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Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - USP Curso de Graduação em História América Colonial – Profº Dr. Dario Horacio Gutiérrez Gallardo Millena Benicio Silva Aulas: ● Escravos no Caribe ● Colonização dos EUA Textos: ● A formação e a estrutura econômica da Hacienda na Nova Espanha – Enrique Florescano ● O açúcar e a escravidão no Caribe nos séculos XVII e XVIII – Herbert S. Klein ● A fase colonial dos EUA – Merril Jensen FICHAMENTO DAS AULAS ➢ Escravos no Caribe Ao iniciar a aula, o professor Horacio apresentou um roteiro dividido em quatro partes para a ministração do conteúdo cujo tema é Açúcar e Escravos no Caribe; a primeira parte ocupou-se em discorrer a Geografia do Caribe, a segunda Tráfico Negreiro, a terceira sobre a Colonização do Caribe e a quarta e última parte as Interpretações. ● Geografia do Caribe Do ponto de vista geopolítico, o Caribe foi uma importante região econômica e política durante os séculos de colonização, haja vista a exportação de produtos tropicais, como cana-de açúcar e tabaco, além do intenso fluxo do tráfico de escravos para os países que compõem esse território; o primeiro contato dos europeus com o Novo Mundo aconteceu nesta área do continente americano. Contrastando este cenário, as nações da região caribenha exercem pouca influência geopolítica. Com a utilização do apoio de um mapa, o professor expôs características das ilhas que integram o Caribe. No estudo da geografia dessa região, encontra-se uma divisão política em Pequenas Antilhas e Grandes Antilhas, que, como o nome sugere, os grupos reúnem as ilhas menores e as ilhas maiores e com maior destaque, respectivamente. Das características, foi ainda comentada a atual situação dessas ilhas, isto é, se hoje são repúblicas independentes ou se configuram como territórios ultramarinos. ○ As ilhas de Aruba, Curaçao até hoje são colônias holandesas, considerando-as como territórios ultramarinos; ○ As ilhas de Guadalupe e Martinica até hoje são colônias francesas, sendo consideradas como territórios ultramarinos; Uma colônia francesa na região do Caribe que conseguiu sua independência foi o Haiti; ○ As ilhas de colonização britânica declaram suas independências entre as décadas de 60 e 70 do século XX, podendo citar como exemplo Trinidad e Tobago, Grenada, Bahamas, Jamaica e Barbados – que teve um grande destaque enquanto colônia inglesa por ter sido muito próspera no comércio de açúcar; A Inglaterra ainda possui territórios ultramarinos no Caribe, como Anguilla, Montserrat, Bermudas e Ilhas Virgens Britânicas. ● Tráfico Negreiro Para início de discussão deste tema, foi apresentada uma tabela que continha estimativas do número de escravos que foram traficados entre os séculos XV a XIX, dados que foram mapeados por Philip Curtin. É expressamente notável a discrepância entre o número de negros que foram transferidos à força para a Europa e para a América, o primeiro continente corresponde somente a 1,8%, ou 175 mil; já o segundo, especialmente as Antilhas e o Brasil, possuem uma concentração de 77,8% dessa migração forçada de africanos transformados em mão-de-obra escrava. Ainda segundo a tabela, a região das Antilhas, que foi colonizada por espanhóis, britânicos, franceses e holandeses, recebeu quase quatro milhões de escravizados traficados nesse período, cerca de 39,7% do número total. É possível compreender a partir dos dados citados o quanto o comércio e o tráfico de negros foi lucrativo – a lucratividade desse empreendimento desumamo é um dos argumentos que sustentam a tese da existência da escravidão. Em outras palavras, é a partir do tráfico negreiro que se pode entender a escravização africana colonial, e não ao contrário – a rentabilidade do comércio dos próprios escravos explica a adoção da escravidão africana na América como força de trabalho. Em 1807, a Inglaterra passa a proibir o tráfico negreiro, mas não a escravidão, e pressiona para que as outras potências também proíbam. Nessa época, os EUA, já independentes, apoiaram a decisão da nação britânica. ● Colonização do Caribe Os holandeses eram poderosos parceiros comerciais da América Portuguesa