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MÓDULO 14 – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Lúria Niemic Onofre – Medicina, turma XXXIV PROBLEMA 9 DOENÇA DIVERTICULAR Um divertículo é um saco ou uma bolsa anormal que faz uma protrusão da parede de um órgão oco, que nessa situação, é o cólon. Um divertículo verdadeiro é composto por todas as camadas da parede intestinal, enquanto um falso divertículo ou pseudodivertículo, não possui uma das porções da parede intestinal. Os divertículos que comumente ocorrem no cólon são protrusões da mucosa através das camadas musculares do intestino. Pelo fato de estas herniações mucosas serem destituídas de camadas musculares normais, eles são pseudodivertículos. Diverticulose ou doença diverticular são termos empregados para indicar a presença de divertículos colônicos. EPIDEMIOLOGIA A diverticulose é uma condição comum na sociedade ocidental e parece ser um produto da Revolução Industrial. É interessante que parece não haver nenhum espécime de diverticulose colônica antes da Revolução Industrial. O processo de trituração da farinha de trigo foi introduzido na Europa 1/4 de século anterior ao aparecimento da diverticulose, que foi inicialmente observada na primeira década do século XX. Foi visto que, o consumo diminuído de cereais não processados e o aumento do consumo de açúcar e de carne pela população foram os fatores que, em grande parte, tornaram-se responsáveis pelo aparecimento da diverticulose. Nos últimos 80 anos, a quantidade de fibras consumidas por indivíduos na América do Norte e na Europa Ocidental diminuiu, enquanto a prevalência da diverticulose tem aumentado significativamente. A formação dos divertículos também está relacionada com o envelhecimento. Os divertículos são raros nos indivíduos com < 30 anos. Além disso, uma dieta com baixo teor em fibra e elevado teor de carboidratos e carne contribui para a incidência da diverticulose. Durante muito tempo tem se especulado que fatores que contribuem para a doença diverticular, ou pelo menos a diverticulite, são o consumo de nozes, pipoca e sementes pequenas, como são encontrados nos tomates, sendo assim, pacientes com doença diverticular geralmente são aconselhados a evitar esses alimentos. No entanto, um grande estudo prospectivo de homens sem doença diverticular conhecida não conseguiu detectar um aumento no risco de complicações diverticulares ou de diverticulose. PATOGÊNESE Os divertículos, na realidade, são herniações da mucosa através do cólon nos locais de penetração da parede muscular pelas arteríolas. Estes locais estão no lado mesentérico das tênias antimesentéricas. Em alguns casos, a arteríola que penetra na parede pode ser deslocada para ficar sobre o domo do divertículo. Esta estrita relação entre a artéria e o divertículo é responsável pela hemorragia maciça que pode complicar a diverticulose. Pelo fato de estes divertículos serem formados apenas por mucosa em vez de por toda a parede do intestino, eles são chamados falsos divertículos. Note que os divertículos formam-se apenas entre as tênias mesentéricas e cada 1 das 2 tênias laterais. Pelo fato de não haver vasos perfurantes, os divertículos não se formam no lado antimesentérico do cólon. A baixa ingestão de fibras leva à produção de fezes volumosas e com baixo teor de água, o que pode alterar o trânsito intestinal, e contribui para aumentar a pressão intracolônica. A disposição das artérias nutrientes (vasa recta) no cólon, junto com o aumento da pressão intraluminal, contribui para a ocorrência dos divertículos. A diverticulose colônica surge no local onde a vasa recta penetra na túnica muscular, na borda mesentérica da tênia antimesentérica. Nesse ponto, ocorre fraqueza intrínseca na parede intestinal, que somada ao aumento da pressão intraluminal facilita as herniações. Existe deposição muito aumentada de elastina nas tênias do cólon, o que causa o seu encurtamento e pode explicar as alterações da parede intestinal nessa doença e o aumento da pressão luminal. As ligações cruzadas do colágeno também aumentam com o avançar da idade, gerando rigidez no cólon e menos complacência no acomodamento das pressões aumentadas. As contrações segmentares do cólon, também denominadas segmentações cólicas, podem participar do processo de formação dos divertículos ao criarem áreas de extrema pressão intraluminal. A segmentação acontece quando duas haustrações adjacentes se contraem simultaneamente, de forma não propulsiva, mas elevando a pressão luminal. MÓDULO 14 – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Lúria Niemic Onofre – Medicina, turma XXXIV Várias complicações podem advir da doença diverticular. Destacam-se a diverticulite (inflamação e infecção de divertículos colônicos) que ocorre em 10-25% das pessoas acometidas pela doença diverticular dos cólons, e a hemorragia digestiva. DIVERTICULITE A diverticulite é o resultado da perfuração de um divertículo colônico. O termo é uma denominação errônea, pois a doença, na realidade, é uma infecção pericólica extraluminar, causada pelo extravasamento de fezes através do divertículo perfurado. Peridiverticulite seria o termo que mais apropriadamente descreveria o processo infeccioso. ETIOLOGIA Não estão totalmente compreendidas e podem variar entre os pacientes. Há muito tempo considera-se que ocorre quando se desenvolve macro ou microperfuração em um divertículo, resultando na liberação de bactérias intestinais e desencadeando inflamação. Mas dados novos sugerem que a diverticulite aguda é mais um processo inflamatório do que infeccioso em alguns pacientes. Além disso, o CMV pode desencadear essa inflamação. FISIOPATOLOGIA O acúmulo de resíduos particulados no saco diverticular favorece a obstrução do colo estreito do pseudodivertículo e ocasiona supercrescimento bacteriano, isquemia tecidual local, inflamação e microperfurações. A inflamação é a causa principal das perfurações da parede dos divertículos. A sintomatologia de diverticulite surge quando ocorrem microperfurações ou perfuração livre em direção à cavidade peritoneal. A peritonite generalizada decorre de ruptura de divertículo simples ou complicado pela formação de abscesso peridiverticular. A obstrução colônica resulta da formação de abscessos, edema da parede colônica ou estenose nas regiões de processo inflamatório após episódios recorrentes de diverticulite. QUADRO CLÍNICO O cólon sigmoide é o segmento do intestino grosso com a maior incidência de divertículos. Muitos pacientes com diverticulite queixam-se de dor no QIE do abdome, que pode irradiar-se para a área suprapúbica, virilha esquerda ou para as costas. Alterações nos hábitos intestinais são uma queixa muito comum. O sangramento retal não está associado a um ataque de diverticulite. Os achados físicos dependem do local da perfuração, da quantidade de contaminação e da presença ou ausência de infecção secundária de órgãos adjacentes. Além da dor, pode haver uma defesa voluntária da musculatura abdominal inferior, e a presença de uma massa dolorosa no QIE que é sugestiva de fleimão ou de abscesso. Pode ser detectada uma distensão da parede abdominal se houver íleo associado ou obstrução do intestino delgado secundária ao processo inflamatório. Um exame vaginal ou retal pode revelar uma massa flutuante dolorosa típica de um abscesso pélvico. DIAGNÓSTICO A diverticulite do sigmoide deve ser distinguida do câncer do retossigmoide, embora raramente seja necessário estabelecer a distinção em casos emergenciais. No entanto, a abordagem cirúrgica é diferente, e se for indicada uma operação de urgência deve-se fazer um esforço para excluir o diagnóstico de câncer. Um exame sigmoidoscópico limitado pode ser útil nessas circunstâncias. No entanto, o ar não deve ser insuflado através do endoscópio devido à distensão do cólon e à possibilidade de que a pressão colônica possa fazer passar mais bactérias através da perfuração para a cavidade peritoneal.O sigmoidoscópio raramente pode ser avançado além de 12 cm em um paciente com diverticulite, e o exame costuma ser útil apenas para excluir um câncer do reto como uma causa dos sintomas. Em muitos casos, o diagnóstico de uma diverticulite pode ser presumido por uma história e um exame físico cuidadosos, e começar o tratamento com antibióticos apenas com estas evidências. No entanto, se o diagnóstico for duvidoso, 4 testes podem ser considerados —TC do abdome, RM, a US abdominal e enema com contraste hidrossolúvel. A TC e a RM fornecem as mesmas informações e vantagens. Há mais experiência com a TC, e é considerada o teste preferido. Revela a localização da infecção, extensão do processo inflamatório, presença e a localização de um abscesso, e o comprometimento compassivo de outros órgãos, com complicações secundárias, como a obstrução ureteral ou uma fístula para a bexiga. MÓDULO 14 – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Lúria Niemic Onofre – Medicina, turma XXXIV O US do abdome oferece muitas das vantagens da TC, inclusive a possibilidade de drenagem percutânea de um abscesso, com