aprendizagem de forma ampla: com dimensões no sentido biológico, cognitivo, social e emocional, formando, portanto, um pensamento holográfico e não linear, que amplia a visão de mundo e de ser humano. Em trabalhos que ampliam as pesquisas feitas por Piaget, como os de Sara Paín* e Alícia Fernan- dez**, percebemos que as fases do desenvolvimento da criança, sensório-motora à fase operacional, estão intimamente ligadas com as experiências de aprendi- zagem, nessa visão holográfica. Sara Paín*, nascida em Buenos Aires, Argenti- na, em 1931, é psicóloga, doutora em Filosofia pela Universidade de Buenos Aires e em Psico- logia pelo Instituto de Epistemologia Genética de Genebra. Alicia Fernández** é psicopedagoga formada pela Faculdade de Psicopedagogia da Universi- dad del Salvador, Buenos Aires, Argentina. Tem desempenhado fundamental papel no desen- volvimento e formação de psicopedagogos em toda a América Latina e em Portugal. Diagnosticar o não aprender como sintoma, se- gundo Sara Paín, consiste: “em encontrar sua funcio- nalidade, isto é, sua articulação na situação integrada pelo paciente”. É para este aspecto fundamental que o profissional psicopedagogo encontra-se preparado, pois conta com recursos pedagógicos, didáticos e com um trabalho em equipe multidisciplinar, por meio do qual busca recursos qualificados para o diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Sob o olhar e escuta psicopedagógica nasce o saber psicopedagógico, que se constrói permitindo uma apropriação dos conhecimentos e do aprender. Alícia Fernández propõe um guia para a escuta, que consideramos importante para o nosso conhecimento. 3.5.1. Escutar e olhar A palavra escutar aparece, aqui, não como si- nônimo de ficar calado, mas como uma escuta que recebe, aceita, interessa-se e impregna-se. A ação de olhar colocada em um entendimento muito maior do que apenas manter os olhos abertos, mas seguir, procurar, incluir e acompanhar. Assim, as ações de escutar e olhar não são passivas, permi- tem ao paciente falar e ser reconhecido, e ao terapeu- ta compreender a mensagem. 3.5.2. Deter-se nas fraturas do discurso e re- lacioná-las com o que aconteceu depois. Pensar no discurso, além do que é oralmente verbalizado, mas também é corporal, metafórico, ex- pressa mais a cena do que o relato verbal. 3.5.3. Descobrir o “esquema de ação subjacente” Aqui, utilizamos o termo esquema de ação, de origem piagetiana como estudado anteriormente, porém não necessariamente nos deteremos no seu conteúdo, mas, sim no processo e mecanismos utili- zados pelo paciente. 3.5.4. Buscar os esquemas de repetição de ação. O terapeuta deve observar a insistência da apa- rição dos esquemas de ação de repetição no com- portamento do paciente, procurando a entrada em outras situaçõese com outros conteúdos, em que se repete a ação. 3.5.5. Interpretar a operação, mais do que o conteúdo Os esquemas de ação constituem como redes, e essa trama de ideias reverberam no aprender, consti- tuindo os sintomas de aprendizagem. “Não queremos deter-nos na manipulação do in- divíduo com o objetivo de consertar sua máquina pensante de maneira que possa adequar-se à cadeia, mas promover nele, ao mesmo tempo, que um má- ximo de independência e autovalorização, a realida- de de uma sociedade, na qual seu problema não seja possível.” (Sara Paín) 3.6. NEUROCIÊNCIA E O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO A neurociência busca uma integração entre a prática pedagógica e o entendimento da neurologia da aprendizagem. Para contornar as dificuldades de aprendizagem e ensinar uma criança, é necessária uma investigação de como ela aprende e de como aprendeu a aprender. Também é preciso ter em mente que, nesse processo, cada um participa a seu modo, tanto aque- le que ensina como o que aprende. Cabe, porém, a quem ensina a responsabilidade de buscar os recur- sos necessários, para que o processo de aprendiza- gem efetivamente aconteça. Para se ter êxito na construção desse novo ca- minho, é preciso, sim, que quem ensina observe a forma de aprender das crianças e jovens com quem lida, mas também precisamos conhecer o funciona- mento do cérebro humano para poder atuar, pois esse órgão representa um fator determinante da ca- pacidade de aprendizagem de uma criança. 