e, consequentemente, de Portugal, mas eram inimigos declarados da Espanha, por questões político-religiosas e guerra de independência. No final do século XVI, Portugal e Espanha passaram a ser governados pelo mesmo monarca, iniciando, assim, um período que ficou conhecido como União Ibérica, que foi de 1580 a 1640. As possessões portuguesas na América e na África estariam seguras e fora do ataque dos holandeses – pois, como já foi dito, Portugal e Holanda eram parceiros no comércio do açúcar –, se os espanhóis não tivessem interferido: as embarcações da nação hispânica atacaram barcos holandeses que se destinavam à colônia portuguesa na América. Com isso, os holandeses, no ano de 1621, criaram a Companhia das Índias Ocidentais com os objetivos de competir com os lusitanos e atacar suas propriedades no continente africano e americano. No ano de 1630, a Holanda consegue tomar posse, inicialmente, de Recife, e depois inicia uma expansão pelo nordeste, tornando-se assim um importante distribuidor de açúcar. Em 1654, os portugueses conseguem retomar o controle do nordeste e expulsam de sua colônia americana os holandeses, porém, como eles obtiveram 24 anos de experiência na América Portuguesa, partem para o Caribe levando o conhecimento adquirido no comércio do açúcar e no tráfico de escravos, e a tecnologia para a produção. Em poucas décadas já é possível notar as consequências promovidas pela chegada dos holandeses no Caribe. Como uma dessas consequências pode-se citar a mudança na demografia das ilhas caribenhas, até então o número de brancos era muito superior, em pouco espaço de tempo, a população negra, vendida a crédito como mão-de-obra escrava para os colonos britânicos e franceses, chegou a uma proporção de 10 para 1. Outra consequência resultou no fim do monopólio do açúcar português, posto que a região das Antilhas, após a chegada dos holandeses, tornou-se uma grande concorrente do açúcar da América Portuguesa. ● Interpretações Existem diversas interpretações historiográficas sobre o período da colonização e o modo de produção usado nesses séculos de dominação europeia. Esse tema foi muito estudado segundo a visão marxista, predominante na época, pelos historiadores da década de 60 e 70 do século XX. Um trabalho de grande notoriedade é a obra O escravismo colonial feita por Jacob Gorender, sua relevância se dá porque o autor estuda o assunto utilizando o sistema que Karl Marx usou para o estudo do capitalismo, isto é, entender qual a dinâmica e as leis que operam o sistema escravista com recorte colonial, para diferenciar da escravidão aplicada na Idade Antiga. ➢ Colonização dos EUA Ao iniciar a aula, o professor Horacio explicou que o objetivo da aula era entender a historiografia norte-americana sobre o período colonial dos Estados Unidos. Um adendo a ser feito: o conteúdo que compõe esse tema é majoritariamente escrito por norte-americanos. Uma característica importante a ser ressaltada é a que a região, onde atualmente corresponde aos Estados Unidos da América, foi ocupada pelos conquistadores espanhóis, franceses e ingleses. Com essa afirmação, é possível questionar-se do por que o desenvolvimento foi diferente das colônias caribenhas ou até mesmo da América Espanhola? ● Periodização Sendo essa uma questão que causa divergências entre os historiadores, as datas que marcam a colonização são adotadas de forma convencional, isto é, a periodização ocorre para auxiliar no estudo da história. Adota-se o ano de 1607 como início da fase histórica de colonização dos EUA, pois foi quando os estrangeiros chegaram no território que batizaram com o nome de Virgínia. Assim como em diversas regiões do continente americano, houveram expedições anteriores de reconhecimento, mas, segundo essa visão historiográfica, nada de importante aconteceupara que se consolidasse como um marco. Para alguns autores estadunidenses, o período colonial dos EUA termina no ano de 1775, quando ocorreu a primeira batalha da luta pela independência; para outros, o marco final da colonização britânica é o ano de 1776 com a Declaração de Independência, promulgada no dia 4 de julho, sendo também uma data convencional. Ainda nessa questão, outro potencial