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Maria Eduarda Pontes 20.1 1 Comportamentos Reflexos Inatos: Todas as espécies possuem, e esses reflexos são uma “ preparação mínima” que os organismos têm para começar a interagir com seu ambiente e para ter chances de sobrevivência. ➢ Exs: Quando o médico bate o martelo no joelho de um paciente, o músculo de sua coxa contrai-se (você “dá um chute no ar"); quando a luz incide sobre sua pupila, ela se contrai; quando você ouve um barulho alto e repentino, seu coração dispara (taquicardia); Esses e inúmeros outros reflexos fazem parte do repertório comportamental de animais humanos e não-humanos desde o momento de seu nascimento, e até mesmo da vida intrauterina. Reflexo, estímulo e resposta: Em psicologia, quando falamos sobre comportamento reflexo, o termo reflexo não se refere àquilo que o indivíduo fez, mas, sim, a uma relação entre o que ele fez e o que aconteceu antes de ele fazer. Reflexo, portanto, é uma relação entre estímulo e resposta, é um tipo de interação entre um organismo e seu ambiente. Estímulo é uma parte ou mudança em uma parte do ambiente; resposta é uma mudança no organismo. (S elicia R) Estimulo Resposta Fogo próximo à mão. Contração do Braço. Alimento na boca. Salivação. Intensidade do estímulo e magnitude da resposta: Tanto intensidade como magnitude referem-se ao "quanto de estímulo" (intensidade) e ao "quanto de resposta". ➢ Ex: Quando entramos em uma sala muito quente, começamos a suar. Maria Eduarda Pontes 20.1 2 Nesse exemplo de comportamento reflexo, o estímulo é o calor (temperatura), e a resposta é o ato de suar. A intensidade do estímulo, nesse caso, é medida em graus Celsius (25°, 40°, 30“, etc.), e a magnitude da resposta é medida pela quantidade de suor produzido. As constâncias nas relações entre estímulos e respostas são chamadas leis (ou propriedades) do reflexo. Lei da intensidade-magnitude: A lei da intensidade-magnitude estabelece que a intensidade do estímulo é uma medida diretamente proporcional à magnitude da resposta, ou seja, em um reflexo, quanto maior a intensidade do estímulo, maior será a magnitude da resposta. Quanto mais intenso um estímulo, mais intensa será a resposta eliciada por ele. ➢ Ex: Quanto mais alto o barulho, maior o susto; quanto mais claro estiver o dia, mais suas pupilas irão se contrair. Lei do Limiar: Esta lei estabelece que, para todo reflexo, existe uma intensidade mínima do estímulo necessária para que a resposta seja eliciada, portanto, valores abaixo do limiar não eliciam respostas, enquanto valores acima do limiar eliciam respostas. Lei da latência: Latência é o nome dado a um intervalo entre dois eventos. No caso dos reflexos, latência é o tempo decorrido entre apresentação do estímulo e a ocorrência da resposta. A lei da latência estabelece que, quanto maior a intensidade do estímulo, menor a latência entre a apresentação desse estímulo e a ocorrência da resposta. ➢ Ex: Quanto mais alto for o barulho, mais rapidamente haverá contrações musculares que caracterizam o susto. Maria Eduarda Pontes 20.1 3 Além da latência entre apresentação, estímulo e ocorrência da resposta, a intensidade do estímulo também possui uma relação diretamente proporcional à duração da resposta: quanto maior a intensidade do estímulo, maior a duração da resposta. Quando um vento frio passa por nossa pele (estímulo), nós nos arrepiamos (resposta). Você já deve ter tido alguns arrepios "mais demorados" que outros. O tempo pelo qual você "ficou arrepiado" é diretamente proporcional à intensidade do frio, ou seja, quanto mais frio, mais tempo dura o arrepio. Habituação e Potenciação: Quando um determinado estímulo, que elicia uma determinada resposta, é apresentado ao organismo várias vezes seguidas, em curtos intervalos de tempo, observamos algumas mudanças nas relações entre o estímulo e a resposta. Quando um mesmo estímulo é apresentado várias vezes em curtos intervalos de tempo, na mesma intensidade, podemos observar um decréscimo na magnitude da resposta. Chamamos esse efeito na resposta de habituação. Para alguns reflexos, o efeito de eliciações sucessivas é exatamente oposto da habituação. À medida que novas eliciações ocorrem, a magnitude da resposta aumenta, e isso é chamado de potenciação/sensibilização. Emoções: Muitas das emoções que sentimos são respostas reflexas a estímulos ambientais. Por esse motivo, é difícil controlar uma emoção; é tão difícil quanto não "querer chutar" quando o médico dá uma martelada em nosso joelho. Os