3.6.1. Nesse sentido, qual é a importância de en- tender-se o funcionamento do sistema nervoso de uma pessoa? O que chamamos de sistema nervoso é um conjunto de órgãos altamente especializados, res- ponsáveis pela vida mental, emocional e relacional do indivíduo, bem como pelo controle do funciona- mento de diversos outros órgãos. A atividade nervosa é fundamental para o ani- mal viver em equilíbrio com o meio externo. Basta haver uma relação de ação e reação para que se con- figure uma atividade nervosa. O conhecimento das bases neuropsicológicas que possibilitam aquisição das competências cogniti- vas fará o educador aumentar a qualidade e eficiência de sua função. Muito mais que esse conhecimento advindo da neurociência permite diminuir o impacto negativo das dificuldades de aprendizagem em crian- ças e jovens. 3.6.2. Quais são as principais funções do siste- ma nervoso? Suas funções principais são cognitivas, de mo- tricidade e equilíbrio, sentidos e sensibilidade, bem como o controle do meio interno na respiração, cir- culação, batimento cardíaco e articulação. Para entender o alcance de suas funções, é im- prescindível entender como a cognição e a consciên- cia humanas nascem da atividade do cérebro, assim como dominar a sequência, pela qual ocorrem os eventos da criança, no seu processo de aprendizagem. Abaixo, encontramos alguns pré-requisitos para que a aprendizagem ocorra baseada nos estudos de Piaget e na Psicologia Cognitiva que, hoje, são fru- tos de investigações neurológicas recentes, sobre o funcionamento cerebral. Estes estudos permitem en- tender o desenvolvimento da criança de forma mais abrangente. Vale ressaltar que, até meados do século passado, apenas se intuía como o cérebro funcionava. Pretendemos refletir um pouco sobre esses es- tudos e descobertas neurocientíficas e levá-las para a sala de aula, pois é o pedagogo responsável pela tur- ma, que irá fornecer o complemento deste trabalho com estratégias de ensino. 3.6.3. Como a emoção interfere no processo de aprendizagem? Por meio de um tomógrafo, foi observada a re- lação entre a ativação da amídala (parte importante do sistema nervoso do cérebro) e o processo de for- mação da memória. “Quanto mais emoção contenha determinado fenômeno, mais ele será gravado pelo cérebro,“ diz Iván Izquierdo, médico, neurologista e coordenado do Centro de Memória da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. O psicólogo Jean Piaget, em seus estudos, já va- lorizava o termo afetividade como influência positi- va ou negativa nesse processo, podendo acelerar ou atrasar a aprendizagem, como vimos anteriormente. Os professores, quando adotam uma postura de escuta e de acolhimento, ao observar as emoções dos alunos, podem perceber como o meio, a escola está afetando o dia a dia de seus alunos, e terão opor- tunidade de reverter um prognóstico negativo, que não favoreça a aprendizagem. 3.6.4. Por que precisamos de motivação para aprender? Dopamina no comportamento: procurando a recompensa do prazer A Dopamina é o produto químico que ne- gocia o prazer no cérebro. É liberada du- rante situações agradáveis e estimula um procurar a atividade ou a ocupação agradá- vel. Isto significa que o alimento, o sexo, e diversas drogas de abuso são, igualmen- te, estimulantes da liberação da dopamina no cérebro, particularmente nas áreas tais como, os accumbens do núcleo e o córtice pré-frontal. (www.news-medical.net) Estudos comprovam que no cérebro exis- te um sistema dedicado à motivação e à recom- pensa. Quando o aluno é afetado de forma po- sitiva por algum fenômeno, a região responsá- vel pelos centros de prazer produz uma subs- tância chamada dopamina* que gera sensação de bem–estar e mobiliza a atenção reforçando seu comportamento em relação ao objeto que a afetou. Por outro lado, tarefas muito difíceis ou muito fáceis podem desmotivar e frustrar o cérebro, que não se mobiliza plenamente para execução desse tipo de atividade, por não obter prazer do sistema de recompensa. Para Piaget, motivação: “é a procura das respostas quando a pessoa esta diante de uma situação que ainda não consegue resolver”. A escola deve ser um espaço que motive e não se ocupe somente de transmitir conteúdos. As ativi- dades devem ser preparadas para despertar a criati- vidade e o interesse dos alunos, para isso precisam ser condizentes com suas condições, com sua faixa etária etc.. Só, dessa forma, serão capazes de lhes despertar a curiosidade e, consequentemente, movê- -los a realizá-las, a ir além, enfrentando desafios, fa- zendo perguntas e procurando respostas. 