marco para o fim da colonização dos EUA poderia ser o tratado de paz assinado em 1783, declarando o fim das guerras de independência. ● Semelhanças entre a colonização dos EUA e da América Espanhola Por mais que algumas regiões da América do Norte tenham sido exploradas pelos espanhóis, a colonização britânica nessa região foi quem obteve destaque, além de um desenvolvimento diferente daqueles encontrados nas colônias espanholas e inglesas no Caribe como na América Espanhola. Apesar das diferenças, que serão pontuadas mais a frente, existem semelhanças encontradas no contexto denominado colonização. Pode-se apontar como semelhanças gerais entre as colonizações: 1) o governo da metrópole tomava decisões sem consultar as opiniões dos colonos – uma característica válida para todas as colônias da América; 2) as metrópoles estavam interessadas no desenvolvimento das colônias desde que atendessem seus interesses econômicos – tratavam-nas como subordinadas às suas necessidades comerciais e financeiras; 3) a metrópole considerava as populações da colônia como inferiores – os colonos nascidos na colônia eram vistos como verdadeiros vassalos. ● Diferenças entre a colonização dos EUA e da América Espanhola As diferenças dos sistemas coloniais podem ser resumidas através de “conceitos-chaves”: modelo de administração e experiência de governo, questão religiosa na colônia, questão agrária e imigração de colonos. Das diferenças citadas acima, a primeira delas caracteriza-se praticamente como oposta entre as Américas Espanholas e Portuguesas e as Treze Colônias. Nas Américas, o governo da metrópole, Portugal e Espanha, era quem gerenciava o desenvolvimento da colônia de forma a sustentar seus interesses econômicos. No caso da América Espanhola, o modelo de administração usado para gerir a área conquistada abrangia uma divisão territorial em 4 partes, chamadas de vice-reinos, que eram governados por um representante direto do rei, o vice-rei. Em contraste deste cenário, havia liberdade de organização política nas Treze Colônias, especialmente em comunidades locais, onde os representantes se ocupavam na construção de soluções, sem interferência da coroa inglesa. Tira-se de conclusão que os Estados Unidos, mesmo na sua época colonial, tiveram uma experiência de governo democrática incipiente. A questão religiosa na América Espanhola foi marcada principalmente pela intolerância, visto que a única religião permitida na colônia era o catolicismo pregado na Igreja Católica. Para a efetivação dessa religiosidade na colônia, foram criadas as Missões, as Ordens Religiosas, além de um aparato judicial, como a Inquisição, trazido da Europa para a América. Já nas Treze Colônias, a tolerância religiosa foi o ponto central, apesar de existir um número maior de protestantes, a prática de outras religiões e crenças era de livre culto. A liberdade religiosa foi fundamental para a atração de imigrantes, como por exemplo, os judeus, mas, além dessa, outra característica que contribui para a atratividade foi a promessa de distribuição de terras, desenvolvendo assim pequenas propriedades produtoras. Observa-se o contrário na América Espanhola, visto que a concentração das terras e os grandes latifúndios foram marcantes na questão agrária. Por fim, a imigração de colonos também acontecia de forma diferente, o governo espanhol possuía rígidos códigos sobre a imigração, a exemplo, era necessária uma autorização da coroa para vir à América. Já no caso das Treze Colônias, o governo inglês até incentivava a transumância da Europa para à América do Norte, não só de ingleses, mas de outras “nacionalidades”, visto que esse conceito no contexto abordado ainda não estava formado. FICHAMENTO DOS TEXTOS ➢ Texto 9a: A formação e a estrutura econômica da Hacienda na Nova Espanha – Enrique Florescano O capítulo faz um panorama histórico de como se deu a construção da estrutura econômica da Hacienda na Nova Espanha, passando pelos pontos chaves que estão divididos em tópicos, sendo eles: a transformação econômica, a distribuição da terra, a mão-de-obra, a comercialização e o crédito. Ao ler o texto, é possível notar que o autor constrói as ideias seguindo uma lógica