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76 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II Unidade II 5 DESEMPENHO MOTOR EM ADULTOS E IDOSOS De maneira geral, o ser humano experimenta uma melhora contínua nas suas funções da infância à fase da adolescência. Durante a vida adulta, pode‑se dizer que chegamos ao auge do desenvolvimento motor; é neste momento que alcançamos as melhores condições físicas e fisiológicas, ou seja, um período de estabilização. Neste estágio, pouco progresso pode ser visto quando observamos o curso natural de desenvolvimento, então podemos dizer que chegamos a um patamar no qual a linha de desenvolvimento não sobe nem desce. Figura 36 – Marcas de envelhecimento Entretanto, a vida adulta é dividida entre fase adulta e meia‑idade. A literatura é divergente em classificar exatamente a faixa etária de cada uma delas. Contudo, para ser ter uma ideia deste período, a fase adulta vai dos 20 aos 40 anos, e a meia‑idade, dos 40 aos 60 anos. Ao chegar à meia‑idade, algumas leves perdas (especialmente fisiológicas) já podem ser observadas, mas na terceira idade isso ocorre quando o declínio se pronuncia mais drasticamente. No entanto, muitos fatores podem contribuir para mexer nesta forma simplista de descrever o desenvolvimento, como melhora até a adolescência, estabilização na fase adulta, leve declínio na meia‑idade e declínio na velhice. Alguns sistemas podem sofrer deterioração na infância e na adolescência. Usemos a obesidade infantil como um exemplo, processo que leva certamente à piora no funcionamento fisiológico, motor e psicológico. Na fase adulta, pode ocorrer o mesmo, tanto declínio pronunciado associado a alguma doença ou a alguma característica do estilo de vida que não favoreça a manutenção dos níveis ótimos de desenvolvimento típicos dessa fase. Na meia‑idade também podemos, por exemplo, observar sistemas que apresentam pronunciadas melhoras, outros que se mantêm estáveis e outros que ainda podem iniciar o processo de declínio, como a visão. 77 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR Lembrete O auge da performance e da maturação do sistema motor é alcançado na idade adulta. 5.1 Alterações biológicas, fisiológicas e morfológicas nos sistemas dos adultos Inicialmente, podemos estudar os motivos do envelhecimento por meio dos aspectos biológicos (lembrando que este não é o único, nem mesmo o principal; temos ainda os aspectos sociais, emocionais, do estilo de vida etc.). Já foi observado que as células que compõem nossos órgãos podem ter o número de divisões celulares que elas serão capazes de realizar, tudo limitado e definido geneticamente. Por exemplo, as células do tecido conjuntivo passam por cerca de cinquenta divisões durante o ciclo da vida de um sujeito (HAYFLYCK, 1980). Uma característica como essa pode ser um limitador e um determinante no processo do envelhecimento. A produção de radicais livres (fator ligado à alimentação e ao nível de atividade física, por exemplo) pode ser vital para o processo de envelhecimento. Os radicais livres influenciam negativamente o funcionamento de células saudáveis do organismo. A homeostasia do corpo (manutenção da execução harmoniosa entre os sistemas fisiológicos) também pode ser um fator que favorece o envelhecimento, caso não esteja em equilíbrio. A ingestão de antioxidantes e restrições na dieta de alimentos prejudiciais à saúde são elementos que podem atuar positivamente no processo de envelhecimento. 5.2 Sistema musculoesquelético No sistema esquelético é comum observarmos uma redução na estatura conforme envelhecemos. Essa redução pode estar associada à perda de alinhamento da coluna ou à má postura, mas muitas vezes está mais diretamente ligada à diminuição da densidade dos discos intervertebrais, que perdem uma porção de água de seu conteúdo com o passar do tempo. Pode ainda haver a perda da densidade mineral óssea, chamada de osteoporose, que aumenta a vulnerabilidade, havendo fraturas “dentro de” um osso e também “do” osso. Pode acometer tanto homens quanto mulheres, entretanto mulheres no período pós‑menopausa sofrem de alterações hormonais, facilitando a manifestação dessa doença. Todavia, mesmo tendo o sistema esquelético comprometido com perda da densidade óssea, com atividade física é possível manter a musculatura fortalecida para que os prejuízos sejam amenizados. 