Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Clara Feitosa | DISTÚRBIOS SENSORIAIS DEFINIÇÃO • Déficit neurológico geralmente focal, de instalação súbita ou com rápida evolução, sem outra causa aparente que não vascular • Duração > 24h – ou menor, mas levando à morte • Os tipos são isquêmico e hemorrágico → 80-85% são isquêmicos • O AVC isquêmico é causado por fluxo sanguíneo insuficiente em parte ou em todo o cérebro, diferente do AVC hemorrágico porque não há extravasamento de sangue no parênquima cerebral EPIDEMIOLOGIA • 2ª maior causa de morte no mundo e principal causa de morte no Brasil • Faixa etária avançada é o maior fator de risco para as doenças cerebrovasculares • Predominância do sexo masculino • Incidência e prevalência 2x maior na população negra • Os fatores de risco são: V Etnia negra V Baixo nível socioeconômico V História familiar de eventos cerebrovasculares V HAS V DM V Cardiopatias V Hiperlipidemia V Tabagismo V Etilismo V Obesidade e sedentarismo FISIOPATOLOGIA • Súbita instalação de um déficit neurológico focal persistente → consequência de uma isquemia seguida de infarto no parênquima encefálico • Decorre da oclusão aguda de uma artéria de médio ou pequeno calibre → oclusão na maioria das vezes do tipo embólica (trombo proveniente de local distante que caminha pela circulação arterial até impactar na artéria) mas também pode ser trombótica (trombo formado na própria artéria envolvida no AVC) • A oclusão aguda de um vaso intracraniano reduz o fluxo para a região cerebral que ele supre → surge uma região de infarto cerebral propriamente dito, onde o dano funcional e estrutural é irreversível e há uma outra região funcionalmente comprometida mas estruturalmente viável, que é a zona de penumbra isquêmica • A zona de penumbra isquêmica é temporariamente suficiente para manter a viabilidade celular e depende de fatores como circulação colateral, variações do fluxo sanguíneo cerebral, oxigenação, temperatura corporal, equilíbrio hidroeletrolítico e metabólico • Ocorrido o infarto neuronal, instala-se o edema citotóxico com aumento do volume dos neurônios, acompanhado de edema vasogênico que se dá pelo acúmulo de líquido no interstício, atingindo seu pico entre 3 e 4 dias • Nas primeiras 48h há migração de células inflamatórias para o local, seguida pela migração de monócitos e células gliais fagocitárias. Entre 10 dias e 3 semanas a fagocitose provoca uma necrose de liquefação, transformando o infarto em uma área amolecida e depois forma-se uma cicatriz cística e retraída HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA (HIP): é o acúmulo de sangue no parênquima cerebral que eleva agudamente a pressão intracraniana, por ocorrer edema vasogênico em volta da lesão, organização do coágulo e compressão dos tecidos adjacentes → o paciente normalmente morre da própria hipertensão intracraniana, que leva à herniação cerebral HEMORRAGIA SUBARACNÓIDEA (HSA): o acúmulo de sangue no espaço subaracnóideo produz uma meningite química, que geralmente aumenta a pressão intracraniana durante dias ou semanas → o edema cerebral é máximo e o risco de vasoespasmo e infarto subsequente é maior entre 72h e 10 dias → pode ocorrer uma segunda ruptura (ressangramento) em até 7 dias Clara Feitosa | DISTÚRBIOS SENSORIAIS ETIOLOGIA EMBÓLICO: 1. Cardioembólico: fonte emboligênica é o coração, na maioria das vezes com fibrilação atrial com formação de trombo no AE, seguida pelo IAM de parede anterior formando trombo no VE e pelas cardiomiopatias dilatadas que formam trombo em VE e/ou AE 2. Arteroembólico: a fonte emboligênica é geralmente uma placa aterosclerótica instável (com trombo) na carótida comum ou bifurcação carotídea ou na artéria vertebral → mais comum é