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RAYANE BRASIL ABORTAMENTO 1 - AMEAÇA DE ABORTAMENTO Como o nome sugere, é “quase” um abortamento, mas ele ainda não ocorreu e pode não acontecer. Ocorre em 15 a 20% de todas as gestações. A probabilidade de evolução para abortamento espontâneo é de 50%. Após a visibilização de atividade cardíaca à ultrassonografia, a taxa de abortamento cai consideravelmente, para menos de 10%. O quadro é de uma paciente com sangramento vaginal de pequena intensidade associado a cólicas leves ou ausentes. O colo, no entanto, persiste fechado, a vitalidade ovular está preservada e o tamanho uterino é compatível com a idade gestacional. O exame ginecológico é importante para afastar lesões ou pólipos vaginais e vaginites agudas que podem ocasionar sangramento vaginal, principalmente após o coito. Os valores do beta-hCG encontram-se dentro da normalidade. De uma forma geral, quando identificamos um saco gestacional intrauterino, as dosagens de beta-hCG são superiores a 1.000 mUI/ml. A dosagem seriada do beta-hCG também pode ser útil, já que observamos que em uma gravidez normal o valor sérico deste hormônio deve aumentar cerca de 66% a cada 48h. À ultrassonografia, não há alterações significativas, o saco gestacional encontra-se íntegro e caso já seja possível visualizar o embrião, os batimentos cardíacos estarão presentes. O diagnóstico diferencial com gestação ectópica é imprescindível nesses casos. Quando não encontramos imagem de gestação intrauterina à ultrassonografia, devemos recorrer à dosagem de beta-hCG e USG seriadas para definir o diagnóstico. Deve-se indicar repouso relativo (apesar de não haver comprovações do benefício do repouso no leito), abstinência sexual, prescrever antiespasmódicos, se necessário, e dar apoio psicológico. A administração de progesterona exógena é controversa. Atualmente, está indicada apenas para os casos de abortamento habitual por insuficiência do corpo lúteo (que é um diagnóstico difícil e raro, porém na prática, observa-se que habitualmente muitos indicam o seu tratamento). O uso de imunoglobulina é controverso devido à falta de evidências científicas para respaldar seu uso. 2 - ABORTAMENTO INEVITÁVEL Considera-se uma progressão da ameaça de abortamento. Não foi expelido ainda nenhum material pelo colo, mas é certo de ocorrer o abortamento. Caracteriza-se, portanto, pela presença de um ovo íntegro, porém inviável. Ao exame, o colo do útero está aberto e a bolsa amniótica pode estar herniada pelo canal cervical. Há presença de sangramento vaginal, que pode ser intenso, e dor em RAYANE BRASIL cólica cíclica em baixo ventre e região lombar. O volume uterino pode ocasionalmente ser incompatível com o período gestacional. O valor do beta-hCG normalmente encontra-se positivo, porém diminuído e decrescente. À ultrassonografia, normalmente observa-se sinais de descolamento decidual com formação de hematoma retrocorial, saco gestacional ir- regular, com presença ou não de batimentos cardíacos fetais. Em 70% dos casos que ocorrem até 8 semanas, a resolução é espontânea no prazo máximo de 72 horas. A paciente deve ser internada, submetida à hidratação venosa para correção dos distúrbios da volemia e, nos casos que não se resolveram espontaneamente, deve-se instituir o esvaziamento uterino. Caso haja manipulação da cavidade uterina (abortamento provocado), administra-se antI- bioticoterapia profilática. Deve-se prescrever a imunoglobulina anti-Rh para prevenção da aloimunização em pacientes Rh negativo. 3 - ABORTAMENTO COMPLETO Neste caso, já ocorreu a expulsão espontânea e total do feto e dos anexos. Clinicamente, caracteriza-se pela parada ou diminuição súbita do sangramento e das cólicas, sendo mais frequente antes de 8 semanas de gestação. Ao toque, o útero encontra-se contraí- do e pequeno para a idade gestacional, com o colo fechado na maioria das vezes. À anamnese, a paciente ocasionalmente é capaz de referir eliminação de material amorfo pela vagina. À ultrassonografia, podem-se observar imagens compatíveis com coágulos. A espessura endometrial inferior a 15 mm ao corte longitudinal da ultrassonografia transvaginal tem sido considerada indicativa de abortamento completo por alguns autores. O diagnóstico