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TUTORIAL 9 (Acidente ofídico)

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TUTORIAL 9 PERDA DE SANGUE
OBJ. 1 Estudar o acidente ofídico (Epidemiologia; Reconhecer o gênero do animal agressor com base nas manifestações clínicas fazendo diagnóstico diferencial; Explicar o mecanismo de ação dos diferentes tipos do veneno por gênero; Exames complementares pertinentes; Conduta terapêutica e prognóstico das vítimas de acidentes ofídicos por gênero).
ACIDENTE OFÍDICO: INTRODUÇÃO E EPIDEMIOLOGIA
 Animais peçonhentos São aqueles capazes de produzir veneno e armazená-lo em glândulas que se comunicam com o exterior a partir de estruturas (dentes, espinhos, ferrões) especializadas para a inoculação da peçonha em presas ou predadores.
· No mundo Existem cerca de 100.000 espécies peçonhentas Envolvendo serpentes, aranhas, escorpiões, peixes, insetos, cnidários, entre outras.
 Os animais peçonhentos são responsáveis por uma considerável morbidade e mortalidade no mundo inteiro.
· O Sudeste Asiático, a Índia, o Brasil e áreas da África São os líderes mundiais em mortalidade por picada de cobra.
· Nessas regiões são principalmente mais vulneráveis aos acidentes ofídicos os trabalhadores da agricultura Incluindo crianças de 10 a 14 anos As quais desde cedo são engajadas nesse mercado de trabalho.
 Estima-se que, no mundo, a incidência dos acidentes provocados pelas serpentes peçonhentas possa exceder a 5 milhões por ano Com uma mortalidade associada de 125.000 óbitos anuais. 
· Esses nº, no entanto parecem estar subnotificados Isso, porque estudos junto às comunidades em alguns países revelaram uma maior incidência de acidentes ofídicos que os registros hospitalares e os dados governamentais oficiais.
· Na Índia Estudos mostraram 45.900 óbitos no ano de 2005 Número esse 20x maior que os registros oficiais do governo daquele país.
· Estudo similar em um distrito do Sri Lanka Observou-se que os dados oficiais hospitalares não registraram 62,5% dos óbitos efetivamente causados por serpentes.
· Esses acidentes são considerados um problema de saúde pública, sobretudo nos países tropicais. 
· No Brasil São registrados cerca de 25.000 acidentes ofídicos por ano Predominantemente na área rural, com taxa média de letalidade de 0,43% nos casos tratados.
· O que varia de acordo com o gênero da serpente responsável elo acidente. 
· A maior taxa é observada nos acidentes pelas serpentes do gênero Crotalus E a maioria dos óbitos (60,5%) ocorre quando o atendimento é realizado 6 horas ou mais após o acidente Confirmando a importância da precocidade no tratamento.
 Não existem dados de morbidade significativos Como o número de amputações, internações e incapacitações.
· Além disso, o número de exposições e mortes por cobras não nativas Parece estar aumentando, possivelmente devido ao interesse por colecionar variedades “exóticas” ou peçonhentas, como cobras, mambas e víboras.
 A ampla distribuição geográfica desses animais Que exclui apenas as regiões polares, associada aos altos índices de mobilidade internacional no planeta e a natural e crescente curiosidade exibida pelo ser humano em explorar o ambiente Tornam os acidentes por animais peçonhentos cada vez mais frequentes.
 Dentre os agravos de notificação compulsória no Brasil Segundo os dados do SINAN, animais peçonhentos são o 2º mais notificado no país, atrás apenas das notificações de dengue (Quadro 1.1).
 Vale ressaltar:
· Aproximadamente 90% dos acidentes notificados são causados pelo gênero Bothrops.
· A faixa etária mais acometida é de 15 a 49 anos (52,3%).
· 70% ocorrem no sexo masculino.
· Em 70,8% a perna e o pé são atingidos.
· Em 13,4%, a mão e o antebraço são atingidos.
 Esses acidentes, em geral, relacionam-se a fatores climáticos e ao aumento da atividade humana nos trabalhos no campo Ocorrendo mais frequentemente nas estações chuvosas Que correspondem nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste ao período de setembro a março.
· Na região Nordeste A frequência aumenta entre janeiro e maio Enquanto no Norte não se observa sazonalidade marcante.
 A abordagem principal dos acidentes por animais peçonhentos Consiste na aplicação do soro antiveneno específico.
· Na maioria dos casos, o diagnóstico presumível é suficiente para determinação do soro antiveneno correto.
 As consequências clínicas Tanto físicas, quanto psicológicas e as perdas socioeconômicas decorrentes dos acidentes por animais peçonhentos, seja pelo número de hospitalizações, seja pelo tempo de internação, mortes ou aposentadorias precoces devido à invalidez Fizeram com que a Organização Mundial de Saúde (OMS) incluísse tais emergências médicas na categoria de Doenças Tropicais Negligenciadas (DTNs) em 2009.