hipertensos TROMBÓTICO: • AVC lacunar: é o mais comum e é causado pela oclusão de pequenas artérias perfurantes cerebrais → elas desenvolvem uma lesão obstrutiva chamada lipo-hialinose (espessamento hialino da camada média) que pode precipitar a trombose in situ • AVC criptogênico: é um tipo que não pode ser classificado como cardioembólico nem arteroembólico (uma vez que não há evidência em nenhum desses locais da formação dos trombos), então acredita-se que seja ocasionado por embolização paradoxal de trombos venosos que migram para a circulação arterial, através de um forame oval patente ou por êmbolos provenientes de placas ateromatosas da aorta ascendente • Mecanismos menos frequentes são vistos, como arterites, estados hipercoaguláveis, dissecções arteriais cervicais etc. • Hipertensivo: causado por lesão crônica de pequenas artérias perfurantes, promovendo fragilidade da parede vascular e formação de pequenos aneurismas → o rompimento destes, durante um pico hipertensivo, provoca o AVC hemorrágico intraparenquimatoso hipertensivo. Os locais mais acometidos são: V Putâmen V Tálamo V Cerebelo V Ponte • Hemorragia subaracnóidea: ocorre principalmente pela ruptura de aneurismas saculares intracranianos → estes ocorrem principalmente em bifurcações arteriais próximos ao polígono de Willis – como na artéria comunicante anterior, artéria comunicante posterior e artéria cerebral média MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Depende da artéria ocluída e a região do cérebro afetada • Pode haver instalação com posterior estabilidade (quando há hipoperfusão secundária à trombose in situ) ou ocorrer progressão (quando o déficit vai aumentando com o passar do tempo) • Nos quadros embólicos a instalação do déficit costuma ser mais abrupta, atingindo rapidamente o ápice V Território carotídeo: compreende as artérias carótidas internas, cerebral média e cerebral anterior V Território vertebrobasilar: relacionado às artérias vertebral, basilar, cerebelares e cerebrais posteriores DÉFICIT NEUROLÓGICO CONFORME TERRITÓRIO ACOMETIDO ARTÉRIA OFTÁLMICA Alteração visual monocular ARTÉRIA CEREBRAL MÉDIA Déficit motor, déficit sensitivo, negligência e afasia ARTÉRIA CEREBRAL ANTERIOR Déficit motor, déficit sensitivo e sinais de frontalização ARTÉRIA VERTEBRAL Náuseas, vômitos, tonturas, acometimento de nervos cranianos baixos e alterações cerebelares ARTÉRIA CEREBRAL POSTERIOR Alterações de campo visual, déficit sensitivo, rebaixamento do nível de consciência e alterações de funções nervosas superiores ARTÉRIA BASILAR Déficit motor, déficit sensitivo, rebaixamento do nível de consciência e alteração de nervos cranianos • Na HIP o déficit neurológico é focal e súbito, muitas vezes acompanhado de cefaleia, náuseas, vômitos, redução do nível de consciência e níveis pressóricos bastante elevados • Na HSA ocorre a cefaleia súbita, geralmente intensa e holocraniana. Também pode haver náuseas e vômitos, tonturas e sinais de irritação meníngea. Pode ocorrer perda da consciência, manifestações Clara Feitosa | DISTÚRBIOS SENSORIAIS neurológicas como déficits motores, sensitivos, distúrbios da linguagem, crises convulsivas e alteração dos nervos cranianos DIAGNÓSTICO • O AVC deve ser suspeitado quando há déficit neurológico, de instalação súbita ou de rápida progressão (minutos a horas) • O tempo de evolução do déficit é fundamental → se não puder ser determinado, considerar o último momento no qual o doente foi visto em condições normais • Fazer exame físico detalhado → hidratação, oxigenação, FR, ritmo e ausculta cardíaca, além de FR respiratória • O nível de consciência deve ser observado e periodicamente reavaliado • A PA deve ser periodicamente reavaliada → o manejo deve se basear