78 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II Idade 55 anos Idade 65 anos Idade 75 anos Figura 37 – Perda de estatura com o envelhecimento A força muscular é essencial para a realização tanto de atividades atléticas quanto de ações funcionais do cotidiano. Com a idade a estrutura e a função do sistema muscular podem diminuir. A massa muscular decresce à medida que as fibras musculares são subtraídas (em número e tamanho) com o avanço da idade. De maneira geral, entre 25 e 30 anos de idade a força muscular atinge o auge, depois passa por um processo estável até por volta dos 50 anos, quando passa a sofrer um declínio gradual até aproximadamente os 70 anos, e a partir daí a queda passa a ser maior. A atividade física, em especial o treinamento de força, com toda a certeza pode mudar de maneira positiva esse quadro, assim como o sedentarismo pode provocar o lado negativo. Articulações e tecidos conectivos passam pelo mesmo processo de perda de função com o aumento da idade. A capacidade de flexibilidade das articulações se limita conforme os anos se passam, dificultando a realização de tarefas da vida diária em sedentários. Observação Nesse processo de perda, a atividade física tem um papel preventivo, além de retardar a deterioração dos tecidos. 79 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR Figura 38 – Conteúdo muscular normal em adulto fisicamente ativo (A) e sarcopenia em idoso sedentário (B) 5.3 Sistema nervoso central (SNC) Desde que nascemos, a cada dia perdemos neurônios que não são substituídos; isso pode levar a uma perda de 10% a 50% da massa neuronal, dependendo da região do cérebro. Consequentemente o cérebro do idoso é menor e pesa menos que o cérebro de um adulto. Não obstante, os neurônios remanescentes são capazes de criar novas ramificações, que compensam (parcialmente) as perdas de massa neuronal; esse fenômeno é conhecido como plasticidade cerebral. Apesar dos aspectos positivos da plasticidade, com o passar da idade, a capacidade de transmissão de impulsos também fica prejudicada; assim, a força do sinal transmitido passa a ser menor, o que pode ocasionar uma informação mais fraca ou até mesmo distorcida. Além disso, a capacidade de circulação sanguínea no idoso sofre uma diminuição em virtude de alterações estruturais no sistema circulatório e do decréscimo da atividade física, fatores que levam diretamente a uma queda na quantidade de oxigênio disponível para o cérebro, prejudicando um pouco mais o funcionamento geral e a longevidade. Figura 39 – Neurônios e sinapses 80 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II 5.4 Sistemas circulatório e respiratório O sistema circulatório e o respiratório passam a sofrer algumas sutis deteriorações da idade adulta para o envelhecimento. Por exemplo, a perda da elasticidade das artérias (vasos condutores do oxigênio para todo o corpo) pode vir acompanhada de um acúmulo (calcificação) de tecidos (tecido conectivo/ colágeno e até mesmo gordura) na parede dessas artérias. Uma das consequências desses acúmulos pode ser o prejuízo no transporte de oxigênio, elevando a pressão arterial. Desse modo, as artérias trabalham de forma menos eficiente. Laringe Traqueia Pulmões Lobo superior Bronquíolos Lobo médio Lobo inferior Alvéolos Brônquios Pleura Nariz Figura 40 – Sistema respiratório A função respiratóriapulmonar tende a começar a declinar entre 40 e 50 anos de idade, mas na maioria das vezes está associado a outros fatores que não somente o envelhecimento, tais como: sedentarismo, aumento de peso corporal e problemas posturais. Todos esses reveses podem ser melhorados com a prática do exercício físico. 