· Algumas das DTNs Como as verminoses (teníase, cisticercose, filariose, por exemplo) e viroses (AIDS, raiva, dengue, dentre outras) São bastante conhecidas, divulgadas e recebem grande investimento em pesquisa, tanto de instituições públicas como de empresas privadas.
· Outras, porém, ainda permanecem pouco mencionadas, pesquisadas e discutidas Como é o caso dos acidentes por animais peçonhentos.
 No Brasil, os animais peçonhentos com maior relevância em relação à ocorrência de acidentes são serpentes, principalmente as dos gêneros Bothrops (figuras 1.1), Crotalus (figuras 1.4), Lachesis (figura 1.5) e Micrurus (figura 1.6).
 Além disso, no final do século XX, viu-se uma dramática redução no número de produtores de soro antiofídico no mundo.
· A OMS estima que 10 milhões de ampolas de soro antiofídico por ano sejam necessárias para controlar os efeitos dos acidentes por serpentes no mundo E os laboratórios produtores ainda são incapazes de atender essa demanda.
 Ademais Apesar da existência do Sistema Único de Saúde (SUS) no nosso país A situação com os acidentes ofídicos está longe de ser considerada satisfatória. 
· Um dos fatores que agrava a situação dos acidentes ofídicos no país É o desconhecimento por parte dos profissionais da área da saúde no que se refere à identificação correta da serpente e ao conhecimento da sintomatologia relacionada a cada tipo de acidente.
· O fato é decorrente da deficiência existente na grade curricular da maioria dos cursos de nível superior na área da saúde Que não dispõe de uma disciplina exclusiva para informações sobre identificação e tratamento de acidentes por animais peçonhentos.
· Médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde praticamente não são apresentados a esse agravo durante seus cursos de graduação.
 Dos 179.330 acidentes causados por serpentes do gênero Bothrops no Brasil A região norte foi a que mais notificou acidentes por esse gênero, com 62.599 notificações no período de 2007 a 2015 Seguido pela região sudeste com 41.555 notificações. 
· As notificações dos acidentes botrópicos por estado podem ser visualizadas com mais detalhamento na figura a seguir.
· Entre os estados brasileiros, o Pará foi o que mais notificou acidentes, com 38.061 notificações.
 Dos 18.424 acidentes causados no Brasil por serpentes do gênero Crotalus A região nordeste foi a que mais registrou notificações (6.507 notificações), seguida da região sudeste com 6.441 notificações.
· Os estados que mais notificaram acidentes crotálicos no período foram os estados de Minas Gerais (4.556 acidentes) e Maranhão (2.633 acidentes).
 O acidente por serpentes do gênero Lachesis foi responsável por 7.736 notificações no período de 2007 a 2015 no Brasil. 
· A região norte foi a que registrou maior número de notificações com 7.032 registros O que representa 90,89% dos registros em todo pais. 
· Os estados do Amazonas e Pará notificaram 2.944 e 2.260 acidentes, respectivamente e, desta forma, juntos, foram responsáveis por 80,63% dos acidentes da região norte e 73,29% dos acidentes de todo o país.
 Os acidentes por Micrurus foram responsáveis por 1.836 notificações em todo país. 
· A região nordeste foi a que mais registrou acidentes por serpentes desta família, com 975 notificações no período de 2007 a 2015 E a Bahia foi o estado brasileiro que mais registrou acidentes (240 notificações).
GÊNEROS DE COBRASPEÇOHENTAS MAIS IMPORTANTES NO BRASIL
 No Brasil, 4 grupos de serpentes venenosas têm importância médica. Entre eles, o acidente mais comum é o botrópico (jararaca), que com põe 86% dos casos e em um distante 2º lugar o acidente crotálico (cascavel) com 10% dos casos. 
· Os acidentes laquético (surucucu) e elapídico (coral) são ainda mais raros, perfazendo 2% e 0,8% dos casos, respectivamente.
OBS: Quanto à letalidade, o pior é o acidente crotálico (0,87%), seguido dos acidentes laquético (0,77%), botrópico (0,43%) e elapídico (0,4%).
 A família Viperidae Responsável pela grande maioria dos acidentes ofídicos registrados no Brasil Caracteriza-se pela presença de um órgão termorreceptor (A fosseta Loreal Que é um órgão sensível ao calor que permite à cobra localizar presas de sangue quente), situado entre o olho e a narina.
· Apresenta aparelho inoculador de veneno bastante desenvolvido com dentição do tipo solenóglifa (dentição na qual há dentes inoculadores –canaliculados – móveis e cumpridos localizados na parte anterior da boca São responsáveis pela inoculação de peçonha).
