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PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 1 ANÁLISE DE DADOS 1. INTRODUÇÃO 1.1 Tabelas O primeiro estágio de apresentação de uma série de medidas resultante de um experimento é através de tabelas que, em geral, já são montadas durante o processo de obtenção de dados. Embora em cada experimento se deva decidir pela forma de tabela mais conveniente, é mostrado a seguir um padrão de tabela que se adapta à maioria dos experimentos que serão feitos nas disciplinas experimentais de Física. Considere um experimento onde se aplica tensão elétrica V entre 10 e 50 V em um resistor e mede-se a corrente I gerada. A Tabela 1 mostra uma forma conveniente de apresentar os valores obtidos: Tabela 1: Valores da tensão aplicada no resistor e a correspondente corrente. Tensão (𝑽 ± 𝟏%) Corrente (10-3 A) (𝑰 ± 𝟏%) 11,3 22,5 19,5 40,0 22,7 44,4 29,1 59,2 38,4 76,1 42,3 83,8 50,0 99,3 Deve-se observar que: • toda tabela deve ter uma legenda; • no cabeçalho da tabela é importante vir a especificação das grandezas que foram medidas com suas unidades e a estimativa dos erros, absolutos ou relativos, a elas associados; se cada medida apresentar um erro diferente, deve- se especificá-lo após cada uma; • número de algarismos significativos das medidas deve ser compatível com os erros especificados. 1.2 Gráficos A construção de gráficos associando as variáveis medidas em um experimento é bastante interessante, pois permite uma visualização rápida do tipo de dependência existente entre as grandezas estudadas. Existem vários tipos de gráficos, cada um se adequando melhor às grandezas medidas e ao tipo de relações que se deseja fazer entre elas. Uma forma de gráfico bastante comum em experimentos de Física é aquele relacionando duas grandezas onde cada valor de uma está associado a um valor correspondente da outra. O gráfico a seguir, mostrando a relação entre as grandezas tensão e corrente representadas na tabela anterior, ilustra uma forma comumente utilizada. PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 2 Figura 1: Exemplo de um gráfico: Tensão elétrica V versus corrente I em um resistor. Deve-se ter atenção que um gráfico deve conter: • título e/ou legenda; • nome da grandeza em cada eixo com sua respectiva unidade; • dimensionamento correto da escala. Uma observação rápida do gráfico anterior permite identificar uma relação linear entre as duas grandezas analisadas. Tratamento matemático de dados: Ajuste de uma reta por regressão linear O gráfico da seção anterior sugere, visualmente, que existe uma relação linear entre a tensão elétrica aplicada e a corrente no resistor. Isso significa que, procurando- se uma relação matemática que associe a corrente I no resistor sujeito a uma tensão V, deve-se encontrar a equação de uma reta, ou seja, uma equação do tipo: 𝑦 = 𝐴𝑥 + 𝐵 onde a constante A representa a inclinação da reta e a constante B o valor da grandeza y quando x = 0. Para o caso do resistor podemos escrever especificamente 𝑉 = 𝐴𝐼 + 𝐵 É possível traçar no gráfico uma reta que, visualmente, melhor equilibra os pontos medidos e, então, determinar os valores de A e B (faça isso). Entretanto, existem processos matemáticos objetivos que estabelecem a melhor reta que se ajusta aos pontos medidos. O processo mais utilizado com esse intuito é chamado regressão linear. Geralmente, todo