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Insuficiência Adrenal DEFINIÇÃO A insuficiência adrenal ou adrenocortical (IA) é definida como a incapacidade do córtex adrenal em produzir quantidades suficientes de glicocorticoides ou glicocorticoides e mineralocorticoides, hormônios cruciais para a homeostase energética e hidreletrolítica. É uma condição grave e potencialmente fatal devido ao papel central desses hormônios na regulação do metabolismo e da homeostase hidroeletrolítica. A IA pode ser dividida em primária (também chamada de doença de Addison, quando o defeito da produção está localizado na própria glândula adrenal), secundária (quando o defeito está localizado na hipófise) ou terciária (quando o defeito está localizado no hipotálamo). Essas duas últimas também podem ser agrupadas e chamadas de Insuficiência Adrenal Central (IAC). - Cabe ressaltar que somente na IA primária haverá deficiência de mineralocorticoide, hormônio essencial para o equilíbrio hidroeletrolítico. EPIDEMIOLOGIA A IA primária, frequentemente denominada doença de Addison (DA) ou insuficiência adrecortical crônica, é uma condição rara, é um distúrbio incomum que resulta da destruição progressiva do córtex da adrenal, com estimadas prevalência de 100 a 140 casos/milhão de habitantes e incidência de 4 novos casos/milhão/ano. A DA predomina no sexo feminino, na proporção de 2,6:1, sendo habitualmente diagnosticada entre a 3 a e a 5 a década de vida. A IA secundária é mais frequente, com estimada prevalência de 150 a 280 por milhão de habitantes. ETIOLOGIA INSUFICIÊNCIA ADRENAL PRIMÁRIA Dentre os possíveis fatores etiológicos da DA, incluem-se: - Processos autoimunes; - Doenças infecciosas granulomatosas e infiltrativas; -Hemorragia e trombose adrenal; - Uso de alguns fármacos; - Adrenalectomia bilateral; - Hiperplasia adrenal congênita e outras doenças genéticas mais raras PS: Em casos de adrenalite autoimune ou doenças infecciosas ou infiltrativas, a IA habitualmente apenas se manifesta após a destruição de 90% ou mais do córtex adrenal. Doença de Addison autoimune Embora possa ocorrer isoladamente, cerca de 60 a 70% dos pacientes com DA autoimune têm associados um ou mais distúrbios autoimunes, endócrinos e não endócrinos, caracterizando as síndromes poliglandulares autoimunes (SPA). Doença de Addison de causa infecciosa A tuberculose (TB) constitui, de modo geral, a segunda causa mais comum de DA; entretanto, em muitos países em desenvolvimento, continua sendo o fator etiológico principal. Infecções micóticas sistêmicas também podem causar IA. Em regiões brasileiras onde a paracoccidioidomicose (PCM) é endêmica (Sul, Sudeste e CentroOeste), o número de casos relatados com envolvimento das adrenais pelo Paracoccidioides brasiliensis vem crescendo de maneira significativa e possivelmente já superaria os casos causados pela TB. Na síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS), as adrenais são as glândulas endócrinas mais afetadas. Tal envolvimento pode ser secundário a infecções oportunistas (TB, citomegalovírus, micobactérias atípicas, micoses etc.), fármacos (rifampicina, cetoconazol etc.) e lesões metastáticas (sarcoma de Kaposi, linfomas). FÁRMACOS - Medicamentos que inibem a esteroidogênese adrenal (p. ex., cetoconazol, fluconazol, itraconazol, etomidato, mitotano, metirapona, trilostano, aminoglutetimida, osilodrostate etc.) ou que aumentem a depuração metabólica dos esteroides adrenais (p. ex., rifampicina, fenitoína, fenobarbital, troglitazona, ervadesãojoão etc.) podem ser causa de IA primária. -Entretanto, apenas o fazem se administrados em altas doses ou se houver uma doença adrenal de base que limite a reserva secretória da glândula. Anticoagulantes, como a heparina e o dicumarol, e inibidores da tirosinoquinase, como o