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DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 1 MBA GERENCIAMENTO DE PROJETOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROFESSOR: GUILHERME SANDOVAL GÓES DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 2 ÍNDICE AULA 7: A COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS: POR UMA ESTRATÉGIA HERMENÊUTICA PÓS-POSITIVISTA DE SOLUÇÃO 3 INTRODUÇÃO 3 CONTEÚDO 4 INTRODUÇÃO 4 O CONFLITO DE REGRAS E A COLISÃO DE PRINCÍPIOS: OS CONTRIBUTOS DE RONALD DWORKIN E ROBERT ALEXY 9 ESTRATÉGIAS POSSÍVEIS: CONCORDÂNCIA PRÁTICA OU PROPORCIONALIDADE? 16 ESTRATÉGIA HERMENÊUTICA DA PONDERAÇÃO HARMONIZANTE E O PRINCÍPIO DA CONCORDÂNCIA PRÁTICA 18 A ESTRATÉGIA HERMENÊUTICA DA PONDERAÇÃO EXCLUDENTE E O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE 21 ATIVIDADE PROPOSTA 23 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 24 REFERÊNCIAS 27 CHAVES DE RESPOSTA 29 AULA 7 29 ATIVIDADE PROPOSTA 29 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 29 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 3 Direitos e Garantias Fundamentais – Apostila Aula 7: A colisão de direitos fundamentais: por uma estratégia hermenêutica pós-positivista de solução Introdução Nesta aula, serão estudados os elementos teóricos que possibilitam a formulação de uma estratégia hermenêutica de cunho pós-positivista para solucionar as hipóteses de colisão de normas constitucionais, mais precisamente, de direitos fundamentais. Assim, a proposta da presente aula é investigar, inicialmente, as construções doutrinárias de Dworkin e Alexy, cujo legado viabiliza a formulação de tal estratégia. Na sequência dos estudos, o grande desafio a enfrentar será a formulação dessa estratégia propriamente dita, cujo desejo é servir como caminho teórico-conceitual capaz de resolver a colisão de direitos fundamentais. Objetivo 1. Analisar os principais elementos teóricos que circunscrevem a colisão de normas constitucionais de mesma hierarquia, cujo desenvolvimento será feito com base nos princípios da concordância prática e da proporcionalidade. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 4 Conteúdo Introdução A presente aula tem o objetivo de examinar a colisão de normas constitucionais no ordenamento jurídico brasileiro. Com rigor, é a própria Constituição de 1988 que, a partir da sua dimensão compromissória, gesta o conflito de valores contraditórios entre si, como por exemplo, as contraposições entre livre iniciativa x direito do consumidor, liberdade de contratar x políticas públicas de restrição; igualdade formal x igualdade material, desenvolvimento econômico x proteção ambiental, propriedade privada versus função social da propriedade, Estado mínimo x Welfare State, autonomia privada x direitos trabalhistas e muitas outras. Trata-se, portanto, de estudo de linhagem epistêmica complexa, uma vez que envolve o tensionamento entre normas de mesma dignidade constitucional, sem a segurança de um método hermenêutico de aplicação direta. Em linhas gerais, a presente aula buscará destacar a solução do conflito aparente de normas constitucionais definidoras de direitos fundamentais em tensão sob a perspectiva da dogmática pós-positivista, que faz uso científico da ponderação de valores, notadamente a partir das festejadas obras de Ronald Dworkin 1 e Robert Alexy.2 1 DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1998. O império do direito. Tradução de Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999. Uma questão de princípio. Tradução de Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2000. 2 ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. Tradução de Zilda Hutchinson Schild Silva. São Paulo: Landy Livraria Editora e Distribuidora, 2001. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução de Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 5 De fato, a partir destes trabalhos paradigmáticos, foi possível traçar a diferença qualitativa entre regras e princípios, eixo hermenêutico central sobre o qual gira a força normativa do direito constitucional hodierno (neoconstitucionalismo). Não se trata apenas de uma diferença quantitativa, que reconhecia as regras como normas mais específicas e menos abstratas, aplicadas mediante subsunção silogística, enquanto que princípios eram vislumbrados como normas abertas carentes de regulamentação pelo legislador democrático e, portanto, comandos normativos não autoaplicáveis. Nesse sentido, Humberto Ávila, comentando o pensamento de Karl Larenz, destaca que: Para esse autor os princípios seriam pensamentos diretivos de uma regulação jurídica existente ou possível, mas que ainda não são regras suscetíveis de aplicação, na medida em que lhes falta o caráter formal de proposições jurídicas, isto é, a conexão entre uma hipótese de incidência e uma consequência jurídica. (negritos acrescidos) 3 De tudo se vê, por conseguinte, que a ideia de aplicação direta dos princípios jurídicos é o momento culminante do ataque geral ao positivismo (general attack on positivism) feito por Dworkin e, na sua esteira, por Alexy. 3 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. Rio de Janeiro: Malheiros, 2004. p. 27. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 6 É por isso que, com base no pensamento desses autores, a presente aula vai, inicialmente, examinar as diferentes estratégias hermenêuticas de solução do conflito entre regras jurídicas e da colisão de princípios constitucionais. Para tanto, será necessário examinar a estrutura lógico-normativa de regras e princípios, comparando-as de modo a aprofundar a compreensão da questão. Na sequência dos estudos, nosso desafio será então sistematizar uma estratégia hermenêutica de viés pós-positivista capaz de lidar com o conflito aparente de direitos fundamentais de mesma dignidade constitucional. Nessa tarefa, há que se lembrar a maneira pela qual o neoconstitucionalismo – impulsionado pela reaproximação entre a ética e o direito – vislumbra a normatividade dos princípios constitucionais a partir daquela imagem por nós já estudada de que são verdadeiras normas jurídicas capazes de gerar direitos subjetivos ao cidadão comum, independentemente da atuação do legislador democrático. Com efeito, correta a visão de que o “novo paradigma pós-positivista consolida a normatividade dos princípios constitucionais, reconhecendo-a como a exata medida do senhorio jurídico-normativo do Estado neoconstitucional de Direito, cuja afirmação categórica vem da conexão entre a dimensão ética do direito e a dimensão retórico- argumentativa das decisões judiciais”.4 Resta indubitável que o estudo da normatividade dos direitos fundamentais evoluiu lentamente na direção da atual ascensão exegética dos princípios constitucionais, que muito embora tenham estrutura semântica aberta, são comandos normativos de plena efetividade no plano concreto de significação, valendo nesse sentido trazer as palavras do eminente Paulo Bonavides 5 quando pontifica a nova era de “hegemonia axiológica dos princípios, 4 GÓES, Guilherme Sandoval. Por uma estratégia hermenêutica pós-positivista para a solução da colisão de normas constitucionais. In: A reconstrução do direito. Estudos em homenagem a Sergio Cavalieri Filho. Juiz de Fora: Editar, 2011. p. 51. 5 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 264. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 7 convertidos em pedestal normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas constitucionais”. É importante examinar as diferenças qualitativas de regras e princípios porque imprescindível para a formulação deuma estratégia hermenêutica de solução ponderativa. Por detrás dessa estratégia, desponta a imagem de uma Constituição como lugar de ética, política e direito, espaço normativamente superior que impõe limites democráticos ao Estado territorial soberano e que em muito se aproxima do conceito de lebensraum axiológico, vale explicitar, espaço vital de poder democrático inexpugnável, totalmente fora do alcance dos poderes instituídos pelo poder constituinte originário. Para Paulo Bonavides, 6 entre os momentos culminantes da reviravolta que afastou o positivismo está a correta compreensão da natureza dos princípios jurídicos como “normas-valores com positividade maior nas Constituições do que nos Códigos; e por isso mesmo providos, nos sistemas jurídicos, do mais alto peso, por constituírem a norma de eficácia suprema. Essa norma não pode deixar de ser o princípio”. É razoável afirmar, nesse contexto, que a força normativa da Constituição é o cerne da estratégia hermenêutica que se tenta delinear, notadamente na árdua tarefa de suplantar óbices quase que intransponíveis, daí a imagem da dignidade da pessoa se expandindo por toda a ordem jurídica de um verdadeiro Estado Democrático de Direito. Na formulação de uma estratégia pós-positivista, parece inexorável a necessidade de superar a intelecção de que os direitos fundamentais são simples normas programáticas não autoaplicáveis submetidas aos conceitos de reserva legal, simples ou qualificada. Ao contrário, a base da nova estratégia exegética é o entendimento de que os princípios constitucionais são forças ético-normativas que, juntos, 6 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 276. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 8 conjuntos e aliados, geram um espaço normativo sem limites, onde o sentimento constitucional de justiça, desraizado e desvinculado do velho positivismo legalista, se expressa para além do texto da norma. Claro que sempre haverá temores em relação a esse entendimento, questão que aparece na temática dos limites impostos ao ativismo judicial. Porém, é indubitável a mistura epistemológica do pós-positivismo jurídico que congloba diversos elementos fractais como o reconhecimento dos princípios como normas jurídicas, a necessidade de reaproximação entre o direito e a ética, a promoção do princípio da dignidade da pessoa humana, a proteção dos hipossuficientes e muitos outros. Mais uma vez na esteira do magistério superior de Paulo Bonavides, 7 vale fazer rápida compilação de sua visão e que, certamente, é a base teórica sobre a qual deve a estratégia pós-positivista se alicerçar: a) com o pós-positivismo, os princípios passam a ser tratados como direitos; b) os princípios são normas e as normas compreendem as regras e os princípios; c) os princípios fundamentam o sistema jurídico e também são normas (normas primárias); os princípios são as normas-chaves de todo o ordenamento jurídico; d) juspublicismo pós-positivista determina a hegemonia normativa dos princípios (Müller e Dworkin); e) conflito de regras se resolve na dimensão da “validade”, a colisão de princípios na dimensão do “valor”; 7 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 264, 271, 275, 276, 279, 281, 285 e 286. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 9 f) a teoria dos princípios é hoje o coração das Constituições; g) a jurisprudência dos princípios, enquanto “jurisprudência dos valores”, domina a idade do pós-positivismo. Enfim, parece não restar dúvida sobre a relevância do exame das diferenças entre regras e princípios na formulação de uma estratégia hermenêutica que tem a missão de solucionar a colisão de direitos fundamentais. É por tudo isso que vamos nesse primeiro momento examinar a construção teórica dos autores Dworkin e Alexy. O conflito de regras e a colisão de princípios: os contributos de Ronald Dworkin e Robert Alexy Conforme visto antes, a distinção qualitativa entre regras e princípios é um dos elementos nucleares da nova interpretação constitucional (neoconstitucionalismo), em especial, quando se vislumbra a Constituição como um sistema aberto de regras e princípios, em contraposição ao antigo axioma autopoiético (sistema fechado de regras jurídicas). Tal visão aberta da Constituição liberta a interpretação pós-positivista das amarras do dogma da aplicação mecânica de regras jurídicas, impulsionando- a na direção da teoria dos princípios, edificada por sua vez na ponderação de valores feita no caso concreto (novo paradigma axiológico-indutivo). Desloca-se para a centralidade do constitucionalismo da pós-modernidade, o sopesamento de bens jurídicos de mesma dignidade constitucional em conflito aparente, cuja solução desponta com o sentimento constitucional de justiça e com a realização da dignidade da pessoa humana. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 10 Tal mudança de paradigma deve especial tributo à sistematização de Ronald Dworkin e Robert Alexy. Com efeito, para Ronald Dworkin, as regras são comandos normativos aplicáveis sob a forma disjuntiva de tudo ou nada (all or nothing). Isso significa dizer que: se ocorrem os fatos previstos na regra jurídica (ocorrência da hipótese de incidência), então só existem duas possibilidades: (i) a regra é válida e a consequência jurídica (determinação normativa) deve ser aplicada de modo direto e automático sobre o caso concreto, produzindo- se seus efeitos pré-determinados; ou (ii) a regra é inválida e então deve ser desconsiderada na solução do caso concreto e do próprio ordenamento jurídico. Em consequência, as regras são aplicadas segundo o código binário tudo ou nada: ou são válidas (tudo) ou são inválidas (nada). No caso de conflito de regras, somente uma delas é válida, a outra então é considerada inválida, saindo da ordem jurídica. Entretanto, observe, com atenção, que uma regra pode não ser aplicada num determinado caso concreto e, mesmo assim, permanecer no mundo jurídico. Nessa hipótese, estamos diante de uma cláusula de exceção positivada pelo próprio legislador. Ou seja, é certo afirmar que uma regra não será aplicada quando houver exceções previamente estabelecidas pela própria lei. Com efeito, no ordenamento jurídico positivado pelo legislador democrático, existem diversas previsões de exceção (hipóteses de não incidências simbolizadas tradicionalmente pela expressão “salvo”) nas quais as regras não serão aplicadas, mas permanecerão válidas no mundo jurídico. É nesse sentido que a resolução do conflito entre regras jurídicas parte do pressuposto de que uma determinada situação fática não pode ser regida, a um só tempo, por duas regras jurídicas em contraposição, vale dizer, uma DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 11 mesma hipótese de incidência não pode gerar consequências jurídicas diferentes (determinações normativas conflitantes). Igualmente, uma mesma consequência jurídica não pode ser determinada por diferentes hipóteses de incidência, e.g., uma norma fixa a idade de 70 anos para a aposentadoria compulsória para servidores públicos e a outra fixa a idade de 65 anos nas mesmas condições da primeira. É por isso que um conflito de regras jurídicas será solucionado mediante a aplicação dos critérios de hierarquia, cronologia ou especificidade. Assim, para solucionar o conflito de regras, aplica-se o método clássico de resolução de antinomias, a saber: a) o critério da hierarquia, segundo o qual a norma superior prevalece sobre a inferior; b) o critério cronológico, pelo qual a norma posterior prevalece sobre a anterior (lex posterior derrogat priori);c) o critério da especialização, que por seu turno estabelece que a lei específica predomina sobre a lei geral (lex especialis derrogat generali). Observe, com atenção, que a estratégia hermenêutica (caminho metodológico-conceitual) que se emprega para a solução do conflito de regras jurídicas é relativamente simples. Nesse sentido, pode-se afirmar que a estratégia hermenêutica de solução do conflito de regras jurídicas é muito clara, i.e., de simples aplicação, na medida em que o exegeta sabe perfeitamente o caminho a trilhar (verificar os critérios de hierarquia, cronologia e especificidade). DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 12 Já com relação à colisão de princípios constitucionais, tais critérios não são adequados, especialmente entre os direitos fundamentais, que – como se sabe muito bem – são direitos relativos e não absolutos. Portanto, na solução da colisão de princípios de mesma dignidade constitucional, será empregada a ponderação de valores, uma nova estratégia hermenêutica que explora a estrutura lógica dos princípios constitucionais enquanto comandos normativos aplicáveis segundo uma dimensão de peso (dimension of weight), cuja solução será encontrada no caso concreto a partir da prevalência do princípio com maior peso relativo e sem que o princípio afastado perca sua validade no mundo jurídico (Ronald Dworkin). Para este eminente autor, quando os princípios colidem, como, por exemplo, a política de proteção dos consumidores de automóveis contra os princípios da liberdade contratual, o decisor do conflito deve aferir o peso relativo de cada um deles, ou seja, é necessário o juízo de valor para saber qual dos princípios em tensão tem maior dimensão de peso no caso a resolver. No entanto, o princípio que foi desconsiderado – por ter menor dimensão de peso no caso decidendo – não deixa de ser válido na ordem jurídica, apenas, não foi aplicado por ter menor peso relativo na solução do conflito. 