5.5 Sistemas sensoriais De todos os sistemas sensoriais (visual, auditivo, olfativo, do paladar e proprioceptivo), o sistema visual, o auditivo e o proprioceptivo com certeza são os mais influenciados com o avanço da idade. O olho, por exemplo, tende a passar por uma série de alterações estruturais e funcionais que podem afetar a qualidade da visão. Durante a meia‑idade, a capacidade da musculatura dos olhos de contrair‑se e alongar‑se vai se deteriorando, o que pronuncia a típica dificuldade de enxergar após os 40 anos. Inicialmente essa 81 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR degradação não prejudica o desempenho motor na meia‑idade, mas na terceira idade o comprometimento visual pode afetar mais severamente as atividades da vida diária. Com o sistema auditivo acontece o mesmo processo. À medida que a idade avança, várias membranas e diversos órgãos do ouvido tornam‑se menos flexíveis, e declina o fluxo sanguíneo para partes do sistema auditivo, provocando perdas auditivas. Embora o sistema auditivo não seja o canal primordial de informação para a realização de tarefas motoras, a qualidade da informação auditiva influencia indiretamente o comportamento motor a ser realizado. Ouvido externo Ouvido médio Osso temporal Canal auditivo Tímpano Trompa de Eustáquio Pavilhão auditivo (orelha) Ouvido interno Figura 41 – Ouvido interno A propriocepção (senso de consciência corporal e de posição) está muito ligada ao sistema vestibular, responsável por nos fornecer informações a respeito da nossa posição no espaço. Adultos de meia‑idade e idosos têm relatado que frequentemente experimentam a sensação de vertigem (tontura), o que provavelmente se relacione ao mau funcionamento ou ao desgaste do sistema vestibular. Este corrupção pode afetar diretamente o equilíbrio do corpo durante a realização das atividades motoras do cotidiano. Além do sistema vestibular, receptores que enviam informações a respeito do posicionamento corporal também estão localizados nas articulações do sistema musculoesquelético. Assim, se as articulações estiverem comprometidas com falta de flexibilidade, ou ainda algum tipo de lesão (entorse) ou doença (artrose, por exemplo), a captação e o envio das informações ficarão prejudicados, promovendo dificuldades na execução das tarefas motoras. 82 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II Lembrete Melhorar a qualidade dos sinais sensoriais, bem como adequar os espaços físicos, pode compensar parcialmente as perdas sensoriais inevitáveis que acompanham o envelhecimento. 5.6 Sistema motor 5.6.1 Tempo de reação Como destacamos, diversos aspectos afetam o desempenho motor de adultos e idosos (saúde, estilo de vida, fatores psicológicos, alterações do ambiente etc.). Uma das perdas mais evidentes que a deterioração geral dos sistemas pode ocasionar é o declínio do tempo de reação (intervalo de tempo entre a manifestação do estímulo e o início da resposta motora), vital para o comportamento motor humano. Como todos os demais sistemas estão comprometidos, o tempo de recepção do estímulo, bem como o tempo de integração motora e de descarga motora vão afetar diretamente o tempo de reação, provocando uma lentidão nas respostas motoras em todos os deveres cotidianos. Assim, a maioria das tarefas motoras pode representar algum tipo de risco quando o tempo de reação está danificado, por exemplo, responder a um desnível no chão para se manter andando em equilíbrio, reagir rapidamente quando estiver dirigindo um veículo, retomar o equilíbrio depois de uma freada brusca no ônibus e tantas outras atividades que exigem o mesmo. Figura 42 – Exemplo de situação em que o uso do tempo de reação é essencial no dia a dia Com a perda da capacidade de responder rapidamente aos estímulos, adultos da meia‑idade e idosos tendem automaticamente a substituir a velocidade na execução das tarefas motoras por precisão. Assim, preferem realizar uma ação motora mais devagar e de maneira mais precisa, tendo em vista que não são mais capazes de executar comportamentos rapidamente. 83 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR No entanto, apesar de a deterioração dos sistemas levar ao aumento do tempo de reação, outros elementos podem ao menos tentar uma compensação para essas perdas. Por exemplo, quanto mais familiar a tarefa, quanto melhor a qualidade do sinal (SPIRDUSO; MACRAE, 1990) e quanto menos variedade de estímulo for apresentada, menores poderão ser as perdas na capacidade de responder rapidamente a um estímulo. Saiba mais MATSUDO, S. M. M. Envelhecimento, atividade física e saúde. Envelhecimento & Saúde, Brasília, abr. 2009, n. 47, p. 76‑9. Disponível em: <http://periodicos.ses.sp.bvs.br/scielo.php?script=sci_pdf&pid=S1518‑ 18122009000200020&lng=es&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 19 dez. 2016. 