organismos, de acordo com suas espécies, nascem de alguma forma preparada para interagir com seu ambiente. Assim como nascemos preparados para contrair um músculo quando uma superfície pontiaguda é pressionada contra nosso braço, nascemos também preparados para ter algumas respostas emocionais quando determinados estímulos surgem em nosso ambiente. É necessário saber que emoções não surgem do nada. As emoções surgem em função de determinadas situações, de determinados contextos. Não sentimos medo, alegria ou raiva sem motivo; sentimos essas emoções quando algo acontece. Mesmo que a situação que causa uma Maria Eduarda Pontes 20.1 4 emoção não seja aparente, isso não quer dizer que ela não exista, podendo ser até mesmo um pensamento, uma lembrança, uma música, uma palavra, etc. Outro ponto importante a ser considerado é que boa parte (não tudo) daquilo que entendemos como emoções diz respeito à fisiologia do organismo. Os organismos nascem preparados para ter algumas modificações em sua fisiologia em função de alguns estímulos. Por exemplo, se um barulho alto e estridente é produzido próximo a um bebê recém-nascido, poderemos observar em seu organismo as respostas fisiológicas que descrevemos anteriormente como constituintes do que chamamos medo, em algum momento da evolução das espécies (teoria de Charles Darwin), ter determinadas respostas emocionais em função da apresentação de alguns estímulos mostrou ter valor de sobrevivência. Não há dúvidas hoje de que boa parte daquilo que conhecemos como emoções envolve relações (comportamentos) reflexas, ou seja, relações entre estímulos do ambiente e respostas (comportamento) dos organismos. Uma outra característica das espécies animais também desenvolvida ao longo de sua história filogenética, de grande valor para sua sobrevivência, é a capacidade de aprender novos reflexos, ou seja, a capacidade de reagir de formas diferentes a novos estímulos. Os reflexos inatos compreendem determinadas respostas dos organismos a determinados estímulos do ambiente. Esse ambiente, no entanto, muda constantemente, ou seja é preciso aprender novos comportamentos constantemente. Ivan Petrovich Pavlov Um fisiologista russo, ao estudar reflexos biologicamente estabelecidos (inatos), observou que seus sujeitos experimentais (cães) haviam aprendido novos reflexos, ou seja, estímulos que não eliciavam determinadas respostas passaram a eliciá-las. Maria Eduarda Pontes 20.1 5 Pavlov, em seu laboratório, introduziu uma pequena mangueira, o que permitia medir a quantidade de saliva produzida pelo cão (magnitude da resposta) em função da quantidade e da qualidade de comida que era apresentada a ele. Pavlov descobriu acidentalmente que outros estímulos além da comida também estavam eliciando salivação no cão, ele percebeu que a simples visão da comida onde o alimento era apresentado eliciava a resposta de salivação no cão, assim como o som de suas pegadas ao chegar ao laboratório ou simplesmente a aproximação da hora em que os experimentos eram frequentemente realizados também o provocavam. Pavlov, então, decidiu estudar com mais cuidado esses acontecimentos. O Experimento: Para que haja a aprendizagem de um novo reflexo, ou seja, para que haja condicionamento pavloviano, um estímulo que não elicia uma determinada resposta (neutro) deve seremparelhado a um estímulo que a elicia. Um aspecto importante em relação aos termos neutro, incondicionado e condicionado é que o uso deles é relativo. O experimento clássico de Pavlov sobre a aprendizagem de novos reflexos foi feito utilizando-se um cão como sujeito experimental (sua cobaia), carne e o som de uma sineta como estímulos, e a resposta observada foi a de salivação. Basicamente, o que Pavlov fez foi emparelhar (apresentar um e logo em seguida o outro), para o cão, a carne (estímulo que naturalmente eliciava a resposta de salivação) e o som da sineta (estímulo que não eliciava a resposta de salivação), medindo a quantidade de gotas de saliva produzidas (resposta) quando os estímulos eram apresentados. Após cerca de 60 emparelhamentos dos estímulos (carne e som da sineta), Pavlov apresentou para o cão apenas o som da sineta, e mediu a quantidade de saliva produzida. Ele observou que o som da sineta havia eliciado no cão a resposta de salivação. 