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FACULDADE DA POLÍCIA MILITAR DE SANTA CATARINA CURSO DE FORMAÇÃO DE SOLDADOS Im ag em : P M SC , 2 02 0. CAPITÃO PM LUIS ANTONIO PITTOL TREVISAN DOUTRINA DE POLÍCIA F I C H A C A T A L O G R Á F I C A Como referenciar esta publicação: POLÍCIA MILITAR DE SANTA CATARINA. Faculdade da Polícia Militar de Santa Catarina. Curso de Formação de Soldados. Doutrina da polícia. Conteudista: Luis Antônio Pittol Trevisan. Florianópolis: PMSC, 2021. [Intranet - Acesso Restrito]. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP P762p POLÍCIA MILITAR DE SANTA CATARINA. Faculdade da Polícia Militar de Santa Catarina. Curso de Formação de Soldados. Doutrina de polícia. / Conteudista: Luis Antônio Pittol Trevisan. Florianópolis: PMSC, 2021. Florianópolis: PMSC, 2021. 89 p. : il. Bibliografia: p. 82 a 89. 1. Polícia Ostensiva. 2. Segurança Pública. 3. Direto administrativo. 4. Polícia Militar. I. Trevisan, Luis Antônio Pittol. II Curso de Formação de Soldados. III. Título. CDD: 363.2 Ficha catalográfica elaborada por: Dilva Páscoa De Marco Fazzioni - CRB: 14/636 e Luciana Mara Silva - CRB: 14/948. Biblioteca do CEPM (Cap. Oscar Romão da Silva). PM SC 2 02 0 @ 2020. TODOS OS DIREITOS DE REPRODUÇÃO SÃO RESERVADOS À POLÍCIA MILITAR DE SAN- TA CATARINA. SOMENTE SERÁ PERMITIDA A REPRODUÇÃO PARCIAL DESTA PUBLICAÇÃO, DESDE QUE CITADA A FONTE. Edição, Distribuição e Informações: Faculdade da Polícia Militar de Santa Catarina - FAPOM Diretoria de Instrução e Ensino. Educação a Distância - DIE/EAD Av. Me. Benvenuta, 265 - Trindade, Florianópolis - SC, 88035-001 www.pm.sc.gov.br FICHA TÉCNICA POLÍCIA MILITAR DE SANTA CATARINA - PMSC COMANDANTE GERAL - Coronel PM Dionei Tonet SUBCOMANDANTE - Coronel PM Marcelo Pontes CHEFE DE ESTADO MAIOR - Coronel PM Luciano Walfredo Pinho FACULDADE DA POLÍCIA MILITAR - FAPOM DIRETORIA DE INSTRUÇÃO E ENSINO - DIE DIRETOR GERAL - Coronel PM Fábio José Martins CHEFE DIVISÃO DE ENSINO - Tenente Coronel PM Alfredo Schuch CHEFE DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Capitão PM Luiz Carlos Colla Filho EQUIPE DE ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS PROFESSOR CONTEUDISTA - Capitão PM Luis Antonio Pittol Trevisan COORDENADORA DE MATERIAIS DIDÁTICOS - 2º Sargento PM Lucélia Eler DESIGNER EDUCACIONAL - Ana Paula Knaul PROJETO GRÁFICO - Mayara Atherino Macedo DIAGRAMAÇÃO - Fábio Luiz Raulino https://www.pm.sc.gov.br/ SUMÁRIOSUMÁRIO Capítulo 1 DOUTRINA DE POLÍCIA: CON- CEITOS E NOÇÕES GERAIS DOUTRINA DE POLÍCIA: CON- CEITOS E NOÇÕES GERAIS 9 Atividade Policial-militar 10 Atividade Técnica ou Específica 11 Defesa Nacional 12 Defesa Pública 13 Defesa Social 14 Doutrina 15 Estratégia 16 Tática 17 Missão 18 Operação PM 19 Ordem Pública 20 Tranquilidade Pública 23 Salubridade Pública 24 Segurança Pública 25 Dignidade da Pessoa Humana 27 Poder de Polícia 28 Poder Nacional 32 Polícia Ostensiva 33 Preservação da Ordem Pública 34 Capítulo 2 O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA 36 Poder de Polícia 37 Polícia Administrativa 40 Polícia Judiciária 42 SUMÁRIOSUMÁRIO Características das Polícias Admin- istrativas e Judiciárias 43 O Ciclo de Polícia e o Ciclo de Per- secução Criminal 45 Capítulo 3 A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR 49 Investidura e Caráter Militar das Forças Estaduais 50 As PM e BM como Forças Auxilia- res e Reserva do Exército 54 Capítulo 4 DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES 57 Segurança Pública 58 Segurança Interna (Segurança In- tegrada) 62 Defesa Territorial 65 Defesa Civil 66 Emprego Residual ou Rema- nescente 67 Capítulo 5 O SISTEMA BRASILEIRO DE SE- GURANÇA PÚBLICA Polícias da União 70 Polícias dos Estados 73 Âmbito Municipal 76 O Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) 77 CONSIDERAÇÕES FINAIS 81 APRESENTAÇÃO Luis Antonio Pittol Trevisan Capitão PMSC A presente disciplina tem como objetivo apresentar as bases doutrinárias de emprego dos militares estaduais com respeito estrito à Constituição Federal de 1988, que contém normas jurídicas de aplicabilidade direta em relação às atividades dos órgãos de segurança pública, e às legislações