em objetivos diferenciados para cada um dos tipos de AVC • Os fatores de risco devem ser considerados para que seja determinada o provável mecanismo de ocorrência • Colher desde a chegada do paciente hemograma, glicemia, ureia, creatinina,sódio, cálcio, potássio, exames de coagulação, ECG e RX de tórax • TC: não mostra o AVC isquêmico geralmente → o infarto só aparecerá após 24-72h, sendo visto como leve apagamento de sulcos cerebrais, uma tênue hipoatenuação nos núcleos da base e o sinal da artéria cerebral média hipertensa → deve ser usada então para afastar o AVC hemorrágico V A HIP será vista como imagem hiperatenuante dentro do parênquima encefálico, geralmente com boa definição de limites, localização e eventuais complicações (inundação ventricular, hidrocefalia, edema cerebral, desvios hemisféricos e herniação) V A HSA será vista como imagem hiperatenuante, ocupando cisternas e sulcos cerebrais • RM tem maior acurácia para o AVC isquêmico, apesar de menos sensível para detectar sangramento agudo → fazer na sequência T2 ou FLAIR • Doppler transcraniano pode ajudar a descobrir qual a artéria intracraniana obstruída • Análise do LCR é feita nas suspeitas de HSA, quando a TC de crânio é normal → o LCR estará hemorrágico, hipertenso, com taxa proteica elevada e glicorraquia normal; o exame citológico mostrará número elevado de hemácias, número de leucócitos inicialmente na mesma proporção de sangue, porém podendo se alterar após 24-48h pelo aparecimento de resposta inflamatória • Quando feito o diagnóstico de AVC, deve-se seguir para buscar o mecanismo e a etiologia, através de: V Ecocardiograma Doppler transtorácico e transesofágico → mostra alteração que favoreça causa cardioembólica V ECG de 24h (Holter) → mostra arritmia paroxística V Ecodoppler de artérias carótidas, vertebrais/Doppler transcraniano e Angioressonância → informações sobre possíveis estenoses arteriais extra e intracranianas V Angiografia cerebral digital → identifica o mecanismo da HSA V Exame do liquor → diagnóstico de algumas causas menos frequentes de AVCi (arterites infecciosas e não infecciosas) V Perfil de anticorpos, dosagem de anticorpos antifosfolípides e pesquisa de trombofilias ABORDAGEM INICIAL • Fazer o ABCDE primário → estabilização hemodinâmica e posterior investigação do evento • Na avaliação do “D – disability” é aplicado o NIHSS (national institute of health stroke scale) → escala com 11 tarefas que varia de 0 a 42, sendo pior o quadro quanto maior for a pontuação N I H S S 1a. Nível de consciência 1b. Orientação 1c. Comandos 2. Olhar conjugado 3. Campo visual 4. Movimento facial 5. Resposta motora MMSS Clara Feitosa | DISTÚRBIOS SENSORIAIS 6. Resposta motora MMII 7. Ataxia apendicular 8. Sensibilidade 9. Linguagem 10. Disartria 11. Extinção/Desatenção ou negligência TRATAMENTO • SUPORTE CLÍNICO: medidas de suporte de vida avançado → avaliar função cardiorrespiratória + exames laboratoriais para análises bioquímicas, hematológicas e da coagulação • TRATAMENTO ESPECÍFICO: uso de alteplase e a trombectomia mecânica (se indicados) • PREVENÇÃO E TRATAMENTO DE COMPLICAÇÕES: neurológicas ou não • PROFILAXIA SECUNDÁRIA: baseada no mecanismo fisiopatológico determinante do AVCi • INÍCIO PRECOCE DA REABILITAÇÃO TROMBÓLISE: • Dentre os critérios para indicação do tratamento tromboembolítico venoso, o tempo de evolução do quadro neurológico não deve ultrapassar o limite de 4,5 horas até o início da infusão do agente • A administração do rt-PA (alteplase) deve ser feita na dose de 0,9 mg/kg (dose máxima de 90mg) em período de 1h, sendo inicialmente 10% da dose administrada em bolus durante 1 minuto • Não administrar anticoagulante ou antiagregantes nas primeiras 24h pós procedimento