sunitinibe, podem provocar IA aguda por hemorragia adrenal Hemorragia adrenal IA aguda por hemorragia adrenal pode ocorrer no curso da síndrome de WaterhouseFriderichsen, que resulta de choque séptico causado por infecção por meningococo. Eventualmente, a DA pode ser a manifestação inicial dessa síndrome. Traumatismo ao nascimento é outra causa de hemorragia adrenal Doença adrenal metastática Metástases para as glândulas adrenais são comuns, ocorrendo em até 70% dos pacientes com cânceres de pulmão ou mama disseminados. Pode haver também comprometimento adrenal em casos de linfomas, melanomas e metástases de carcinoma de rim, estômago e cólon. No entanto, IA clinicamente manifesta é pouco frequente, a menos que haja lesões bilaterais. Doenças genéticas Hiperplasia adrenal congênita Na hiperplasia adrenal congênita (HAC), a hipofunção do córtex adrenal decorre da deficiência de enzimas envolvidas na biossíntese do cortisol. É a causa mais usual de IA no período neonatal. A forma mais comum é a deficiência da 21 hidroxilase ou CYP21A2, que responde por mais de 90% dos casos de HAC e tem prevalência em nosso meio de 1:10.000 a 1:20.000 nascimentos vivos Adrenoleucodistrofia A adrenoleucodistrofia (ALD) é uma doença recessiva ligada ao X, causada por mutação no gene ABCD1 (cromossomo Xq28). Constitui a terceira causa mais comum de IA em indivíduos do sexo masculino, após a adrenalite autoimune e as doenças granulomatosas (TB e PCM). Resulta da produção de uma proteína transportadora anormal dentro dos peroxissomos que impede a oxidação dos ácidos graxos de cadeia muito longa (AGCML), provocando seu acúmulo no cérebro, no córtex adrenal (preferencialmente, as zonas fasciculada e reticular), nos testículos, no fígado e no plasma. Como consequência, surgem desmielinização do sistema nervoso central e IA primária. Disfunção testicular laboratorial foi relatada em mais de 2/3 dos casos em um número limitado de séries de casos. Adrenalite autoimune É responsável por 60% a 70% dos casos; é, de longe, a causa mais comum de insuficiência adrenal primária nos países desenvolvidos. Como o nome implica, há uma destruição autoimune das células esteroidogênicas. Nesses pacientes, têm-se detectado os autoanticorpos para diversas enzimas esteroidogênicas chaves (21 hidroxilase, 17-hidroxilase). A adrenalite autoimune pode ocorrer em uma de duas condições clínicas: • Asíndrome poliendócrina autoimune do tipo 1 (APS1), também conhecida como poliendocrinopatia autoimune, candidíase e distrofia ectodermal (APECED), é caracterizada por candidíase mucocutânea crônica e lesões de pele, esmalte dentário e unhas (distrofia ectodérmica), em associação com uma combinação de distúrbios autoimunes órgão-específicos (adrenalite autoimune, hipoparatireoidismo autoimune, hipogonadismo idiopático, anemia perniciosa), resultando na destruição dos órgãos-alvo. A APS1 é causada por mutações no gene regulador autoimune (AIRE) no cromossomo 21q22. O AIRE é expresso primariamente no timo, onde funciona como um fator de transcrição que promove a expressão de muitos antígenos dos tecidos periféricos. As células T autorreativas que reconhecem esses antígenos são eliminadas. Na ausência da função do AIRE, a tolerância das células T central para os antígenos do tecido periférico está comprometida, promovendo autoimunidade. • Asíndrome poliendócrina autoimune tipo 2 (APS2) geralmente começa nos primórdios da vida adulta e se apresenta como uma combinação de insuficiência da adrenal e tireoidite autoimune ou diabetes tipo 1. Diferentemente da APS1, não se desenvolvem candidíase mucocutânea, displasia ectodérmica e hipoparatireoidismo autoimune Insuficiência adrenal secundária Causas adquiridas A IA secundária tem como causa mais comum o uso crônico de glicocorticoides em doses suprafisiológicas, que