cronológica dos acontecimentos. ● A Transformação Econômica O início deste tópico traz a agricultura como o tema principal a ser discorrido, explicando a sua relação com o desenvolvimento econômico e a ocupação do território mesoamericano. É fato que em toda história da humanidade e das civilizações, inclusive nas americanas, a agricultura mudou a forma com a qual o ser humano se relaciona com o território, provocando uma verdadeira revolução. O autor complementa que nessa região uma segunda revolução ocorreu décadas após a conquista dos espanhóis, uma vez que estes colonizadores introduziram sua cultura comercial: trouxeram para a América espécies exóticas de plantas e animais que acabaram dominando o cenário. Ainda sobre a agricultura, o plantio da cana-de-açúcar configurou-se também como um instrumento de grande transformação no espaço físico – posto que era necessárias grandes extensões de terra e quantidades de água –, e social – pois este empreendimento estava associado com altos investimentos, portanto, restrito aos ricos. Hernán Cortés foi um dos pioneiros da cana-de-açúcar. Exemplificando melhor, o autor conta que “O custo estimado de um engenho de açúcar novo, no fim do século XVI, era de 50 mil pesos ou mais." (FLORESCANO, 2012, p. 152). O autor segue descrevendo o mecanismo que promoveu maior impacto na Nova Espanha: a importação de gado. A adaptação dos animais trazidos surpreendeu até mesmo os conquistadores. Em pouco espaço de tempo povoaram a região. A partir de 1540, os rebanhos começaram a seguir a rota dos exploradores de prata, conquistando novas áreas para reprodução e multiplicação de suas populações, ato que conseguiram sem dificuldades partindo do ano de 1550, quando chegaram nas planícies semiáridas ao norte do Bajio (FLORESCANO, 2012). A relação entre nativos mesoamericanos com os animais europeus pode ser considerada estreita. Na medida em que porcos, ovelhas, cabras e galinhas passaram a fazer parte da dieta alimentar dessas populações, esses animais europeus, ao dominarem o território, invadiram as regiões povoadas pelos indígenas, tendo como consequência a destruição das áreas de plantação, que seguia um sistema de cultura em campo aberto, e na redução das fontes de alimento dos nativos, posto que estes animais transformaram em áreas para pastagem. Havia duas divisões no que se refere à criação de gado: ganado mayor e ganado menor, sendo o primeiro específico para animais como vacas, cavalos e mulas, e o segundo para animais de porte menor, como ovelhas e cabras. O primeiro grupo, ganado mayor, adaptou-se perfeitamente em regiões onde a população indígena era menos densa: nas terras tropicais, onde as epidemias haviam aniquilado os nativos. ● A Distribuição da Terra No primeiro momento da distribuição das terras, os espanhóis não estavam interessados na agricultura, pois “a produção nativa de alimentos era mais do que suficiente para satisfazer a demanda. ” (FLORESCANO, 2012, p. 156). Com o intuito de fazer os conquistadores se interessarem pela agricultura, Hernán Cortés fez uma divisão de duas ordens, entregando pedaços de terras para os homens que participaram da conquista, os lotes eram chamados de peonías, para os que compunham a infantaria, e caballerías, para soldados da cavalaria. Anos mais tarde, foram realizadas distribuições regulares, com o objetivo depreservar a terra conquistada. Foi autorizado aos cabildos, que era o conselho da cidade, “a fazer concessões de terra a quem quer que desejasse estabelecer-se permanentemente.” (FLORESCANO, 2012, p. 156). Como consequência disso, muitas vilas e vilarejos foram fundados. Já em um segundo momento, em meados do século XVI, os espanhóis despertaram interesse pelas práticas agrícolas, dessa forma, passaram a solicitar extensos lotes de terras. Por conta das epidemias que assolaram e dizimaram a população indígena entre os anos de 1545-1547 e 1576-1580, houve uma intensa distribuição de terras nos anos de 1553 a 1563 e, posteriormente, outra entre os anos de 1585 a 1595. A transferência de tribos indígenas para outras regiões foi outro fator que contribuiu para a liberação de milhares de hectares que também foram distribuídos aos