3.6.5. Qual é a importância da atenção para que a aprendizagem ocorra? Diversas pesquisas ligadas à neurociência mos- tram que o sistema nervoso central só processa aquilo para que esteja atento. Quando, por falta de interesse e motivação, o desvio de atenção é signi- ficativo, a aquisição de habilidades e a memorização dos conteúdos sofrem prejuízos. Para Piaget, prestamos atenção desde que o que nos está sendo apresentado, tenha um significado para nós e represente uma novidade. Em síntese, se há um desafio e se for possível estabelecer alguma relação entre o elemento novo e o que já se sabe, a atenção é despertada. Os educadores podem conquistar melhores re- sultados nas atividades escolares, na medida em que conseguem ter uma visão autocrítica de seu trabalho pedagógico, ou seja, conseguem desvincular a falta de atenção de seus alunos, com o rótulo de desinteresse, ou como sinônimo de indisciplina. A falta de atenção comumente pode ser decorrência de um ambiente de- sestimulante e inadequado. A indisciplina escolar pode estar relacionada diretamente a propostas de atividades completamente desprovidas de desafio e significado. 3.6.6. Como favorecer a fixação de novos co- nhecimentos na memória dos alunos? A fixação de um novo conhecimento na me- mória ocorre mais efetiva e naturalmente, quando a nova informação é associada a um conhecimento prévio. Nesse sentido, é fundamental perceber e va- lorizar o meio cultural dos alunos e sua experiência. A ativação de circuitos neurais se dá parte por sequência de associações: uma rede é ativada por outra e, assim, sucessivamente. Quanto mais fre- quentemente isso acontece, mais estáveis e fortes tornam-se as conexões sinápticas, tornando mais fácil a recuperação das informações pela memória. Todo esse movimento cerebral dá-se por repetição da informação ou, pela associaçãodo novo dado a conhecimentos, já adquiridos. Aprender não é só memorizar informações, é se apropriar delas. Fazer com que as informações se tornem suas. Para isso, é preciso saber relacio- nar uma informação nova com uma já conhecida, adaptá-las, ressignificá-las e refletir sobre elas. Cien- te, dessa forma, do funcionamento do cérebro, o professor na sua prática pedagógica pode conquistar bons resultados, encorajando seus alunos e dando- -lhes condições para que possam construir para si um sentido sobre o tema a ser aprendido. 3.6.7. O que é plasticidade cerebral? O cérebro modifica-se com o meio durante toda a vida, chamamos isso de plasticidade cerebral. A interferência do meio, no sistema nervoso, causa mudanças anatômicas e funcionais no cérebro, desenhando e redesenhando uma complexa rede conectiva. Assim, a quantidade de neurônios e as conexões entre eles, as chamadas sinapses, mudam incessantemente ao longo da vida de acordo com as experiências pelas quais a pessoa passa. Em seus estudos, Piaget mostra que a influência do meio tem importância, na medida em que “para um estímulo provocar certa resposta, é necessário que o indivíduo e seu organismo sejam capazes de fornecê-la, não basta ter um meio que provoque, se a pessoa não participar dele e interagir”. “Causar emoções, controlar a temperatura do nosso corpo, a pressão arterial, a respiração. Receber e ge- renciar milhares de informações vindas das emoções, dos sentidos, do sistema imunológico. Controlar o andar, o correr, o falar, o dançar, o raciocinar, o so- nhar, o imaginar. Registrar memórias e usá-las para planejar o futuro. Todas essas tarefas e muitas outras mais são tarefas controladas pelo cérebro.” (Neuroci- ência na Educação, direção Carlos Cavalheiro Filho – Cedic – 2010) Na escola, os alunos devem ter papel ativo no seu processo de aprendizagem. Para isso, cabe aos professores a tarefa desafiadora de orientar e forne- cer condições para que as crianças e jovens exerçam e desenvolvam suas potencialidades. 1. Quais são as contribuições da Neurociência para a aprendizagem? 2. Explique a afirmação: “Para que o conhecimento possa ser elaborado, é necessário que seja compre- endido nos aspectos que variam, e nos aspectos que se mantêm constantes”. 