· Possuem escamas quilhadas As quais ao invés de serem lisas, possuem uma crista no centro que pode ou não se estender até a ponta da escama Tornando-as ásperas ao toque.
· Os viperídeos brasileiros são representados pelos gêneros Bothrops, Crotnlus e Lachesis.
 
Gênero Bothrops
 O gênero Bothrops encontra-se distribuído em todo o país e é constituído por 20 espécies.
 Tem fosseta loreal e cauda que se afunila progressivamente.
 Habita ambientes úmidos, sendo encontrado em matas fechadas, áreas cultivadas e peridomicílio de habitações rurais.
 São responsáveis por cerca de 90% dos acidentes por serpentes peçonhentas.
Gênero Crotalus
 O gênero Crotalus (" cascavel ") Apresenta fosseta loreal na cabeça e, caracteristicamente, guizo ou chocalho na cauda.
 Habita áreas abertas, em locais secos e quentes Não sendo encontradona Mata Atlântica e na Amazônia, com exceção de algumas áreas de cerrado.
 As serpentes do gênero Crotalus São responsáveis por aproximadamente 9% dos envenenamentos ofídicos no Brasil.
Gênero Lachesis
 As serpentes do gênero Lachesis ("surucucu") São as que apresentam maior comprimento entre as serpentes peçonhentas das Américas.
 Têm fosseta loreal e últimas escamas da cauda semelhantes a espinhos.
 Habitam a floresta Amazônica e a Mata Atlântica.
Gênero Micrurus
 A família Elapidae Representada no Brasil pelo gênero Micrurus É desprovida de fosseta loreal e apresenta cabeça arredondada.
 O corpo é recoberto na parte superior por escamas lisas e brilhantes com desenhos em forma de anéis pretos, vermelhos e brancos, ou amarelos.
 A dentição é do tipo proteróglifa (Dentição na qual há dentes inoculadores –canaliculados - imóveis curtos localizados na parte anterior da boca São responsáveis pela inoculação de peçonha).
· Como são presas pequenas, fixas e sulcadas A sua picada é menos eficiente do que aquela causada pelos viperídeos
 São conhecidas popularmente como corais verdadeiros.
 O diagnóstico de certeza do acidente ofídico é feito pelo reconhecimento do animal causador. 
· No entanto, isso não é prático ou seguro, bem como não é necessário. 
· O diagnóstico presumível é feito pela história, pelo exame físico e pela avaliação dos efeitos do veneno no paciente E na maioria dos casos deve ser suficiente para determinação do soro antiofídico correto.
· Cobra Peçonhenta vs Cobra Não Peçonhenta
ABORDAGEM INICIAL
 O objetivo do tratamento inicial é transporte assim que possível para local que disponha do soro antiveneno, diminuir a absorção do veneno e prevenir complicações.
OBS: Medidas locais, como incisões próximas à picada, ruptura de bolhas, sutura, sucção do veneno ou gelo local não devem ser realizadas.
· Além de não haver benefício comprovado, atrasam o transporte.
 O paciente deve ser deitado e aquecido.
 O local da picada deve ser identificado e deve-se assegurar que não há picadas adicionais. 
· Acessórios e joias na extremidade acometida devem ser removidos. 
· O local da picada deve ser lavado com água e sabão.
· Pode-se fotografar a serpente, mas não se deve tentar recolhê-la.
· O membro deve ser imobilizado, com elevação passiva e articulações estendidas.
· Em estudos em modelo de envenenamento, com análise realizada através de radioisótopos A imobilização compressiva atrasa a absorção do veneno. 
· Portanto, pode haver algum benefício, mas a qualidade da evidência é baixa. 
 O torniquete não é recomendado O seu uso levou a aumento de edema e de gravidade de lesão local comparado a pacientes que não receberam o torniquete.
· Além disso, não há redução na incidência de efeitos sistêmicos do veneno (insuficiência renal aguda, insuficiência respiratória, síndrome hemorrágica, disfunção de múltiplos órgãos ou morte) entre pacientes tratados com torniquete e aqueles não tratados. 
· Um estudo, inclusive, demonstra aumento de dias internados em pacientes nos quais o torniquete foi usado.
 Além dessas medidas, reforçamos que o mais importante é transportar o paciente até local onde o soro antiveneno apropriado esteja disponível. 
 Os exames iniciais indicados são creatinina, eletrólitos, troponina, hemograma, TP, TTPA, fibrinogênio e urina de rotina. 
 O paciente deve ser hidratado e receber analgesia e antieméticos conforme necessário. 
· Como em qualquer outro ferimento de pele, atentar para a vacinação antitetânica.
 Antibiótico de rotina não é recomendado.