colonizadores. Com a descoberta das minas de prata, houve uma intensa migração de colonos para essa região, com isso, foi necessário que surgissem novas fontes de produção de alimento para atender a demanda, atraindo para a região velhos e novos colonizadores. Esse fator somado à alta dos preços dos alimentos e às quantidades de terras disponíveis fomentaram para a formação de haciendas e estancias mistas – a diferença era que esta unia a agricultura e a criação de gado –, com o objetivo de abastecer e suprir as necessidades das áreas de mineração. Por fim, a forma mais comum de ampliação dos domínios territoriais era a ocupação de uma determinada terra que não possuía um título legal. Porém, já no final do século XVI e início do século XVII, a coroa espanhola começou a regularizar esse processo para a aquisição de novas terras. A maioria das grandes propriedades adquiridas pela Igreja foram regularizadas por conta de uma ordenança de 1591, onde o proprietário, tendo adquirido terras de modo ilegal, poderia torná-la legal através de um pagamento ao tesouro, chamado por composición. ● A Mão-de-Obra Com a atração da mineração de prata, rapidamente os mercados urbanos foram se formando em volta das haciendas, estruturas que alimentavam essa demanda. Com o sucesso da atividade mineradora, logo a hacienda se transformou em uma unidade econômica e social, ou, até mesmo, em uma unidade de produção independente, sendo a base para a construção de uma população e criando um sistema capaz de administrar a mão-de-obra, porém, para chegar nesse estágio de estabilidade, foi necessário atravessar vários processos que acabaram por durar mais de um século. Na primeira parte, pode-se dizer que os indígenas foram submetidos a um sistema de exploração compulsória, porém temporária, onde os encomenderos poderiam utilizar suas forças de trabalho. O regime de trabalho temporário não atendeu a necessidade de trabalho esperado pelos espanhóis, dessa forma, buscaram introduzir a escravidão, sendo ela indígena ou africana, na Nova Espanha. Em 1548, a escravidão indígena foi proibida resultando em uma nova “classe”, os naborias, que trabalhavam nas haciendas ou minas em troca de salário. Uma mudança importante ocorreu nesse período: o tributo só poderia ser pago em dinheiro ou em produtos agrícolas, como milho ou trigo. Com isso, os indígenas tiveram que ser empregados em empreendimentos espanhóis, como as minas ou as próprias haciendas. Como forma de manter essa mão-de-obra permanente e presa ao negócio, os proprietários realizavam acordos com os trabalhadores, podendo apontar como o mais famoso deles o pagamento do tributo anual ao tesouro real no lugar do indígena, ou então “pagar as taxas que os trabalhadores deviam ao padre da paróquia por casamentos, funerais e batismos” (FLORESCANO, 2012, p. 167). Referência: FLORESCANO, Enrique. A formação e a estrutura econômica da Hacienda na Nova Espanha. Em: História da América Latina: A América Latina Colonial, São Paulo: Edusp, 2012. V. II, cap. 4, p. 151-186 ➢ Texto 10: O açúcar e a escravidão no Caribe nos séculos XVII e XVIII – Herbert S. Klein O objetivo deste capítulo é fazer uma descrição cronológica e comparativa de como sucedeu a escravidão africana nas ilhas colonizadas pelos ingleses, franceses e espanhóis, que atualmente correspondem ao território do atual Caribe. Em paralelo, o texto traz também uma breve introdução da relação dos holandeses com a América Portuguesa e como esse povo prosperou com o empreendimento do açúcar, levando suas técnicas para as novas colônias dos colonizadores do Norte da Europa. ● Companhia das Índias Ocidentais Esse empreendimento de gênese holandesa foi responsável por grandes mudanças na produção de açúcar, no regime escravocrata e no território que viria ser o Brasil, a partir da tomada de terras na América e no controle do comércio de escravos na África; explicando melhor os dois últimos itens, o domínio holandês no tráfico de escravos fez com que as províncias da américa portuguesa sofressem um déficit em relação à mão-de-obra escravizada negra; para contornar tal situação, ascenderam as figuras dos bandeirantes paulistas, que adentraram regiões