8 Nesse sentido, a obra de Dworkin é paradigmal, uma vez que demonstra que a distinção entre princípios e regras não é meramente de grau (maior ou menor grau de generalidade, maior ou menos grau de abstração, maior ou menor grau de certeza, maior ou menor grau de densidade normativa), mas, sim, uma diferença qualitativa calcada na estrutura lógica das normas e, principalmente, no modo de sua aplicação. Como bem destaca Humberto Ávila: 9 Nessa direção, a distinção elaborada por Dworkin não consiste numa distinção de grau, mas numa diferenciação quanto à estrutura lógica, baseada em critérios classificatórios, em vez de comparativos, como afirma Robert Alexy. A distinção por ele 8 Cf. Ronald Dworkin, Los derechos en serio, p. 77 e 78. 9 Cf. Humberto Ávila, Teoria dos princípios, p. 28. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 13 proposta difere das anteriores porque se baseia, mais intensamente, no modo de aplicação e no relacionamento normativo, estremando as duas espécies normativas. Alexy, partindo das considerações de Dworkin, precisou ainda mais o conceito de princípios. Explicando melhor: a estratégia hermenêutica de colisão de normas constitucionais com apoio na teorização de Robert Alexy vê os princípios (principles) como comandos de otimização aplicáveis em vários graus, segundo as possibilidades normativas e fáticas. Ou seja, enquanto os princípios são "comandos de otimização", as regras são “comandos de definição”. Com isso, o autor quer dizer que os princípios são normas jurídicas que podem ser aplicadas em diversos graus, enquanto que as regras são normas que podem ou não podem ser realizadas, isto é, quando a regra é válida então deve ser feito exatamente o que determina seu enunciado normativo, nada mais e nada menos. Se a regra vale então há que se cumprir rigorosamente o que ela prescreve, nem mais nem menos, daí a ideia de “comandos de definição” ou “comandos de certeza”. Tal distinção qualitativa é primordial na compreensão da estratégia hermenêutica de solução de conflitos entre regras jurídicas, ou seja, tal conflito será resolvido da seguinte maneira: a) pela declaração de invalidade de uma das regras e sua consequente retirada do mundo jurídico; ou b) pela introdução de uma cláusula de exceção que afasta o conflito, ainda que para uma determinada situação jurídica. Nesta última hipótese, a introdução de uma cláusula de exceção em uma das regras deve ser feita previamente pelo legislador democrático. Se tal cláusula DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 14 de exceção não tiver sido positivada, a regra não aplicada será declarada inválida. Portanto, somente a declaração expressa de exceção à regra é capaz de mantê-la no mundo jurídico após a sua não aplicação num determinado caso concreto. Em síntese, uma regra "vale ou não vale juridicamente”, não sendo possível a validade de dois juízos de valor reciprocamente contraditórios, exceto se houver uma cláusula de exceção efetivamente positivada em uma delas. Diferente é o caso de colisão de princípios jurídicos (normas com dimensão de peso, aplicáveis em grau variado), cuja solução não pressupõe a perda de validade de um deles, nem muito menos se exige a formulação prévia e abstrata de uma cláusula de exceção, tal qual no caso de conflito das regras jurídicas. É a própria qualificação dos princípios como "determinações de otimização” que lhes imprime a possibilidade de poderem ser cumpridos em diferentes graus, de acordo as possibilidades normativas e fáticas do caso concreto. No dizer de Humberto Ávila: 10 “normativas, porque a aplicação dos princípios depende dos princípios e regras que a eles se contrapõem, fáticas, porque o conteúdo dos princípios como normas de conduta só pode ser determinado quando diante dos fatos”. Para Alexy, o critério utilizado para solucionar um caso que se traduz em colisão de princípios é a aplicação da "lei de colisão", ou seja, por serem "mandamentos de otimização" ou "determinações de otimização", a colisão de princípios se resolve pela "ponderação". A colisão de princípios não demanda que um dos princípios em contradição seja declarado inválido e, portanto, eliminado do sistema jurídico exatamente porque tais princípios são aplicáveis em graus variados. 10 Cf. Humberto Ávila, Teoria dos princípios, p. 29. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 15 Logo, a colisão será resolvida levando-se em consideração os elementos fáticos do caso decidendo (fatos portadores de juridicidade), estabelecendo- se entre os princípios colidentes uma relação de preferência condicionada em função do seu peso relativo advindo da ponderação de valores. É importante que o estimado aluno compreenda neste ponto que não existe relação de prevalência absoluta entre as normas constitucionais, isto é, não há hierarquia entre princípios constitucionais no plano abstrato de significação. Não se pode dizer que um princípio prevalece sobre o outro, sem considerar as circunstâncias fáticas do caso concreto. Como bem aponta David Diniz Dantas:11 A lei de colisão é um dos fundamentos da teoria dos princípios em Alexy, refletindo o caráter dos princípios enquanto determinações de otimização, com duas nuanças: a) não há hierarquia absoluta de precedência e b) os princípios referem-se a situações e ações que não são matematicamente