 Antes da aplicação do soro antiveneno Deve-se considerar pré-medicações para evitar reações de hipersensibilidade ao soro agudas e tardias. 
· A evidência para o uso de corticoide e bloqueador histamínico é fraca. 
· A única medida que comprovadamente reduz o risco de reações graves é a aplicação de adrenalina (250 µg) por via subcutânea imediatamente antes de aplicação do antiveneno.
· A aplicação dessa medicação foi segura, inclusive em pacientes com coagulopatia.
 O soro nunca deve ser diluído e deve ser sempre aplicado de forma endovenosa e não há benefício de aplicá-lo de forma subcutânea, próximo à lesão. 
· A administração do soro deve ser feita em 10 a 30 minutos sob monitorização contínua.
· O número de ampolas depende de cada serpente e da gravidade do quadro.
 A gravidade do quadro pode ser dinâmica E um quadro inicialmente diagnosticado como moderado e depois reinterpretado como grave Tem indicação de receber o número de ampolas adicionais devidas.
 Recomenda-se deixar adrenalina e material de intubação próximo ao paciente.
 O diagnóstico de certeza depende do reconhecimento do animal causador. No entanto, o diagnóstico presumível, feito pelos sinais e sintomas, é suficiente para determinação do soro antiofídico correto.
ACIDENTE BOTRÓPICO
· A SERPENTE
 As serpentes do gênero Bothrops compreendem cerca de 30 espécies, distribuídas por todo o território nacional. 
 As espécies mais conhecidas são: 
· B. atrox Encontradas no norte do Brasil.
· B. eryt hromelas Encontradas na região nordeste.
· B. neuwiedi Encontradas em todo território nacional, exceto região norte do país.
· B. jararaca Distribuídas na região sul e sudeste.
· B. jararacuçu Encontradas no cerrado da região central e em florestas tropicais do sudeste.
· B. alternatus Distribuídas ao sul do país.
 Possuem cauda lisa, não tem chocalho e as suas cores variam muito Dependendo da espécie e da região onde vivem.
 Habitam zonas rurais e periferias de grandes cidades Preferindo ambientes úmidos como matas e áreas cultivadas e locais onde haja facilidade para proliferação de roedores.
 Tem hábitos predominantemente noturnos ou crepusculares.
· A PEÇONHA 
 Entre os acidentes ofídicos, os botrópicos são os mais frequentes Correspondendo a 90% das notificações. Ocorrem em todo país.
 O veneno botrópicos apresenta 3 atividades principais:
· Ação Inflamtória Aguda (Ou proteolítica) A chamada atividade inflamatória aguda se deve, em verdade, a um conjunto de frações do veneno como metaloproteinases, fosfolipases e serinoproteases, com especificidadesdiversas e que são responsáveis pelos fenômenos locais do envenenamento (fenômenos flogísticos observados nesse acidente).
 As enzimas encontradas nesses venenos podem atuar por ação direta sobre diferentes substratos Causando lesão tecidual, ou por ação indireta Por meio da ativação/liberação de mediadores moleculares e celulares do processo inflamatório.
· A ação das fosfolipases sobre membranas celulares levando à liberação de derivados do ácido araquidônico (Como leucotrienos, prostaglandinas e prostaciclinas com potente atividade inflamatória) É um exemplo da ação indireta desse veneno. 
· Também contribui nesse processo diversas citocinas inflamatórias, como TNF-a, IL-1 e IL-6.
· Ação Coagulante Toxinas do veneno atuam sobre a cascata de coagulação Levando ao consumo de vários fatores de coagulação e fibrinogênio Com consequente formação de fibrina intravascular Pela ativação da fibrinólise/fibrinogenólise, é rapidamente degradada em PDFs Em decorrência dessa atividade, observa-se alteração da coagulação na maioria dos envenenamentos botrópicos.
 A incoagulabilidade sanguínea ocorre com frequência. 
 Essa atividade, ao levar à formação de trombos na microvasculatura Provoca hipóxia com consequente agravamento do edema e sofrimento tecidual. 
· Também fora m isoladas frações com atividade sobre plaquetas.
· Ação Hemorrágica É atribuída particularmente a metaloproteinases (hemorraginas) Encontradas no veneno e que apresentam ação distinta das frações coagulantes Lesando o endotélio vascular.
· A atividade hemorrágica amplia o quadro inflamatório, particularmente na região da picada, além de provocar sangramentos.
 É importante ressaltar que a quantidade de veneno inoculado varia de acordo com o tamanho da serpente e, também, se ela atacou alguma outra presa recentemente.
 No caso de serpente do gênero botrópicos Há uma diferença entre o veneno do filhote, que é predominantemente coagulante, e do adulto, com maior ação proteolítica e menor ação coagulante.
· QUADRO CLÍNICO
 O acidente botrópicos pode evoluir com alterações locais e/ou sistêmicas.