infraconstitu- cionais, reflexos dos princípios e valores de um Estado Democrático de Direito. Para os fins desta formação básica na PMSC, têm-se como enfoque especial as polícias militares como instituições detentoras de características especiais, de natureza híbrida, haja vista que se tratam de organizações com investi- dura militar para o exercício da função primordial na segurança pública. Além disso, por determinação legal e das múltiplas facetas da segurança nacio- nal, são compelidas também a partici- par na segurança integrada, na defesa civil, defesa territorial e remanescente. MINICURRÍCULO DO PROFESSOR Luis Antonio Pittol Trevisan Capitão PMSC Função: Adjunto da PM-3, no Estado- Maior Geral da PMSC Graduação Direito Administração Pública Especialização Direito Constitucional Direito Penal Processual Penal Mestrado e doutorado Administração pela UDESC, com período de pesquisa sanduíche na University of North Florida (UNF - Flórida/ EUA) e Jacksonville Sheriff´s Office (JSO), na linha de pesquisa de Gestão Pública e Coprodução de serviços públicos. Doutorando em Administração - UDESC. Cursos de Formação Curso de Formação de Oficiais (CFO) Atuação Atuou como Advogado e Analista do Seguro Social no Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3133992605929054 http://lattes.cnpq.br/3133992605929054 Im ag em : F re e- Ph ot os / P ix ab ay . DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS C A P Í T U L O 1 9Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Im ag em : P M SC , 2 02 0. DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS Considerando os termos estabelecidos na apresentação da disciplina, inicia-se, com base nos autores referencia- dos e listados ao fim desta apostila, pautando-se na cola- ção de conceitos fundamentais para o entendimento da missão das forças de segurança pública estaduais. 10Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Atividade Policial-militar Imagem: PMSC, 2020. São todas as ações dos órgãos de direção, de apoio e de execu- ção operacional que objetivam, direta ou indiretamente, o exer- cício da competência que lhe é legalmente atribuída (VALLA, 2012; PMMG, 1994). Nesse sentido, as atividades policiais-militares podem ser classificadas como: I. atividade-fim: é o conjunto de esforços de exe- cução que pode ser dividido em atividades de (a) linha e (b) auxiliar. A atividade de linha está relacionada diretamente com o público externo (ex: ações e operações policiais-militares), enquanto a atividade auxiliar pauta-se no apoio imediato ao policial militar na atividade de linha. II. atividade-meio: É o conjunto de esforços de planejamento e de apoio que permitem ou facilitam a atividade-fim da Corporação Vinicius Realce 11Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Atividade Técnica ou Específica São as atividades opera- cionais pertencentes a unidades ou frações que executam a atividade- -fim específica, por tipo ou processo. Normal- mente, são responsáveis por intervenções qua- lificadas (VALLA, 2012; PMMG, 1994). São exemplos: policiamento rodoviário, ambiental, montado etc. Policiamento montado é um exemplo de atividade técnica da PM. Imagem: PMSC, 2020. 12Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Imagem: PMSC, 2020. É o conjunto de medidas e ações do Esta- do, com ênfase na expressão militar, para a defesa do território, da soberania e dos interesses nacionais contra ameaças pre- ponderantemente externas, potenciais ou manifestas. Cabe ao Ministério da Defesa coordenar as ações necessárias à defesa nacional (BRASIL, 2005). Defesa Nacional Vinicius Realce 13Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Defesa Pública É o conjunto de medidas e ações da Administração Pública para garantir o cumprimento das leis,frente aos atos que perturbem a ordem pública. Normalmente tem caráter policial, por meio do Poder Executivo e suas ações preventivas e repressivas, mas também englobam participações do Ministério Público, da Justiça Criminal e do Siste- ma Prisional (VALLA, 2012). Título / legenda da foto Imagem: Autor / Banco de Imagens. Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce 14Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Defesa Social Mais amplo que o conceito de defesa pública, consiste no conjunto de ações desenvolvidas por diversos órgãos, entidades e agentes com a finalidade de buscar soluções de conflitos, pre- ponderantemente preventivas, para proteger os cidadãos contra os riscos decorrentes da própria convivência em sociedade e de seus agrupamentos sociais (PMMG, 1994). Ela é mais eficaz quando exercida pelo chamamento e inclusão de outros setores e poderes constituídos, insti- tuições, órgãos e entidades públicas e privadas que tenham por fim prote- ger, de maneira ampla, os cidadãos e a sociedade, por meio de mecanismos que assegurem a harmonia social (VALLA, 2012). Podemos citar, além da Polícia Militar e que possuem relação direta com esta, as seguintes instituições públicas: Polícia Civil, Ministério Público, Poder Judi- ciário, o Sistema Prisional, Guarda Mu- nicipal etc. Integram, também, órgãos relacionados ao trânsito, saúde pública, educação, assistência social, dentre inúmeras outras instituições, públicas e privadas, que prestam serviços públicos. Proerd. Imagem: PMSC, 2020. Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce 15Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Imagem: Mikhail Pavstyuk / Unsplash. Trata-se de uma reunião de princípios, conceitos e normas procedimentais a se- rem observados pelo Estado, sempre for- muladas em níveis político e estratégico, com a utilização de informações também administrativas, logísticas e operacionais (BRASIL, 2007), mais especificamente: I. os princípios são os níveis mais eleva- dos e decorrem de intuições, idealiza- ções ou percepções influenciadas por valores e visões próprias do mundo; II. os conceitos buscam, por meio de fun- damentação racional, prover um senti- do lógico à formulação doutrinária; III. as normas consubstanciam os aspec- tos práticos da doutrina e valem-se de tecnologia e técnicas; IV. os procedimentos e as diversas práticas doutrinárias decorrem das normas. Em suma, é o conjunto de valores, prin- cípios gerais, conceitos e pressupostos básicos (leis, normas, diretrizes, técni- cas e processos) que têm por finalidade estabelecer as bases para a organiza- ção, o preparo e o emprego uniforme da Corporação (VALLA, 2012). Doutrina Vinicius Realce 16Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Estratégia A estratégia, na dimen- são Militar, é a arte e a ciência de prever o em- prego, preparar, orientar e aplicar o poder militar durante os conflitos, considerados os óbices existentes ou potenciais, visando à consecução ou manutenção dos obje- tivos fixados pelo nível político (BRASIL, 2007). Assim, ela engloba a determinação dos objetivos de longo prazo, das políticas e ações adequadas de segurança pública para a preservação da ordem pública. Em um sentido mais restrito, relacio- na-se ao emprego hábil das Polícias Militares no amplo rol e exercício de suas competências (VALLA, 2012). Imagem: Kaboompics .com / Pexels. Vinicius Realce 17Doutrina de Polícia • Capítulo 1 É a arte de planejar, dispor e empregar adequadamente, no tempo e no espaço, comandos intermediários, unida- des e subunidades, ou outras frações constituídas, segun- do missões atribuídas às Corporações (VALLA, 2012). Tática Imagem: jarmoluk / Pixabay. Vinicius Realce 18Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Missão É a tarefa ou dever a ser executado, ou cumprido, por um indivíduo, orga- nização, força militar ou força policial. Relacio- na-se à noção de dever, obrigação ou compro- misso (VALLA, 2012). Nesse sentido, pode- mos dizer que a missão (constitucional) da Polícia Militar é prover segurança pública por meio da polícia osten- siva e preservação da ordem pública, podendo participar da segurança integrada e da defesa territorial, situações em que se subordinam à Força Terrestre. Im ag em : S ki tt er ph ot o / P ex el s. Vinicius Realce 19Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Operação PM É o conjunto de ações, executadas por uma tropa ou suas frações constituídas, que exige planejamento específico, com claro grau de coordenação e controle (VALLA, 2012). Os Comandantes-Gerais da PM são os responsáveis, perante os Governadores das respectivas Unidades Federativas, pela administração e emprego da Corporação. Essa responsabilidade funcional se verifica por meio da opera- cionalidade, ao adestramento1 e apres- tamento2 das respectivas Corporações (BRASIL, 1983), conforme segue. 