quantificáveis. Para Alexy, enquanto os conflitos de regras se solucionam no plano da validade, os conflitos de princípios só encontram resposta no plano dos valores — na dimensão do peso, o princípio que na situação tenha o maior peso relativo prepondera. (...) Do pensamento de Alexy podemos extrair que uma norma será princípio ou regra não por qualquer propriedade intrínseca aoseu enunciado linguístico, mas, pelo modo particular que se apresenta quando em colisão com outras normas. Se a norma, ao colidir com outra, cede sempre ou triunfa sempre, será por ter ela nota típica de regra. Mas se o conflito com outras normas ocasiona vitórias e derrotas — segundo as situações concretas — é porque estamos diante de um princípio. Em suma, de todo o exposto, conclui-se que a colisão de princípios não pode ser posta em termos de tudo ou nada, de validade ou invalidade no mundo jurídico. Há que se reconhecer aos princípios uma dimensão de peso ou 11 Cf. DANTAS, David Diniz. Interpretação constitucional no pós-positivismo. Teorias e casos práticos. São Paulo: Madras, 2004. p. 64-65. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 16 importância, atribuída à luz dos elementos fáticos do caso concreto (fatos portadores de juridicidade). Nesse sentido, a aplicação dos princípios se dá mediante ponderação de valores ou ponderação de interesses, estabelecendo-se o peso relativo de cada um dos princípios contrapostos no plano concreto de significação. Não existe na colisão de normas constitucionais superioridade abstrata de nenhum dos princípios em tensão. Não se poderia encerrar esta segmentação temática sem deixar de trazer a crítica de Lenio Streck, no seu artigo “Pendurando a meia na árvore”: “Que, por favor, não mais se use a frase ‘na colisão de regras, age-se no tudo ou nada’ e colisão de princípios ‘usa-se a ponderação’ e que não mais se escreva ou diga que ‘princípios são valores’”. Tal crítica vem da visão do autor de que não há distinção entre casos fáceis e casos difíceis. De qualquer modo, há que se reconhecer que, por serem dotados de maior carga axiológica, menor densidade normativa, maior grau de abstração e textura aberta, os princípios geralmente indicam apenas o fim colimado ou a direção a seguir, não determinando a consequência jurídica (determinação normativa) de forma direta. É por isso que os princípios não se prestam para a aplicação disjuntiva do código binário do tipo “tudo ou nada”, da mera aplicação mecânica do direito calcado na premissa maior (lei) premissa menor (fato). Estratégias possíveis: concordância prática ou proporcionalidade? Como não há hierarquia in abstracto, o objetivo da ponderação de valores é exatamente determinar a dimensão de peso relativo dos princípios colidentes após a incidência dos fatos portadores de juridicidade no caso concreto decidendo. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 17 Aqui, é imperioso compreender que a ponderação de valores não pode ficar atrelada tão somente ao princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade. Grande parte da doutrina, infelizmente, somente destaca a ponderação de valores e o princípio da proporcionalidade, focalizando o problema da colisão na escolha de um princípio vencedor (que será aplicado ao caso decidendo) e de um princípio perdedor (que será afastado do caso concreto, mas permanece válido no ordenamento jurídico). Esta visão é tão preponderante que se chega mesmo a pensar que esse é o único resultado possível de um processo de ponderação de valores, qual seja: verificar qual é o direito em colisão que tem maior dimensão de peso e que, portanto, será apresentado como a solução jurídica para aquele caso concreto específico. Mas não é bem assim. Com rigor, existem dois caminhos hermenêuticos muito bem definidos (duas estratégias hermenêuticas possíveis de aplicação) que podem ser apresentados como sendo o resultado de um processo de ponderação de valores e que são: a) aplicação do princípio da concordância prática, como resultado de uma ponderação harmonizante de valores (concessões mútuas ou recíprocas dos princípios em tensão, sem sacrifício de nenhum deles e com aplicação de ambos de modo atenuado); b) aplicação do princípio da proporcionalidade, como resultado de uma ponderação excludente de valores (escolha de um princípio vencedor, com sacrifício dos demais princípios perdedores). No primeiro caso, o objetivo que se busca é a harmonização dos princípios constitucionais em colisão, sendo, pois, resultado de uma ponderação harmonizante de valores, pautada pela aplicação do princípio da concordância prática, na qual o exegeta vai procurar a solução jurídica que seja capaz de conciliar os valores em colisão, ainda que fazendo concessões mútuas, numa tentativa desesperada de otimização de todos os direitos envolvidos. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 18 Não sendo possível tal harmonização, deve, então, o intérprete da Constituição, efetuar a ponderação excludente de valores a partir da aplicação do princípio da proporcionalidade e cujo objetivo será a determinação do peso específico dos princípios constitucionais em colisão, resultando na escolha de um princípio vencedor. Tais estratégias hermenêuticas serão examinadas em seguida. Estratégia hermenêutica da ponderação harmonizante e o princípio da concordância prática Gustavo Zagrebelsky 12 vê na pluralidade de valores a condição espiritual da sociedade contemporânea e por isso mesmo entende que cada princípio, cada valor não pode ser entendido como conceito absoluto, o que evidentemente negaria a existência concomitante de outros. Não se pode resolver o conflito de valores dando-se vitória a todos, muito embora não se ignore sua tendencial inconciliabilidade. Para esse autor de nomeada, é perfeitamente válido buscar-se algo que seja conceitualmente impossível, porém, altamente salutar para o discurso pragmático do Direito, isto é, o reconhecimento da não prevalência de um só princípio, mas a salvaguarda de vários simultaneamente. Ensina, dessarte, o professor da Universidade de Turim que o imperativo teórico da não contradição, apesar de ser válido somente para a scientia juris (expressão aqui interpretada como sendo o normativismo positivista kelseniano) não deve, por outra banda, impedir o avanço da ciência do direito no sentido de realizar positivamente as diversidades e até mesmo as contradições do pluralismo. 