trombolítico • Monitorizar o paciente para evitar complicações hemorrágicas • Não atrasar a trombólise para aguardar resultados de exames → exceção de pacientes que receberam anticoagulantes ou há suspeita de sangramento ou trombocitopenia • Único teste mandatório antes da trombólise é o HGT → contraindicação absoluta se estiver abaixo de 50mg/dL TROMBECTOMIA MECÂNICA: • Indicada para pacientes com AVCi devido a oclusão de artéria calibrosa na circulação anterior que podem ser tratados dentro de 24h do início dos sintomas ou do último momento que foram vistos sem sintomas CONTROLE DE PA: • Após o AVC é comum que haja aumento da PA como mecanismo protetor para garantir a perfusão cerebral • Para pacientes que serão submetidos à trombólise, é recomendado que a PA esteja ≤ 185x110 mmHg antes do procedimento e ≤ 180x105 mmHg por pelo menos 24h após a trombólise • Para pacientes que não têm indicação para a trombólise, a PA não deve ser tratada a não ser que haja hipertensão > 220x120 mmHg ou o paciente tenha doença coronária ativa, eclampsia, dissecção de aorta ou encefalopatia hipertensiva → quando o tratamento é indicado, reduzir cerca de 15% nas primeiras 24h CONTROLE DA HIPOGLICEMIA: • Pode causar déficits neurológicos focais, mimetizando um AVC → checar e corrigir assim que possível CONTROLE DE HIPERFLICEMIA: • Pode aumentar a lesão cerebral por diversos mecanismos → deve ser tratada quando severa → deve ser mantida na faixa de 140 a 180mg/dL TERAPIA ANTITROMBÓTICA: • Indicado uso de aspirina dentro de 48h do início dos sintomas DEGLUTIÇÃO: • Disfagia é comum após AVC → ter cuidado com pneumonias e broncoaspiração → avaliar a deglutição antes de introduzir medicamentos e alimentação via oral ELEVAÇÃO DA CABECEIRA: • Manter a cabeceira a 30° na fase aguda do AVC para evitar aumento da pressão intracraniana e broncoaspiração FEBRE: • A etiologia deve ser investigada e tratada → podem ser usados antipiréticos • Evitar hipo/hipertermia HIP: • O tratamento da HIP é de suporte → controlar PA para valores < 140 mmHg • Investigar a causa do sangramento (hipertensivo, coagulopatias, malformações venosas, ruptura de aneurismas, neoplasias etc) • Evitar hipo/hiperglicemia → tratar com insulina se > 180mg/dL • Fazer prevenção para TEP/TVP com meias de compressão pneumática intermitente e mobilização precoce Clara Feitosa | DISTÚRBIOS SENSORIAIS • Prevenir úlceras de decúbito • Não usar antiepilépticos profiláticos • Na monitorização da pressão intracraniana, manter a pressão de perfusão cerebral > 70 mmHg → após drenagem cirúrgica, a PAM não deve ficar > 110 mmHg HSA: • Suporte clínico • Tratamento das complicações neurológicas → ressangramento, vasoespasmo, hidrocefalia, convulsões • Tratamento do aneurisma propriamente dito (neurocirúrgico x vascular) → a escola do método depende do estado clínico do paciente, a localização e as características anatômicas do aneurisma roto (o qual recomenda-se tratamento precoce) PREVENÇÃO SECUNDÁRIA • ANTIAGREGAÇÃO PLAQUETÁRIA: no AVCi, fazer AAS 100-300mg/dia e/ou clopidogrel 75mg/dia (se intolerância a AAS ou recorrência do AVC com fatores de risco controlados) • HIPERTENSÃO: iniciar tratamento após a fase aguda → pressão-alvo é 120/80 mmHg → a primeira escolha é diurético ou a combinação diurético + iECA • DIABETES: pacientes diabéticos devem ter controle rigoroso com a PA e lipídios → glicemia deve ser normal ou próxima do normal • LIPÍDIOS: utilizar estatina em pacientes com AVCi com hipercolesterolemia (alvo LDL <100mg/dL e em pacientes com alto risco vascular, o alvo será <70mmg/dL) • FIBRILAÇÃO ATRIAL: pacientes com AVC isquêmico que tenham fibrilação atrial persistente ou paroxística, iniciar profilaxia com anticoagulação oral
Compartilhar