inibem diretamente tanto a secreção de ACTH como a de CRH. Os sintomas surgem após a suspensão indevida ou brusca dos glicocorticoides, bem como pela falta de um ajuste adequado da dose do medicamento em situações de estresse.Pode, também, resultar de traumatismo craniano, necrose hipofisária pósparto (síndrome de Sheehan), apoplexia hipofisária, cirurgia, radioterapia, anorexia nervosa e tumores do terceiro ventrículo, bem como de qualquer doença tumoral, infecciosa ou infiltrativa que envolva a hipófise ou o hipotálamo. Causas congênitas A deficiência congênita de ACTH e de outros hormônios hipofisários pode resultar de mutações dos fatores de transcrição envolvidos nos estágios iniciais do desenvolvimento hipofisário (RIEG, HESX1, LHX4, LHX3, PROP1, POU1F1/Pit1). Deficiência isolada congênita de ACTH pode ser secundária a mutações do gene do TPIT, fator de transcrição necessário para a expressão do gene da próopiomelanocortina (POMC) e para a diferenciação terminal da linhagem corticotrófica. A síndrome de deficiência de POMC (por mutação em seu gene) caracteriza-se por obesidade grave de início precoce, cabelos avermelhados e IA. IA secundária foi também descrita em até 60% dos pacientes com síndrome de PraderWilli (obesidade, hipotonia, retardo mental e hipogonadismo) FISIOLOGIA ADRENAL As glândulas adrenais (ou suprarrenais) são constituídas de dois componentes diferentes: o córtex (local de produção dos esteroides adrenais, os glicocorticoides, os mineralocorticoides e os androgênios) e a medula (local de produção das catecolaminas). O córtex responde por cerca de 90% do peso das adrenais e consiste em três zonas, com distintas características morfológicas e funcionais: a zona glomerulosa, que constitui a única fonte do mineralocorticoide aldosterona; a zona fasciculada, que produz os glicocorticoides (cortisol e corticosterona) e os androgênios (deidroepiandrosterona [DHEA], sulfato de DHEA e androstenediona); e a zona reticular, que se desenvolve a partir dos 2 anos de idade e também produz glicocorticoides e androgênios. O hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), também chamado corticotrofina, é produzido pelas células corticotróficas da hipófise anterior e estimula a síntese dos glicocorticoides e androgênios adrenais. A secreção de ACTH é regulada pelo hormônio liberador da corticotrofina (CRH), produzido pelo hipotálamo. O cortisol (principal glicocorticoide) inibe a biossíntese e a secreção de CRH e de ACTH, em um exemplo clássico de retroalimentação hormonal (feedback) negativa. O ACTH também pode retroalimentar negativamente o hipotálamo. Isso permite que o sinal original seja inibido quando os níveis plasmáticos de ACTH ou cortisol se tornem muito altos. Esse circuito estreitamente regulado é conhecido como o eixo hipotalâmico-hipofisárioadrenal (HHA). A secreção de catecolaminas é regulada pelo sistema nervoso simpático e é também estimulada pelo cortisol. Epinefrina e norepinefrina, por sua vez, podem estimular a secreção de ACTH. FISIOPATOLOFIA DA INSUFIÊNCIA ADRENAL A fisiopatologia da insuficiência adrenal primária é marcada por destruição de mais de 90% do córtex da adrenal, cursando com queda de glicocorticoides, mineralocorticoides e andrógenos. Pela falta do feedback destes hormônios com seus reguladores, ocorre consequente aumento do ACTH e da renina na tentativa de estimular a produção adrenal de cortisol e aldosterona, respectivamente. O déficit de aldosterona ainda reflete sobre a retenção de potássio e excreção de sódio. Efeitos patológicos de podem ocasionar hipercalemia grave e depleção de fluidos. Na insuficiência adrenal secundária há a redução da produção de ACTH e/ou de hormônio liberador de corticotrofina (CRH) devido a patologias do eixo hipotálamo-hipofisário, que são