5.6.2 Equilíbrio e postura O equilíbrio e o controle postural são a capacidade de controlar a posição do corpo no espaço por propósitos duplos de estabilidade e orientação (SHUMWAY‑COOK; WOOLLACOTT, 2010). A orientação postural é a habilidade de manter uma relação apropriada entre os segmentos corporais e entre o corpo e o meio ambiente (HORAK; MCPHERSON, 1996). O termo postura é frequentemente utilizado para descrever o alinhamento biomecânico do corpo e a orientação do corpo no ambiente. A estabilidade postural, também referida como equilíbrio, é a habilidade de controlar o centro de massa em relação à base de sustentação. A vocação de controlar a posição do nosso corpo no espaço é fundamental para tudo o que realizamos. Todas as tarefas motoras requerem controle postural, que exige orientação e estabilidade. Para a manutenção da postura e da orientação, é preciso uma interação complexa entre os sistemas musculoesquelético e neural. Os componentes musculoesqueléticos incluem: • amplitude de movimento da articulação (determina a restrição ou a liberdade do movimento da referida articulação); • flexibilidade espinal; • propriedades dos músculos; • relações biomecânicas entre os segmentos corporais ligados. Os componentes neurais são: • processos motores: incluem a organização dos músculos pelo corpo em sinergias musculares (ritmo e sequenciamento da ativação de grupos musculares); • processo sensorial/perceptual: envolvem a disposição e a interação dos sistemas visual, vestibular e somatossensorial (informações sobre a posição do corpo no espaço); 84 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II • processos de níveis superiores: essenciais para o mapeamento da sensação à ação e a garantia dos aspectos antecipatórios e adaptativos (capacidade de modificar as informações sensoriais e as respostas motoras programadas). Além disso, as estruturas física e biológica do indivíduo, como altura, peso e tamanho dos pés, podem ser determinantes para a capacidade de orientação e equilíbrio dos indivíduos. Tendo em vista que o bom funcionamento do sistema de controle postural é dependente da interação de diversos outros sistemas, cada um deles influencia diretamente a ação do outro. Assim, o controle postural é um elemento‑chave para o desempenho motor, que está intimamente ligado ao tempo de reação. O declínio da força e do controle muscular, na flexibilidade das articulações e nas características físicas, também interage para alterar o processo de equilíbrio e postura. Em atividades de rotina, os sujeitos são submetidos a situações de desequilíbriopostural. Para tais situações, deve‑se adotar estratégias de manutenção do equilíbrio e orientação postural. Essas medidas são empregadas tanto em situações de desequilíbrio como em casos de antecipação para a manutenção do equilíbrio. Quando há o desequilíbrio e o sistema precisa ser reestabelecido, há atuação do mecanismo de controle de feedback como resposta ao desequilíbrio. O controle de antecipação refere‑se às respostas posturais que são feitas em antecipação aos movimentos voluntários, potencialmente desestabilizadores, a fim de manter a estabilidade durante o movimento (SHUMWAY‑COOK; WOOLLACOTT, 2010). Figura 43 – Estratégias de controle postural (tornozelo, quadril e passada) após perda de equilíbrio Nos idosos com deterioração dos sistemas em geral, o restabelecimento do equilíbrio e da postura em situações de instabilidade se torna cada vez mais difícil, e frequentemente menos efetivo, conforme o avanço da idade. As estratégias de controle postural que são aplicadas em casos de desequilíbrio passam a ser utilizadas de maneira diferente com o aumento da idade e a deterioração dos sistemas. Pesquisas apontam que o padrão de ativação das estratégias de recomposição da postura é diferente quando são comparados adultos jovens e idosos. Os idosos tendem a coativar os músculos agonistas e antagonistas da articulação, portanto, e tendem a enrijecer as articulações em um maior grau que os 85 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR adultos (NASHNER; SHUMWAY‑COOK; MARIN, 1983). Inicialmente, quando o desequilíbrio é pequeno e todos os sistemas estão em