Alterações Locais
 Após a picada Há sangramento pelos orifícios de inoculação em pequena quantidade, e a região pode evoluir com dor e edema.
 Equimose local ou próxima à área de drenagem linfática regional pode ser observada, e bolhas podem surgir.
Alterações Sistêmicas
 A alteração sistêmica mais frequentemente observada é a incoagulabilidade sanguínea com ou sem hemorragia.
 Equimose (local e regional), gengivorragia, epistaxe e hematúria são as manifestações mais comumente observadas.
· Hipotensão e choque são descritos raramente.
· COMPLICAÇÕES
Complicações Locais
 Alguns casos podem evoluir com complicações como:
· Infecções Podem ocorrer abscesso, celulite e erisipsela Especialmente nos casos moderados ou graves.
 Germes mais frequentemente isolados dos abscesso Bacilos gra negativos, sendo particularmente frequente o achado de Morganella morganii.
· Necrose Mais frequentemente observada quando o acidente ocorre nos dedos, bem como em pcts que fazem uso de torniquete Raramente há a necessidade de amputação.
· Síndrome Compartimental Consiste na pressão aumentada do tecido dentro de um compartimento fascial apertado, o que resulta em isquemia do tecido. 
 É uma complicação rara Que geralmente ocorre nas primeiras 24 horas após a picada.
 O quadro é decorrente da compressão do feixe vasculonervoso, causada pelo edema acentuado.
Complicações Sistêmicas
· Insuficiência Renal Aguda (IRA) Pode estar associada à hipovolemia (decorrente do sangramento ou sequestro de líquidos na região da picada), hipotensão/choque e coagulopatia de consumo.
 As lesões mais comumente observadas têm sido a necrose tubular aguda e, raramente, a necrose cortical.
· Óbito Pode ocorre em virtude da IRA, hemorragia grave, choque ou septicemia.
 Podem ocorrer náuseas, vômitos, sudorese, hipotensão arterial e, mais raramente, choque.
· DIAGNÓSTICO
 A confirmação laboratorial do acidente pode ser feita através de antígenos do veneno botrópico Que podem ser detectados no sangue ou outros líquidos corporais do paciente, através da técnica de ELISA.
 A avaliação laboratorial é realizada através do tempo de coagulação (TC), que geralmente está aumentado, bem como o tempo parcial de tromboplastina (PTT).
· São exames importantes para diagnóstico, conduta e evolução clínica.
 O hemograma geralmente revela Leucocitose com neutrofilia e plaquetopenia de intensidade variável. 
 O exame de urina pode apresentar Proteinúria, hematúria e leucocitúria.
 Outros exames complementares importantes incluem:
· Dosagem de eletrólitos.
· Creatinoquinase (CK) Pode estar elevada em pcts que apresentem processos flogístico acebtuado no local da picada ou em acidentes causados por serpentes com veneno com atividade miotóxica local (B. jararacuçu).
· Uréia e creatinina.
 Com a finalidade de detectar precocemente distúrbios hidroeletrolíticos e insuficiência renal aguda.
 Baseado nas alterações clínicas e laboratoriais e visando orientar a terapêutica a ser empregada, os acidentes botrópicos são classificados em casos leves, moderados e graves.
· CONDUTA TERAPÊUTICA
 O tratamento específico consiste na administração o mais precocemente possível, por via endovenosa do soro antibotrópico (SAB).
· Na falta deste, deve-se lançar mão da administração das associações antibotrópico-crotálico (SABC) ou antibotrópico-laquético (SABL), em ambiente hospitalar.
 Se o tempo de coagulação permanecer alterado 24 horas após a soroterapia, está indicada dose adicional de antiveneno.
 A eficácia da ação do antiveneno pode ser apreciada pela normalização da coagulometria em 12 a 36 horas após sua infusão.
 As medidas gerais incluem procedimentos indicados para tratamento das alterações locais.
· O local de inoculação do veneno deve ser limpo com água e sabão.
· A elevação do membro acometido pouco acima do resto do corpo pode facilitar a diminuição do edema. 
· Analgésicos são comumente necessários nos casos mais graves.
· Os tecidos necrosados devem ser cuidadosamente debridados e os abscessos drenados. 
· A fasciotomia (Procedimento cirúrgico no qual a fáscia é cortada para aliviar a pressão) deve ser realizada se ocorrer síndrome compartimental.
· Adequada hidratação e profilaxia contra o tétano são medidas complementares importantes. 
· A antibioticoterapia é reservada para casos onde sejam verificados sinais clínicos e laboratoriais de infecção.
 Considerar a necessidade de cirurgia reparadora nas perdas extensas de tecidos, e preservar o segmento acometido até que se tenha certeza de que nada poderá ser feito para recuperá-lo ou se está em risco a vida do paciente.