frequentemente associadas ao uso crônico de glicocorticoides. O déficit crônico de ACTH gera atrofia das camadas fasciculada (produtoras de cortisol) e reticulada (produtora de andrógenos), mas a camada glomerulosa (produtora de aldosterona), por estar sob o comando principal do SRAA e não do ACTH, se mantém intacta. Observam-se, geralmente, baixos níveis de cortisol e DHEA, com renina e aldosterona normais nos casos de insuficiência adrenal secundária. Manifestações Clínicas da Doença de Addison; A doença de Addison começa insidiosamente e não chama a atenção até que os níveis de glicocorticoides e mineralocorticoides circulantes estejam significativamente diminuídos. Os distúrbios gastrointestinais são comuns e incluem anorexia, vômitos, perda de peso e diarreia. Em indivíduos com doença adrenal primária, a hiperpigmentação da pele, particularmente das áreas expostas ao sol e nos pontos de pressão, como pescoço, cotovelos, joelhos e articulações dos dedos, é muito característica. Essa hiperpigmentação é causada pelos elevados níveis de pró-opiomelanocortina (POMC), que é derivada da adenoipófise e é uma precursora tanto do ACTH quanto do hormônio estimulador de melanócitos (MSH). Contrariamente, a hiperpigmentação não é observada em pessoas com insuficiência adrenocortical causada por doença hipofisária primária ou hipotalâmica. Mais frequentemente, a hiperpigmentação é observada em áreas expostas ao sol, nos pontos de pressão, dobras cutâneas e mucosa oral. A atividade mineralocorticoide em pessoas com insuficiência adrenal primária resulta em retenção de potássio e perda de sódio, com consequente hipercalemia, hiponatremia, depleção de volume e hipotensão. Ocasionalmente, pode ocorrer hipoglicemia como resultado da deficiência de glicocorticoides e da gliconeogênese prejudicada. Nesses pacientes, fatores de estresse como infecções, traumas ou procedimentos cirúrgicos podem precipitar uma crise adrenal aguda, manifestando-se por vômito intratável, dor abdominal, hipotensão, coma e colapso vascular. A morte ocorre de forma muito rápida, a menos que se inicie imediatamente terapia com corticosteroides Os sintomas ocorrem, em geral, quando há destruição de mais de 90% da glândula. Os sintomas mais comuns relacionados à deficiência de glicocorticoides são: fadiga, fraqueza, anorexia, perda de peso, tontura, náusea e vômito. Nas mulheres, amenorreia pode estar presente entre as queixas, principalmente se houver perda de peso importante oU associação com ooforite autoimune. A deficiência de mineralocorticoide resulta em hipovolemia, desidratação, hipotensão postural e avidez por sal. Em mulheres, a deficiência de andrógenos provoca diminuição de pelos axilares e pubianos, além de perda de libido. Observa-se vitiligo em 10 a 20% dos pacientes com DA autoimune e raramente em outras formas de IA primária. Doença celíaca é encontrada em 15 a 22% dos pacientes com DA e deve ser sempre pesquisada quando houver sintomas gastrintestinais Miocardiopatia reversível com a administração de glicocorticoides foi recentemente descrita em pacientes com DA. Também foi relatado tamponamento cardíaco precedendo a IA Insuficiência Adrenal Secundária Diferente da falência primária, as manifestações da insuficiência adrenal secundária não apresentam hiperpigmentação cutaneomucosa, e como não há deficiência de mineralocorticoide, não se observam depleção de volume, desidratação, avidez por sal e hipercalemia. As manifestações gastrintestinais e a crise adrenal são menos comuns. Podem ser observados sintomas relacionados à deficiência de outros hormônios hipofisários, como LH, FSH, TSH e GH. Insuficiência adrenal aguda | Crise adrenal ou crise addisoniana Aproximadamente 25% dos pacientes com DA apresentam-se, na ocasião do diagnóstico, com uma crise adrenal