1 Atividade destinada a exercitar o policial-militar, individualmente e em equipe, desenvolvendo-lhe a habilidade para o desempenho das tarefas para as quais já recebeu a adequada instrução (art. 2º, “2”, BRASIL, 1983). 2 Conjunto de medidas, incluindo instrução, adestramento e preparo logístico, para tornar uma organização policial- -militar pronta para emprego imediato (art. 2º, “4”, BRASIL, 1983). I. Operacionalidade Capacidade de uma organização policial-militar para cumprir as missões a que se destina (BRA- SIL, 1983). II. Orientação Operacional Conjunto de diretrizes baixadas pela autoridade competente visando assegurar a coorde- nação do planejamento da preservação da ordem pública a cargo dos órgãos integrantes do Sistema de Segurança Pública (BRASIL, 1983). III. Forças tarefas São executadas mediante ações combinadas com outras forças policiais ou militares para o cum- primento de missões específicas, bem como mediante a partici- pação de outras instituições e órgãos de apoio (VALLA, 2012). Vinicius Realce 20Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Cumpre registrar, primeiramente, que existem inúmeros conceitos, divergên- cias doutrinárias e jurisprudenciais quan- to ao real significado e abrangência do que seria a ordem pública. Cumpre regis- trar, que não há unanimidade e, assim, a definição segue certa conveniência deste Coordenador, uma vez que a própria lei também dá uma ampla margem de liberdade para interpretação. Com isso, para os fins desta disciplina, aplica-se o conceito voltado exclusivamente para o campo da segurança pública. Extrai-se do Decreto Federal n. 88.777/83 o conceito de Perturbação da Ordem, em seu art. 2º, item 25 que [...] abrange todos os tipos de ação, inclu- sive as decorrentes de calamidade pública que, por sua natureza, origem, amplitude e potencial possam vir a comprometer, na esfera estadual, o exercício dos poderes constituídos, o cumprimento das leis e a manutenção da ordem pública, ameaçan- do a população e propriedades públicas e privadas” (BRASIL, 1983). Assim, como objeto da segurança pú- blica, trata-se da convivência pacífica e harmoniosa dos cidadãos, fundada nos princípios éticos vigentes na sociedade. O conceito se liga umbilicalmente ao acautelamento do meio social e na sua acepção sistêmica, “[...] a ordem pública é pré-requisito de funcionamento do sistema de convivência pública [...], uma vez que viver em sociedade importa necessariamente conviver publicamen- te” (MOREIRA NETO, 1988, p. 142; VALLA, 2012). Ordem Pública Im ag em : F re ep ik . Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce 21Doutrina de Polícia • Capítulo 1 DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS ● ORDEM PÚBLICA Desse modo, podemos categorizar os entendimentos acerca do conceito, como segue. I. Legal, formal ou normativo Conjunto de regras formais que emanam do ordenamento jurídico da Nação, tendo por escopo regular as relações sociais de todos os níveis do interesse público, estabelecendo um clima de convivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo Poderde Po- lícia, e constituindo uma situação ou condição que conduza ao bem comum (BRASIL, 1983). [...] a ordem pública é um conjunto de valores, de princípios e de normas que se pretende devam ser observados numa sociedade, impondo uma disposição ideal dos elementos que nela interagem, de modo a permitir-lhe um funciona- mento regular e estável, assecu- ratório da liberdade de cada um” (MOREIRA NETO, 1988, p. 143, grifos do autor). Nesse sentido, trata-se da situação de normalidade que o Estado tem o dever de assegurar às instituições e todos os membros de sua sociedade, con- soante as normas jurídicas legalmente estabelecidas. II. Material/descritivo [...] é uma situação de fato, ocor- rente numa sociedade, resultante da disposição harmônica dos elementos que nela interagem, de modo a permitir-lhe um funciona- mento regular e estável, assecura- tória da liberdade de cada um. [...] como situação, modelo real, resultado da observação, é a mais antiga. [...] É o sentido material, também, o que melhor se presta para dessumir um ‘conceito opera- tivo’ de ordem pública, tal como o fez a Polícia Militar do Rio de Ja- neiro, em documento de doutrina: ‘ordem pública é o estado de paz social que experimenta a popula- ção’ [...]” (MOREIRA NETO, 1988, p. 143, grifos do autor). Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce ORDEM PÚBLICA SEGURANÇA PÚBLICA (delitos) TRANQUILIDADE PÚBLICA (sossego/sensação) SALUBRIDADE PÚBLICA (ambiência: saúde e higiene) DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 22Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Apesar das diferenças, há comple- mentaridade entre as duas acepções, sendo uma do “dever ser” e a outra o “ser ou o que se pôde realizar”. Logo, a ordem pública existe quando estão garantidos os direitos individuais, a estabilidade das instituições, o regular funcionamento dos serviços públicos e a moralidade pública (CRETELLA JUNIOR, 1977; LAZZARINI,1999). Em suma, podemos afirmar que a ordem pública é uma noção de valor composta por diferentes preceitos, a saber: se- gurança, tranquilidade e salubridade públicas, bem como a dignidade da pes- soa humana, conforme mapa conceitual representado abaixo (TEZA, 2011): DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS ● ORDEM PÚBLICA Mapa conceitual sobre Ordem Pública. Imagem: Produção do autor, 2020. Vinicius Realce Vinicius Realce 23Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Imagem: Min An / Pexels Tranquilidade Pública É o estágio de serenidade (maturida- de) em que se encontra uma socieda- de, tendo no clima de convivência har- moniosa e pacífica o seu fundamento mais importante. Por isso, a tranquili- dade pública concorre para produzir o efeito agradável da situação de bem-estar social (LAZZARINI,1999; TEZA, 2011). Exemplo: sensação de segurança comunitária e ausência do medo generalizado de atos criminosos e de desordens. Vinicius Realce 24Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Refere-se ao que é saudável, conforme as condições favoráveis de qualidade de vida, prin- cipalmente relacionada à área de saúde e meio ambiente, inclusive nas excepcionais situações decorrentes de calami- dades públicas. Desig- na, também, o estado de higiene de um lugar, mostrando-se propícia às condições de vida de seus habitantes (LAZ- ZARINI,1999; TEZA, 2011). Salubridade Pública Imagem: Polina Tankilevitch / Pexels. Vinicius Realce 25Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Em termos de abrangência, o conceito de Segurança pode se desdobrar nos níveis (a) individual, (b) comunitário, (c) nacional e (d) coletivo, a depender da complexidade das responsabilidades em relação à segurança (BRASIL, 2007). Os níveis individual e comunitário encontram-se no âmbito da segurança pública. Quanto à segurança individual (a), o ser humano deve ter garantidos os direitos de liberdade, propriedade, lo- comoção, proteção contra o crime, além do encaminhamento de seus problemas básicos de saúde, educação, justiça, ali- mentação, entre outros. Já a segurança comunitária (b), traduz uma extensão da individual, tratando da garantia dos elementos que asseguram estabilidade às relações políticas, econômicas e so- ciais, preservando propriedade, capital e trabalho, para sua plena utilização em prol do interesse social (BRASIL, 2007). A percepção da existência de ameaças ao atendimento dos interesses nacio- nais vitais pertence ao domínio da (c) segurança nacional. Ameaças à segu- rança individual ou comunitária, quando generalizadas e graves, podem pôr em risco a própria segurança nacional, na medida em que se contrapõe aos inte- resses vitais do país (BRASIL, 2007). Já o conceito de segurança coletiva (d), decorre do fortalecimento da nação por meio da associação com outros centros de poder, a partir da convergência de interesses comuns. Exemplos são vistos com as alianças, os tratados e a adesão a organismos multilaterais (ex.: Organiza- ção das Nações Unidas e a Organização dos Estados Americanos). Segurança Pública Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce Vinicius Realce 26Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Verifica-se, assim, que a se- gurança é uma condição que permite ao país a preservação da soberania e da integridade territorial, a realização dos seus interesses nacionais, livre de pressões e ameaças de qualquer natureza, e a garantia aos cida- dãos do exercício dos direitos e deveres constitucionais (BRA- SIL, 2007). DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS ● SEGURANÇA PÚBLICA Com relação à segurança pública, para fins deste material, trata-se do conjunto de processos po- líticos e jurídicos destinados a garantir a ordem pública na convivência de homens em sociedade. Didaticamente, este conceito pode ser assim ex- plicitado (TEZA, 2011; MOREIRA NETO, 1988): I. Valor garantido (o quê?) Convivência pacífica II. Autor da garantia (quem?) Estado (monopólio do uso da força) III. Risco (contra o quê?) Perturbação potencial ou efetiva da ordem pública IV. Tipo/modalidade de poder garantidor (com o quê?) Exercício pleno do poder de polícia (ordem, consentimento, fiscalização e sanção de polícia 27Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Trata-se de princípio fundamental do Estado Democrático de Direito, inscul- pido na CF/88, de crescente importân- cia na interpretação dos atos do Estado. O seu conceito, de forma simplificada para esses fins, está ligado a um conjun- to de princípios e valores que têm a fun- ção de garantir que cada cidadão tenha seus direitos fundamentais respeitados (LENZA, 2018). Dignidade da Pessoa Humana Im ag em : M at he us V ia na / Pe xe ls. Immanuel Kant (1724-1804 d.C.) defen- dia que as pessoas deveriam ser tratadas como um fim em si mesmas, e não com um meio (objetos), formulando, assim, o seu conceito acerca deste princípio: "No reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha aci- ma de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade" (KANT, Immanuel. Funda- mentação da metafísica dos costumes e outros escritos, tradução de Leopol- do Holzbach, São Paulo: Martin Claret, 2004, p. 64). 28Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Poder de polícia é o que legitima a ação da polícia e a sua própria razão de ser. Trata-se do poder de condicionar e restringir a propriedade, as atividades e a liberdade das pessoas, ajustando-as ao interesse da coletividade (MEIRELLES, 2002; LAZZARINI, 1987). Poder de Polícia Na sequência, apresentamos os três atributos do poder de polícia, segundo Carvalho (2016). a. Discricionariedade: liberdade esta- belecida em lei perante caso concreto, caracterizado pela faculdade à adminis- tração de determinar a oportunidade e conveniência no exercício do poder de polícia, bem comoda aplicação de san- ções e emprego dos meios. Exemplo: graduação das sanções aplicáveis. b. Autoexecutoriedade: o ato será exe- cutado diretamente pela Administra- ção, sem necessidade de ratificação e/ ou interferência do Poder Judiciário para tornar-se apto. É evidenciado apenas nos casos em que há lei per- missiva e situações urgentes/emer- genciais (contraditório diferido). Este conceito possui dois aspectos: a. amplo: leis, que trazem limitações administrativas (ex.: Código de Trânsito Brasileiro); b. restrito: atos administrativos, por meio da polícia administrativa (ati- vidade da administração tendente a fiscalizar o cumprimento das limita- ções administrativas) (DI PIETRO, 2002; CARVALHO, 2016). 29Doutrina de Polícia • Capítulo 1 c. Coercibilidade: também chamado imperatividade ou “poder extroverso”, pois se impõe independente da von- tade do administrado. Ao particular, a decisão administrativa sempre será cogente, obrigatória, admitindo o emprego de força para o cumprimen- to. Todavia, não legaliza a violência desproporcional. Exemplo: uso proporcional de força, notificação para limpeza de terreno de particular, sinais de trânsito e apli- cação de multa em descumprimento. DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS ● PODER DE POLÍCIA T E O R I A N A P R Á T I C A Segundo a doutrina, a autoexecutorieda- de não está presente em todas as medi- das de polícia. Para ser aplicada, é neces- sário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente. Exemplo: embargo de obra, dissolução de um evento, apreensão de mercado- rias, interdição de uma fábrica ou esta- belecimento comercial, apreensão de alimentos inviáveis ao consumo. 