pleno funcionamento, a primeira tática de que um adulto jovem lança mão é a técnica de tornozelo, que contrai a musculatura dos tornozelos para devolver o corpo a uma situação de equilíbrio. À medida que o desequilíbrio passa a ser maior, adota‑se a estratégia do quadril e em seguida a da passada, para situações de grande desequilíbrio. Entretanto, os idosos já sabem das perdas sensoriais que sofrem e acabam por adotar pouco a ativação do tornozelo, e o que é mais frequente é o uso da estratégia de quadril ou passada. O uso exacerbado das técnicas de quadril e passada é fruto da deterioração dos demais sistemas (sensorial e musculoesquelético), que fornecem informações mais pobres, e a ativação muscular já não é mais muito efetiva, mas também deve ser avaliada a característica mais conservadora do grupo de idosos. Boa parte desses idosos tem consciência das perdas que seus sistemas vêm sofrendo com o passar do tempo e acabam adotando essas medidas propositadamente porque as consideram mais seguras para evitar quedas. Embora muitas perdas que levam ao declínio do equilíbrio e da postura sejam irreversíveis – sobretudo na velhice –, existem possibilidades de se minimizar essas perdas com estratégias de compensação. Por exemplo, caso a perda visual seja inevitável, pode‑se melhorar a iluminação do ambiente. A prática da atividade física e o trabalho de flexibilidade articular podem atenuar as perdas de força muscular, provocando menos instabilidade e aumento da capacidade articular de ação. Dessa forma, a prática da atividade física tem sido reconhecida como um dos fatores mais importantes para reduzir os fatores de risco que o avanço da idade provoca, e isso ocorre em especial na prevenção de quedas, que é uma das maiores preocupações em pessoas da terceira idade. Saiba mais Para saber mais sobre controle postural, leia: SHUMWAY‑COOK, A.; WOOLLACOTT, M. H. Controle motor. 3 ed. São Paulo: Manole, 2010. p. 212‑33. 6 PADRÃO DA MARCHA Uma das características principais do comportamento humano é a capacidade de locomoção independente. A marcha é um comportamento complexo que envolve o corpo inteiro, portanto requer uma coordenação intrincada de vários sistemas. A marcha é composta basicamente de três elementos: a progressão (padrões rítmicos de ativação muscular nas pernas e no tronco que movem o corpo na direção desejada), o controle postural (restabelecer e manter a postura apropriada) e a adaptação (considerar as alterações que o ambiente e o organismo oferecem e fazer os ajustes imediatos necessários). A marcha é dividida em fase de apoio (na qual temos os dois pés no chão) e fase de balanço (na qual um dos pés está em fase aérea enquanto o outro está apoiado). Durante a fase de apoio, é preciso gerar força contra a superfície de apoio para mover o corpo na direção desejada. Na fase de balanço, deve‑se atender aos objetivos de progressão e de controle postural, e ainda é desejável ser capaz de adaptar‑se a desníveis 86 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II (obstáculos) e fazer os ajustes. Em um comportamento de andar ideal, cada fase – de apoio e de balanço – compõe 50% do ciclo da marcha. Qualquer variação na composição dessa porcentagem representa alteração no padrão da marcha. Events initial contact Load response Heel off Opposite initial contact Toe off Feet adjacent Tibia vertical Next initial contact periods loading response Mid stance Terminal stance Pré swing Initial swing Mid swing Terminal swing tasks Weight acceptance Single‑limb support Limb advancement phases Stance phase Swing phase cycle Right gait cycle 0% 10% 30% 50% 60% 73% 87% 100% Figura 44 – Composição do ciclo da marcha Em geral, a marcha é descrita considerando os parâmetros de velocidade, distância, comprimento e frequência da passada. A velocidade é o tempo gasto para cada passo, e a distância é a medida de espaço percorrido em um passo. O comprimento da passada é o tamanho de cada passo, e a frequência é a quantidade de passos por unidade de tempo. Adultos jovens costumam andar a uma velocidade de 1,46 m/s, e seu comprimento médio do passo é de 76,3 cm. À medida que aumentamos a velocidade da marcha, alteramos a proporção do tempo gasto em cada uma das fases (apoio e balanço). Todavia, quando