estabelecida ou iminente. Tal apresentação é bem menos comum na IA secundária. Crise addisoniana pode ser observada em portadores de IA crônica, expostos ao estresse de infecções, cirurgia ou desidratação (por privação de sal, diarreia ou vômitos), seja por falta do diagnóstico prévio da doença, seja porque não se fez o ajuste adequado da dose do glicocorticoide, necessário para essas situações.Pode, também, ser precipitada pela reposição isolada de hormônios tireoidianos em indivíduos com hipotireoidismo e hipocortisolismo, bem como pelo uso de inibidores da esteroidogênese adrenal (cetoconazol, mitotano, metirapona, aminoglutetimida etc.), quando usados em doses elevadas ou administrados a pacientes com reserva funcional das adrenais reduzida A crise adrenal de pior prognóstico é aquela resultante de hemorragia adrenal bilateral, sendo muitas vezes fatal. Frequentemente, os pacientes se apresentam com choque ou hipotensão, em associação a outros sintomas inespecíficos, tais como anorexia, náuseas, vômitos, dor abdominal (podendo simular um abdome agudo), distensão abdominal, fraqueza, apatia, confusão mental (podendo progredir para coma), febre (secundária à infecção ou ao hipocortisolismo per se), cianose ou palidez. Caso haja hiperpigmentação, ela pode ser útil para o diagnóstico. A detecção de petéquias e equimoses aponta para a síndrome de WaterhouseFriderichsen. Achados adicionais incluem uremia, hipercalcemia (rara), hiponatremia (pode ser mascarada pela desidratação), hipercalemia (se houver hipoaldosteronismo), linfocitose, eosinofilia e hipoglicemia. Choque e coma podem rapidamente levar à morte os pacientes não tratados. Pode ser resultado de situações de estresse em pacientes com insuficiência adrenal crônica, na presença ou não de tratamento, ou ainda de acometimento agudo da função adrenal, como nos casos de hemorragia adrenal bilateral relacionada à septicemia, uso de anticoagulantes ou trauma. Caracteriza-se pelo agravamento dos sintomas específicos, como náuseas, vômitos, anorexia, fraqueza, febre e dor abdominal, podendo até simular um quadro de abdome agudo e frequentemente é acompanhada por hipotensão, hipercalemia, convulsões e colapso circulatório. DIAGNÓSTICO O cortisol sérico basal coletado entre 8 e 9h, deve ser o primeiro exame a ser solicitado. Valores menores ou igual a 3 mg/dL confirmam o diagnóstico de insuficiência adrenal, assim como valores acima de 18 mg/dL praticamente excluem este diagnóstico. O valor normal do cortisol sérico é de 5 a 25 mg/dL. No entanto, muitas vezes, o cortisol sérico basal está entre esses valores, o que não permite um diagnóstico conclusivo. Nessa situação, é recomendado o teste de estímulo com ACTH sintético (teste da Cortrosina) Os valores do ACTH plasmático na insuficiência adrenal primária estão elevados e usualmente ultrapassam 100 pg/ ml (valor normal de 10 a 60 pg/mL), podendo inclusive estar acima de 4.000 pg/mL. Na insuficiência adrenal secundária, tais valores encontram-se baixos ou no limite inferior da normalidade: < 20 pg/mL. Teste da Cortrosina Amostras para dosagens de cortisol sérico são coletadas antes e após administração de 250 mg via IV ou IM de ACTH exógeno, nos tempos 0, 30 ou 60 minutos. Valores de pico de cortisol maiores ou iguais a 18 mg/dL indicam função adrenal normal, enquanto um pico de cortisol menor que 18 mg/dL é indicativo de insuficiência adrenal, porém não discriminado se é primária ou secundária. No entanto o teste da Cortrosina não exclui a presença de insuficiência adrenal secundária parcial ou baixa reserva de ACTH. Nesse caso, o teste de tolerância insulina deve ser realizado se não houver contraindicações clínicas, tais como pacientes com idade avançada, portadores de doença cardiovascular ou epilepsia. Teste de tolerância à insulina É