 O paciente deve permanecer, pelo menos por 72 horas após a picada, internado em hospital para controle clínico e laboratorial.
ACIDENTE CROTÁLICO
· A SERPENTE 
 O acidente crotálico representa menos de 10% dos acidentes ofídicos no Brasil.
· No ano de 2016 as notificações nas regiões Nordeste e Sudeste representaram 74% desse total.
 São popularmente conhecidas por cascavel.
 São encontradas em campos abertos, áreas secas, arenosas e pedregosas, raramente na faixa litorânea.
· Não têm hábito de atacar e, quando ameaçadas, denunciam sua presença pelo ruído característico do guizo ou chocalho, presente na cauda.
· A PEÇONHA
 O principal componente do veneno crotálico é a crotoxina, representam do 65% do total da peçonha.
 A crotoxina possui 2 subunidades A fosfolipase A2 e a crotapotina E possui ação miotóxica e neurotóxica.
 O veneno crotálico quase não produz lesão local Possuindo principalmente 3 atividades com importância clínica conhecida:
· Ação Neurotóxica A crotoxina, um complexo formado pela crotapotina e fosfolipase A2 Atua na membrana pré-sináptica da junção neuromuscular Impedindo a liberação da acetilcolina, com consequente paralisia muscular.
 A ação neurotóxica é a mais evidente Trata-se de efeito neuroparalítico com início na cabeça e progressão craniocaudal.
· Ação Miotóxica Também atribuída àcrotoxina, principal componente do veneno da cascavel sul -americana, que apresenta potente atividade miotóxica. 
 Experimentalmente, a inoculação em músculo induz à formação de lesões subsarcolêmicas e edema de mitocôndrias Levando à necrose seletiva de fibras da musculatura esquelética (Rabdomiólise).
· Ação Coagulante O veneno crotálico apresenta atividade trombina-like Podendo levar à incoagulabilidade sanguínea Uma vez que há hidrolise direta do fibrinogênio com consequente formação de trombina.
· QUADRO CLÍNICO
 O quadro clínico local habitualmente causa manifestações discretas, como dor, eritema, edema, e parestesia local ou regional.
 As manifestações sistêmicas gerais incluem mal-estar, prostração, sudorese, náuseas, vômitos, sonolência ou inquietação e sensação de boca seca Que podem aparecer precocemente.
 As manifestações neurológicas surgem nas primeiras horas e melhoram a partir do 2º dia do acidente. 
 O fácies miastênica é característico e denominado "fácies neurotóxico de Rosenfeld", evidenciando:
· Ptose palpebral uni ou bilateral.
· Flacidez da musculatura da face.
· Midríase bilateral semiparalítica.
· Oftalmoplegia.
· Visão turva e/ou diplopia Indicando, portanto, o comprometimento do III, IV e VI pares cranianos.
· Diplopia secundária à oftalmoplegia.
· Visão turva.
 Como manifestações menos frequentes Pode-se encontrar paralisia velopalatina, com dificuldade à deglutição, alterações do paladar e olfato.
 Miotoxicidade do veneno É evidenciada por intensa mialgia generalizada, que pode ser acompanhada por discreto edema muscular.
· A miólise causa mioglobinúria que confere cor avermelhada ou vinhosa à urina.
 Pode haver incoagulabilidade sanguínea ou aumento do tempo de coagulação em aproximadamente 40% dos pacientes Observando- se raramente gengivorragia.
· COMPLICAÇÕES
Complicação Local
 Infecção secundária na região da picada (raro).
 As complicações locais são raras, podendo ocorrer parestesias locais duradouras, porém reversíveis após algumas semanas.
Complicações Sistêmicas
 IRA é uma complicação que pode ocorrer e está associada à rabdomiólise e eventual efeito direto do veneno.
· A necrose tubular aguda é a lesão usualmente observada.
· DIAGNÓSTICO
 A confirmação laboratorial do acidente pode ser feita através de antígenos do veneno crotálico que podem ser detectados no sangue ou outros líquidos corporais do paciente através da técnica de ELISA.
 Na avaliação laboratorial, encontramos como resultado da miólise, valores elevados de creatinofosfoquinase (CPK), desidrogenase lática (LDH) e aspartasealanino-transferase (ALT).
· O aumento da CPK é precoce, com pico de máxima elevação dentro das primeiras 24 horas após o acidente.
· O aumento da LDH é lento e gradual Constituindo-se, pois, um exame para diagnóstico tardio do envenenamento crotálico.
 O hemograma pode mostrar leucocitose, com neutrofilia e desvio à esquerda.
O tempo de coagulação Frequentemente está prolongado. 
 O exame de urina pode apresentar proteinúria discreta, presença de mioglobina, com ausência de hematúria.