0 cão havia aprendido um novo reflexo: salivar ao ouvir o som da sineta. Maria Eduarda Pontes 20.1 6 Emoções: Se os organismos podem aprender novos reflexos, podem também aprender a sentir emoções (respostas emocionais) que não estão presentes em seu repertório comportamental quando nascem. ➢ Watson: o condicionamento de uma resposta de medo. 0 psicólogo americano John Watson, mostrou a relevância do condicionamento pavloviano para a compreensão das emoções (como podemos aprender a sentir determinadas emoções em relação a estímulos que antes do condicionamento não sentíamos). Quando um médico bate o martelo no joelho de um paciente, ele não decide se a perna irá ou não se distender: ela simplesmente se distende. Da mesma forma, uma pessoa que tem fobia de penas de aves não decide ter medo ou não quando está na presença desse estímulo, ela tem o medo. Pouco ou nada adianta explicar a essa pessoa que seu medo é irracional, que não há motivos para ela temer uma simples pena de ave. A razão de "respondermos emocionalmente" de formas diferentes aos mesmos estímulos está na história de condicionamento de cada um de nós, todos nós passamos por diferentes emparelhamentos de estímulos em nossa vida. Esses diferentes emparelhamentos produzem o nosso "jeito" característico de sentir emoções hoje Generalização Respondente: Após um condicionamento, estímulos que se assemelham fisicamente ao estímulo condicionado podem passar a eliciar a resposta condicionada em questão. a resposta condicionada de medo pode ocorrer na presença de partes do estímulo condicionado, como, por exemplo, bico da ave, penas, suas pernas. Um interessante aspecto da generalização respondente reside no fato de que a magnitude da resposta eliciada dependerá do grau de semelhança entre os estímulos em questão. Quanto mais parecido com o estímulo condicionado presente no momento do condicionamento um outro estímulo for, maior será a magnitude da resposta eliciada, isso é chamado de gradiente de generalização. Maria Eduarda Pontes 20.1 7 Extinção respondente e recuperação espontânea: Quando um estímulo condicionado é apresentado várias vezes, sem o estímulo incondicionado ao qual foi emparelhado, seu efeito eliciador se extingue gradualmente, ou seja, o estímulo condicionado começa a perder a função de eliciar a resposta condicionada até não mais eliciar tal resposta. Denominamos tal procedimento e o processo dele decorrente de extinção respondente. A necessidade de se expor ao estímulo condicionado sem a presença do estímulo incondicionado é a razão pela qual carregamos, ao longo da vida, uma série de medos e outras emoções que, de algum modo, nos atrapalham. Por exemplo, devido a emparelhamentos ocorridos em nossa infância, podemos passar a ter medo de altura. Consequentemente, sempre que pudermos, evitaremos lugares altos, mesmo que estejamos em absoluta segurança. Desse modo, não entramos em contato com o estímulo condicionado (altura), e o medo pode nos acompanhar pelo resto da vida. Se tal pessoa, no entanto, por alguma razão, precisar trabalhar na construção de prédios, ao expor-se a lugares altos em segurança provavelmente seu medo deixará de ocorrer. Uma característica interessante da extinção respondente é que, às vezes, após a extinção ter ocorrido, ou seja, após um determinado estímulo condicionado não eliciar mais uma determinada resposta condicionada, a força de reflexo pode voltar espontaneamente. Por exemplo, alguém com medo de altura é forçado a ficar à beira de um lugar alto por um longo período de tempo. No início, a pessoa sentirá todas as respostas condicionadas que caracterizam seu medo de altura. Após passado algum tempo, ela não mais sentirá medo: extinção da resposta de medo. Essa pessoa passa alguns dias sem subir em lugares altos e novamente é forçada a ficar no mesmo lugar alto a que foi anteriormente. É possível que ocorra o fenômeno conhecido como recuperação espontânea, ou seja, o reflexo altura - medo ganha força outra vez, após ter sido extinto. Sua força será menor nesse momento, ou seja, o medo que a pessoa sente é menor que o medo que sentiu antes da extinção. Maria Eduarda Pontes 20.1 8 Contracondicionamento e dessensibilização sistemática: O Contracondicionamento, como sugere o próprio nome, consiste em condicionar uma resposta contrária àquela produzida pelo estímulo condicionado. Por exemplo, se um determinado estímulo condicionado elicia uma resposta de ansiedade, o contracondicionamento consistiria em emparelhar esse estímulo condicionado a um outro estímulo que elicie relaxamento (uma música ou uma massagem, por exemplo). Uma outra técnica muito eficiente e muito utilizada para se suavizar o processo de extinção de um reflexo é a dessensibilização sistemática, seria