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ebook violencia contra a mulher

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Prévia do material em texto

VIOLÊNCIA
CONTRA A
MULHER 
pela perspectiva da Atenção Primária à Saúde
Organização
Ackel Stannier Souza Reis
Amália Dias dos Santos
Ana Clara Fernandez Martins
Ana Flávia Santana Lousada
Camilla Mesquita da Silva 
Carolina Ferreira Santos
Cinthia De Fátima Machado
Clara Bensemann Gontijo Pereira
Danielle Souza Reis
Eveline de Oliveira Frota
Fernanda Alves Martins
Gabriela Silva do Nascimento
Geice Zago Haus
Giovanna Lopes Ventura Moraes
Hanna Eduarda Soubhia Quaglia
Huara Berbert Câmara de Vidal 
Iasmin Silva Campos
Isabela Miranda Caldas
Isadora Monteiro Dutra
Jessica Alves Rodrigues
Joyce Beatriz Pasqualotto Reis Borges
Luísa Chaves Simões Silva
Ilustrações
Juliana Garcez Silva Carvalho
Autores
Juliana Garcez Silva Carvalho
Karina Faria Barbosa
Laura de Oliveira Martins Rosa
Lia Prudente Guimarães Arantes
Lívia Gontijo Silva 
Livia Nardelli Araújo
Luana Maria Pereira Galdino
Luana Martins Ribeiro
Luísa Chaves Simões Silva
Marcela Silveira Freitas Drumond
Maria Clara Nolasco Alves Barbosa
Maria Clara Santana Silveira
Maria Laura Mendes dos Santos Leal
Matheus Arengheri Vicente
Matheus Silva Antonio
Melissa Vieira de Moraes Agapito
Mercês Maria Otati e Silva
Monalisa Maria de Souza Fernandes Paulo
Oilson José Hostert Junior
Raphaela Ferreira de Sousa
Stella Rodrigues Barros do Nascimento
Sthefany de Paula Gomes 
Suellen Maroco Cruzeiro Lombello 
Tânia Carolina Rodrigues Subirá
Vanessa Maria Oliveira Morais
Autores
1. Contexto
1.1. Global
1.2. Do Brasil
2. Prevenção e Educação em Saúde
3.9. Feminicídio
4. Machismo
5.8. Em situação de rua
6.3. Grupos
INTRODUÇÃO
3. Violências
3.1. Violência física
3.2. Violência psicológica
3.3. Violência sexual e cultura do estupro
3.4. Violência patrimonial
3.5. Violência moral
3.6. Violência doméstica e relacionamento abusivo
3.7. Violência obstétrica
3.8. Violência cibernética
5. Recortes sociais
5.1. Feminismo
5.2. Raça e Etnia
5.3. Classe
5.4. Gênero
5.5. Orientação sexual
5.6. Privadas de liberdade
5.7. Com deficiência
6. Redes de apoio
6.1. Saúde
6.2. Justiça e Segurança
SUMÁRIO
7.4. Sigilo médico: aspectos éticos
8.7. Notificação em caso de suspeita
9.5. Equipe Multidisciplinar e Projeto Terapêutico Singular
10.4. Divórcio
11. Abordagem ao agressor
REFERÊNCIAS
7. Lei Maria da Penha
7.1. Como funciona
7.2. Denúncia: como e quando realizar
7.3. Direitos e principais informações legais
8. Rastreamento: como identificar?
8.1. O início
8.2. Perfil do agressor
8.3. Como a vítima pede ajuda
8.4. A culpabilização da mulher
8.5. Sinais
8.6. Anamnese básica
9. Atendimento à Mulher
9.1. Papel do profissional de saúde
9.2. Acolhimento
9.3. Prevenção e profilaxia de IST
9.4. Acesso ao aborto
10. Acompanhamento
10.1. Empoderamento e independência
10.2. Pensão
10.3. Filhos
12. A importância do SUS na abordagem à violência
INTRODUÇÃO
5
Esse Ebook foi produzido por 46 pessoas, espalhadas por vários estados
do Brasil e em fuso-horários diferentes! Começou com um grupo de
interessadas(os) na área de Medicina - estudantes e graduadas - com
interesse em aprender sobre Medicina de Família e Comunidade com
uma Residente do segundo ano na especialidade. 
Ao longo de menos de 1 mês, construímos em conjunto esse material,
embasado cientificamente e sem conflitos de interesse! Mas, claro, com
muitos interesses: capacitar a atuação da Saúde à nível Primário,
defender as mulheres e comemorar os 15 anos de Lei Maria da Penha
(celebrado em 07/08/21, dia de lançamento deste material).
O acesso à saúde vai além de consulta médica dentro de consultórios,
exames de alto custo e medicamentos de nomes difíceis, a saúde é
ampla e passa pelos direitos básicos, como moradia, segurança,
alimentação, educação e justiça. 
Convido então você, leitor e leitora, a desenvolver o olhar atento para a
sua prática, as pessoas do seu convívio e as questões políticas e sociais.
A saúde é determinada por uma série de fatores, que serão brevemente
abordadas aqui. E todos os dias milhares de mulheres sofrem com
violências estruturais da sociedade patriarcal.
E a todas(os) as(os) colaboradoras(es), autoras(es) e ilustradora (sem
palavras de tão talentosa) deste livro: PARABÉNS! Em breve temos mais!
1. CONTEXTO
6
1.1. Global
 Em 1789, a Assembleia Nacional Constituinte aprovou a "Declaração
dos Direitos Humanos e Civis", sendo este o primeiro passo da República
Francesa para formular uma constituição por escrito, visando garantir a
liberdade aos cidadãos. No entanto, ao usar "homens", "homem" e "todo
homem" para se referir a todo o povo francês, eles excluíram os sem
propriedade, escravos, negros livres e as mulheres.
 Na Revolução Francesa de 1789, a discussão sobre a interna-
cionalização dos direitos civis como um direito básico foi proposta pela
primeira vez. No entanto, mesmo após a internacionalização, as mulheres
foram excluídas dos direitos. Portanto, muito foi discutido sobre sua
aplicação, se realmente envolve todos os seres humanos ou apenas os
homens. Com base no conceito de igualdade, privar as mulheres de seus
direitos naturais seria complexo, pois é preciso provar que elas não
pertencem ao gênero humano.
 Nesse contexto, o direito ao voto universal para ambos os sexos na
Revolução Francesa foi defendido contra os fundamentos da
inferioridade feminina e da chamada discriminação natural, como a
gravidez e a menstruação.
 Prove assim a importância de defender a educação e a universalidade
de direitos através de manifestações, pois as mulheres eram
consideradas imprudentes e rejeitadas por grande parte da sociedade.
De acordo com a história, a francesa Olympe de Gouges foi guilhotinada
por escrever a "Declaração dos Direitos da Mulher e dos Cidadãos", após
ser apresentada à Assembleia Nacional Francesa durante a Revolução
Francesa em setembro de 1791, exigindo que o "direito natural" fosse
estendido às mulheres. A partir deste fato, muitas sentiram a necessidade
de afirmar seus direitos através de reivindicações feitas por elas
envolvendo questões de gênero.
 Diante disso, o conceito de gênero sofreu grandes mudanças, de modo
que a perspectiva de gênero posteriormente passou a fazer parte das
políticas públicas em todas as áreas de ação governamental. Além disso,
no processo de busca do empoderamento da mulher e de seus direitos,
falar 
AUTORA Huara Berbert Câmara de Vidal
7
8
falar sobre gênero tem se tornado uma forma de superar padrões de
desigualdade. 
 Durante séculos, em face de todas as lutas e revoluções que apoiam a
proteção dos direitos humanos, as relações de gênero têm sido
turbulentas e desiguais. Afirma-se que “[a]s feministas começaram a
utilizar a palavra “gênero” mais seriamente, num sentido mais literal,
como uma maneira de se referir à organização social da relação entre os
sexos”. Essa palavra pode incluir sexo, mas não é diretamente
determinada pelo gênero e tem muito a ver com pesquisas sobre coisas
relacionadas às mulheres.
 Portanto, gênero é uma forma de expressão da estrutura cultural, que
estabelece papéis sociais adequados para homens e mulheres. Essa
palavra foi muito importante para que os debates ganhassem mais força.
Na luta pelos direitos, as mulheres se organizaram e formaram forças de
mobilização para reivindicar a igualdade de gênero nas relações sociais.
 As principais reivindicações das mulheres são os direitos básicos, como
voto, participação política e direitos à vida pública; uma grande
revolução das feministas da época chocou-se com visões de diferentes
períodos históricos. Nessa visão, a mulher deve ser sempre a zeladora da
família e não ter compreensão suficiente das disputas no campo do
poder. Este é um dos temas da primeira onda feminista, que questionou o
papel da submissão e da passividade sobre as mulheres. Durante o
movimento feminista, ocorreu a Primeira Convenção dos Direitos das
Mulheres de 1848, sendo o primeiro encontrosobre os direitos das
mulheres nos Estados Unidos.
 Outro marco na luta das mulheres por seus direitos é o Movimento
Sufragista, que ocorreu durante o século XIX, levando muitas mulheres na
Inglaterra e nos Estados Unidos, irem às ruas como forma de protesto e
luta pelo direito à participação política, como candidatas e eleitoras. Em
registro histórico na Inglaterra, foi fundado o grupo “Women´s Social and
Political Union”, que teve uma grande influência em outros posteriores
movimentos das mulheres. Já nos Estados Unidos, os direitos de voto
foram definidos em 1919, e o movimento obteve grande influência das
sufragistas inglesas que surgiu com a luta contra a escravidão.