· Elevação dos níveis de ureia, creatinina, ácido úrico, fósforo, potássio e diminuição da calcemia São observadas na fase oligúrica da IRA.
 Baseados nas alterações clínicas e laboratoriais e visando orientar a terapêutica a ser empregada Os acidentes crotálicos são classificados em casos leves, moderados e graves:
· TRATAMENTO
 O tratamento específico é a infusão do soro anticrotálico (SAC) ou o soro antibo
trópico-crotálico (SABC) endovenosamente Com a dose variando com a gravidade do caso.
· Deve-se ressaltar que a quantidade a ser administrada na criança é a mesma da do adulto.
 O tratamento geral inclui medidas simples Porém de grande importância para o prognóstico. 
 É recomendado:
· Lavar a região afetada com água e sabão.
· Analgesia e profilaxia do tétano, se necessário. 
· Os pacientes devem ser bem hidratados para prevenir a insuficiência renal.
· A alcalinização da urina e a diurese osmótica Estão indicadas nos casos que evoluam com mioglobinúria, no intuito de diminuir a toxicidade renal.
· A alcalinização é realizada através da administração parenteral de bicarbonato de sódio Monitorizada por controle gasométrico. 
· A diurese osmótica pode ser induzida com a administração endovenosa de manitol a 20%. 
· Em casos de oligúria indica-se o uso de diuréticos de alça, como a furosemida.
· Nos casos em que for constatado insuficiência renal aguda (IRA) Deve-se instalar um tratamento dialítico precoce.
ACIDENTE LAQUÉTICO
· A SERPENTE
 As serpentes do gênero Lachesis pertencem à espécie L. muta com 2 subespécies.
· É a maior das serpentes peçonhentas das Américas, atingindo até 3,5 m de comprimento e possuem cauda com escamas eriçadas. 
· São popularmente conhecidas por surucucu.
 Habitam áreas florestais como Amazônia, Mata Atlântica e alguns enclaves de matas úmidas do Nordeste.
 Os acidentes laquéticos se restringem praticamente à região Norte, onde são notificados 90% desses acidentes.
· A PEÇONHA 
 O veneno laquético possui as três atividades principais do veneno botrópico, com quadro clínico semelhante, entretanto, rotineiramente mais grave.
 O veneno laquético é caracterizado por ação proteolítica, coagulante e neurotóxica.
· A composição se as semelha à do veneno botrópico com MPVS, serina protease e fosfolipases A2. 
· Além disso, também apresenta o peptídeo potenciador de bradicinina.
· O veneno laquético tem propriedades Que ativam o plasminogênio, coagulantes, a resposta hemorrágica, inflamatória, proteolítica, miotóxica, hemolítica, hipotensiva e neurotóxica. 
· Possui a fosfolipase A2 LmTx-1 Que induz in vitro bloqueio neuromuscular irreversível.
 Especificamente para o acidente laquético deve-se monitorizar o paciente e solicitar eletrocardiograma (ECG) seriado Pois pode haver bradicardia, alterações do segmento ST e onda T e bloqueio atrioventricular.
· QUADRO CLÍNICO
 As manifestações clínicas são semelhantes às descritas no acidente botrópico, predominando a dor e o edema Que podem progredir para todo o membro acometido.
 Podem surgir equimose, necrose cutânea, vesículas e bolhas de conteúdo seroso ou sero-hemorrágico nas primeiras horas do acidente. 
 As manifestações hemorrágicas limitam-se ao local da picada na maioria dos casos.
 As manifestações sistêmicas incluem hipotensão arterial, tonturas, escurecimento da visão, bradicardia, cólicas abdominais e diarreia (“síndrome vagal”).
· COMPLICAÇÕES
 As complicações locais descritas no acidente botrópico, como síndrome compartimental, necrose, infecção secundária, abscesso e déficit funcional, também podem estar presentes nesse tipo de acidente.
· DIAGNÓSTICO
 Hemograma, dosagens séricas de uréia, creatinina e eletrólitos São indicados dependendo da evolução do paciente. 
 A determinação do tempo de coagulação (TC) é importante medida auxiliar no diagnóstico e acompanhamento dos casos. 
 O ELISA vem sendo utilizado em caráter experimental, não estando disponível na rotina nesse tipo de envenenamento.
 Por serem serpentes de grande porte considera-se grande a quantidade de peçonha inoculada em um acidente.
· TRATAMENTO
 O tratamento específico consiste na infusão endovenosa do soro antilaquético (SAL) ou antibotrópico-laquético (SABL).
· Na falta dos soros específicos, o tratamento deve ser realizado com soro antibotrópico, apesar deste não neutralizar de maneira eficaz a ação coagulante do veneno laquético.
 As medidas gerais são as mesmas indicadas para o acidente botrópico.