considerado padrão-ouro para o diagnóstico de insuficiência adrenal secundária de início recente, situação em que o teste da Cortrosina pode apresentar resposta normal. O teste baseia-se no fato de que a hipoglicemia é um potente estimulador do eixo HHSR. Consiste na administração de 0,1 unidade/Kg/IV de insulina regular e dosagens de cortisol nos tempos basal, 60 e 90 minutos. A glicemia deve atingir o valor de 40 mg/dL ou menos para o teste ser considerado efetivo. Considera—se a resposta normal do cortisol um pico maior ou igual a 18 mg/dL. Dosagem de ACTH plasmático Na presença de níveis reduzidos de CS (< 5 μg/dℓ), valor de ACTH plasmático acima de duas vezes o limite superior da normalidade é altamente indicativo de DA. 1,2 Na DA, os níveis de ACTH plasmático quase sempre excedem 100 pg/mℓ (VN: < 46 pg/mℓ) e podem alcançar 4.000 pg/mℓ ou mais. Valores de ACTH superiores a 300 pg/mℓ representam um estímulo máximo para a secreção do cortisol. Concentração elevada de ACTH na presença de níveis normais de cortisol pode ser o primeiro sinal da fase precoce da IA primária. Na IA secundária, os valores de ACTH são baixos (geralmente < 10 pg/mℓ ou no limite inferior da normalidade [entre 10 e 20 pg/mℓ]) Teste de estimulação rápida com ACTH Procedimento: Após coleta de amostra para o CS, administramse por via intravenosa (IV) 250 μg (0,25 mg) de um peptídeo sintético correspondente aos primeiros 24 aminoácidos do ACTH endógeno – tetracosactida ou cosintropina (Cortrosina ® , Synachten ® etc.), e dosa-se novamente o CS após 30 e 60 minutos. O teste costuma ser feito no período da manhã, mas pode ser realizado a qualquer hora do dia. A dose recomendada para crianças com idade inferior a 2 anos é de 125 μg. Interpretação: Uma resposta normal à Cortrosina ® (pico de cortisol > 18 μg/dℓ ) 1 exclui IA primária e franca e IA secundária com atrofia adrenal. Não descarta, contudo, a possibilidade de uma deficiência leve ou recente (até 4 semanas) de ACTH. Um pico de cortisol < 18 μg/dℓ confirma o diagnóstico de IA, mas não discrimina se o problema é adrenal ou hipotalâmico- hipofisário, dilema este facilmente resolvido pela dosagem de ACTH plasmático. Para os casos de IA secundária leve ou recente, o melhor exame confirmatório é o teste da hipoglicemia induzida por insulina ou teste de tolerância à insulina (ITT). Se o ITT estiver contraindicado, podese administrar metirapona (não comercializada no Brasil) ou glucagon. Teste de hipoglicemia induzida por insulina ou teste da tolerância à insulina Indicação: O ITT está indicado para pacientes com suspeita de IA secundária franca ou parcial (baixa reserva hipofisária) quando o teste da Cortrosina ® não possibilitar uma definição diagnóstica. Procedimento: O ITT consiste na dosagem do CS basal 30 e 60 minutos após a administração IV de insulina regular (0,05 U/kg). Esse teste baseia-se na capacidade de a hipoglicemia induzir uma resposta de estresse do sistema nervoso central (SNC) e aumentar a liberação do CRH e, consequentemente, a secreção de ACTH e cortisol; Interpretação. A resposta normal do CS é um pico > 18 μg/dℓ. Sua detecção descarta IA e baixa reserva hipofisária; contudo, é necessário que a glicemia caia para menos de 40 mg/d ℓ para que o teste possa ser interpretado corretamente; Contraindicações. Casos de pacientes idosos, doença cardiovascular ou cerebrovascular ou doenças que cursem com convulsões são contraindicações ao ITT. Para esses pacientes, devese optar pelo teste de estímulo com metirapona (não comercializada no Brasil) ou glucagon. Teste do glucagon Indicação: Trata-se de um teste seguro, caso o ITT esteja contraindicado. Infelizmente, náuseas são um efeito colateral comum do glucagon; Procedimento: Administra-se 1 mg de glucagon (1,5 mg no obeso) por via subcutânea (SC), e o