orientação ultrassonográfica. A seleção do exame, com a escolha de uma TC, RM ou um US varia entre as instituições, mas todos demonstraram ser úteis em estabelecer o diagnóstico de diverticulite, especialmente quando um abscesso complicou a doença. O emprego do clister opaco diminuiu consideravelmente devido às vantagens oferecidas pelos testes não invasivos. Um clister acarreta um risco de aumentar a pressão colônica e causar um extravasamento adicional de fezes através do divertículo perfurado. Alguns estudos mostraram uma vantagem do clister opaco em distinguir a diverticulite aguda do câncer perfurado, porém muitos acham que o risco associado supera o ganho potencial. Se for usado um clister opaco, o agente de contraste deve ser hidrossolúvel pois não acarretam risco de peritonite fecal por bário, mas ainda há um risco considerável de extravasamento do material de contraste do cólon, o que pode agravar a infecção e disseminar a extensão da peritonite. A diverticulite, apresenta-se de várias formas, com um amplo espectro de gravidade, de um único episódio de doença leve autolimitada a episódios repetidos que respondem a antibióticos até uma doença complicada fulminante, caracterizada pela sepse ameaçadora à vida. Descreveram um sistema de classificação prático que fornece uma organização do espectro clínico da doença: ▪ Estádio I: Abscesso pericólico ou mesentérico ▪ Estádio II: Abscesso pélvico bloqueado ▪ Estádio III: Peritonite difusa purulenta ▪ Estádio IV: Peritonite difusa fecal É evidente que o tratamento apropriado deve ser individualizado com base na gravidade da doença. CLASSIFICAÇÃO – QUADRO CLÍNICO E TRATAMENTO DIVERTICULITE NÃO COMPLICADA A diverticulite não complicada (doença não associada à perfuração livre intraperitoneal, formação de fístula ou obstrução) em muitos casos pode ser tratada com antibióticos ou ambulatorialmente. Se o paciente tiver dor significativa característica de peritonite localizada, hospitalização e antibióticos IV são indicados. O uso de morfina deve ser evitado por causa do aumento na pressão intracolônica associado; tem sido relatado que meperidina pode diminuir a pressão intraluminal e é um analgésico mais apropriado. Esses pacientes costumam responder imediatamente ao tratamento antibiótico, com melhora acentuada nos sintomas em 48 horas. Após os sintomas terem desaparecido durante pelo menos 3 semanas, devem ser conduzidos estudos de averiguação para se estabelecer a presença de divertículos e excluir câncer, que pode simular diverticulite. O exame usual é o colonoscópico, que pode visualizar diretamente o lúmen colônico, mesmo na presença de numerosos divertículos. Um clister opaco pode mostrar a extensão da doença diverticular, mas um câncer do sigmoide pode passar despercebido na vigência de numerosos divertículos repletos de contraste no cólon sigmoide, o que diminui consideravelmente seu o valor na avaliação do paciente com diverticulose. Na primeira crise, uma diverticulite não complicada que responde à terapia antibiótica é tratada não cirurgicamente, com a introdução de uma dieta com alto teor de fibra. Um estudo mostrou que apenas uma percentagem (5,5%) dos pacientes que se recuperaram do episódio inicial de diverticulite não complicada exigiu colectomia ou colostomia de emergência subsequente. As possibilidades de uma segunda crise de diverticulite são relativamente baixas, < 25%. O tratamento de pacientes com menos de 45 anos afetados por uma crise de diverticulite não complicada é um tanto controverso. Muitos cirurgiões recomendam uma sigmoidectomia eletiva após a recuperação em pacientes jovens, pois a história natural da diverticulite no jovem não é bem compreendida e pode haver um elevado risco de recorrência da doença durante o período de vida longa esperada. Entretanto, estudaram 40 pacientes com menos de 50 anos que foram hospitalizados com diverticulite e os acompanharam por até 9 anos. 2/3 não necessitaram de operação durante o período de acompanhamento. Esses resultados são similares às expectativas para os pacientes com > 50 anos, e os autores concluíram que os mais jovens devem ser tratados da mesma maneira que os pacientes cuja primeira crise de diverticulite ocorre após os 50 anos. Se o paciente sofre crises recorrentes de diverticulite, o tratamento cirúrgico deve ser considerado. Em geral, tem-se recomendado oferecer a sigmoidectomia após 2 crises não complicadas para evitar um futuro episódio complicado que poderia exigir operação de emergência ou uma colostomia. MÓDULO 