aumentamos a velocidade a ponto de não haver a fase de duplo apoio (quando os dois pés estão no chão), entramos em outro tipo de locomoção, a corrida. Se o equilíbrio e a postura sofrem influência do processo de envelhecimento, como relatamos, consequentemente o padrão de caminhada também é afetado. Essas alterações podem ser facilmente observadas no padrão de caminhada de adultos mais velhos, sobretudo em idosos. Usualmente, os estudos apontam que há uma diminuição na velocidade da marcha, no comprimento e na frequência do passo. Em pesquisas com análise cinemática, foi verificado que há um aumento da fase de apoio e um encurtamento da fase de balanço a partir dos 65 anos de idade. Ainda havia uma maior flexão do quadril, do joelho e do tornozelo em idosos, quando comparados com adultos mais jovens. Por fim, constatou‑se uma diminuição da altura do pé durante a fase de balanço em idosos. Todas essas alterações observadas na marcha em idosos curiosamente não têm sido comparadas a nenhum tipo de patologia. Em vez disso, os relatos dos estudos que compararam a marcha de idosos com marcha de pessoal em situações de risco, por exemplo, em ambientes escorregadios, destacam a marcha na terceira idade como cuidadosa, provavelmente na tentativa de promover maior estabilidade, 87 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR assim como acontece com adultos jovens em situações de instabilidade. Durante a marcha de idosos, também foi identificada coativação de musculatura agonista e antagonista em algumas articulações. Esse padrão, via de regra, é detectado em indivíduos jovens que não têm habilidade para a tarefa ou quando estão caminhando em situações que requerem controle elevado. Então, mais elementos indicam que o padrão da marcha nos idosos não é patológico, mas cuidadoso. Figura 45 A diminuição no tamanho da passada também pode estar relacionada com a reduçãoda força muscular que é necessária para a geração de força para o impulso, e uma das justificativas apresentadas para essa subtração foi o fato de os idosos estarem sendo mais cautelosos, portanto aplicariam menos força, gerando menos potência na fase propulsiva da marcha. De maneira geral, são estas as alterações observadas na marcha em idosos: • velocidade encurtada; • comprimento reduzido do passo; • ritmo diminuído do passo; • aumento da largura da passada; • extensão da fase de apoio; • aumento do tempo em duplo apoio; • diminuição da fase de balanço; • abreviação de balanço do braço; 88 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II • redução da flexão do quadril, joelho e tornozelo; • pé mais plano no choque do calcanhar; • estabilidade dinâmica subtraída durante o apoio; • coativação muscular elevada; • contração da potência de geração de impulso; • diminuição da potência de absorção no choque do calcanhar. A combinação de todos esses elementos amplia a suscetibilidade de a pessoa mais velha sofrer quedas, que podem resultar em sérias consequências em adultos, sobretudo em idosos, haja vista eles terem o processo de recuperação mais lento – em razão do declínio de funcionamento de todos os sistemas em geral. Os aspectos da marcha em idosos saudáveis diferem das características em idosos com o equilíbrio comprometido e que passam por repetidos eventos de queda. Todas as alterações da marcha que podem ser verificadas em idosos quando comparados com adultos são ainda mais evidentes em idosos que já sofreram quedas ou que tenham o equilíbrio comprometido. Alguns estudos tentam identificar o comprometimento da capacidade de equilibrar‑se em tarefas de marcha com ultrapassagem de obstáculos. Nessas análises são observadas a oscilação do centro de massa dos indivíduos durante a ultrapassagem de obstáculo. Em idosos com histórico de quedas, há um maior deslocamento médio‑lateral do centro de massa, e essa ação mais extensa também pode ser usada como elemento promotor de possíveis tendências a quedas. A reação do sistema de controle postural, mais especificamente o sistema adaptativo, em caso de tropeços, também deve ser observado com atenção, a fim de prevenir quedas. Afinal, 35% a 47% das quedas em idosos são provenientes de tropeços em objetos. Estudos apontam que os músculos essenciais para a recuperação do