 
9
 Diante das catástrofes ocorridas e a negação do valor do ser humano
na Segunda Guerra mundial que “simbolizou a ruptura com relação aos
direitos humanos, significando o Pós-Guerra a esperança de
reconstrução destes mesmos direitos”. Pelo fato ocorrido, se fez
necessário construir um código universal de direitos humanos que
representou um grande desafio para os Estados membros da ordem
internacional, a fim de consolidá-la e tomando os direitos humanos como
referência ética para orientar a ordem internacional. Diante disso, os 48
estados membros da Organização das Nações Unidas (ONU), realizaram
a universalização dos direitos humanos em 10 de dezembro de 1948 e
consolidaram a ética universal que introduziu os conceitos
contemporâneos de direitos humanos.
 Os Direitos Humanos são uma forma abreviada e genérica de se
referir a um conjunto de exigências e enunciados jurídicos superiores aos
demais direitos. São fundamentais, pois sem eles o ser humano não é
capaz de existir, desenvolver-se e participar plenamente da vida. Além
de serem universais, qualquer autoridade política e/ou lugar precisa
deles. Eles representam os requisitos mínimos para uma vida decente.
 O movimento feminista no início preocupava-se com a igualdade
política e econômica das mulheres perante os homens. Porém, após a
segunda guerra mundial, o feminismo aborda outros temas, as feministas
procuram alcançar uma compreensão da natureza cultural da opressão,
observando o agir das próprias instituições culturais que alicerçam e
perpetuam a subordinação das mulheres.
 A partir de uma supremacia do falo, as sociedades foram fundadas
e isso fez com que as mulheres fossem inferiorizadas. O homem adquiriu
uma posição historicamente privilegiada por ser o portador do falo,
diferente das mulheres que passaram por lutas na história para
conquistar seus direitos e serem reconhecidas. Em diversas sociedades,
as mulheres são extremamente oprimidas e ainda há uma necessidade de
oprimir e subjugar a mulher em diversos lugares, não apenas no mercado
de trabalho.
 Com a expansão dos debates acerca das condições de gênero,
sucede a possibilidade de incluir debates sobre as mulheres nos
encontros ocorridos em âmbito internacional. 
 O apoio da ONU foi muito importante para o movimento dos direitos
das mulheres; como na questão da igualdade em termos de direitos e
liberdades para mulheres e homens, sendo este um dos princípios básicos
da carta da ONU.
 Além disso, esta carta é o primeiro documento legal, com vínculo
internacional que se concentra o princípio da igualdade. Outro marco
importante ocorreu no ano de 1975, quando a ONU instituiu o dia 8 de
março como o Dia Internacional da Mulher. Atualmente esta data é
celebrada em mais de 100 países, relembrando os progressos alcançados
pelas mulheres e a busca continua por uma igualdade de gênero no
mundo.
 No ano de 1993, a ONU reafirma os Direitos Humanos das Mulheres
perante a comunidade internacional e destaca atenção para as questões
relacionadas à violência contra as mulheres. Além de sofrerem pela não
garantia total de seus direitos, as mulheres sofrem violências diárias.
Portanto, através da Declaração sobre a Eliminação da Violência contra
as Mulheres, a Assembleia Geral cita a necessidade de “um compromisso
por parte dos Estados em relação às suas responsabilidades, e um
compromisso da comunidade internacional em geral para a eliminação
da violência contra as mulheres”.
 Somente em 1995, com a Declaração e Plataforma de Ação de
Pequim, que se define o conceito de gênero, estabelecendo consenso de
um compromisso dos Estados membros com os Direitos Humanos das
Mulheres. O documento traz doze áreas prioritárias de preocupação
relativa às mulheres e o seu empoderamento consiste em um dos
objetivos centrais. Ao apresentar o conceito de gênero, a declaração
tem como base uma análise da situação da mulher em caráter de
aspecto biológico para uma compreensão das relações entre homens e
mulheres. Assim, as relações de gênero passam a constituir o centro das
preocupações relativas aos padrões de desigualdade.
 No ano de 2000, o tema gênero foi integrado em muitos dos objetivos
da Declaração do Milênio. A partir de então as nações se
comprometeram a uma nova parceria global, conhecidos como os
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.
10
 Em 2010, a Assembleia Geral da ONU criou um órgão com objetivo de
acelerar os processos para alcançar a igualdade de gênero e fortalecer
a autonomia das mulheres. O órgão recebeu o nome ONU Mulheres, uma
entidade dedicada à igualdade de gênero que trabalha em conjunto com
a sociedade civil e os governos, a fim de elaborar leis, programas e
serviços necessários para certificar que a norma seja efetivamente
realizada e amparar verdadeiramente mulheres e meninas em todo o
mundo.
 Portanto, diante dos diferentes avanços conquistados na história dos
Direitos Humanos e na história dos Direitos Humanos das Mulheres, ainda
persistem as desigualdades de gênero e a violência contra mulheres. As
lutas das mulheres pela libertação de seus direitos avançaram
significativamente ao longo das décadas, acarretando na ampliação de
programas internacionais e em uma maior demanda por Direitos Humanos
das Mulheres pelo mundo.
1.2. Do Brasil
AUTORA Vanessa Maria Oliveira Morais
 A violência contra a mulher no Brasil tem raízes profundas. A história
de dominação do patriarcado se estende desde os primórdios da
sociedade quando as mulheres eram tratadas como propriedade de seus
pais e maridos e viam-se obrigadas a permanecer em relacionamentos
extremamente machistas e dominadores, que eram regulamentados pelo
Código Civil de 1916.
 Apesar das muitas conquistas alcançadas até então, como a Lei do
divórcio, nº 6,515 de 26 de dezembro de 1977, e a Lei Maria da Penha sob
o número 11.340 de 7 de agosto de 2006, muitas mulheres ainda são
submetidas a situações de violência, as quais em sua maioria são
cometidas por pessoas próximas, e em número expressivo pelos seus
parceiros íntimos.
11
12
 A maior parte dos casos de violência contra a mulher ocorre na
própria casa da vítima, enquanto a violência que atinge os homens
acontece majoritariamente fora do domicílio. No ano de 2013 o Brasil
ocupava a quinta posição no ranking de homicídios de mulheres no
mundo e que, no mesmo ano, no Brasil, o SINAN (Sistema de Informação
de Agravos de Notificação) registrou que 37,3% das notificações de
violência contra a mulher cadastradas na plataforma se tratavam de
violência de repetição.
 Durante a pandemia pelo SARS-CoV-2, iniciada em 2020, os números
dessa covarde prática aumentaram. O maior tempo de convívio com os
agressores, a limitação do convívio social e a dificuldade em encontrar
uma rede de apoio são determinantes.
 Embora não seja estritamente um problema de saúde pública, a
violência contra a mulher é muitas vezes identificada e notificada
somente a partir da Atenção Primária. Os atendimentos às vítimas de
violência contra a mulher passaram a ser obrigatoriamente notificados no
Brasil a partir da criação da lei nº 10.714, de 2003. Mais tarde, em 2009,
começaram a ser adicionados ao SINAN e no ano de 2011, tornaram-separte da lista de notificação compulsória, sejam eles suspeitos ou
confirmados.
 Analisando a perspectiva psicossocial da problemática percebe-se
que, atualmente, os serviços de saúde são uma das principais formas
pelas quais as situações de violência são identificadas, já que mesmo
quando não ocorre a denúncia, muitas mulheres recorrem ao sistema de
saúde para buscar ajuda/atendimento. Portanto, evidencia-se a grande
necessidade da atenção primária, como porta de entrada do sistema,
através dos seus profissionais, acolher, apoiar e tratar para além das
sequelas físicas dessas mulheres, visualizando suas fragilidades e
buscando formar uma rede de apoio multidisciplinar e sólida no entorno
da vítima.
2. PREVENÇÃO E
EDUCAÇÃO EM SAÚDE
13
 Em vista das problemáticas que culminam na violência contra a mulher
cabe destacar que a prevenção representa o eixo mais importante para
reduzir e exterminar as agressões.
 Desse modo, a prevenção deve ter dois focos gerais, primeiramente
deve-se buscar a resolução de conflitos já existentes, com o objetivo de
garantir a segurança da vítima e evitar futuras agressões. Em paralelo,
deve-se atuar na educação em saúde, visando promover uma melhora
substancial na sociedade como um todo.
 
AUTORA Geice Zago Haus
14
O ambiente de ensino, enquanto formador social, deve abordar a
temática da violência desde os primeiros anos escolares, visando que
os educandos aprendam sobre direitos, responsabilidades individuais
e respeito às diferenças. Além disso, as escolas também devem ser
um local seguro para denúncias presenciados pelos educandos no
ambiente familiar.
As empresas também devem fornecer postos de trabalhos e salários
igualitários às mulheres, pois isso auxilia na independência e
empoderamento feminino, diminuindo os casos de permanência em
relações abusivas por dependência financeira.
A Atenção Primária à Saúde deve promover capacitação constante
dos profissionais, para que estes estejam aptos a identificar sinais de
violência em consultas rotineiras e auxiliar a sanar dúvidas caso a
mulher deseje realizar denúncias de violência.
No que tange à Estratégia de Saúde da Família, o Agente
Comunitário de Saúde, tem um papel fundamental, já que, quando
capacitado ele consegue perceber sinais de relações abusivas
durante as visitas domiciliares, ainda que sutis. Esse profissional
também tem um importante papel em campanhas de conscientização
sobre essa temática, buscando criar um vínculo com a comunidade e
permitindo que as vítimas sintam-se seguras em buscá-lo para relatar
situações de violência.
Os meios de comunicação devem abordar essa violência - e suas
várias formas de manifestação, nas diferentes produções midiáticas
visando conscientizar a sociedade de uma forma geral sobre a
gravidade do assunto.
 Algumas medidas podem ser tomadas no campo da prevenção:
 
 Cabe salientar que, para que haja uma mudança na estrutura da
sociedade e a mitigação (ou erradicação) da violência contra mulher, os
diferentes setores sociais, públicos e privados precisam se inter-
relacionar, ainda que atuem em diferentes âmbitos. Por exemplo:
campanhas escolares podem ser financiadas e coordenadas por
psicólogos, médicos e enfermeiros atuantes na Unidade Básica de Saúde. 