processo operacional de ajuste, ou seja, de obtenção das constantes A e B que definem a reta, será feito por calculadora ou computador. No entanto é interessante que se tenha conhecimento da origem das fórmulas empregadas e do processo de cálculo envolvido. PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 3 Regressão Linear: Pode-se dizer que regressão linear é a: “determinação da equação de uma reta que melhor se sobrepõe aos resultados de medidas relacionando grandezas linearmente dependentes.” Considere a série de pontos experimentais genéricos (𝑥𝑖 , 𝑦𝑖) colocados no gráfico da Figura 2. Figura 2: Pontos experimentais definindo uma reta; 𝛿𝑖 é a diferença entre a ordenada 𝑦𝑖 medida para e 𝑥𝑖 o correspondente valor calculado pela equação da reta. Se a melhor curva que passa por estes pontos é a reta desenhada, podemos escrever sua equação na forma 𝑦 = 𝐴𝑥 + 𝐵, onde B é o ponto onde a reta corta o eixo vertical, em x = 0, e A é a inclinação da reta escolhida. Observando o gráfico da Figura 2 notamos que para o ponto xi, o valor experimental corresponde é , mas, pela reta escolhida, a ordenada correspondente a 𝑥𝑖 será A𝑥𝑖 + B. Desta forma, para cada ponto 𝑥𝑖 existe uma diferença 𝛿𝑖, ou resíduo, entre o valor experimental medido e o valor de y calculado pela reta: 𝛿𝑖 = 𝑦𝑖 − (𝐴𝑥𝑖 + 𝐵) Alguns resíduos são positivos e outros negativos. Uma grandeza que daria uma visão de “quão boa” é a reta calculada, seria: 𝐷 = ∑(𝛿𝑖) 2 = ∑[𝑦𝑖 − (𝐴𝑥𝑖 + 𝐵)] 2 𝑒𝑞. 1 a qual representa a soma dos quadrados dos resíduos de todos os pontos. PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 4 A melhor reta que ajusta os pontos experimentais é aquela que minimiza D, ou seja, deve-se achar os valores de A e B tais que D seja mínimo. Como D é uma função de A e B, para que ele seja mínimo devemos ter: 𝜕𝐷 𝜕𝐴 = 0 𝑒 𝜕𝐷 𝜕𝐵 = 0 Derivando a equação 1 tem-se: 𝜕𝐷 𝜕𝐴 = −2 ∑[𝑦𝑖 − 𝐵 − 𝐴𝑥𝑖]𝑥𝑖 𝑒 𝜕𝐷 𝜕𝐵 = −2 ∑[𝑦𝑖 − 𝐵 − 𝐴𝑥𝑖] Assim, para que D seja mínimo, devemos ter: ∑[𝑦𝑖 − 𝐵 − 𝐴𝑥𝑖]𝑥𝑖 = 0 𝑒 ∑[𝑦𝑖 − 𝐵 − 𝐴𝑥𝑖] = 0 𝑒𝑞. 2 que é um sistema de duas equações com duas incógnitas A e B que determinam a melhor reta 𝑦 = 𝐴𝑥 + 𝐵, que passa pelos pontos experimentais (𝑥𝑖 , 𝑦𝑖). A solução do sistema de equações 2 é simples e dá como resultado os seguintes valores para A e B: 𝐴 = 𝑛 ∑ 𝑥𝑖𝑦𝑖 − ∑ 𝑥𝑖 ∑ 𝑦𝑖 𝑛 ∑ 𝑥𝑖2 − (∑ 𝑥𝑖) 2 𝐵 = 1 𝑛 [∑ 𝑦𝑖 − 𝐴 ∑ 𝑥𝑖] Todos os somatórios apresentados aqui são para i de 1 até N, onde N é o número de pares de valores experimentais (𝑥𝑖 , 𝑦𝑖). Uma descrição mais completa do método nos permitiria ainda determinar estatisticamente os desvios (incertezas) associadas às constantes A e B calculadas. Aqui serão dados apenas os resultados dos cálculos destes desvios: ∆𝐴 = 𝐷 (𝑛 − 2)√𝑛 ∑ 𝑥𝑖2 − (∑ 𝑥𝑖) 2 𝑒 ∆𝐵 = 𝐷 (𝑛 − 2) √ ∑ 𝑥𝑖 2 𝑛 ∑ 𝑥𝑖 2 − (∑ 𝑥𝑖) 2 Observações 1) Existe um parâmetro estatístico, chamado coeficiente de determinação, que permite avaliar a qualidade do ajuste. Para os propósitos das atividades deste curso esse parâmetro tem pouca relevância e, portanto, não será tratado. 