equilíbrio após um tropeço são os flexores do quadril da perna que está em fase de balanço e os flexores plantares da perna que está em apoio. Além disso, esta pesquisa mostrou que a geração do torque é mais relevante para a recuperação do equilíbrio do que a força muscular, portanto a rapidez com que as forças se reúnem e se organizam para gerar contração muscular é mais importante do que a quantidade de força em si. Assim, a atividade física em idosos deve estar focada no treinamento de força para que se tenha a pujança disponível para as atividades da vida diária. Ela deve ser usada em momentos de necessidade e no treinamento da velocidade de força, principalmente nos membros superiores, o que parece ser fundamental para a qualidade de vida dos idosos. Uma solução para tentar minimizar os problemas causados pelo processo de envelhecimento dos sistemas é promover alterações no ambiente que facilitem a realização das atividades diárias e reduzam os riscos de acidentes. Por exemplo, aumentar a luminosidade do ambiente, diminuir o número de objetos no caminho, evitar uso de tapetes que podem provocar tropeços e escorregões, bem como promover ações de intervenção ambiental que possam ajudar. Entretanto, a operação mais efetiva tem sido a manutenção 89 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR de um estilo de vida ativo e saudável, com prática constante de atividade física para atenuar as perdas das capacidades físicas como força, agilidade, equilíbrio e flexibilidade, para que a manutenção dessas habilidades compense as perdas funcionais e estruturais inevitáveis dos sistemas sensoriais. Figura 46 – Idoso ativo fisicamente em corrida de rua Resumo Durante a fase adulta, chegamos ao auge do desenvolvimento motor, e é neste momento que alcançamos as melhores condições físicas e fisiológicas, ou seja, um período de estabilização. A fase adulta, dividida entre adultos jovens (20‑40 anos) e adultos de meia‑idade (40‑60 anos), pode começar a apresentar alguns declínios no funcionamento dos sistemas a partir da meia‑idade. A partir dos 60 anos, período que caracteriza a terceira idade, os declínios tornam‑se mais pronunciados em todos os aspectos biológicos, fisiológicos e motores. A preocupação com a manutenção da capacidade motora para realização das atividades da vida diária deve ser constante, e uma atenção especial deve ser dada para que seja evitado ou diminuído o risco de quedas, um dos maiores responsáveis pela falta de mobilidade e pela morte em idosos. Para isso, a atividade física, especialmente o trabalho de força, tem se mostrado como fator importante para a manutenção da vida saudável e ativa em adultos e idosos. 90 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II Nesta unidade, ainda vimos que uma das características principais do comportamento humano é a capacidade de locomoção independente. A marcha é um comportamento complexo que envolve o corpo inteiro, portanto requer uma coordenação intrincada de vários sistemas. Ela é composta basicamente de três elementos: a progressão (padrões rítmicos de ativação muscular nas pernas e no tronco que movem o corpo na direção desejada), o controle postural (restabelecer e manter a postura apropriada) e a adaptação (considerar as alterações que o ambiente e o organismo oferecem e fazer os ajustes imediatos necessários). Exercícios Questão 1. Considere as seguintes afirmativas a respeito do desenvolvimento motor ocasionado no processo de envelhecimento. No que se refere ao processo de perda de massa muscular e força, responda corretamente, considerando o gráfico a seguir. 250 12.5 12,0 11,5 10,5 11,0 10,0 9,5 10 20 30 40 50 60 70 Força isométrica 60º/s 180º/s Idade (anos) EMI (rad/seg.)Torque (Nm) 200 150 100 50 Figura 47 – Força máxima isométrica (FMI, Nm) e velocidade máxima de extensão do joelho (EMJ, rad/s) em sujeitos do sexo masculino de diferentes grupos etários I – A força muscular máxima é alcançada por volta dos 30 anos e mantém‑se mais ou menos estável até a 5ª década. II – Entre os 50 e os 70 anos há uma perda de aproximadamente 15% por década, e a redução da força muscular aumenta para 30% a cada 10 anos. III – A diminuição da força é atribuída majoritariamente à perda de massa muscular, seja pela atrofia, seja pela redução do número de fibras musculares – hipoplasia. IV – Em razão das perdas acentuadas de massa muscular e força muscular associadas à desinervação das unidades motoras (UM), a possibilidade de ganho de massa muscular em idosos é muito pequena. 