3. VIOLÊNCIAS
15
 A violência física contra a mulher compreende comportamentos
agressivos, relacionados ao uso de armas ou da própria força, que
prejudicam a integridade do corpo feminino e comprometem a sua saúde
orgânica. Estes atos violentos são praticados de forma intencional tendo
como objetivo ocasionar lesões físicas, promover dor e sofrimento ou
causar a morte da mulher.
 Diversos são os comportamentos associados à violência física, tais
como beliscões, chutes, empurrões, tapas, queimaduras, esfaqueamentos
e tiros. Além disso, as agressões podem ocorrer uma única vez ou então
repetitivamente. Geralmente, se não houver denúncia, com o tempo a
violência física vai se tornando mais frequente e intensa.
 Sendo comumente relatada, a violência física doméstica contra
mulheres é aquela cometida por pessoas com quem a mulher tem
convívio familiar, como cônjuge, pais, filhos e irmãos. De acordo com
dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2019, 52,4% das mulheres que
sofreram agressão física afirmaram terem sido agredidas por parceiros
íntimos. Logo, os agressores mais envolvidos em violência doméstica são
os cônjuges, companheiros ou namorados atuais ou anteriores.
 Diversos fatores podem ser geradores dessa agressão. O machismo,
por exemplo, envolve um sentimento de direito, no qual o homem sente
que tem a liberdade e a autoridade para agredir a mulher. Atualmente,
devido à luta feminista, as mulheres têm ganhado voz e se tornado
provedoras do lar e profissionais competentes em diversas áreas.
Todavia, essa igualdade de gênero, muitas vezes, não agrada o homem,
que ainda acredita na condição de submissão conferida à mulher
histórica e culturalmente. Dessa forma, a violência de gênero
compreende os atos agressivos destinados à mulher pelo fato de ser
mulher, independente da raça, idade, classe social ou outro fator.
16
3.1. Violência Física
AUTORA Stella Rodrigues Barros do Nascimento
 Em relação à situação econômica, a diferença econômica entre o
homem e a mulher, a dependência financeira feminina e a dificuldade de
gestão podem ser motivos que colaboram com a hostilidade masculina.
Apesar de ocorrer em todas as classes sociais, a violência doméstica
ocorre
acontece mais frequentemente com mulheres com menores taxa de
escolaridade e condição econômica. Entretanto, em famílias com maior
aporte financeiro, tem-se a possibilidade de ocultação da violência em
razão da disponibilidade de recursos, podendo ocorrer subnotificação
nestas classes sociais.
 O uso de álcool é um dos principais fatores relacionados à violência
doméstica. O álcool é utilizado por diferentes motivos socioculturais,
entretanto, é mais consumido para melhora do humor e desinibição.
Dessa forma, sentimentos como raiva e frustração podem se tornar
exorbitantes, gerando o aumento da agressividade. Além disso, o
consumo abusivo de álcool pode comprometer à relação familiar, em
relação às questões econômicas, quando o homem utiliza o dinheiro para
alimentar seu vício nas bebidas, e devido à dificuldade de diálogo, haja
vista que o álcool pode prejudicar a conversa clara e também levar à
violência verbal.
 Os ciúmes são fatores importantes. A insegurança associada à baixa
autoestima pode provocar o comprometimento da relação,
principalmente conjugal, sendo precipitante para a expressão de
violência física. Ademais, o consumo de álcool e de outras drogas pode
produzir pensamentos delirantes de ciúmes, induzindo o homem a agredir
a mulher.
 Apesar dos agressores serem mais frequentemente parceiros íntimos,
os maus tratos contra a mulher também podem resultar de qualquer tipo
de violência extrafamiliar executada por qualquer agressor, incluindo por
pessoas desconhecidas. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de
2019 demonstram que 8,7% das mulheres que sofreram violência tiveram
como agressores amigos, colegas ou vizinhos, e que 11,6% sofreram
ataques de desconhecidos. Outros dados importantes envolvem o local
da agressão física, 72,8% das mulheres informaram sofrer violência
dentro de suas residências e 17,9% afirmaram terem sido agredidas em
espaços públicos.
 A violência física pode envolver agressões que resultem em lesões
leves ou graves, conforme o Código Penal Brasileiro. As lesões leves são
aquelas que não apresentam grande comprometimento da integridade
física da vítima. Já as lesões graves estão relacionadas às agressões que
levam à impossibilidade da mulher de realizar seus afazeres cotidianos,
que 
17
18
que prejudicam permanentemente algum membro ou órgão, que
favorecem o desenvolvimento de doenças consideradas incuráveis e que
podem provocarperigo de morte. Considerando uma mulher grávida, a
antecipação do parto e o aborto também são consideradas lesões graves
em decorrência da violência física.
 Quanto ao local de dano, geralmente as regiões de cabeça e pescoço
são as mais atingidas, destacando-se a face. A escolha pela face pode
ser explicada pelo agressor querer expor a lesão e causar humilhação à
vítima, o que implica a intenção de comprometer a beleza feminina. As
agressões aos membros superiores podem também estar correlacionadas
à tentativa da mulher em se proteger dos ataques, utilizando as mãos e
braços para impedir que lesione o rosto. Além disso, outras regiões do
corpo também podem ser atingidas, como membros inferiores, abdome e
costas.
 As lesões mais comuns evidenciadas devido à violência física são os
hematomas, escoriações, luxações e lacerações. Em relação às doenças
decorrentes da resposta inflamatória e imunológica, pode haver
desenvolvimento da obesidade, crises da gastrite e úlcera, além de
aumento da pressão arterial e dores no corpo. 
 Dessa forma, a violência contra a mulher é concebida como um
problema de saúde pública, haja vista que compromete a saúde física e
emocional da mulher, além de que, por muitas vezes as agressões serem
recorrentes, pode haver demasiados gastos ao serviço de saúde. 
3.2. Violência Psicológica
 Definida pela Lei Maria da Penha, a violência psicológica é
caracterizada por atitudes que resultam em danos ao âmbito emocional.
Dessa forma, o agressor pode fazer o uso de várias técnicas, tais como a
ridicularização da vítima, chantagem, episódios de humilhação, bem
como desrespeito às crenças, controle de outros vínculos sociais e
principalmente manipulação das ideias, com o intuito de manter o
controle sobre a situação. 
AUTORA Raphaela Ferreira de Sousa
 A cultura é um compartilhamento de ideias, símbolos e valores por
uma sociedade. Ela é formada artificialmente pelo homem, de uma forma
não natural. O termo cultura do estupro tem sua origem na década de
70, quando mulheres feministas passaram a utilizá-lo para descrever
situações e ambientes onde a violência contra a mulher e o estupro eram
normalizados. Dizer que tal atitude faz parte da cultura, caracteriza-a
como regra e não como exceção, deixando a ação normalizada pela
atividade humana. Logo, a perpetuação da cultura do estupro ocorre
devido a manutenção e normalização de ideias machistas vindas de uma
sociedade patriarcal, como por exemplo o consumo de músicas que
infamam a mulher, piadas sexistas, a culpabilização da vítima e a
tolerância a violência contra a mulher. 
 Violência sexual pode ser caracterizada por uma violência de gênero,
em que ocorre um abuso de poder no qual a vítima, sem seu
consentimento, é usada como forma de gratificação sexual do agressor,
com ou sem violência física. Estupro, tentativa de estupro, sedução, aten-
19
 Recentemente, as mulheres tiveram uma conquista muito importante
no combate à violência psicológica com promulgação da Lei n°14.188, de
28 de julho de 2021, que institui a pena de 6 meses a 2 anos e multa aos
abusadores.
 Nesse sentido, a identificação da violência psicológica contra a
mulher por profissionais da saúde se tornou ainda mais importante, dado
que é a forma de abuso mais prevalente entre as usuárias da Atenção
Primária e, agora, é reconhecido criminalmente. Ainda, cabe elencar, que
esse tipo de violência pode ser não percebido pelas pessoas do convívio
da vítima. No entanto, é necessário que todo profissional da saúde esteja
atento, pois a abordagem precoce ajuda a prevenir outros tipos de
violência.
3.3. Violência Sexual e Cultura do Estupro
AUTORA Marcela Silveira Freitas Drumond
20
tado violento ao pudor e assédio fazem parte da violência sexual. 
 Tal situação pode acabar gerando em suas vítimas problemas de
saúde física, reprodutiva e até mesmo psicológica. Na maioria das vezes,
as vítimas passam a apresentar problemas que se estendem para além
das consequências imediatas dos atos vivenciados, por isso, uma
abordagem interdisciplinar é crucial. Os agressores podem ser
conhecidos, desconhecidos, e até mesmo familiares. Com muita
frequência os autores das agressões contra a mulher são parceiros,
maridos ou namorados. 
 A magnitude e a frequência da violência sexual são difíceis de se
estimar, pois em muitos casos, as vítimas não denunciam seus agressores,
seja por vergonha, sentimento de culpa ou até mesmo medo de
represália. Como a agressão cursa com diversas consequências, é
imprescindível que a vítima procure o atendimento à saúde para que
todas as medidas cabíveis sejam tomadas em prol da saúde de sua
saúde, tendo em vista que o ato pode trazer diversas ameaças a saúde,
como por exemplo infecções do trato reprodutivo, infecções sexualmente
transmissíveis e a chance de gravidez.