diferencial com gestação ectopica é imprescindível também nesses casos. A conduta se restringe ao encaminhamento da paciente para acompanhamento ambulatorial. Nas gestantes Rh negativo, deve-se administrar a imunoglobulina anti- Rh. 4 - ABORTAMENTO INCOMPLETO Dois quadros clínicos distintos são compatíveis com o diagnóstico: abortamento incompleto com colo fechado e abortamento incompleto com colo aberto. Em alguns casos, percebe-se a presença de material ovular ao toque e o colo aberto, com sangramento moderado e cólicas moderadas. É aquele caso em que a paciente chega ao atendimento eliminando o material, porém ainda não o fez por completo, também chamado por alguns de abortamento em curso. Contrariamente, em alguns casos, ocorre a eliminação quase total dos produtos ovulares. As cólicas e o sangramento regridem substancialmente e o diagnóstico é RAYANE BRASIL feito exclusivamente pelo encontro de restos ovulares à ultrassonografia. Em ambos os casos, o útero é menor do que o esperado para a idade gestacional e a conduta deve ser o esvaziamento uterino. A dosagem de beta-hCG é normalmente negativa. À ultrassonografia, visualizam-se ecos endometriais amorfos e mal definidos (FIGURA 2). A conduta consiste em “facilitar” o que já começou ou está em vias de começar. Assim, deve-se realizar o esvaziamento uterino. 5 - ABORTAMENTO INFECTADO (OU SÉPTICO) É uma complicação do abortamento incompleto, associada frequentemente à manipulação da cavidade uterina em tentativas de provocar o abortamento. Inicia- se pela endometrite e, se não tratada adequadamente, pode progredir para peritonite, choque séptico, insuficiência renal, coagulopatia, síndrome de angústia respiratória e morte materna. Geralmente, são infecções polimicrobianas a partir da ascensão de germes que normalmente fazem parte da flora que coloniza o trato genital inferior, produzindo infecção local ou sistêmica. Os agentes mais envolvidos são germes encontrados na flora genital e intestinal, como coco anaeróbios (peptococcos e peptoestreptococcos), Gram- negativos (E. coli), Clostridium perfingrens (ou welchii) e bacteroides. O quadro clínico pode variar de acordo com a extensão da infecção: Quando a infecção é limitada à cavidade uterina e miométrio, a febre normalmente é baixa, com a paciente em bom estado geral, com do- res discretas e contínuas, com algumas cólicas. Não há sinais de abdome agudo e o sangramento é escasso. Quando a infecção abrange o miométrio, paramétrio, anexos e peritônio pélvico, o sangra- mento normalmente está associado a um líquido de odor fétido, devido à presença de anaeróbios. A febre geralmente é alta (maior que 39°C), acompanhada de taquicardia, desidratação, paresia intestinal, anemia, dores constantes e espontâneas com defesa à palpação pélvica. O útero encontra-se amolecido, com redução da mobilidade e colo entreaberto, estando o toque vaginal muito dificultado pela presença da dor. Os casos em que a infecção é generalizada geralmente ocorrem por bactéria Gram- negativa; no caso de infecção por Clostridium, o prognóstico é sombrio. Há presença de peritonite e choque séptico. A febre é elevada e ocorre taquisfigmia, hipotensão arterial, vômitos, desidratação e anemia. O abdome encontra-se distendido e podem ser percebidas crepitações uterinas. As condições hemodinâmicas e infecciosas podem levar a icterícia, coagulopatia, falência cardíaca e insuficiência respiratória.Podemos encontrar ainda abscessos abdominais e pélvicos. RAYANE BRASIL À ultrassonografia, observam-se imagens de restos ovulares e/ou de coleções purulentas no fundo de saco de Douglas. O tratamento deve ser iniciado pela internação hospitalar, com monitoração dos sinais vitais, isolamento do agente etiológico através de hemoculturas e culturas de material do canal cervical, correção da volemia, avaliação do estado hemodinâmico, do sistema de coagula- ção e da extensão do processo infeccioso. Além disso, é importante realizar a profilaxia antite-tânica, promover a perfusão de ocitocina (80 mUI/minuto) e antibioticoterapia adequada. O esquema preferencial de tratamento é a associação da gentamicina com a clindamicina, por 7 a 10 dias: • Gentamicina (1,5 mg/kg/dose 8/8h) ou ami- cacina (15 mg/kg/dia 8/8h) + • Clindamicina (600 a 900 mg a cada 6 a 8 ho- ras) ou metronidazol (500 a 1 g 6/6h). As doses podem ser ajustadas para administra- ção uma vez ao dia (gentamicina 5,0 mg/kg IV e clindamicina 2.700 mg ao dia IV). Esse tem- po de uso indicado pelo Ministério da Saúde, no entanto, não é consenso. Alguns autores afirmam que, após 48 horas apirética e em bom estado geral (endometrite não complicada), a paciente pode receber alta hospitalar sem o uso de antimicrobianos. A ampicilina (500 mg a 1 g 6/6 horas) ou a penicilina cristalina (20 a 40 milhões de UI/dia) só devem ser associadas ao esquema terapêutico em caso de falha de resposta ao tratamento. Após instituição da antibioticoterapia, deve- se proceder ao esvaziamento uterino, sempre com administração de ocitocina antes e durante o procedimento, para diminuir o risco de perfuração uterina. Não há necessidade de aguardar algum tempo de efeito do antibiótico (“esfriar a infecção”) para a realização do esvaziamento uterino. Caso haja abscessos, estes devem ser drenados. Posteriormente, o esquema antibiótico deve ser direcionado de acordo com o resultado das culturas. Em casos graves com peritonite e sepse, sem melhora após 48 horas do início da antibioticoterapia e esvaziamento uterino, pode ser necessária a histerectomia, além da abordagem extensa da cavidade peritoneal com lavagem exaustiva. Se houver febre persistente após o esvaziamento uterino e o início da antibioticoterapia, e for afastada a presença de abscessos tubo-ovariano ou peritonite generalizada, deve-se pensar em tromboflebite pélvica séptica. O diagnóstico é de exclusão e o tratamento recomendado é a administração de heparina em doses terapêuticas. A melhora do quadro após o uso da heparina confirma o diagnóstico. Nas gestantes Rh negativo, deve-se administrar a imunoglobulina anti-Rh. RAYANE BRASIL 6-ABORTAMENTO RETIDO Consiste na interrupção da gravidez com retenção do ovo morto por período prolongado. Também denominado missed abortion, ou seja, gestação interrompida. Alguns autores definem um período mínimo de quatro semanas, classificando o abortamento diagnosticado antes desse período como oculto. Pode ocorrer pequeno sangramento vaginal, o colo está fechado, mas em geral a paciente é assintomática. Caracteriza-se por regressão dos sintomas da gravidez, como sonolência, náuseas, polaciúria e sialorreia. O volume uterino se estabiliza ou involui. O diagnóstico é realizado pela USG de rotina no pré-natal. À ultrassonografia há irregularidade do saco gestacional, alterações da vesícula vitelínica e ausência de atividade cardíaca fetal. Deve-se repetir o exame 15 dias após a realização do primeiro para confirmação diagnóstica, caso a estimativa da idade gestacional seja menor que sete semanas. Em USG transvaginal, a ausência de batimento cardíaco em embrião com comprimento cabeça-nádega maior ou igual a 5 mm indica interrupção da gestação. Pode complicar com discrasia (Coagulação Intravascular Disseminada – CID), especialmente após um período maior que quatro semanas, e mais raramente com infecção. O tratamento consiste no esvaziamento uterino. É importante salientar que, embora a conduta expectante seja possível, ela costuma apresentar resultados piores – sangra- mento imprevisível, maior intensidade de dor, demora na recuperação e, ocasionalmente, necessidade de curetagem de urgência. Clinicamente, caracteriza-se pela parada ou diminuição súbita do sangramento e das cólicas, sendo mais frequente antes de 8 semanas de gestação. Ao toque, o útero encontra-se contraído e pequeno para a idade gestacional, com o colo fechado na maioria das vezes. À anamnese, a paciente ocasionalmente é capaz de referir eliminação de material amorfo pela vagina. À ultrassonografia, podem-se observar imagens compatíveis com coágulos. A espessura endometrial inferior a 15 mm ao corte longitudinal da ultrassonografia transvaginal tem sido considerada indicativa de abortamento completo por alguns autores. O diagnóstico diferencial com gestação ectópica é imprescindível também nesses casos. A conduta se restringe ao encaminhamento da paciente para acompanhamento ambulatorial. Nas gestantes Rh negativo, deve-se administrar a imunoglobulina anti- Rh.
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