91 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR V – As perdas motoras ocasionadas pelo processo de envelhecimento e pela sarcopenia independem do histórico de prática de exercícios físicos durante a vida e na velhice. Estão corretas apenas as afirmativas: A) I, II e III. B) I, II e V. C) II, III e IV. D) I, II, III e IV. E) I, II, IV e V. Resposta correta: alternativa A. Análise das afirmativas I – Afirmativa correta. Justificativa: de maneira geral, entre 25 e 30 anos de idade, a força muscular atinge o auge, depois passa por um processo estável até aproximadamente os 50 anos. II – Afirmativa correta. Justificativa: a partir dos 50 anos, a massa muscular passa a sofrer um declínio gradual até perto dos 70 anos de idade, e a queda passa a ser maior depois disso. III – Afirmativa correta.Justificativa: o processo natural de envelhecimento associado ao aumento do comportamento sedentário na população idosa gera perda de massa muscular por atrofia, perda do volume muscular, perda da quantidade de proteína contrátil nas fibras musculares e até por perda de fibras, que são destruídas por falta de uso e atividade neuromuscular. IV – Afirmativa incorreta. Justificativa: o tecido muscular do idoso responde de forma semelhante ao tecido jovem aos estímulos de força geradores de hipertrofia muscular, dessa forma a manutenção e até a recuperação do volume muscular é possível no idoso. 92 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 Unidade II V – Afirmativa incorreta. Justificativa: a atividade física, em especial o treinamento de força, pode mudar drasticamente de maneira positiva esse quadro, assim como o sedentarismo pode mudar para o lado negativo. A manutenção da prática de exercícios pode manter os níveis de massa muscular, força e autonomia nos idosos. Questão 2. (Enade 2016, adaptada) Integram uma equipe multiprofissional que trabalha em um asilo com idosos institucionalizados uma profissional de educação física, um enfermeiro, uma nutricionista, dois médicos, dois fisioterapeutas e uma terapeuta ocupacional. Na reunião semanal da equipe, os integrantes discutem sobre a mobilidade e a aptidão física dos idosos, e a profissional de educação física explica que, ao longo da vida, o organismo humano apresenta um nível de aptidão física que, normalmente, aumenta até a metade da quarta década de vida e, depois, segue em declínio. Ela apresenta, então, o gráfico a seguir, que mostra o resultado de uma coleta de dados sobre o nível de força muscular ao longo da vida como um dos componentes da aptidão física, aferido por meio de dinamômetro de pressão manual, em pessoas fisicamente ativas de ambos os gêneros. 10 20 30 Idade (anos) Fo rç a iso m ét ric a de pr es sã o m an ua l ( kg f) 40 50 60 70 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 Masculino Feminino Figura 48 Considerando as informações apresentadas e a perspectiva básica de trabalho do profissional de Educação Física que atua com idosos e integra a equipe multiprofissional, avalie as afirmativas a seguir e a relação proposta entre elas. I – Com o avanço da idade, o declínio do nível de força muscular ocorre de forma mais acentuada após os 30 anos. PORQUE II – Ao envelhecer, as pessoas deixam de praticar exercícios físicos com volumes e intensidades eficazes para impedir o declínio da força muscular. 93 Re vi sã o: V ito r - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 01 /1 7 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO MOTOR A respeito dessas afirmativas, assinale a alternativa correta: A) As afirmativas I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da I. B) As afirmativas I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa correta da I. C) A afirmativa I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa. D) A afirmativa I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira. E) As afirmativas I e II são proposições falsas. Resolução desta questão na plataforma.
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