3.4. Violência Patrimonial
 Entre os tipos de violência descritos na Lei Maria da Penha encontra-
se a violência patrimonial. Trata-se, então, de:
[...] qualquer conduta que configure retenção, subtração,
destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de
trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou
recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas
necessidades. (BRASIL, 2006)
 As ações de violência patrimonial podem aparecer no controle do
dinheiro da mulher, na destruição de seus documentos e objetos pessoais,
em deixar de pagar a pensão alimentícia, em furtos, estelionatos e
privação de seus bens, além de outras formas. (Instituto Maria da Penha)
 
AUTORA Juliana Garcez Silva Carvalho
21
Ainda, esse tipo de violência pode passar despercebido, e alguns sinais
para se atentar são a troca de senhas do banco, a destruição de objetos
da mulher ou negar acesso ao dinheiro do casal. 
 A violência patrimonial também pode ocorrer em momentos de término
ou brigas, de forma que muitas mulheres sem independência financeira
ficam presas naqueles relacionamentos, sem meios de conseguirem sair,
fato este que é reforçado pelas estruturas sociais de desigualdades de
gênero. Por fim, é importante salientar que este tipo de violência é um
crime, e o agressor pode (e deve) ser denunciado. 
3.5. Violência Moral
 Define-se honra como um conjunto de atributos morais, físicos e
intelectuais de um ser humano, que o fazem merecedor de respeito no
meio social e promovem sua autoestima, sendo inerente a todo ser
humano.
 Três são os crimes contra a honra previstos pelo Código Penal: calúnia
(art. 138), difamação (art. 139) e injúria (art. 140). A Lei Maria da Penha
(nº 11.340/2006) em seu artigo 7º, inciso V, tipifica a violência moral da
seguinte forma:
 “V – A violência moral, entendida como qualquer conduta que
configure calúnia, difamação ou injúria”. É um crime com prazo
decadencial, ou seja, perde a efetividade se não requerido no
prazo legal (no caso, 6 meses) e necessita de representação, o
que diz que somente se a vítima tiver interesse em ver o autor do
crime processado e julgado é que o Ministério Público dará
continuidade aos trâmites.
 Essa violência, por se tratar de um crime contra a honra, pode ser
considerado algo subjetivo, pois vai nortear-se através dos próprios
princípios da vítima, sendo sempre necessário na abordagem médico-
paciente compreender particularidades como religiosidade, crenças,
questões éticas, além do histórico cultural baseado na submissão do
papel da mulher dentro do ambiente doméstico e no meio social.
AUTORA Eveline de Oliveira Frota
 Ao falar em Saúde Pública, é notória a importância de se entender os
fatores que levam à prática de alguma forma de violência. No âmbito
doméstico, a violência contra a mulher configura o agravo de uma
desigualdade social, cujo respaldo está na construção histórica das
relações interpessoais, no qual a atribuição da mulher é pautada em
ações de subordinação. Dessa forma, factualmente, as questões de
gêneroimpuseram um papel inferior à mulher, incitando condições
desiguais e diversas formas de violência, seja ela psicológica, verbal,
financeira ou física, como a sexual. 
 A violência doméstica e o relacionamento abusivo são situações que,
na prática, expõe uma falha social e configuram um perfil epidemiológico
que afeta a saúde da população. Essas formas de violência são abusos
cometidos por pessoas próximas à vítima, dentro de sua casa, pelos
parceiros ou familiares.
 Após o ocorrido, as vítimas de agressão demonstram resistência em
procurar a ajuda e fazer a denúncia. Seus medos permeiam uma
retaliação por parte do agressor – no caso da violência doméstica, é
alguém conhecido –, vergonha, medo, sentimento de culpa e/ou
merecimento, provável exposição, além da dependência emocional e
financeira do parceiro agressor, dentre outros diversos motivos.
 Nesse contexto, a Atenção Primária à Saúde (APS) é de suma
importância para o reconhecimento da violência e posterior combate
dessa mazela social. De frente ao exposto, infere-se que, após os
episódios de violência
22
 Acusações de traição, críticas mentirosas, exposição da vida íntima,
xingamentos que incidem sobre a sua índole, desvalorização da vítima
sobre seu modo de vestir, emitir juízo moral sobre suas condutas são
exemplos de violência moral que fazem parte do cotidiano de mulheres.
Isso afeta o seu bem-estar, saúde e equilíbrio, necessitando de um olhar
atento por parte da rede de apoio e dos profissionais de saúde.
3.6. Violência Doméstica e Relacionamento
Abusivo
AUTORA Luana Martins Ribeiro
episódios de violência, a vítima busque atendimento em algum serviço de
saúde, seja para reparar danos físicos quanto psíquicos.
 Tal quadro relatado exige que os profissionais de saúde estejam
preparados para atender a vítima e tenham sensibilidade para conduzir o
caso da melhor maneira para a paciente. O olhar do profissional da
saúde deve ser treinado para que tenha a capacidade de entender a
mulher como um todo complexo, além do que foi verbalizado
explicitamente. 
 A linguagem corporal, as lacunas na explicação do ocorrido, o olhar
da vítima e o tom da fala devem ser analisados para que possam
incorporar a percepção que o profissional da saúde tem da pessoa que
busca o atendimento. Dessa forma, a atenção primária detém um leque
de profissionais que devem estar dispostos a combater esse tipo de
violência.
 O Agente Comunitário de Saúde (ACS), os psicólogos, os enfermeiros
e os médicos, ao atender a vítima de violência doméstica, devem ter a
postura adequada ao caso. Identificar o ocorrido, conversar com a
vítima, acolhê-la e apoiá-la são atitudes essenciais nesse primeiro
momento. Deve-se abordar o caso de forma que a vítima entenda que a
culpa não é dela e que existem mecanismos legais que a defende.
 Após o reconhecimento do ocorrido, é obrigatória a notificação à
autoridade sanitária do local. Assim, deve-se orientar a mulher a fazer
uma denúncia em uma delegacia, caso ela deseje e com caráter
facultativo, lembrando-a da Delegacia da Mulher, cujo princípio envolve
o acolhimento da vítima. Em casos especiais de violência física, orientar
para a realização do exame de corpo de delito.
 Porém, para as situações em que há resistência em fazer a denúncia,
o profissional da saúde pode informar sobre a Central de Atendimento à
Mulher, “Ligue 180”, cuja ligação é gratuita e disponível 24 horas.
 Um meio para analisar as formas de violência que chegam à Unidade
Básica de Saúde (UBS) é a Ficha de Notificação Individual de Violência
Interpessoal/Autoprovocada, que foi implementada em 2006 pelo Plano
Nacional de Redução de Acidentes e Violências. Deve ser preenchida
pelo profissional da saúde após a confirmação ou suspeita de violência -
nesse caso, 
 23
24
nesse caso, a violência doméstica. De forma contrária ao objetivo do
plano, a subnotificação ou notificação inconclusa dos casos é uma
realidade no Brasil. Como consequência, institui-se uma visão errônea do
quadro epidemiológico da região e do país, desestimulando campanhas
e ações de combate à violência doméstica e aos relacionamentos
abusivos.
 Outro ponto essencial durante a abordagem da vítima, além do
acolhimento inicial, é a importância do atendimento psicológico com um
profissional qualificado. A mulher precisa ser atendida de forma integral
e humanizada, sanando todas as suas demandas dentro de sua
realidade.
 Todo processo de combate à violência de gênero é difícil. Envolve
ciclos de naturalização e aceitação de diferentes formas de agressão e
subordinação da mulher. O reconhecimento da violência como tal, a
denúncia e o acolhimento da vítima são essenciais para o início da
quebra de um comportamento. Ao ajudar uma mulher e dar voz ao seu
relato, a Atenção Primária à Saúde estará cumprindo seu papel,
contribuindo para a saúde pública e zelando pela comunidade adscrita.
3.7. Violência Obstétrica
AUTORA Livia Nardelli Araújo
Violência por negligência: negar atendimento ou impor
impedimentos para que a gestante não receba a atenção adequada
e os serviços que são garantidos por lei, como por exemplo o direito a
X consultas pré natais e o direito ao acompanhante durante o
momento do parto, a fim de garantir a saúde da mãe e do bebê...
.pp.
 A Constituição Brasileira de 1988 garante, em seu artigo 6º, o direito
à saúde, ao lazer, à proteção à maternidade e à infância e à convivência
familiar, a todos os brasileiros. Tal artigo protege a mulher de qualquer
ofensa, de forma verbal ou física, praticada pelo médico, pela equipe do
hospital, por um familiar ou acompanhante, durante a gestação, no
momento do trabalho de parto, no período de puerpério ou recuperação
pós abortamento.
 A violência obstétrica pode ser dividida em vários subtópicos, tendo
todos eles em comum o desrespeito à mulher:
Violência física: contemplam práticas e intervenções
desnecessárias, sem o consentimento da mulher. Destacam-se
aplicação do soro com ocitocina, lavagem intestinal, privação da
ingestão de líquidos e alimentos, exames de toque em excesso,
ruptura forçada da bolsa, raspagem dos pelos pubianos, imposição
de uma posição de parto, não oferecer alívio para dor (seja ele
natural ou medicamentoso), realização de episiotomia ou uso de
fórceps sem indicação médica e cesariana sem indicação e
consentimento da mulher.
Violência verbal: contempla humilhações verbais, desconsiderações
das necessidades e dores da mulher. Dentre das frases mais
escutadas por mulheres incluem: “NÃO CHORA NÃO QUE ANO QUE
VEM VOCÊ ESTÁ AQUI DE NOVO”, “NA HORA DE FAZER NÃO
CHOROU, POR QUE ESTÁ CHORANDO AGORA?”, “SE GRITAR EU
PARO AGORA O QUE EU ESTOU FAZENDO, NÃO VOU TE ATENDER”,
“SE FICAR GRITANDO VAI FAZER MAL PRO SEU NENÉM, SEU NENÉM
VAI NASCER SURDO”.
Violência psicológica: toda e qualquer ação verbal ou
comportamental que cause a mulher sentimento de culpa,
inferioridade, abandono, medo, instabilidade emocional ou
insegurança.