12 ZAGREBELSKY, Gustavo. El Derecho Dúctil. Ley, Derechos, Justicia. Madrid: Editorial Trotta, [s.d.], p. 16. No mesmo sentido, as ideias de Constituição compromissória e Constituição axiologicamente fragmentada, cuja característica central é a dualidade axiológica dos valores constitucionalmente garantidos. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 19 Nesse diapasão, o processo de interpretação de uma Constituição axiologicamente dividida, que se mostra aberta à pluralidade de princípios e valores da democracia liberal e da social democracia, torna impossível, ao exegeta constitucional, recorrer a qualquer tipo de "formalismo dos prin- cípios" (expressão do próprio Zagrebelsky). 13 Como bem aponta o eminente jurista italiano, fica impossível compatibilizar a aplicação formal-subsuntiva de normas sob a forma de princípios, já que não existe hierarquia formal entre princípios de mesma dignidade constitucional. Assim, a estratégia hermenêutica da ponderação harmonizante de valores transforma-se em instrumento vigoroso no processo de interpretação constitucional, uma vez que seu resultado final buscará a harmonização de princípios constitucionais de mesma hierarquia, mediante concessões recíprocas, porém, sem sacrifício de nenhum deles. Sob o ponto de vista de uma estratégia hermenêutica de colisão, é imperioso destacar, com muita ênfase, que a busca da concordância prática deve ser o primeiro caminho exegético a orientar o intérprete durante o processo de ponderação de valores, ou seja, o exegeta não pode escolher um direito vencedor, sem que antes tenha tentado alcançar a harmonização dos bens constitucionais em conflito. Trata-se,pois, do primeiro e obrigatório passo de uma estratégia hermenêutica de solução de conflito de normas constitucionais. Antes de tudo, a primeira tentativa do intérprete da Constituição deve ser a busca da ponderação harmonizante de valores, também denominada eficácia otimizável, na medida em que a técnica de ponderação nesse caso visa a otimizar a aplicação de todas as normas em tensão, sem sacrifício de umas em relação a outras. Enfim, aqui os direitos ou bens jurídicos constitucionalmente protegidos, que estavam aparentemente em conflito, 13 ZAGREBELSKY, Gustavo. El Derecho Dúctil. Ley, Derechos, Justicia. Madrid: Editorial Trotta, [s.d.]. p.124. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 20 fazem concessões recíprocas para serem aplicados simultaneamente dentro de um mesmo caso concreto. Na lição do grande mestre português, J.J. Gomes Canotilho: 14 Subjacente a este princípio está a ideia do igual valor dos bens constitucionais (e não uma diferença de hierarquia) que impede, como solução, o sacrifício de uns em relação aos outros, e impõe o estabelecimento de limites e condicionamentos recíprocos de forma a conseguir uma harmonização ou concordância prática entre esses bens. Dessarte, note-se que a ponderação harmonizante de valores é pautada na aplicação do princípio da concordância prática, garantindo-se a harmonização recíproca, isto é, garantindo-se a incidência dos enunciados normativos em tensão sobre o mesmo caso concreto, sem exclusão de nenhuma hipótese. Konrad Hesse 15 ensina que: (...) bens jurídicos protegidos jurídico-constitucionalmente devem, na resolução do problema, ser coordenados um ao outro de tal modo que cada um deles ganhe realidade. Onde nascem colisões não deve, em ‘ponderação de bens’ precipitada ou até ‘ponderação de valor’ abstrata, um ser realizado à custa do outro. Antes, o princípio da unidade da Constituição põe a tarefa de uma otimização: a ambos os bens devem ser traçados limites, para que ambos possam chegar a eficácia ótima. Os traçamentos dos limites devem, por conseguinte, no respectivo caso concreto ser proporcionais; eles não devem ir mais além do que é necessário para produzir a concordância de ambos os bens jurídicos. (grifo no original). 14 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Livraria Almedina, 1992. p. 1098. 15 HESSE, Konrad. Elementos de direito constitucional da República Federal da Alemanha. Tradução de Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p. 66- 67. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 21 Em suma, o que importa, aqui, repetir com muita ênfase, é que a estratégia hermenêutica preconiza a busca da otimização dos direitos constitucionais em tensão como primeiro passo do intérprete na solução da colisão. A estratégia hermenêutica da ponderação excludente e o princípio da proporcionalidade Nem sempre o resultado da ponderação poderá desaguar na harmonização dos princípios em colisão, ao revés, na maioria das vezes, as circunstâncias do mundo dos fatos em conexão com os elementos semânticos da ordem jurídica positiva estarão a exigir a ponderação excludente, isto é, a escolha de um determinado princípio vencedor em detrimento dos demais. Nesse caso, serão os fatos portadores de juridicidade (elementos fáticos do caso concreto) que orientarão o intérprete na escolha excludente. Com efeito, como bem salienta Luís Roberto Barroso, há determinadas situações reais em que não é possível aplicar a ideia de concessões mútuas entre direitos constitucionais e em especial direitos fundamentais como no caso do famoso político flagrado por um jornalista saindo de um motel com vistosa moça desconhecida. Na espécie, temos a colisão entre a “liberdade de imprensa” versus “direito à privacidade”. Na solução do caso em liça, o juiz não pode decidir previamente qual destes dois direitos tem maior hierarquia in abstrato. Serão os fatos portadores de juridicidade que influenciarão a decisão final acerca do direito vencedor. Entretanto, uma coisa é certa, o juiz terá que optar por um dos princípios em colisão, na medida em que não lhe é dado harmonizá-los mediante concessões recíprocas, ou seja, ou bem autoriza a publicação da foto privilegiando a liberdade de imprensa, ou não autoriza homenageando o direito de privacidade. Não há que falar em ponderação harmonizante, mas, sim, em ponderação excludente, após a qual um dos dois direitos fundamentais será sacrificado. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 22 E assim é que constatamos o segundo grande caminho hermenêutico da ponderação de valores no âmbito do neoconstitucionalismo, a ponderação excludente ou eficácia excludentemente ponderável. Dentro deste espectro normativo, o intérprete deve eleger um comando constitucional vencedor diante da colisão de conflitos normativos que se materializa a partir das circunstâncias fáticas do caso concreto. É um segundo túnel hermenêutico (uma segunda estratégia hermenêutica) que se abre ao intérprete quando a entrada da harmonização se fecha e que conduz inexoravelmente para a vitória de um determinado enunciado normativo que por via de consequência afasta a incidência dos outros igualmente válidos, porém, sacrificados na solução do caso concreto específico. Não há como harmonizar, logo, resta escolher os vencedores e os perdedores com espeque nos fatos portadores de juridicidade do mundo real. Em conclusão, de tudo o que foi analisado nesta aula, é importante destacar que a estratégia hermenêutica pós-positivista para a solução da colisão de direitos fundamentais deve levar em consideração a aplicação de dois grandes princípios, quais sejam, a concordância prática e a proporcionalidade. Do ponto de vista do estudo realizado, restou patente que o resultado de uma ponderação de valores é sempre função de uma decisão que deve seguir uma estratégia hermenêutica bem delineada, a saber: 1. identificar os princípios constitucionais em colisão a partir a incidência dos fatos reais portadores de juridicidade; 2. verificar se é possível aplicar o princípio da concordância prática, optando pela harmonização dos princípios colidentes (ponderação harmonizante de valores); DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 23 3. não sendo possível obter a harmonização, aplicar o princípio da proporcionalidade (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) para dimensionar o peso relativo dos princípios em colisão de modo a escolher o direito constitucional vencedor (ponderação excludente de valores). A figura abaixo sintetiza toda essa ideia. Harmonização de princípios em tensão Aula 7: Direitos fundamentais, colisão e ponderação de valores Ponderação Excludente (escolha do princípio vencedor) Princípio da concordância prática Subprincípio da adequação Subprincípio da necessidade Subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito Atividade proposta Maria, jovem estudante de Direito, aproveitando a onda de calor que marcou o último verão carioca, resolveu praticar topless na praia da Barra da Tijuca. Enquanto tomava seu banho de sol, foi fotografada inúmeras vezes por um repórter de um importante jornal de circulação nacional. No dia seguinte ao evento, uma das fotos foi estampada na primeira página do jornal e era acompanhada por uma legenda que informava o fato de "os termômetros terem registrado 40º (quarenta graus centígrados) no último final de semana". Maria resolve então entrar com uma ação judicial pedindo indenização por dano moral. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 24 A partir da situação narrada, responda, justificadamente, se, sob a ótica dopós-positivismo jurídico e da hodierna teoria dos direitos fundamentais, assiste razão à Maria, pois, o direito à imagem e à honra é hierarquicamente superior à liberdade de imprensa? Exercícios de fixação Questão 1 Leia o texto abaixo de Luís Roberto Barroso, verbis: DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 25 “A cláusula constitucional que estabelece a aposentadoria compulsória por idade é uma regra. Quando o servidor completa 70 anos, deve passar à inatividade, sem que a aplicação do preceito comporte maior especulação. O mesmo se passa com a norma constitucional que prevê que a criação de uma autarquia depende de lei específica. O comando é objetivo e não dá margem a elaborações mais sofisticadas acerca de sua incidência. Uma regra somente deixará de incidir sobre a hipótese de fato que contempla se for inválida, se houver outra mais específica ou se não estiver em vigor. Sua aplicação se dá, predominantemente, mediante subsunção”. A partir da leitura do texto acima, analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: I. Uma regra "vale ou não vale juridicamente”, não sendo possível a validade de dois juízos de valor reciprocamente contraditórios, ou