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AULA 03 – TEORIA DOS MODOS FICCIONAIS 1. Sentido da superioridade ou inferioridade das personagens: Para Aristóteles, a distinção entre tragédia e comédia ocorre devido à superioridade ou à inferioridade dos personagens perante a realidade, respectivamente. Frye afirma que Aristóteles restringiu a sua perspectiva ao caráter dos personagens, fazendo muito mais sentido uma análise voltada para o poder, ou seja, a capacidade de ação – os personagens possuem consciência de que podem fazer muito mais seja para o bem ou para o mal. 2. Tragédia x comédia: Outro ponto que Frye se dispõe para criticar a poética aristotélica consiste na distinção entre tragédia e comédia. De acordo com Frye, a dicotomia tragédia e comédia não deveria se basear na questão de superioridade ou de inferioridade, tendo em vista que nos dois casos podem acontecer situações negligenciadas por Aristóteles (tragédias contendo personagens inferiores à realidade e comédias contendo personagens superiores à realidade). Nesse sentido, o autor propõe uma nova distinção baseada no critério de isolamento ou integração à realidade. 2.1 – Tragédia: narrativa de isolamento do herói da sociedade; 2.2 – Comédia: narrativa de integração do herói perante a sociedade; 3. Teoria dos modos ficcionais: 3.1 – Modo mítico (dionisíaco x apolíneo): nessas narrativas os personagens apresentam uma capacidade de ação superior aos outros seres e ao ambiente em espécie. O modo dionisíaco seria o modo mítico trágico e o modo apolíneo, o modo mítico cômico. A título exemplificativo pode-se citar Paixão de Cristo como modo mítico dionisíaco (enredos que retratam morte de deuses ou destruição de templos divinos) e a Ressureição de Cristo como modo mítico apolíneo (um recomeço divino). 3.2 – Modo maravilhoso (elegíaco x idílico): nessas narrativas há a presença de personagens com poderes sobrenaturais, porém não divinos. O modo elegíaco (ex: Game of Thrones) seria o modo maravilhoso trágico e o modo idílico (ex: Harry Potter), o modo maravilhoso cômico. A maior parte dos super-heróis são personagens maravilhosos, com algumas exceções como o batman, viúva negra, entre outros. 3.3 – Modo mimético elevado (destronador x recompensador): nessas narrativas não há divindades nem seres maravilhosos, mas a presença de personagens que se destoam da coletividade devido a determinadas habilidades como a capacidade intelectual (ex: Sherlock Holmes) ou física (ex: Batman). O destronador refere-se a narrativas trágicas e o recompensador, a narrativas de superação ou de inspiração. Capitu, uma das principais personagens de “Dom Casmurro” é considerada um mimético elevado devido à sua capacidade de persuasão, definida na obra como “cigana oblíqua e dissimulada”. Nesse sentido, há a sustentação da tese de que qualquer vida pode ser repleta de enredos interessantes e incomuns; 3.4 – Modo mimético baixo (patético x picaresco): nessas narrativas, assim como no modo mimético elevado, não há divindades nem seres maravilhosos, todavia, os poderes inerentes aos personagens são comuns. Como exemplo de patético pode-se citar Bentinho – protagonista de Dom Casmurro, enquanto “Se beber, não case” se encaixa como exemplo de um mimético baixo picaresco; 3.5 – Modo irônico (expiatório x lúdico): nessas narrativas, as personagens são inferiores e imponentes no que tange à capacidade de ação. O modo irônico expiatório corresponde ao trágico e o modo irônico lúdico, ao cômico. O modo irônico vincula-se à reação dos personagens diante da condição de impotência. Partindo desse pressuposto, Josef K – personagem kafkaniano – distingue-se de Solomon – de 12 anos de escravidão, tendo em vista que o segundo resiste veementemente diante das condições que lhe foram impostas, ao passo que Josef K foi declinando significativamente até culminar na sua morte encomendada por si mesmo. A título exemplificativo, “O processo” de Kafka se encaixa no irônico expiatório e “Os trapalhões” como irônico lúdico; OBS: Essas obras colocam dilemas éticos e jurídicos que não existem na vida real, mas colocam em dúvida eventos que podem vir a acontecer (por exemplo, a capacidade de destruição do mundo que antes era considerada meramente ficcional é evidente a sua aplicabilidade no contexto vigente, ilustrada no aperfeiçoamento das indústrias bélicas). Essas narrativas além de debater relações de poder, testam o medo do desconhecido e a capacidade da sociedade de reagir à intolerância. OBS: O mítico, muitas vezes, pode renascer do irônico devido à grande reviravolta inerente a determinadas narrativas. RESUMO: PODER DE AÇÃO DO HERÓI SITUAÇÃO MODO EXEMPLO Superior aos outros seres e ao ambiente em espécie Isolamento Mítico dionisíaco Paixão de Cristo, Ragnarok Superior aos outros seres e ao ambiente em espécie Integração Mítico apolíneo Ressureição de Cristo Superior aos outros seres e ao ambiente em grau Isolamento Maravilhoso elegíaco Game of Thrones Superior aos outros seres e ao ambiente em grau Integração Maravilhoso idílico Harry Potter, Êxodo Superior aos outros seres em grau, mas não ao ambiente Isolamento Mimético elevado destronador O irlandês Superior aos outros seres em grau, mas não ao ambiente Integração Mimético elevado recompensador À procura da felicidade Nem superior aos outros seres nem ao ambiente Isolamento Mimético baixo patético Dom Casmurro Nem superior aos outros seres nem ao ambiente Integração Mimético baixo picaresco Se beber, não case Inferior aos outros seres Isolamento Irônico expiatório O processo Inferior aos outros seres Integração Irônico lúdico Os trapalhões
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