2) No método da regressão linear, todos os pares ordenados têm a mesma importância. Em alguns casos, condições físicas impõem que alguns pontos tenham mais importância que outros (muitas vezes, por exemplo, a reta deve passar pela origem). Neste caso, você pode entrar com os correspondentes pares de valores várias vezes para aumentar sua importância nos cálculos. A reta tenderá a passar mais próxima deste ponto. PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 5 Considerações gerais O processo de superpor uma curva descrita por uma equação a um conjunto de pontos experimentais não se aplica apenas quando a relação entre as grandezas é linear. Sempre que existir algum modelo ou previsão teórica para a relação matemática entre as grandezas, é possível encontrar os parâmetros que ajustem a curva correspondente com os resultados experimentais. O método matemático genérico que permite essetipo de ajuste é chamado de “Método de Mínimos Quadrados”, pois, como foi exemplificado no caso particular do ajuste da reta, são procurados os parâmetros que minimizem o quadrado das diferenças 𝛿𝑖 (eq.1) entre o valor medido e o correspondente valor calculado. Muitos programas atuais de tratamento de dados permitem fazer um ajuste diretamente de uma função matemática estabelecida pelo usuário. Na seção seguinte será apresentado um procedimento que permitirá, através da linearização de um gráfico, usar ainda a regressão linear apresentada na seção 3- 1. 2. ATIVIDADES: Tratamento matemático de dados: linearização de gráficos É muito frequente em Física se lidar com fenômenos onde duas grandezas x e y se relacionam linearmente, ou seja, 𝑦 = 𝐴𝑥 + 𝐵. Nesses casos, a partir da regressão linear dos pares de resultados obtidos (𝑥, 𝑦), é possível encontrar as constantes A e B da reta que melhor se ajusta aos pontos experimentais, conforme descrito na seção anterior. Usando os valores dessas constantes é possível tirar informações importantes relativas ao experimento. Há, obviamente, experimentos onde a relação entre as grandezas estudadas não é linear, o que significa que essas grandezas não estão relacionadas por uma equação de reta. Em situações como esta, a obtenção de informações relevantes ao experimento pode ser feita de mais de uma maneira. Apresenta-se a seguir o procedimento de linearização, usando a Lei de Coulomb como exemplo. ATIVIDADE 1: Linearização Considere uma situação física onde duas pequenas esferas carregadas positivamente com cargas 𝑞1 e 𝑞2 estão separadas de uma distância 𝑟; existe uma repulsão elétrica mútua entre elas com forças iguais e opostas �⃗�1 e �⃗�2, como indicado na figura abaixo. Figura 3: Duas cargas positivas 𝑞1 e 𝑞2 separadas por uma distância 𝑟, se repelem com forças �⃗�1 e �⃗�2. Figura adaptada de [3]. PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 6 Foi realizado um experimento, dispondo-se de um equipamento apropriado, onde se variou a distância 𝑟 entre as cargas e mediu-se o valor do módulo 𝐹 da força de repulsão. Os resultados encontram-se na Tabela 3. Tabela 3: Força de repulsão entre duas cargas. F(N) r (cm) 2,93 1,0 2,50 1,2 1,41 1,5 0,96 1,8 0,78 2,0 0,51 2,5 0,36 3,0 0,20 4,0 0,13 5,0 0,09 6,0 0,07 7,0 0,05 8,0 0,04 9,0 0,03 10,0 1) Plote um gráfico de 𝐹 × 𝑟 com as respectivas grandezas em Newton e metro. A Lei de Coulomb afirma que a força elétrica entre duas cargas pontuais varia com o inverso do quadrado da distância entre elas, ou seja, para valores de cargas constantes, pode-se escrever a lei física, que deve corresponder ao presente experimento, na forma: 𝐹 = 𝐶 ( 1 𝑟2 ) onde 𝐶 é uma constante. 2) Tendo em vista a lei de Coulomb, qual mudança de variável poderia gerar um gráfico com padrão linear? 