Violência obstétrica em casos de abortamento: consiste na
negação ou demora ao atendimento, questionamentos e acusações
sobre a causa do aborto e até mesmo culpabilização e denúncia da
mulher.
 Desde 2011 o Ministério da Saúde disponibiliza a Rede Cegonha, que
tem o objetivo de reduzir a mortalidade materna e infantil e garantir os
direitos sexuais e reprodutivos de mulheres, homens, jovens e
adolescentes, proporcionando às mulheres saúde, qualidade de vida e
bem estar durante a gestação, parto, pós-parto e o desenvolvimento da
criança até os dois primeiros anos de vida.
 Além disso, a caderneta da gestante é um instrumento distribuído e
reconhecido na rotina de pré-natal dos serviços de saúde que realizam
.....
25
acompanhamento da gestação pelo SUS, que permite à gestante o fácil
acesso aos direitos de atendimento, trabalhistas, legais, dentre outros. 
 É importante realizar a denúncia em casos de violência obstétrica.Para realizá-la deve-se reunir todos os documentos: prontuário médico
(fornecido pelo hospital ou unidade de saúde, sem custo), cartão da
gestante, plano de parto, exames, contratos e recibos (quando na rede
privada); além de redigir um relato detalhando o que sofreu, como se
sentiu ao sofrer isso e quais as consequências dessa violência.
 A denúncia pode ser feitas nas secretarias Municipal, Estadual ou
Distrital, CRM (Conselho Regional de Medicina) quando se tratar de
profissional médico ou COREN (Conselho Regional de Enfermagem)
quando a abordagem violenta venha de enfermeiro ou técnico de
enfermagem. Denúncias também podem ser feitas pelo número 180 ou
pelo Disque Saúde 136.
26
3.8. Violência Cibernética
AUTORA Isabela Miranda Caldas
 
 O surgimento da internet e a facilidade de acesso, consumo e
propagação de informações trouxe para as mulheres uma nova categoria
de medo: ter sua imagem injuriada para milhares de pessoas, em questão
de segundos. Segundo dados da ONG SaferNet, os crimes cibernéticos
contra mulheres foram os que mais cresceram nos anos de 2017 e 2018,
com aumento de 1.600%. 
 A violência contra a mulher, infelizmente muito recorrente no mundo
real, ganhou novos formatos na rede, mas se baseando no mesmo
princípio: A busca do homem pela reafirmação do seu poder sobre o
corpo e a autonomia feminina. Dessa vez, através de ameaças que em
sua maioria, estão ligadas à exposição de conteúdos íntimos como fotos
e vídeos sexuais, sem o consentimento da vítima, quando feitas na
intensão de punir a mulher, é descrito como crime de pornografia de
vingança e, quando feitas para extorquir financeiramente a vítima, é
chamado de sextorsão. 
27
 Outros tipos de violência na rede de computadores também comuns,
são o estupro virtual, em que o autor do crime ameaça e chantageia a
vítima, exigindo favores sexuais como despir-se em uma chamada de
vídeo, e a perseguição online, que é uma forma de violência psicológica
em que o agressor, ao invadir a privacidade da mulher envia mensagens
e expõe boatos e fatos sobre a vítima nas redes. 
 A violência cibernética contra a mulher, apesar de não ser algo
recente, demorou a alcançar a visibilidade necessária para ser tratada
como crime. Foi somente em 2012, após uma atriz global ter sido vítima
desse tipo de abuso, é que foi criada no Brasil a primeira lei que defende
mulheres contra crimes cibernéticos. A Lei Carolina Dieckmann tornou
crime a invasão de computadores e aparelhos eletrônicos com
finalidades ilícitas, mas foi somente no ano de 2018, que a Lei nº 13.718/18
deixou claro a criminalização de divulgação de foto, vídeo ou cena de
sexo, nudez ou pornografia sem o consentimento da vítima. 
3.9. Feminicídio
AUTOR Ackel Stannier Souza Reis
 O Feminicídio, Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015, trata-se de
homicídio contra a mulher por razões da condição de sexo feminino. A
Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o
crime envolve: violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou
discriminação à condição de mulher.
 Em primeira análise, é indispensável salientar que o feminicídio tem
como base conceitual a definição de crime de gênero que se perpetua
sobre as mulheres na sociedade de modo geral. Assim, o feminicídio é o
ápice que finda a vida de mulheres, sendo a etapa final de uma
sequência de negligências que o meio social tem para com os seres
humanos do sexo feminino.
 Desse modo, diversos tipos de agressões podem levar aos homicídios
de mulheres, incluindo agressões de caráter físico, psicológico, sexual e
patrimonial, que podem culminar nas mortes de indivíduos do sexo
............
28
feminino, que têm como agente potencializador o despreparo do Estado
em buscar alternativas que possam sanar esse infortúnio e uma
sociedade que se molda no machismo e nas bases patriarcais de
submissão do gênero feminino.
 Portanto, o assassinato de forma intencional de mulheres por ações
de homens que se empoderam de conceitos sociais errôneos e do poder
biológico que possuem é a principal forma de violência contra as
mulheres, que pode gerar em muitas das vezes a morte dessas.
 Ademais, há três vertentes que necessitam serem identificadas e
compreendidas para que se possa ser realizada uma melhor análise no
tocante geral do feminicídio, dentre elas há a vertente “genérica” que
busca reconhecer que uma das causas centrais é a discriminação pela
desigualdade de gênero, a vertente “específica” que analisa de forma
singular a compreensão de cada fator que levou a ocorrência desse
crime e a “judicializada” que expõe de forma coerente uma maior
necessidade da avaliação acerca do tratamento e da punição devida
aos infratores, debatendo a judicialização desse crime.
4. MACHISMO
29
AUTORA Luísa Chaves Simões Silva
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 Machismo é definido pela discriminação e recusa à igualdade de
direitos entre homens e mulheres e a reprodução de violências de gênero.
 O machismo é um sistema de representações simbólicas que oferecem
modelos de identidade tanto para o sexo masculino quanto para o
feminino. A sociedade brasileira foi historicamente construída com base
em uma cultura machista e misógina, pondo sempre a mulher em uma
posição secundária.
 Sendo assim, o machismo pressupõe que há um único detentor de
todo o respeito e reverência: o macho.
 Essa submissão do feminino ao masculino é o que chamamos de
machismo, oferecendo modelos de identidade e de postura para ambos
os sexos, assim como um ideal a ser atingido por todos os homens e
acatado ou invejado pelas mulheres. Esse sistema privilegia os homens ao
longo do tempo em diferentes áreas da vida por não estar em igualdade
com as mulheres, o que resulta em movimentos e lutas feministas, em
busca da igualdade entre os gêneros. 
 Há fatores considerados condicionantes da violência: opressões
perpetradas pelas desigualdades de ordem econômica, machismo,
instituições discriminatórias à mulher e efeitos da educação que
privilegia o gênero masculino em detrimento ao feminino.
 Sendo assim, ao discutir violência contra a Mulher, faz-se necessário
destacar que é um debate também sobre o machismo, fator importante
relacionado às várias formas de violência. Na perspectiva da Atenção
Primária à Saúde é fundamental considerar essas questões sociais e
culturais, tanto na identificação, na abordagem e na prevenção.
5. RECORTES
SOCIAIS
31
32
5.1. Feminismo
AUTORA Luana Maria Pereira Galdino
 O feminismo surge como um movimento político e coletivo de luta das
mulheres por direitos civis e por emancipação, decorrente do
reconhecimento da opressão sofrida, a separação desigual dos poderes
e a evidência de que as desigualdades nas relações entre entre homens
e mulheres não estão inscritas na natureza e sim na sociedade. Dessa
forma, o movimento feminista rompe ideologias politicas, econômicas,
sociais e culturais, ou seja, ultrapassa os moldes de organização
tradicionais, mediada pela desigualdade e pelo autoritarismo. Em virtude
disso, o feminismo não pende somente sobre uma questão específica,
uma vez que as relações de gênero permeiam toda a sociedade e seus
impactos não estão subjugados somente às mulheres.
 Diante disso, o feminismo expôs que a integralidade corporal,
autonomia pessoal, igualdade e diversidade são componentes vitais para
a transformação democrática da sociedade e para a extinção de
desigualdades. A partir disso, as mulheres assumem a posse acerca das
decisões em relação ao seu próprio corpo e da sua vida, tornando
favorável o livre exercício da sua sexualidade.
AUTORA Joyce Beatriz Pasqualotto Reis Borges
5.2. Raça e Etnia
 A violência contra as mulheres não se restringe a uma questão de
gênero, somente. Quando se analisa a formação da sociedade no Brasil,
a raça - definição quanto características fenotípicas, como a cor da pele
- e a etnia - que envolve fatores culturais, como a nacionalidade,religião, língua e tradições - produziram hierarquias, que, juntamente
com o gênero, determinaram como certo grupo se comportaria e o modo
como ele é visto. A objetificação da mulher, principalmente negra, parda
e indígena, e sua inserção desigual nas relações sociais é histórica.
Desde os tempos do Brasil Colônia, essas mulheres sofrem inúmeros tipos
de violência e exploração, além de serem objetos de prazer disponíveis
fruto de uma hiperssexualização em um meio machista.
33
 No contexto atual, depois de muitos avanços através de ações de
movimentos feministas e o estudo da interseccionalidade entre raça,
etnia e violência de gênero, os dados ainda são alarmantes. O Atlas da
Violência (IPEA, 2020) informou que, em 2018, 68% das mulheres
assassinadas no país eram negras. Ainda, entre 2008 e 2018, a taxa de
homicídios de mulheres brancas caiu 11,7%, enquanto a taxa entre as
mulheres negras aumentou 12,4%.