cortisol é dosado com 0, 90, 120, 150, 180 e 240 minutos. Interpretação:Os critérios para a resposta do cortisol são os mesmos esperados com o ITT. Entretanto, trata-se de um estímulo menos potente e mais sujeito a produzir resultados equívocos Dosagem de atividade plasmática de renina e aldosterona A determinação da atividade plasmática da renina (APR) e da aldosterona está indicada para averiguar a presença de deficiência de mineralocorticoide, a qual, nas fases iniciais de IA primária, pode preceder a deficiência de glicocorticoide. A APR está elevada em quase todos os pacientes não tratados com IAprimária, quando associada a níveis séricos de aldosterona baixos ou normais. Em alguns casos de IA primária, tais como deficiência familiar de glicocorticoide ou alguns casos de HAC, a produção de mineralocorticoide pode não estar comprometida. Na IA secundária, o sistema renina-angiotensina-aldosterona está íntegro ALTERAÇÕES Alterações bioquímicas Na DA, as alterações bioquímicas mais comuns são hiponatremia e hipercalemia (por deficiência mineralocorticoide), além de uremia (secundária à depleção de volumétrica e à desidratação). Ademais, podem ser encontradas hipoglicemia de jejum, hipoglicemia pósprandial (raramente), hipercalcemia leve a moderada (em cerca de 6%), elevação de transaminases e, raramente, hipomagnesemia. Os mecanismos da hipercalcemia na insuficiência adrenal incluem redução da filtração glomerular e aumento da reabsorção tubular de cálcio. Aumento da reabsorção óssea foi sugerido como mecanismo adicional Na IA secundária, não ocorre hipercalemia devido à manutenção da integridade do sistema renina- angiotensinaaldosterona, mas, como mencionado, pode haver hiponatremia; ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS Dentre as anormalidades hematológicas observadas na IA, anemia (normocítica e normocrômica) e eosinofilia são as mais usuais. Neutropenia e linfocitose relativa também podem ser observadas. Macrocitose ocorre nos casos de DA associada à anemia perniciosa. Elevação do TSH sérico e moderada hiperprolactinemia também podem ser vistas em pacientes com DA, sendo ambas reversíveis com a introdução da corticoterapia. ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS Alterações eletrocardiográficas são comuns na IA. A hipercalemia é responsável pelo surgimento de ondas T em tenda, ondas P baixas, complexos QRS largos e, em casos extremos, assistolia atrial, bloqueio intraventricular e, por fim, assistolia ventricular. Outras anormalidades, como ondas T achatadas ou invertidas, baixa voltagem do QRS e intervalo QTc prolongado, devem-se ao hipocortisolismo per se. São reversíveis com a reposição de glicocorticoide; ALTERAÇÕES RADIOLÓGICAS A TC e a ressonância magnética (RM) podem ser úteis no diagnóstico diferencial de IA primária. Na doença autoimune, as glândulas adrenais têm tamanho normal ou diminuído, enquanto estão quase sempre aumentadas nos outros casos. Há calcificação das adrenais na TB adrenal (presente em 50% dos casos), em outras doenças granulomatosas crônicas e em pacientes com metástases ou hemorragia adrenal antiga. TB adrenal pode também se manifestar por massa adrenal unilateral. Biopsia adrenal guiada por TC pode ser realizada nos casos de adrenais aumentadas de volume, e a análise anatomopatológica do material obtido pode ser útil na identificação do agente etiológico de IA, predominantemente no caso de doenças granulomatosas (TB, PCM, histoplasmose e criptococose) O achado de redução da área cardíaca (microcardia) é comum à radiografia simples do tórax. Além disso, nos casos crônicos não tratados ou inadequadamente tratados, pode-se também encontrar um aumento de volume da sela túrcica em radiografia do crânio, e da hipófise, na TC ou RM. Esse fato, em geral, se deve à hiperplasia