14 – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Lúria Niemic Onofre – Medicina, turma XXXIV Entretanto, estudos recentes têm lançado alguma dúvida sobre esse conceito. Parece que a necessidade de realizar uma colostomia é maior com a primeira crise de diverticulite, e a recomendação de indicar a sigmoidectomia após 2 crises para evitar uma colostomia no futuro precisa ser reconsiderada à luz da evidência recente. Alguns defendem que pacientes com +2 episódios de diverticulite não têm um risco aumentado de maus resultados se subsequentemente desenvolverem diverticulite complicada e que morbidade e mortalidade não são significativamente diferentes entre os pacientes com múltiplos episódios de diverticulite em comparação com aqueles que sofreram apenas 1 ou 2 ataques anteriores. Alguns defendem que a realização de colectomia após o 4º episódio, em vez de após o 2ª episódio, em pacientes com > 50 anos resulta em uma queda de 0,5% no número de óbitos, e 0,7% nas colostomias e uma redução no custo pecuniário por paciente. A recomendação para sigmoidectomia devido a crises recorrentes de diverticulite precisa considerar o estado geral do paciente e estilo de vida, a frequência das crises e a debilidade associada a cada ataque. A diverticulite no hospedeiro imunocomprometido representa um desafio especial para o cirurgião. A sigmoidectomia eletiva após uma única crise de diverticulite deve ser considerada devido a sua frágil capacidade para combater uma lesão infecciosa. Presume- se que a terapia clínica seja menos eficaz, resultando em uma incidência aumentada de operações de emergência. Infelizmente, as taxas de mortalidade após a operação são maiores comparadas com os pacientes cujo sistema imune não está comprometido. Uma tendência que está em crescente na indicação de uma operação eletiva para a doença diverticular é a utilização de uma abordagem laparoscópica. A maioria dos estudos revela uma estada hospitalar de 2-3 dias menor para os submetidos a uma sigmoidectomia por uma abordagem laparoscópica, quando comparados com os que realizaram uma cirurgia tradicional-padrão. DIVERTICULITE COMPLICADA ❖ ABSCESSO Um abscesso complicando a diverticulite está geralmente confinado à pelve. Quase sempre apresenta dor significativa,febre e leucocitose. Os exames abdominal, pélvico ou retal podem detectar uma massa dolorosa, flutuante, e a TC, RM ou US confirmarão o diagnóstico e a localização do abscesso. A menos que o abscesso seja muito pequeno (< 2 cm em diâmetro), ele deve ser drenado, e o método preferido é pela via percutânea orientada pela TC e/ou pelo US. Ocasionalmente, um abscesso pélvico pode ser drenado para o lúmen retal através de uma abordagem transanal. Estes métodos de drenagem são preferíveis a uma abordagem transabdominal via laparotomia, que pode possibilitar a disseminação do abscesso por toda a cavidade peritoneal. A drenagem adequada de um abscesso, combinada com a administração de antibióticos IV, resulta em uma rápida evolução clínica. Ainda que uma fístula possa sobrevir do cólon sigmoide até o local de inserção do cateter percutâneo que propiciou a drenagem, isto pode ser facilmente manuseado na vigência da operação eletiva, quando a infecção intra-abdominal houver sido reduzida. A operação eletiva só deve ser executada após o paciente ter se recuperado por completo da infecção, cerca de 6 semanas após a drenagem do abscesso. Neste momento, geralmente é realizável a ressecção do cólon sigmoide comprometido seguida de uma anastomose entre o cólon descendente e o reto, evitando-se uma colostomia. É essencial remover todo o cólon que esteja anormalmente espessado e utilizar o segmento retal que não esteja inflamado ou espessado na porção distal da anastomose. Uma das principais causas de diverticulite recorrente, após a sigmoidectomia, é a não remoção completa de todo o intestino anormalmente espessado que está associado a esta doença. Se o cólon sigmoide distal não for ressecado, a taxa de diverticulite recorrente é elevada. Raramente é necessário mobilizar o reto + 2 cm abaixo do promontório sacral para obter um intestino normal para uma anastomose satisfatória. Ainda que os divertículos possam estar presentes ao longo de todo o cólon, não é necessário resseca-lo todo; apenas o segmento que esteja espessado e friável (geralmente todo o sigmoide) precisa ser ressecado. ❖ FÍSTULAS Uma fístula entre o cólon sigmoide e a pele (que pode resultar da drenagem percutânea de um abscesso, bexiga, vagina ou intestino delgado) é uma