 Além disso, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, a
violência contra mulheres, independentemente de sua raça ou etnia,
aumenta o risco de problemas de saúde. Há relatos que correlacionam
vítimas de violência e o desenvolvimento de doenças como alergias,
dores pélvicas, irregularidade menstrual, complicações gestacionais e
aborto, além de repercussões psíquicas evidentes. Esses problemas são
mais evidentes em mulheres negras, pardas e indígenas vítimas de
violência, que tem sua autopercepção em saúde classificada como
regular, ruim ou muito ruim após o episódio de agressão sofrido,
enquanto mulheres brancas permanecem com uma autopercepção boa
ou muito boa. 
 Por mais difícil que seja mensurar consequências, elas podem se
manifestar como dificuldade de acesso aos serviços de saúde, que,
associado ao fato de mulheres negras, indígenas ou pardas possuírem
menor escolaridade, serem trabalhadoras informais e residentes em
ambientes insalubres, ampliam os determinantes do processo saúde-
doença tornando o atendimento primário na atenção básica mais
complexo.
 Cabe ressaltar que a análise aqui abordada discute com mais afinco
a interseccionalidade de raça - quanto caráter biológico - e a violência
de gênero. Quando se volta à etnia, embora muitas vezes confundida
com raça, há um conceito mais ampliado que compreende fatores
culturais, como a nacionalidade, religião e língua. Dessa forma, quando
se nasce mulher e negra, indígena ou parda, além da herança genética,
elas carregam uma herança cultural que as colocam num estereótipo e
perfil mais violentados no convívio social, principalmente nas relações
familiares. 
 Por outra perspectiva, diante do aumento do número de migrantes no
Brasil (haitianos, senegaleses, venezuelanos, entre outros), a relação da
etnia e violência de gênero se torna ainda mais necessária para
ultrapassar obstáculos culturais e linguísticos e melhorar a assistência à
saúde dessas mulheres, muitas vezes negligenciada.
 À luz desse contexto, a maior vulnerabilidade de mulheres negras,
pardas, indígenas e de múltiplas etnias torna imprescindível a discussão e
problematização de todos os tipos de violência contra a mulher e seus
fatores associados. Dessa forma, a sociedade seguirá em um caminho
rumo à diminuição das disparidades de cor e gênero e melhoria no
atendimento em saúde dessa população.
AUTORA Lia Prudente Guimarães Arantes
5.3. Classe
 O mito de que a mulher de baixa renda e com pouca escolaridade é a
única a sofrer violência doméstica deve ser desfeito. Segundo
Cavalcanti, não é possível traçar um perfil exato da vítima e do agressor
porque a violência doméstica está presente em todas as classes sociais.
Estudos mostraram que 42,6% de mulheres atendidas em hospitais do Rio
de Janeiro por violência doméstica tinham renda familiar entre um a três
salários mínimos. Entretanto, deve-se considerar que em famílias de
rendas maiores, os casos de violência são ocultados por advogados e
muitas vezes não são denunciados como crime. 
 Outro estudo realizado em parceria entre o DataPopular e o Instituto
Avon mostrou que entre os homens entrevistados pertencentes a classe
alta, 59% admitem ter realizado algum tipo de agressão contra mulher,
enquanto que da classe média 55% e da baixa 53% admitem. 
 Portanto, o recorte social de classe é muito importante de ser
analisado pois a violência contra a mulher é um problema amplamente
disseminado em todas as classes sociais que envolve questões culturais e
históricas. 
34
 O conceito de trans ou transgênero equivale aos que não se
identificam com seu sexo desde o nascimento, sendo eles homens trans,
mulheres trans e travestis. Há 17 anos, a data 29 de janeiro tornou-se o
dia da visibilidade trans no Brasil, a partir de um manifesto realizado por
toda a comunidade denominada transexual, em frente ao Congresso
Nacional, em Brasília, com intuito de lançar a campanha “TRAVESTI É
RESPEITO”.
 O dilema que as pessoas trans sofrem é diário, a identificação
pessoal e o julgamento da sociedade criam um debate sobre como lutar
de forma efetiva para quebrar paradigmas enraizados na cultura em que
vivemos. As pessoas são treinadas para entender que o que define o
homem e a mulher são critérios da anatomia corporal e a compreensão
de conceitos diferentes trava um transterrorismo, impedindo a libertação
daqueles que possuem uma identidade psicológica diferente da sexual.
 Com os estigmas psicológicos e sociais colocados diretamente sobre
esses indivíduos, a falta de políticas públicas destinadas às necessidades
de pessoas TGNC (“transgender and gender non-conforming children”,
.....
35
 No contexto atual, as consequências da pandemia de COVID-19 sobre
a renda familiar dos brasileiros impactou nos índices de violência contra
as mulheres. O estudo “Visível e Invisível: A vitimização de mulheres no
Brasil” realizado pelo Datafolha e o Fórum Brasileiro de Segurança
Pública mostrou que dentre as mulheres que sofreram violência
doméstica 25% afirmaram que a dificuldade de garantir o próprio
sustento seja por perda do emprego ou da renda foi o fator principal que
contribuiu para o episódio de violência que sofreram, enquanto que 22%
afirmaram que o motivo foi a maior convivência com o agressor. Além
disso, dentre as mulheres que vivenciaram violência doméstica, 62%
relataram piora nas condições de vida e dentre as que não sofreram, a
proporção foi de 50%.
5.4. Gênero
AUTORAS Danielle Souza Reis e Amália Dias dos Santos 
36
que significa: crianças transgêneras e em desconformidade de gênero)
cria dificuldades significativas para elas/eles. 
 Com isso, a violência, o isolamento, repressão comunitária, evasão
escolar e a defasagem no apoio familiar se tornam uma realidade
presente no cotidiano desses indivíduos, normalmente sendo algo
naturalizado pela sociedade. Destarte, após um longo período de
aversão a essa comunidade, principalmente ofertada pelos sistemas
governamentais e autoritaristas, a nova conjuntura formada, oferecia
mudanças que agregariam melhorias efetivas, melhorias essas, tanto
emocionais, como físicas e principalmente que recolocariam a
comunidade transgênero em um novo pilar social.
 A luta pelo concebimento de direitos a esse grupo é tardia, mas muito
válida. O Ministério da Saúde ajudou a estabelecer o Dia da Visibilidade
Trans em 29 de janeiro de 2004, e assim no mesmo ano o Governo
Federal criou o programa “Brasil sem homofobia”, fundou o comitê
técnico para a formulação de proposta da política nacional de saúde de
população GLTB (gays, lésbicas, traveis e bissexuais).
 Em 2008 foi instituído o Processo Transexualizador no SUS por meio
da portaria GM/MS nº 1.707. Já em 2009, a carta dos direitos dos
usuários do sus passou a assegurar o uso do nome social,
independentemente do registro civil e em 2011 o Ministério publicou a
Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais,
Travestis e Transexuais (LGBT).
 Em 2013, houvea redefinição e ampliação do processo transexualizador
no SUS, incluindo o atendimento a travestis e homens trans, pela portaria
nº 2.803. E em 2016, o decreto nº 8727 determinou o uso do nome social
e reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e trans
no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e
fundacional.
 A partir disso, estabelecem-se as lesbofobias — diversas formas de
opressão, subjetivas e objetivas, cujos objetivos são marginalizar, apagar,
silenciar, invisibilizar e violentar tal grupo social em desacordo com a
heteronorma. Essa violência sexual e de gênero pode se manifestar tanto
no âmbito intrafamiliar, a partir do não acolhimento da orientação sexual
das filhas por parte dos responsáveis; como no ambiente coorporativo,
mediante importunações, perda de cargos pela orientação sexual,
silenciamento, avisos com normas de comportamentos e apagamento
ocasionado pela internalização da cisheteronormatividade. Também
podem acontecer opressões na formação escolar e acadêmica, por meio
de bullying e da negligência da coordenação ou dos responsáveis. 
 É possível citar também a violência religiosa, cujo condenamento e
demonização das práticas homossexuais femininas promovem conflitos
familiares, emocionais, sociais e espirituais, na medida em que afastam
tais mulheres de uma necessidade humana que é a espiritualização.
 Além das violências já citadas, evidencia-se o estupro corretivo —
aquele em que uma ou mais pessoas estupram mulheres lésbicas,
supostamente como forma de "curar" sua orientação sexual. Tal prática
além de reforçar o ideal de algo patológico necessitado de cura, nega
as identidades lésbicas, de modo a configurar-se causa específica de
aumento de pena dos crimes de estupro. Outra violência mais cruel é o
próprio lesbocídio: assassinato de mulheres lésbicas como forma de
aniquilação dessas identidades em detrimento de uma plena aceitação
social desse grupo como sujeitos em igualdade de direitos e deveres
constitucionais. 
37
 Lesbofobia: Lésbicas e outras mulheres que se relacionam afetiva
e/ou eroticamente entre si sofrem dupla opressão, o machismo e as
violências decorrentes da divergência da cisheteronormatividade —
sistema patriarcal e capitalista pautado na validação apenas de
estruturas de expressão afetiva-sexual que se enquadrem em contextos
heterossexuais, monogâmicos, cristãos, tradicionais e cisgêneros. Dessa
forma, a lesbianidade configura-se a fuga do roteiro sexual tradicional
imposto às mulheres como mecanismo de subordinação. 
 
AUTORA Maria Laura Mendes dos Santos Leal
5.5. Orientação sexual
38
 Bifobia: a bifobia feminina caracteriza-se pela discriminação de
mulheres que se relacionam afetiva e/ou sexualmente com mais de um
gênero, tal violência difere daquela sofrida por lésbicas na medida em
que as mulheres bissexuais sofrem opressões particulares e, na maioria
das vezes, simbólicas e subjetivas. Isso porque são muito os estereótipos
associados a bissexualidade feminina, tais como a promiscuidade,
estigma favorecedor da sexualização e fetichização dessas mulheres por
homens. 