dos corticotrofos, reversível com a reposição do glicocorticoide. Raramente um adenoma secretor de ACTH pode se desenvolver. Achados radiológicos na insuficiência adrenal secundária. Lesões primárias ou metastáticas no hipotálamo, eminência média ou hipófise, causadoras da IA secundária, podem ser visualizadas por meio de TC e, sobretudo, RM. A presença de massas selares resulta, sobretudo, de tumores hipofisários ou hipotalâmicos, doenças infiltrativas ou infecciosas, metástases e hipofisite. Espessamento da haste hipofisária é frequente nas hipofisites. Se a RM for normal, considerar a possibilidade de IA secundária idiopática ou hipofisite. Investigação da etiologia da insuficiência adrenal A etiologia da IA primária deve ser determinada por motivos terapêuticos em todos os pacientes com doença confirmada do ponto de vista hormonal. Como as causas mais comuns de IA primária são a destruição autoimune do córtex adrenal em adultos e a HAC em crianças, recomendase a dosagem dos anticorpos anti21hidroxilase (Ac21OH) e da 17 hidroxiprogesterona (17OHP) basal. Crianças, adolescentes e adultos jovens do sexo masculino Ac21OHnegativos deverão ser testados para adrenoleucodistrofia (ALD), por meio da mensuração sérica dos ácidos graxos de cadeia muito longa. Se esses diagnósticos forem excluídos, a tomografia computadorizada (TC) das adrenais poderá revelar lesões bilaterais decorrentes de doenças granulomatosas, hemorragia e metástases ou outras neoplasias (p. ex., linfoma adrenal) Na DA autoimune, as adrenais mostram-se de volume normal ou atrofiadas. A indicação da TC pode ser antecipada caso não se disponha da dosagem de Ac21OH Dosagem dos anticorpos antiadrenais Anticorpos anticórtex adrenal (ACA) são observados em 60 a 80% dos casos de DA autoimune, somente excepcionalmente sendo encontrados, em títulos baixos, em outras formas de IA primária. Os Ac21OH são os mais específicos e mais sensíveis para o diagnóstico de adrenalite autoimune (presentes em 64 a 89% dos pacientes). Ausentes em casos de IA secundária, raramente são encontrados, em títulos baixos, na população geral (1,4 a 2,5%) e em pacientes com IA causada por doenças granulomatosas Dosagem dos anticorpos antiinterferonώ ou α Anticorpos antiinterferonώ ou α apresentam alta sensibilidade e especificidade diagnósticas para SPA1 Dosagem de 17hidroxiprogesterona Está particularmente indicada em criança na investigação de HAC por deficiência de 21- hidroxilase. Níveis > 1.000 ng/dℓ confirmam o diagnóstico Dosagem dos ácidos graxos de cadeia muito longa O diagnóstico de ALD se baseia na detecção de níveis elevados de AGCML, encontrados em 100% dos pacientes do sexo masculino afetados. Dessa maneira, a dosagem de AGCML deve ser feita em todos os indivíduos do sexo masculino com DA sem outra etiologia identificada, mesmo na ausência de sinais e sintomas neurológicos. Níveis elevados de AGCML também são observados em 80 a 95% das mulheres heterozigotas. Em virtude de resultados falso negativos, é imprescindível a pesquisa de mutações no gene ABCD1 em todas as mulheres em risco de serem heterozigotas para ALD. REFERÊNCIAS MINISTÉRIO DA SAÚDE, Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Insuficiência Adrenal. 2020; KUMAR, V., ABBAS, A.K., ASTER, J.C Robbins & Cotran-patologia bases patológicas das doenças 9a edição. Elsevier Brasil, 2016; VILAR, Lúcio. Endocrinologia Clínica- Editora Guanabara Koogan, 2021; GOZZANO, José Otávio Alquezar; GOZZANO, Maria Luiza Coelho; GOZZANO, Maria Carolina Coelho. Doença de Addison. Revista da Faculdade de Ciências Médicas de Sorocaba, v. 21, n. Supl., 2019; PULZER, A.; BURGER-STRITT, S.; HAHNER, S. Addison's disease: Primary adrenal insufficiency. Der Internist, v. 57, n. 5, p. 457-469, 2016.
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