3) Definindo-se uma outra variável 𝑋 igual ao inverso do quadrado de 𝑟, tem- se uma relação entre 𝐹 e 𝑋 que é linear, ou seja, definindo-se uma grandeza 𝑋 ≡ 1/𝑟2, tem-se 𝐹 = 𝐶. 𝑋. Plote o gráfico de 𝐹 (ordenada) em função de 𝑋 (abscissa), e faça uma regressão linear para encontrar os parâmetros da reta do tipo 𝑌 = 𝐴𝑋 + 𝐵 que melhor se ajustam aos pontos. Qual é o significado físico do coeficiente angular da reta? PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 7 O resultado da linearização está ilustrado na Figura 4. Figura 4: A força entre duas cargas elétricas é linear com o inverso do quadrado da distância entre elas. O procedimento para se linearizar um gráfico depende de cada situação, pois as equações envolvidas na análise do problema é que irão dar a “receita” do que deve ser feito para se encontrarem novas variáveis, que serão funções das anteriores, de maneira que elas tenham relação linear entre si. No caso aqui apresentado, o procedimento foi simplesmente representar a força e o inverso do quadrado da distância. ATIVIDADE 2: O uso da função logaritmo. Uma maneira muito comum de se procurarem relações que linearizem um gráfico é aplicar a função logaritmo. Entretanto, deve-se ter o cuidado em utilizar esse expediente apenas em situações em que pelo menos uma das variáveis envolvidas no experimento esteja no expoente. Apresenta-se a seguir o procedimento de linearização, usando a função logaritmo. Sabemos que quando dois objetos, com temperaturas diferentes, são colocados em contato térmico, há transferência de calor do objeto mais quente para o mais frio, até ambos atingirem a mesma temperatura. Segundo a lei de resfriamento de Newton, a taxa de resfriamento de um corpo em contato com o ambiente à temperatura 𝑇𝑎 é dada por 𝑑∆𝑇 𝑑𝑡 = −𝑘∆𝑇 em que ∆𝑇 é a diferença entre a temperatura da superfície do corpo (𝑇) e do ambiente (𝑇𝑎). É possível demonstrar que a solução dessa equação diferencial é ∆𝑇 = ∆𝑇0𝑒 −𝑘𝑡 PUC Minas Departamento de Física e Química – ICEI Laboratório de Física Geral II 8 em que ∆𝑇0 é a diferença entre a temperatura do corpo e do ambiente no instante de tempo 𝑡 = 0. A constante 𝑘 depende da superfície do corpo exposta ao ambiente, assim como das características do meio que constitui o ambiente. A equação acima pode ser escrita como: 𝑇 = 𝑇𝑎 + ∆𝑇0𝑒 −𝑘𝑡 onde 𝑇𝑎 é a temperatura ambiente. A tabela 4 mostra a temperatura em função do tempo da glicerina em contato com um fluxo de ar contínuo, cuja temperatura é 𝑇𝑎 = 25,1℃. Tabela 4: temperatura de uma porção de glicerina em função do tempo. Tempo (min) ± 3% (𝑻 ± 0,5) 0C 0 130,0 1 116,5 2 108,7 3 91,1 4 75,0 5 62,0 6 53,3 7 47,0 8 42,4 9 38,8 10 36,2 15 28,0 20 26,0 25 25,5 30 25,2 1) Com auxílio do programa Scidavis, construa o gráfico ∆𝑇 versus 𝑡. Determine a constante 𝑘 e a diferença de temperatura inicial, ∆𝑇0 através do ajuste de uma função exponencial. 2) Linearize o gráfico anterior e determine o valor de 𝑘 e ∆𝑇0 através do ajuste linear da curva. 3) Compare os resultados obtidos. BIBLIOGRAFIA: [1] CORRADI, Wagner; et al. Física Experimental. Belo Horizonte, ed. UFMG, 2008. [2] CAMPOS, Agostinho Aurélio Garcia; ALVES, Elmo Salomão; SPEZIALI, Nivaldo Lúcio. Física experimental básica na universidade. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2007. [3] CUTNELL, John D.; JOHNSON, Kenneth W. Física: volume 1. 6.ed. Rio de Janeiro: LTC - Livros Técnicos e Científicos, 2006.
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