 Pode-se citar também as violências ocasionadas pela invisibilidade,
pois, na visão errônea dos bifóbicos, essas mulheres estariam apenas
passando por uma fase indecisa a fim de chamar atenção, já que para
eles a bissexualidade inexiste. Essa invisibilização pode ser definida
como um processo de apagamento social dessas identidades,
repercutido na ausência de representação nas mídias comunicativas, nos
ambientes sociais coletivos, no entretenimento, nas próprias
organizações LGBTQIA+, na abordagem à saúde digna e, sobretudo, na
computação de dados sobre bifobias. As poucas investigações tangentes
às opressões sofridas por essas mulheres vai de encontro à urgência da
abordagem da temática, visto que, segundo uma pesquisa estadunidense
sobre violência, mulheres bissexuais são mais frequentemente vítimas de
violências sexuais que outros grupos de mulheres, por exemplo.
 Além disso, configura-se imprescindível citar e discutir nos espaços
coletivos as bifobias sofridas por mulheres trans e travestis que se
identificam como bissexuais. Isso porque as questões deste grupo
demográfico não se restringem à sua identidade de gênero, mas também
dizem respeito às demandas vivenciadas pela sua orientação sexual.
Logo, ratifica-se a necessidade de analisar as opressões nas relações
sáficas com recortes de gênero, sexualidade, identidade de gênero, etnia
e classe, visto que as interseccionalidades são diversas.
 Violência sáfica nos relacionamentos: é preciso romper o mito da
inexistência de violência nas relações afetivas e/ou sexuais entre
mulheres, pois tal grupo também é influenciado por valores patriarcais e
...
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machistas. Assim, é comum observar casais sáficos com dinâmicas
cisheteronormativas internalizadas, nas quais, geralmente, uma mulher
assume pra si o papel de “homem da relação” e passa a reproduzir
opressões de gênero no cotidiano e nas performances do casal. Por isso
é importante que mulheres sáficas vítimas de violência conjugal não se
silenciem e busquem uma rede de apoio.
 Ademais, convém relatar as violências sofridas por mulheres bissexuais
em seus relacionamentos com lésbicas decorrentes do estigma social de
promiscuidade socialmente atribuído à bissexualidade feminina. Isso
porque, corriqueiramente, as bissexuais sofrem rejeição por parte de
algumas lésbicas, cuja visão preconceituosa tangente à bissexualidade
as fazem acreditar que a bissexual irá trocá-la a qualquer momento por
um homem ou que essas mulheres são “sujas”, pois transam com a
população masculina e “trazem doenças” para a comunidade lésbica.
 Saúde da mulher sáfica: A negligência da saúde de mulheres que
se relacionam com mulheres enquadra-se como lesbofobia, pois acarreta
deficiências no rastreamento de câncer de colo uterino e de mama,
ausência de informações corretas sobre sexo seguro e descuidos a
respeito do planejamento reprodutivo dessas mulheres. Essa ineficiência
no atendimento ocorre pelo fato de os profissionais de saúde possuírem
uma formação acadêmica incompleta que desconsidera a saúde sexual
de mulheres divergentes da cisheteronormatividade.
 Convém apontar também as dificuldades no atendimento à saúde
psicológica, já que a lesbofobia e a bifobia são violências, por si só,
fragilizadoras do emocional de mulheres não heterossexuais. Aliado a
essas discriminações, observa-se que tais empecilhos não apenas
retardam a melhoria da saúde mental, como podem ser também
caracterizados como uma violência simbólica. Isso porque são poucos os
profissionais capacitados para lidar com as vivências dessas mulheres,
cujas demandas são, muitas vezes, relativizadas e questionadas em
detrimento da construção de um ambiente de apoio assistencial efetivo e
seguro. 
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Desta maneira a antropóloga Debora Diniz define em seu livro “Cadeia:
relatos sobre mulheres” o perfil das mulheres presas em uma
penitenciária no Distrito Federal, após seis meses de convivência. Tal
definição pode ser ampliada à outras penitenciárias do Brasil, à outras
mulheres em situação de vulnerabilidade social; mulheres que são
privadas não somente de sua liberdade, mas também de seus direitos e
qualidade de vida.
“Assim, se há um universo oculto no presídio, ele se manteve
desconhecido mesmo após meu longo trabalho de campo. Do
que conheci, posso dizer que o presídio é uma máquina de
abandono para a qual os sentidos da violência são múltiplos.
Uma mulher ao atravessar o grande portão principal em um
cubículo de camburão jamais será a mesma. Não importa se
permanecerá no presídio como sentenciada ou se a estadia
será provisória. O abandono é a cena final de um rito de vida
que teve início na casa ou na rua. As mulheres do presídio são
muito parecidas – pobres, pretas ou pardas, pouco
escolarizadas, dependentes de drogas,cujo crime é uma
experiência de economia familiar. Não são apenas mulheres
presas quem conheci, mas famílias de pessoas presas. O
principal crime é a categoria ambígua de “tráfico de drogas”.
Não conheci uma traficante semelhante a líder de facção
criminosa, talvez uma característica do tráfico na capital ou,
quem sabe, da traficante dos presídios do país. Elas eram
mulheres comuns, donas de casa, ambulantes ou empregadas
domésticas, que um dia resolveram levar drogas no corpo para
os maridos ou companheiros no presídio masculino. Ou que
acharam possível esconder um pacote de cocaína embaixo da
cama, ou vender pamonha com maconha.”
 
5.6. Em privação de liberdade
AUTORA Fernanda Alves Martins 
 No dia 06 de julho de 2015 foi promulgada a Lei nº 13.146, a qual
determinou a criação da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com 
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 A jornalista Nana Queiroz retrata em seu livro “Presos que menstruam:
a brutal vida das mulheres – tratadas como homens – nas prisões
brasileiras”, as diversas violências que sofrem as reclusas no seu dia a
dia. Desde questões mais gerais como a higiene pessoal – a autora cita
em seu livro que, em geral, cada mulher recebe por mês dois papéis
higiênicos e 16 absorventes, uma quantia insuficiente para os seus
cuidados, recorrendo às vezes a miolos de pão durante o período
menstrual – a questões mais específicas como a maternidade – as presas
sofrem agressão física mesmo durante a gestação, é comum que não
tenham atendimento pré-natal e não são tratadas com respeito durante
o parto e o período de amamentação. Quando as crianças não são
retiradas do cuidado materno precocemente, vivem em condições
desumanas junto às suas mães, o que afeta diretamente seu
desenvolvimento. 
 Quando se fala em minorias no campo social, não se fala de uma
minoria em números, mas de uma minoria de direitos. O termo é usado
para referir-se a populações que são de alguma forma prejudicadas no
contexto social em que vivem, que são privadas de bem-estar social, de
sua autonomia; que perdem o caráter de ser humano. É necessário
oferecer a essas mulheres confinadas em presídios aquilo que se oferece
às mulheres que estão em condição de liberdade. Deve-se fornecer a
elas acesso integral à saúde, de maneira que todas suas particularidades
sejam respeitadas e suas queixas atendidas. 
 O Estado, que pune essas mulheres de acordo com seus dispositivos
legais, tem responsabilidade sobre as mesmas durante o cumprimento da
pena, e portanto deve fornecer profissionais da saúde especializados no
cuidado dessas mulheres, fiscalizar as condições do ambiente em que
vivem e garantir o exercício de seus direitos, já que ser presidiária não
lhes quita a condição de cidadã.
AUTORA Iasmin Silva Campos
5.7. Com deficiência
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Deficiência. Em seu Art. 5º, a lei descreve que “são considerados
especialmente vulneráveis a criança, o adolescente, a mulher e o idoso,
com deficiência”. Logo, a mulher com deficiência está em situação de
maior vulnerabilidade. 
 Em seu Art. 26, a lei define que “os casos de suspeita ou de
confirmação de violência praticada contra a pessoa com deficiência
serão objeto de notificação compulsória pelos serviços de saúde públicos
e privados à autoridade policial e ao Ministério Público, além dos
Conselhos dos Direitos da Pessoa com Deficiência”. A partir disso, a lei
obriga o SUS a desenvolver ações destinadas à prevenção de
deficiências por causas evitáveis, através da nutrição da mulher e da
criança, por exemplo.
 Sabe-se que, além das mulheres com deficiência possuírem menos
acesso à proteção contra violência sexual e outros tipos de violência,
frequentemente são menos capazes de se defender. Geralmente os
agressores são os responsáveis por prover o cuidado, ajuda física ou
financeira e, com isso, há uma barreira para a denúncia, inclusive porque
há uma tendência de que suas denúncias não venham a ter crédito e,
também, por falta de acessibilidade para que essas informações
cheguem ao Estado. Além disso, a situação da violência contra mulher
com deficiência é agravada por falta de políticas e agendas que estejam
voltadas para essas ações, pela omissão e baixa cobertura de
procedimentos de socorro1.
AUTORA Cinthia De Fátima Machado
5.8. Em situação de rua
 A população em situação de rua, conforme a Política Nacional para a
População em Situação de Rua (PNPR) – 7.053/2009, pode ser definida
como:
 Os principais motivos que levam os seres humanos até ás ruas são o
desemprego, os vícios – álcool e drogas, as desavenças familiares e a
violência. Além disso, destaca-se a intensa exclusão e invisibilidade
social existente, sobretudo pelo modelo econômico vivenciado no século
XXI, bem como pelas estruturas políticas-sociais que negam a garantia
de direitos previstos na Constituição, como o acesso a saúde, transporte,
moradia, educação e oportunidades. 
 Estudos realizados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada no
Brasil (IPEA) – ano 2020, estima-se a existência de cerca de 221.900
pessoas em situação de rua, sendo dessas cerca de 15% a 20%
representadas por mulheres – o percentual é variável de acordo com a
cidade, não existindo dados atualizados e disponíveis nacionalmente.