complicação frequente da diverticulite. A fonte da infecção (divertículo perfurado) continua a suprir a fístula, e não se obterá uma cura até que a fonte da manutenção seja erradicada pela ressecção do cólon sigmoide doente. A diverticulite é causa mais comum de fístula entre o cólon e a bexiga do que a DC ou câncer. As fístulas sigmóideo-vesicais são mais comuns em homens do que em mulheres, pois o útero impede o sigmoide de aderir à bexiga nas mulheres. As mulheres com fístulas sigmoides geralmente já fizeram uma histerectomia prévia. MÓDULO 14 – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Lúria Niemic Onofre – Medicina, turma XXXIV Os sintomas de uma fístula sigmóideo-vesical incluem a pneumatúria (com a passagem de ar pela uretra notada ao final da micção), fecalúria e infecções recorrentes do TU. A fístula pode causar urossepse significativa em homens, com a hipertrofia prostática ocasionando uma obstrução relativa do TU distal. O teste mais confiável para confirmar a suspeita de fístula entre o intestino e a bexiga é a TC, que pode mostrar a presença de ar na bexiga. A cistoscopia revela cistite e edema bolhoso no local da fístula, mas o teste é útil para excluir o câncer (de cólon ou da bexiga) como a causa da fístula. O tratamento inicial é o controle da infecção e a redução da inflamação associada. Uma fístula que seja proveniente do cólon raramente é causa de operação de emergência; de fato, a condição do paciente com frequência melhora quando a drenagem de um abscesso resulta na formação de uma fístula. Os antibióticos devem ser administrados para reduzir a celulite adjacente, e medidas para avaliação diagnóstica devem ser adotadas para confirmar a etiologia da fístula, antes que seja realizada uma operação definitiva. Uma colonoscopia é mandatória para examinar a mucosa do sigmoide e excluir o câncer do cólon (ou a DC) como a causa da fístula. Devem ser empregados todos os esforços para se descartar câncer, pois a operação para uma fístula sigmóideo-vesical secundária a um câncer do sigmoide requer uma ressecção em bloco dos órgãos envolvidos, uma operação mais extensa do que é necessário para se tratar uma fístula não maligna e excisar-se o cólon sigmoide doente (porém benigno). Podem ser tratadas com uma operação em um único estádio, retirando-se a fístula e excisando-se o cólon sigmoide, e reconstituindo-se o trânsito por anastomose entre o cólon descendente e o reto. Os órgãos secundários envolvidos (geralmente a bexiga) cicatrizarão assim que a fonte da infecção, o cólon sigmoide, tenha sido removida. Em geral, o defeito na bexiga é tão pequeno que nenhum fechamento é necessário, e ocorrerá a cicatrização se a bexiga for drenada com um cateter de Foley ou uma cistostomia suprapúbica durante 7 dias após a intervenção. Aberturas maiores na bexiga podem necessitar de um fechamento com suturas com fios absorvíveis (catgut cromado) associadas a drenagem. Se houver inflamação significativa no abdome e na pelve, apesar de um período de “repouso”, a utilização de próteses ureterais colocadas pré-operatoriamente pode facilitar a identificação dos ureteres e minimizar sua possível lesão inadvertida. Uma técnica de identificação precoce do ureter é a dissecção na direção proximal até a porção do cólon sigmoide para facilitar a sua ressecção quando um fleimão causado por uma diverticulite altera a anatomia normal. ❖ PERITONITE GENERALIZADA Pode ocorrer de 2 maneiras: (1) um divertículo pode perfurar para a cavidade peritoneal e a perfuração não ser tamponada pelas defesas normais do organismo ou (2) um abscesso que esteja inicialmente localizado expande-se e subitamente rompe para a cavidade peritoneal desprotegida. Na primeira maneira, a cavidade peritoneal é contaminada por fezes; na última, é proveniente do pus contendo bactérias entéricas. Em qualquer uma, o resultado é uma infecção avassaladora que requer uma intervenção cirúrgica imediata. Felizmente, ambas as circunstâncias são relativamente raras. Os pacientes queixam-se de dor abdominal difusa, com defesa voluntária ou involuntária por todo o abdome. Os Rx abdominais ou as TCs podem revelar ar livre intraperitoneal, mas a ausência de ar extraintestinal não exclui o diagnóstico. Os sinais de sepse generalizada incluem leucocitose, febre, taquicardia e hipotensão. A celiotomia imediata é obrigatória para a identificação e a ressecção do segmento do cólon que contém a perfuração. Nessas circunstâncias, não é seguro restabelecer-se a continuidade intestinal, devido à elevada probabilidade