seja, a regra é um comando normativo de otimização; II. A cláusula constitucional da aposentadoria acima mencionada pode ser enquadrada como um princípio jurídico, pois sua aplicação se dá mediante subsunção. A. ( ) As duas assertivas são falsas; B. ( ) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; C. ( ) Ambas as assertivas são verdadeiras; D. ( ) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. Questão 2 A posição atual do Supremo Tribunal Federal acerca dos direitos fundamentais é no sentido de que: DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 26 a) ( ) São direitos absolutos, salvo aqueles previstos no art. 5° da Constituição Federal de 1988. b) ( ) São direitos absolutos em qualquer hipótese. c) ( ) São direitos relativos, salvo aqueles previstos no art. 5° da Constituição. d) ( ) São direitos relativos, mesmo aqueles previstos no art. 5° da Constituição. Questão 3 Pode-se afirmar como CORRETO que os critérios da hierarquia (lex superior derogat inferioris), segundo o qual a norma superior prevalece sobre a inferior, o critério cronológico, pelo qual a norma posterior prevalece sobre a anterior (lex posterior derogat priori), e, finalmente, o critério da especialização que, por seu turno, estabelece que a lei específica predomina sobre a lei geral (lex especialis derogat generali) tem emprego adequado: a) ( ) Na aplicação de princípios e regras; b) ( ) No conflito de regras apenas; c) ( ) Na colisão de princípios e regras; d) ( ) Na aplicação de princípios apenas. Questão 4 Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 27 I. O “domínio eficacial otimizável” não pressupõe o sacrifício de nenhum dos enunciados normativos em tensão. No entanto, há que se reconhecer que a aplicação da “eficácia ótima” não autoriza o intérprete da Constituição a ir além do que é necessário para harmonizar os bens jurídicos em colisão. II. A interpretação de uma Constituição compromissória axiologicamente dividida, que se mostra aberta à pluralidade de valores da democracia liberal e da social democracia, torna imprescindível ao exegeta constitucional, recorrer aos processos de ponderação de valores para alcançar plena efetividade dos princípios constitucionais. a) ( ) As duas assertivas são falsas; b) ( ) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; c) ( ) Ambas as assertivas são verdadeiras; d) ( ) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. Questão 5 Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: I. A ponderação de valores feita nas hipóteses de colisão de normas constitucionais é dita harmonizante quando o exegeta busca inicialmente excluir áreas de confrontação para encontrar espaços de concessões mútuas. II. O primeiro grande passo hermenêutico do intérprete dentro de um processo de ponderação de valores deve ser a ponderação excludente que escolhe o direito vencedor com maior dimensão de peso no caso concreto. a) ( ) As duas assertivas são falsas; b) ( ) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; c) ( ) Ambas as assertivas são verdadeiras; d) ( ) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. Referências ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. Tradução de Zilda DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 28 Hutchinson Schild Silva. São Paulo: Landy Livraria Editora e Distribuidora, 2001. ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. Rio de Janeiro: Malheiros, 2004. BARROSO, Luís Roberto. 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Portanto, na solução da colisão de princípios de mesma dignidade constitucional, será empregada a ponderação de valores, como estratégia hermenêutica de solução, cujo desfecho será encontrado no caso concreto a partir da prevalência do princípio com maior peso relativo e sem que o princípio afastado perca sua validade no mundo jurídico (Ronald Dworkin). Exercícios de fixação Questão 1: A Justificativa: As duas assertivas são falsas. Primeiro: muito embora a regra seja aplicada no plano da validade, não é um comando normativo de otimização, mas, sim, um comando de certeza, do tipo all or nothing. Já a segunda assertiva está errada, porque a cláusula constitucional da aposentadoria acima mencionada não pode ser enquadrada como um princípio jurídico, mas, sim, como uma regra, esta, sim, aplicada mediante subsunção. Questão 2: D Justificativa: A alternativa D é a correta, porque uma das principais características dos direitos fundamentais é a sua relatividade ou DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS – AULA 7 30 limitabilidade. Até mesmo o direito à vida é relativizado na hipótesede guerra declarada. Questão 3: B Justificativa: A alternativa B é a correta, porque no conflito de regras jurídicas aplica-se um dos critérios de solução, quais sejam da hierarquia, cronológico ou da lei específica. Na colisão de princípios, aplica-se a ponderação de valores. Questão 4: C Justificativa: As duas assertivas estão corretas. Com efeito, o “domínio eficacial otimizável” é aquele que utiliza o princípio da concordância prática para fazer a harmonização dos enunciados normativos em tensão. Já o caráter compromissório, vale dizer, uma Constituição axiologicamente dividida entre o liberalismo e o socialismo gera o tensionamento de bens jurídico- constitucionais, daí a ideia de ponderação de valores. Questão 5: B Justificativa: A assertiva II é falsa, porque o primeiro grande passo hermenêutico do intérprete dentro de um processo de ponderação de valores deve ser a ponderação harmonizante e o princípio da concordância prática.
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