necessário construir um escala crescente da intensidade do estímulo (hierarquia de ansiedade), ou seja, descobrir, para aquela pessoa, quais são os estímulos relacionados a cães que eliciam nela maior ou menor medo. Um exemplo seria pensar em cães, ver fotos de cães, tocar em cães de pelúcia, observar, de longe, cães bem diferentes daquele que a atacou, observar, de perto, esses cães, tocá-los, e assim por diante, até que a pessoa pudesse entrar no canil em que irá trabalhar sem sentir medo. A dessensibilização sistemática é uma técnica: expõe-se o indivíduo gradativamente a estímulos que eliciam respostas de menor magnitude até o estímulo condicionado original. É muito comum, na prática psicológica, utilizar em conjunto contracondicionamento e dessensibilização sistemática. Palavras: Como as palavras passam a eliciar emoções? Boa parte dessa “carga emocional" das palavras está relacionada ao condicionamento pavloviano. Tendemos a considerar palavras faladas como algo mais do que realmente são. São estímulos como outros quaisquer. São estímulos auditivos. Maria Eduarda Pontes 20.1 9 É comum, por exemplo, que palavras como “feio", "errado", "burro" e "estúpido" sejam ouvidas em situações de punição, como uma surra. Quando apanhamos, sentimos dor, choramos e, muitas vezes, ficamos com medo de nosso agressor. Se a surra ocorre junto com xingamentos (emparelhamento de estímulos), as palavras ditas podem passar a eliciar sensações semelhantes a que a surra eliciou, bem como a voz ou a simples visão do agressor. Condicionamento de ordem superior: O condicionamento de ordem superior é um processo em que um estímulo previamente neutro passa a eliciar uma resposta condicionada como resultado de seu emparelhamento a um estímulo condicionado que já elicia a resposta condicionada em questão. Outras aplicações: Robert Ader e Nicholas Cohen (1982) mostraram que o Condicionamento Pavloviano se estende a respostas imunológicas. Esses pesquisadores deram simultaneamente a ratos água com açúcar e uma droga supressora do sistema imunológico. Depois de váriosemparelhamentos droga-água com açúcar (US-NS), a supressão imunológica ocorreu apenas pela ingestão de água com açúcar. Essa descoberta tem importantes implicações para a saúde humana. Quando órgãos são transplantados, há sempre o risco de rejeição (uma interpretação equivocada do sistema imunológico). O sistema imunológico passa a combater o órgão como se fosse um corpo estranho danoso ao organismo. Os médicos contornam tal situação receitando aos pacientes remédios que têm efeito de supressão do sistema imunológico. O emparelhamento dos remédios com cheiros, por exemplo, pode fazer com que apenas o cheiro tenha efeitos supressores sobre o sistema imunológico, o que poderia reduzir a quantidade de medicação tomada e, consequentemente, seus efeitos colaterais. Fatores que influenciam o condicionamento pavloviano: ➢ Frequência dos emparelhamentos: Em geral, quanto mais frequentemente o estímulo condicionado é emparelhado com o estímulo incondicionado, mais forte será a resposta condicionada. No entanto, em alguns casos (ingestão de alimentos tóxicos ou eventos Maria Eduarda Pontes 20.1 10 muito traumáticos, como um acidente de carro ou um estupro), basta apenas um emparelhamento para que uma resposta condicionada de alta magnitude surja. ➢ Tipo do emparelhamento: Respostas condicionadas mais fortes surgem quando o estímulo condicionado aparece antes do estímulo incondicionado e permanece quando o estímulo incondicionado é apresentado. ➢ Intensidade do estímulo incondicionado: Um estímulo incondicionado forte tipicamente leva a um condicionamento mais rápido. Por exemplo, um jato de ar (estímulo incondicionado) direcionado ao olho elicia a resposta incondicionada de piscar. Emparelhamentos de jato de ar com som fazem com que a resposta de piscar ocorra ao se ouvir o som. Nesse exemplo, um jato de ar mais forte levaria a um condicionamento mais rapidamente do que um jato de ar fraco levaria. ➢ Grau de predição do estímulo condicionado: Para que haja condicionamento, não basta que ocorra apenas o emparelhamento estímulo incondicionado – estímulo neutro repetidas vezes. O estímulo neutro deve ter um caráter preditivo da ocorrência do estímulo incondicionado. Um som que ocorre sempre antes da apresentação de alimento eliciará com mais facilidade a salivação do que um som que às vezes ocorre antes da apresentação da comida, ou às vezes não ocorre.
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