Entretanto, embora sejam minorias na população de rua, segundo
levantamento realizado pelo Ministério da Saúde (MS), as notificações de
violência em indivíduos do sexo feminino foram cerca de 56% no ano de
2017, e embora as agressões entre homossexuais e bissexuais apresente
cerca de 4%, evidencia-se que a maioria das notificações no que tange
a identidade de gênero ocorre entre travestis e transexuais mulheres. 
 A dificuldade em avaliar os dados reais acerca da violência sofrida
pela mulheres em situação de rua ocorre principalmente pela defasagem
de dados oficiais e atualizados desse grupo, bem como pelas
subnotificações das brutalidades sofridas. Todavia, o que se pode inferir
é que as mulheres em situação de rua estão mais expostas aos
obstáculos e aos diversos tipos de violência, devido a situação de maior
vulnerabilidade, como também à cultura patriarcal existente em nosso
país. 
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 [...] grupo populacional heterogêneo que possui em
comum a pobreza extrema, os vínculos familiares
interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia
convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos
e as áreas degradadas como espaço de moradia e de
sustento, de forma temporária ou permanente, bem como
as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou
como moradia provisória (BRASIL, 2009).
 Cabe ressaltar que a forma de violência mais evidente é a física, e
que apesar da existência das demais, essas são pouco nominadas, sendo
reconhecida como algo sem relevância. Além disso, nota-se que as
múltiplas formas de violência estão em todas as partes, gerando maior
medo, insegurança e violação dos direitos. Dessa forma, quando se relata
a violência contra as mulheres em situação de rua, observamos entraves,
pois essas, vivem á margem da sociedade, são abandonadas,
depreciadas tanto pela sociedade, quanto pelas políticas públicas.
 Nessa perspectiva, para além das dificuldades enfrentadas para
combater e denunciar as violências, tais mulheres sofrem ainda mais pela
falta de informação, apoio, direcionamento e impunidade ao agressor –
que muitas vezes é desconhecido. Nesse sentido, ressalta-se que as
estratégias de enfrentamento da violência contra mulheres em situação
de rua, baseia-se principalmente no olhar dos profissionais que assistem
esta população. Assim, é necessário que o conceito de cuidado perpasse
a literatura e comece a existir no seu aspecto mais amplo.
 Desse modo, no que tange ao serviços públicos de acolhimento em
casos de violência contra as mulheres em situação de rua pode-se
destacar as Equipes de Consultórios de Rua, que é uma estratégia
instituída pela Política Nacional de Atenção Básica em 2011.Nesse
ambiente, oferta-se acolhimento, acesso os serviços básicos de saúde,
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*PSR: Pessoas em situação de rua 
 Os diversos tipos e as formas de violências vivenciadas pelas mulheres
em situação de rua são demonstradas no esquema a seguir:
bem como ações juntamente com as Unidades Básicas de Saúde do
território, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPSs), os serviços de
Urgência e Emergência e os outros pontos de atenção da rede de saúde
intersetorial. Além disso, tais consultórios são compostos por uma equipe
multidisciplinar incluindo os profissionais do Nasf, o que permite maior
atuação na temática de violência. 
 Também, pode-se citar o Centro de Referência Especializado para
População em Situação de Rua (Centro Pop). Esses centros permitem o
convívio social e o desenvolvimento de relações que envolvem a
solidariedade, o respeito e a afetividade, o que permite a
longitudinalidade e a criação de vínculo, garantindo um maior acesso às
políticas públicas, aos direito e a confiabilidade de medos e receios, já
que é possível realizar encaminhamentos, contatos, reuniões e
articulações direcionadas a essa população, principalmente após a
Resolução n° 2, de 27 de fevereiro de 2013 que define diretrizes e
estratégias de orientação para o processo de enfrentamento das
iniquidades e desigualdades em saúde com foco na População em
Situação de Rua (PSR) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
 Além disso, destaca-se as redes de atendimento às mulheres em
situação de violência, que são a articulação entre as instituições/
serviços governamentais, não governamentais e a comunidade, que visa
auxiliar, promover e prevenir casos de violência. Nesse sentido, a rede
possui como tripé o combate, a prevenção, a assistência e a garantia de
direitos como previsto na Política Nacional de Enfrentamento à Violência
contra as Mulheres. Desse modo, no que se refere aos serviços
especializados existem Centros de Atendimento à Mulher em situação de
violência, Casas Abrigo, Casas de Acolhimento Provisório (Casas-de-
Passagem), Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Postos
ou Seções da Polícia de Atendimento à Mulher), Núcleos da Mulher nas
Defensorias Públicas, Promotorias Especializadas, Central de
Atendimento à Mulher - Ligue 180, Ouvidoria da Mulher, Serviços de
saúde voltados para o atendimento aos casos de violência sexual e
doméstica, dentre outros.
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 Contudo, apesar de existir meios para o processo de denúncia, a
população em situação de rua encontra diversos empecilhos. Conforme
PINTO (2019), em casos de adoecimento, a população busca inicialmente
o atendimento nos hospitais de emergência, e as Unidades Básicas de
Saúde. Porém, devido ao processo de discriminação, estigmatização e
olhares preconceituosos, essas mulheres evitam buscar auxílios mesmo em
caso de necessidade, inferindo-se que em casos de violência essas
permanecem em silêncio e sem buscar auxílio. 
 Diante disso, cabe considerar a necessidade da ampliação dos
serviços especializados e da criação de ajuda diferenciada para essas
mulheres, garantindo maiores informações, apoio e acolhimento
humanizado, assegurando acesso às políticas a fim de evitar a
perpetuação dos ciclos de violência. Assim, a articulação entre as
esferas públicas torna-se fundamental, a fim de considerar a
especificidade de cada mulher e o seu contexto histórico, já que a vida
das mulheres vão além das ruas. Também é fundamental entender que
embora seja um fenômeno social semelhante, existem singularidades que
necessitam ser vistas e solucionadas, afinal, ninguém quer estar na rua,
ninguém quer sofrer diversas formas de violências, e sim querem ser
vistas, ouvidas, ajudadas.
 Por fim, tal realidade demonstra a necessidade de novas ações
principalmente da Atenção Primária a Saúde, a fim de assegurar os
direitos sociais das mulheres em situação de rua que vivenciam a
violência. Sendo assim, é fundamental desenvolver mecanismos mais
reflexivos e palpáveis, visando a organização de condutas conjuntas e
efetivas. Assim, em um cenário brasileiro caótico e invisível para essas
mulheres, desenvolver estratégias que possam acolher e solucionar a
demanda dessas é iniciar o fim da perpetuação desses ciclos, e garantir
quem sabe um pouco de esperança. 
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6. REDES DE APOIO
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Centros de Referência de Atendimento à Mulher: Os Centros de
Referência são espaços de acolhimento/atendimento psicológico e
social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação
de violência, que devem proporcionar o atendimento e o acolhimento
necessários à superação de situação de violência, contribuindo para
o fortalecimento da mulher e o resgate de sua cidadania.
 Como o setor de saúde é um dos espaços estratégicos para identificar
mulheres e adolescentes em situação de violência, seu papel é essencial
na definição e articulação dos serviços e organizações que, direta ou
indiretamente, atendem situações de violência. 
 É necessário que gestores de municípios e estados sejam ativos para a
organização de redes integradas de atendimento, na capacitação de
recursos humanos, na provisão de insumos e na divulgação dessa rede
para o público em geral. É preciso que todos os serviços de orientação
ou atendimento tenham pelo menos uma listagem com endereços e
telefones das instituições componentes da rede, como tanto Unidades
Básicas de Saúde quanto Hospitais podem ser porta de entrada para
mulheres em situação de violência, é necessário que essas informações
sejam de fácil acesso para profissionais e para as mulheres nessa
situação. Essa lista deve ser do conhecimento de todos os colaboradores
dos serviços, permitindo que as mulheres tenham acesso a ela sempre
que necessário e que possam conhecê-la independentemente de
situações emergenciais.
 Em 2010, o sistema de atendimento para mulheres em situação de
violência foi reformulado. Anteriormente, os serviços e órgãos
disponibilizados no sistema da rede de atendimento e no site da
Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) não eram categorizados,
o que dificultava a busca de informações por parte dos usuários. Dessa
forma foram criadas seis categorias gerais e especificados os conceitos
dos serviços e órgãos listados no sistema. As principais categorias de
Serviços Especializados de Atendimento à Mulher serão listados no
próximo tópico, mas vale destacar
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6.1. Saúde
AUTORA Melissa Vieira de Moraes Agapito
Serviços de Saúde voltados para o atendimento dos casos de
violência sexual e doméstica: a área da saúde, por meio da Norma
Técnica de Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da
Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes, tem prestado
assistência médica, de enfermagem, psicológica e social às mulheres
vítimas de violência sexual, inclusive quanto à interrupção da gravidez
prevista em lei nos casos de estupro. A saúde também oferece
serviços e programas especializados no atendimento dos casos de
violência doméstica.
 Embora todos os serviços de apoio estejam listados na Rede de
Enfrentamento à Violência Contra às Mulheres, é preciso que os serviços
de saúde, principalmente as Unidades Básicas de Saúde, que se
constituem como porta de entrada, bem como pelo atendimento
longitudinal e integral da sua população, disponibilizem o acesso
facilitado aos endereços desses serviços no seu município e no seu
estado. Pois a Rede de Atendimento à Mulher não pode ser apenas
composta por serviços isolados, eles devem ser integrados, de forma que
a UBS possa ser coordenadora do cuidado quando alguma mulher
precisar utilizar esses serviços. Pelo contato próximo, a APS tem papel
fundamental na identificação dos casos de qualquer tipo de violência
contra a mulher, portanto, deve sempre capacitar os profissionais da
equipe para o atendimento nessas situações, promovendo o acolhimento,
o suporte e o referenciamento necessários.
 Desde 2003, através da Lei 10.778, tornou-se

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