interioranas do território em expedições cujo objetivo era encontrar e capturar tribos indígenas e vendê-las como mão-de-obra escrava, sendo assim, a escravidão indígena sofreu uma revitalização, uma vez que nunca entrou em desuso, mas apenas a sua procura acontecia em menor escala. ● Colonização no Caribe e os holandeses Após Pernambuco ter sido invadido e colonizado pelos holandeses, mesmo que por tempo relativamente curto, houve mudanças no comércio de açúcar, podendo apontar como a principal o fim do monopólio “brasileiro” nesse segmento. Um dos motivos pelo qual a América Portuguesa perdeu seu lugar de destaque foi a expulsão dos holandeses de seu território que, tendo dominado as técnicas de plantio de cana-de-açúcar, implantaram seu sistema, constituído por modernos equipamentos de moagem, em colônias inglesas e francesas na região do Caribe. Além disso, os agricultores holandeses que que tiveram experiência em Pernambuco foram realocados para as ilhas do Caribe, como Barbados, Martinica e Guadalupe. Essa movimentação tornou-se mais intensa quando, em 1654, Pernambuco e Olinda foram reconquistadas pelos portugueses. A colonização das Pequenas Antilhas representou o grande primeiro desafio para o mundo ibérico conquistador, porque finalmente havia concorrentes à altura: franceses e ingleses, com apoio das técnicas dos holandeses, colonizaram ilhas até então não exploradas. A primeira "commodity" de grande êxito comercial plantada nessa região da costa nordeste da América do Sul foi o tabaco, tornando-se, ao lado do índigo, os principais produtos de exportação. O açúcar, apesar de ter sido implantado logo no início, não obteve um bom retorno até a chegada dos holandeses e suas técnicas de produção. ● Colonização no Caribe e os escravizados No que diz respeito à população de negros escravizados nas colônias caribenhas, um ponto é importante de evidenciar: os escravos estiveram presentes desde o início da colonização francesa e britânica nessa região, mas em número consideravelmente menor. A explicação para tal fato é que os colonizadores dessa região, a princípio, tentaram colonizar essas ilhas com trabalhadores brancos e europeus. Para exemplificar melhor, o censo realizado na ilha de Barbados, colonização inglesa, consta que, em 1645, havia uma população branca de mais de 18 mil homens e aproximadamente 6 mil escravos. A chegada da Companhia das Índias Ocidentais e dos holandeses muda esse cenário, trazendo novas técnicas para plantio do açúcar, importação de maquinário e moinhos e, especialmente, crédito para adquirirem escravos africanos. A consequência desses fatores pode ser notada em poucas décadas, já nos anos 70 do século XVII, pela primeira vez na história da colonização dessa ilha, a população negra havia ultrapassado a branca. No ano de 1680, de acordo com o censo realizado, constatou que havia 37 mil escravos na ilha, sendo a maioria nascidos naÁfrica, posto que os navios negreiros levavam mais de mil escravos por ano. Seguindo o exemplo de Barbados, a ilha de Martinica, colonizada pelos franceses, também passou por um processo semelhante. No início, a população branca era predominante e a mão-de-obra mais utilizada era a dos trabalhadores brancos europeus. Após a chegada dos holandeses, que trouxeram para a ilha técnicas de engenhos de açúcar eficientes, houve grandes mudanças nesse panorama, sendo uma delas no número de escravos, chegando a 20 mil no ano de 1683, que foram trazidos da Senegâmbia, região situada na África, por comerciantes franceses. Tal fluxo comercial de escravizados negros provindos da África, descrito nos parágrafos anteriores, resultou em uma intensa migração forçada dos povos africanos que foram realocados nas colônias americanas dos ingleses e franceses, uma estimativa que aponta mais de 450 mil africanos. Em uma comparação, o Caribe “não-ibérico” ocupa o segundo lugar neste comércio em número de escravizados trazidos para a América, ficando atrás apenas do Brasil, que recebeu entre 500 mil a 600 mil. Referência: KLEIN, Herbert S. O açúcar e a escravidão no Caribe nos séculos XVII e XVIII. Em: KLEIN, Herbert S. A escravidão africana na América Latina e Caribe. São Paulo. Brasiliense, 