de a anastomose intestinal não cicatrizar, quando confeccionada em um ambiente infectado. A operação apropriada nesta situação é a ressecção do cólon sigmoide doente, a execução de uma colostomia usando- se o cólon descendente não inflamado e a sutura da extremidade distal do reto. Este procedimento é chamado operação de Hartmann. Apesar de ter sido inicialmente descrita para o tratamento do câncer, agora é a técnica mais comum para as operações de emergência necessárias ao controle de uma infecção secundária à diverticulite. A eliminação da fonte infecciosa pela ressecção do cólon sigmoide perfurado, estabelecendo um desvio para as fezes com uma colostomia e controlando a infecção peritoneal pela irrigação da cavidade peritoneal e administração de antibióticos IV, juntamente com um suporte geral e nutricional apropriados, deve resultar na resolução da infecção. Quando o paciente já tiver se recuperado completamente da doença, após 10 semanas, elimina-se a colostomia e executa-se uma anastomose entre o cólon descendente e o reto para o restabelecimento da continuidade intestinal. Tem havidorelatos recentes de sucesso do tratamento da diverticulite aguda complicada por lavagem laparoscópica e antibióticos IV, sem ressecar o segmento lesado. Embora esses relatos sejam intrigantes, a ressecção do segmento perfurado parece a abordagem mais segura neste momento. MÓDULO 14 – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Lúria Niemic Onofre – Medicina, turma XXXIV ❖ OBSTRUÇÃO Ocorre em 2 circunstâncias. A primeira é relativamente incomum e é causada por estenose do sigmoide devido a hipertrofia muscular da parede intestinal. Esse tipo de estreitamento raras vezes provoca obstrução mecânica anterógrada, mas às vezes apresenta um problema diagnóstico se um estudo com contraste revelar uma estenose do sigmoide em uma área contendo numerosos divertículos. Pode ser impossível para o radiologista excluir a possibilidade de um câncer como causa do estreitamento. Em tais casos, a estenose pode impedir a passagem de um colonoscópio para uma avaliação adequada, e a sigmoidectomia pode ser a única solução se não se puder excluir câncer. O tipo mais comum é obstrução do intestino delgado associada ao aspecto infeccioso e inflamatório da diverticulite. O intestino delgado pode tornar-se aderente ao fleimão ou abscesso, com uma obstrução causada pelo processo infeccioso. Em tais circunstâncias, o tratamento adequado é a passagem de uma sonda nasogástrica para reduzir as secreções da parte superior do intestino enquanto se cuida da obstrução com antibioticoterapia para a infecção e drenagem percutânea do abscesso. ❖ COLITE ASSOCIADA À DIVERTICULOSE Recentemente, tem sido dada atenção para uma entidade relativamente incomum associada à doença diverticular, o que pode mimetizar o DII. A entidade é caracterizada por prolapso da mucosa associada com divertículos, hiperplasia glandular e muscularização da lâmina própria. Erosões e deposição de hemossiderina na submucosa podem sugerir semelhanças patológicas e endoscópicas com DC ou colite ulcerativa. Em casos graves, a depleção de mucina, distorção estrutural crônica, criptite e abscessos da cripta podem ser detectados. Esta entidade foi designada colite associada à diverticulose (DAC). A preservação do reto é um achado importante para excluir colite ulcerativa, mas a natureza segmentar da DC pode às vezes confundir o diagnóstico. Em uma tentativa para classificar e definir a DAC, realizaram uma revisão sistemática da literatura e uma reavaliação dos pacientes de sua própria instituição para definir as características clínicas e patológicas da DAC. As características clínicas foram diarreia, hematoquezia e tenesmo. Diagnóstico endoscópico incluiu equimose eritemal submucosal focal, erosões e úlceras. Achados patológicos foram caracterizados por inflamação que poderia ser compatível com CU ou DC em áreas de doença diverticular. Uma vez que a diverticulite simples e DII tinham sido descartadas, 163 pacientes de 227 na revisão sistemática foram considerados com DAC. A maioria desses pacientes puderam ser tratados clinicamente; 25% dos pacientes com DAC apresentaram recorrência, porém mais de 50% destes responderam à terapia clínica subsequente. Alguns pacientes necessitaram cirurgia como última alternativa. Concluiu-se que a DAC é uma entidade clínica distinta que se apresenta com uma colite segmentar e tem uma variedade de características clínicas e patológicas.
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