3. Cite exemplos que já vivenciou/observou para cada fase do desenvolvimento estudado por Piaget. 4. Segundo Piaget, quando o sujeito tem noção de conservação? Exemplifique. 5. Que dificuldades pode apresentar na escola uma criança de 6 a 7 anos com dificuldades para reali- zar provas de conservação (quantidade descontínua com pequenos conjuntos)? Questões Gabarito 52 53 Unidade 3 1. Quais são as contribuições da Neurociência para a aprendizagem? A neurociência busca uma integração entre a prá- tica pedagógica e o entendimento da neurologia da aprendizagem. Para contornar as dificuldades de aprendizagem e ensinar uma criança, é necessária uma investigação de como ela aprende e de como aprendeu a aprender. O cérebro humano representa um fator determi- nante da capacidade de aprendizagem. O conhe- cimento das bases neuropsicológicas que possibi- litam aquisição das competências cognitivas fará o educador aumentar a eficiência de sua função. Esse conhecimento permite diminuir o impacto negativo das dificuldades de aprendizagem. 2. Explique a afirmação: “Para que o conhecimento possa ser elaborado, é necessário que seja compre- endido nos aspectos que variam e nos aspectos que se mantêm constantes”. Para que um conhecimento seja elaborado e com- preendido nos aspectos que se variam e se mantêm, é necessário que se consiga identificar, na transfor- mação do fenômeno ou do objeto, o que não se al- 54 tera (a constância) e/ou resgatar o todo sem deixar de aprender simultaneamente as partes articuladas a esse todo. 3. Cite exemplos que já vivenciou/observou para cada fase do desenvolvimento do estudo de Piaget. • Fase sensório-motora: é possível e identificar a voz da mãe em relação a outros sons diferentes. • Pré-Operatório: Todos que cuidam da criança (avó, avô, mãe, pai) são “mamãe”. • Operações concretas- Possível entender que a mãe, quando sai do campo de visão da criança, não desa- parece definitivamente, ou seja, ela vai retornar. • Operações formais: Na adolescência, elaboram- -se estratégias mentalmente para conquistar o que se quer. 4. Segundo Piaget, quando o sujeito tem noção de conservação? Exemplifique. Para Piaget, o sujeito tem noção de conservação quando, ao entrar em contato com qualquer fenô- meno, apreende o que se mantém nas transforma- ções apesar das alterações. Exemplo: • Fase sensório-motora: percepção de objetos, sons e cores. • Pré-operatória: percepção de algumas proprieda- 55 des básicas das classes: tudo que tem rabo é gato. • Operações concretas: relações para classificação e seriação concretas. Exemplo: eu transformo uma massa de modelar em bola ou cobra, e a quantidade permanece constante. No campo afetivo, consegue superar o egocentrismo, com o olhar para si e para o outro, mantendo um diálogo complementar. • Operações formais: chega a conclusões hipotéti- cas, explica um fenômeno, algo abstrato e com al- ternativas saindo das limitações da experimentação. 5. Que dificuldades pode apresentar na escola uma criança de 6 a 7 anos com dificuldades para reali- zar provas de conservação (quantidade descontínua com pequenos conjuntos)? Esta criança possivelmente encontra dificuldades rela- cionadas à formação de conceitos abstratos, como se dissermos: pense em um objeto que é quadrado. Ela consegue representar mentalmente a figura de um qua- drado, mas encontrará maior dificuldade em articular as variáveis, como a figura de uma mesa quadrada. Referencias ^ 58 59 BATRO, Antônio M. Dicionário terminológico de Jean Piaget. Ed. Pioneira. São São Paulo 1974. CIASCA, S.M. & ROSSINI, S.D.R.: Distúrbio de aprendizagem: mudanças ou não? Correla- ção de uma década de atendimento. Temas so- bre desenvolvimento, artigos 8 (48): 11-16, 2000. DAVIS, Ronald. O Dom da Dislexia. Editora: Rocco. São Paulo, 2004. DOLLE, Marie Jean. Para compreender Jean Piaget. Uma iniciação à Psicologia Genética Piagetiana. 4.ª edição. Guanabara. Koogan 1974. FRIED, Dora. Novos paradigmas, cultura e subjetividade. Porto Alegre: Artmed, 1996. FAGALI, Eloísa Q. Múltiplas faces do apreen- der. Novos paradigmas da pós-modernidade. São Paulo: Unidas Ltda, 2001. FERNANDEZ, Alícia, a Inteligência Aprisio- nada. Porto Alegre: Artmed, 1991. 60 FONSECA, V. Introdução às dificuldades de aprendizagem. 2.ª ed. 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