1986. p. 58-81 ➢ Texto 11: A fase colonial dos EUA – Merril Jensen O autor do capítulo em questão tem por objetivo mostrar como o passado colonial contribuiu na formação e na história das nações do Novo Mundo , discorrendo sobre os modos de colonização europeia no continente americano e comparando-os. Fica evidente ao longo da leitura que o seu foco está em mostrar como o passado colonial formou o que as nações são hoje e, para isso, ele aponta as semelhanças e diferenças dos sistemas implantados nas Américas Portuguesa e Espanhola, com ênfase na espanhola, e na colonização britânica da América do Norte, especialmente no território que viria a ser os Estados Unidos da América. No início, o autor apresenta a tese de que o passado colonial exerceu e ainda exerce influência em diversos âmbitos, seja social, econômico ou político, nos países que hoje, independentes, compõem o continente Americano. Ele continua dizendo que todas as colônias tinham uma característica em comum: contribuir para a prosperidade de sua metrópole. Configurando-se como uma exceção, uma das colônias do Novo Mundo desenvolveu suas próprias particularidades impactando de forma direta na construção da nação independente que viria a se tornar a partir do ano de 1776. Para isto, o autor pontua em seu texto essas particularidades que transformaram as Treze Colônias Americanas nos Estados Unidos da América. O primeiro tópico que Jensen analisa relacionando as colônias da Espanha e as Treze Colônias é a questão da emigração europeia para a América. No caso da primeira, o governo espanhol não permitia a livre transferência de espanhóis de um continente a outro, para isto era necessária uma autorização para deixar a Espanha. Em contrapartida, a colonização britânica na América do Norte aconteceu com maior liberdade, uma vez que o governo inglês não interferiu nos processos, entre eles, na migração, pelo contrário! Com isso, os Estados Unidos ganharam fama de ser uma terra de possibilidades. Importante ressaltar que no século XVIII, migraram para essa região alemães, judeus, irlandeses, escoceses e suíços. O segundo tópico trazido pelo autor é sobre a religião e a liberdade de culto. A Igreja Católica tinha uma relação extremamente próxima com as colônias espanholas – como prova desse relacionamento tem-se as Ordens Religiosas, o envio de padres e jesuítas às colônias, além das missões de catequização e conversão dos povos nativos. Com isso, a liberdade religiosa era uma ideia inexistente, visto que a única religião permitida era a Católica; aqueles que professavam outra fé poderiam ser submetidos a punições. Do contrário aconteceu no lugar que viriam a ser os Estados Unidos, uma das possibilidades que essas colônias permitiam era a liberdade religiosa, sendo este um dos pilares que mais atraíram imigrantes, vide o contexto de guerras político-religiosas na Europa. Outro detalhe importante que é posto em questão é a política administrativa. Na colonização espanhola, a região conquistada foi dividida em quatro vice-reinos, cada um [dos vice-reinos] era governado por uma figura que detinha poder absoluto chamado de vice-rei. Durante a colonização este sistema pode até ter tido uma experiência administrativa positiva, mas quando essas regiões se revoltaram com o objetivo de tornar-se uma nação independente, elas não tinham experiência de governo próprio, como afirma o autor. Como foi dito acima, o governo inglês pouco interferiu nas colônias da América do Norte, ação contrária ao que fez o governo espanhol, que marcou forte presença em suas colônias. Posto isso, é possível compreender a diferença entre os sistemas, visto que as Treze Colônias acabaram desenvolvendo sociedades políticas, administrando assuntos de caráter internos e com regime de votação. Por fim, o autor explica que por conta dessa particularidade do passado colonial, em virtude de um século e meio de experiência política, os Estados Unidos se erguem administrativamente fortes em 1776 e viriam a ser o que são atualmente. Referência: JENSEN, Merril. A Fase Colonial. Em: WOODWARD, Comer Vann. Ensaios comparativos sobre a história americana. São Paulo. Ed. Cultrix, 1972. cap. 2, p. 30-45