ACIDENTE ELAPÍDICO
· A SERPENTE
 As serpentes do gênero Micrurus compreendem 18 espécies distribuídas em todo o território brasileiro. 
· As espécies mais comuns são:
· M. corallinus Encontrada na região sul e litoral da região sudeste.
· M. frontalis Também encontrada nas região sul, sudeste e parte do centro-oeste.
· M. lemniscatus Distribuídas nas regiões norte e centro-oeste.
 Apresentam anéis vermelhos, pretos e brancos em qualquer tipo de combinação.
· Consideradas animais de pequeno a médio porte sãoconhecidas por coral, coral verdadeira.
 Estas serpentes são bem menos agressivas Tem habitat subterrâneo, apresentam presa inoculadora pequena e não tem a mesma possibilidade de abertura da boca que as outras serpentes.
 Raramente causam acidentes, e quando o fazem, geralmente picam os dedos da mão de indivíduos que as manipulam.
 O mesmo padrão de coloração possuem as falsas-corais Porém a configuração dos anéis não envolve toda a circunferência e são desprovidas de dentes inoculadores, portanto, não peçonhentas.
 O acidente elapídico é o mais raro dos acidentes ofídicos no Brasil. 
· A coral é a única das serpentes peçonhentas de importância no Brasil que não possui a fosseta loreal.
· A PEÇONHA
 O veneno elapídico possui constituintes tóxicos denominados de neurotoxinas Substâncias de baixo peso molecular que são rapidamente absorvidas e difundidas para os tecidos Explicando a precocidade dos sintomas de envenenamento.
· Este veneno produz bloqueio neuromuscular (pós-sináptico) Levando à paralisia muscular, competindo com a acetilcolina (Ach) pelos receptores colinérgicos Atuando de modo semelhante ao curare.
 O uso de substâncias anticolinesterásicas (neostigmina) antagonizam esse efeito Levando a uma rápida melhora da sintomatologia.
· QUADRO CLÍNICO
 O quadro clínico caracteriza-se por sintomas que surgem precocemente, em menos de uma hora após a picada. 
· Há discreta dor local, geralmente acompanhada de parestesia com tendência a progressão proximal.
 As manifestações sistêmicas incluem vômitos, fraqueza muscular progressiva, ptose palpebral, oftalmoplegia e a presença de fácies miastênica ou “neurotóxica”.
 Também podem surgir mialgia localizada ou generalizada, dificuldade para se manter na posição ereta, dificuldade para deglutir, devido à paralisia do véu palatino. 
· A paralisia flácida da musculatura respiratória compromete a ventilação Podendo evoluir para insuficiência respiratória aguda e apneia.
 O acidente elapídico é considerado muito grave, podendo causar a morte da vítima em curto intervalo de tempo.
· DIAGNÓSTICO
 Não têm sido relatadas alterações laboratoriais específicas do envenenamento elapídico.
· TRATAMENTO
 O tratamento específico é a administração, por via endovenosa do soro antielapídico (SAE). 
· Todos os casos que apresentam manifestações clínicas são considerados potencialmente graves.
 O tratamento geral baseia-se numa adequada assistência ventilatória, boa hidratação, analgesia, cuidados locais e antibiticoterapia, se necessário. 
· Os anticolinérgicos (neostigmina), por atuarem como antagonistas da ação pós-sináptica Podem ser benéficos a pacientes picados por espéciesque possuem neurotoxinas pós-sinápticas no veneno. 
· Cada administração de neostigmina deve ser precedida de uma injeção endovenosa de 0,6mg de sulfato de atropina Para se obter o aumento da frequência cardíaca e evitar a hipersecreção.
PROGNÓSTICO E PREVENÇÃO
 O prognóstico geralmente é bom nos acidentes classificados como leves e moderados e nos pacientes atendidos nas primeiras 6 horas após a picada.
 Observa-se que pacientes vítimas de picada na perna, que utilizam torniquete, atendidos com mais de 6 horas do acidente, com administração incorreta do soro antiofídico Apresentam mau prognóstico, evoluindo com complicações que frequentemente levam à óbito.
 A aplicação de substâncias como fumo, esterco, café e alho no local da picada ou ingestão oral de pinga, álcool ou querosene pelo paciente Devem ser desaconselhadas.
· Deve ser evitada a incisão e a sucção do local da picada, por favorecer a infecção secundária.
 Vale ressaltar a importância e a necessidade de um tratamento precoce e agressivo para pacientes vítimas de acidente ofídico Utilizando, sempre que possível, a via endovenosa para administração de soro específico, em doses eficazes, após a identificação correta da serpente.
 A utilização de equipamentos individuais de proteção como sapatos, botas, luvas de couro e outros pode reduzir em grande parte esses acidentes.

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