30Doutrina de Polícia • Capítulo 1 DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS ● PODER DE POLÍCIA FASES DO PODER DE POLÍCIA a. Ordem de polícia: decorre do atributo da imperatividade dos atos administrativos, impondo restrições aos particulares, dentro dos limites da lei, independentemente de sua concordância. A ordem de polícia nasce necessariamente da lei, pois se trata de uma reserva legal (art. 5º, II, CF/88)3. Enquanto não declarada a ilegalidade do ato praticado, o particular deve cumprir as regras nele expostas. Exemplo: Casos em que se veda a aquisição de armas de fogo, ou quando se proíbe o estacionamento de veículos em determinada rua. b. Consentimento de polícia: está presente nas hipóteses em que a lei autoriza o exercício de determinada atividade condicionada à aceitabilidade estatal. Exemplo: Alvará e suas espécies, sendo elas: (a) autorização, como o deferimento para interrupção de trânsito, em determinadas ruas, para a realização de um evento esportivo, e (b) licenças, como a concessão de habilitação para se conduzir veículos automotores, definição de horário para funcionamento de determinado estabelecimento, entre outros. c. Fiscalização de polícia: decorre da possibilidade conferida ao ente estatal de controlar as atividades submetidas ao poder de polícia, com o intuito de verificar o seu cumpri- mento ou regularidade, a qual pode ser ex officio ou provocada. Exemplo: Policiamento ostensivo, inspeções e análise de documentos, vistoria de veí- culos, fiscalização de pesos e medidas, das condições de higiene dos estabelecimentos comerciais, da vistoria de veículos automotores como condição de renovação de docu- mentação, a fiscalização da atividade de caça, entre outros d. Sanção de polícia: nas situações em que se verifica o descumprimento das normas im- postas pelo poder público, justificando a culminação de sanções. Em outras palavras, é a atuação repressiva diante de uma irregularidade. Exemplo: Lavratura de auto de infração, constrangimento pessoal, direto e imediato, na justa medida para restabelecer a ordem pública, embargos de obras e imposição de multas, dissolução de passeata tumultuosa, apreender revistas pornográficas, a apreen- são de mercadorias, o fechamento de estabelecimentos comerciais que descumpram normas de segurança, o guinchamento de veículo que obstrua via pública, entre outros. 3 II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; 31Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Cabe registrar que somente as fases (a) “ordem de polícia” e (c) “fiscalização de polícia”, estarão presentes em todo e qualquer ciclo de polícia. Isso porque nem sempre o (b) “consen- timento” do poder público é necessário para o uso de bens ou a prática de certas atividades privadas e, na mes- ma linha, a aplicação da (d) “sanção” somente ocorrerá, se for constatada alguma infração administrativa (ALE- XANDRINO; PAULO, 2015). A classificação e identificação dessas diferentes fases do ciclo de polícia são importantes para a determinação das atividades do poder de polícia que possam ser objeto de delegação. Extrai-se da jurisprudência do STJ que a (a) “ordem de polícia” e a (d) “sanção de polícia” são indelegáveis, pois possuem poder coercitivo. Já o (b) “consentimento de polícia” e a(c) “fis- calização de polícia” são delegáveis a entidades com personalidade jurídica de direito privado integrantes da ad- ministração pública, pois não contêm poder coercitivo (ALEXANDRINO; PAULO, 2015). Mais adiante retomaremos este conceito na definição de polícia, sendo que os atributos podem ou não estar presentes, conforme a mo- delagem ofertada pela lei à atuação administrativa. DOUTRINA DE POLÍCIA: CONCEITOS E NOÇÕES GERAIS ● PODER DE POLÍCIA IMPORTANTE Em síntese, as únicas fases que sempre existirão quando estivermos diante de um determinado ciclo de polícia são as fases de "ordem de polícia" e de "fisca- lização de polícia". 32Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Imagem: designelo / Pixabay É a capacidade que tem a Nação para alcançar e manter os objetivos funda- mentais e os princípios dispostos na Constituição Federal (BRASIL, 1988), mediante o envolvimento dos setores militar e civil, em todas as expressões (a política, a econômica, a psicosso- cial, a militar e a científico-tecnoló- gica) e campos do poder político ou administrativo, em conformidade com a vontade nacional (BRASIL, 2007; VALLA, 2012). Poder Nacional 33Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Polícia Ostensiva A polícia ostensiva tem como missão primária desenvolver atividades de prevenção ao co- metimento de ilícitos penais ou de infrações administrativas sub- metidos às responsa- bilidades das Polícias Militares (VALLA, 2012; BRASIL, 1988). 34Doutrina de Polícia • Capítulo 1 Preservação da Ordem Pública Tem como missão primária tanto a pre- venção quanto a restauração da ordem pública, abrangendo, assim, parte da po- lícia judiciária denominada de repressão imediata. Cumpre observar que a expres- são constitucional anterior à CF/1988 era “manutenção”, ao invés de “preser- vação”, tendo menor amplitude quando comparado com o atual texto, pois o seu objetivo é defendê-la e resguardá-la, conservando-a íntegra (VALLA, 2012; TEZA, 2011; HIPÓLITO e TASCA, 2012). PMSC atua na preser- vação da ordem pública. Imagem: PMSC, 2020. Im ag em : A ut or / B an co d e Im ag en s. O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA C A P Í T U L O 2 36Doutrina de Polícia • Capítulo 2 Im ag em : F re ep ik . O direito administrativo é um ramo do direito que abarca um conjunto de normas jurídicas (regras e princípios) de direito público que visam disciplinar as atividades administrativas necessárias à realização dos direitos fundamentais e interesses da coletividade (CARVALHO, 2016; DI PIETRO, 2002). Assim, é imprescindível que estudemos este ramo do direito nos aspectos que regulam e organizam as atividades de- senvolvidas pelas instituições policiais. O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA 37Doutrina de Polícia • Capítulo 2 O conceito legal apresentado acima, tem especial foco no sentido estrito do poder de polícia, isto é, aquele que se insere no âmbito dafunção administra- tiva. Porém, inúmeros doutrinadores apresentam um conceito amplo, abar- cando os condicionamentos e restrições de direitos individuais realizados no meio administrativo e legislativo (CAR- VALHO, 2016; MEIRELLES, 2002). Assim, o vínculo entre a Administração e o particular é geral, ou seja, é o mesmo que ocorre com toda a coletividade. Por exemplo, é o poder de polícia que fundamenta a aplicação de uma multa Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de conces- são ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com obser- vância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder (BRASIL, 1966). O poder de polícia se insere na esfera privada, permitindo que se apliquem restrições ou condicionamentos nas atividades privadas, eis o porquê de sua elevada importância para a pre- servação do interesse público (CAR- VALHO, 2016). A definição legal do poder de polícia se encontra no Códi- go Tributário Nacional, nos seguintes termos: Poder de Polícia 38Doutrina de Polícia • Capítulo 2 O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA ● PODER DE POLÍCIA de trânsito ao particular que comete infrações descritas no Código de Trânsi- to Brasileiro. Nesse sentido, de acordo com Carvalho (2016) e Di Pietro (1990), a finalidade do poder de polícia é a proteção do inte- resse público e a sua definição abrange três elementos, conforme segue. I. Subjetivo: o Estado como detentor único do poder de polícia; II. Teleológico: a noção de finalidade de preservação da ordem, da segurança individual e coletiva como condição indispensável para que os grupa- mentos humanos progridam. III. Objetivo: o conjunto de restrições jurídicas e limitações legais à liber- dade necessárias para que uma ação abusiva de um não cause embaraços à ação de outro ou à coletividade. Podemos, ainda, de acordo com Carvalho (2016) fazer a distinção entre Poder de Polícia nos sentidos elencados a seguir. I. Amplo ou Geral: toda e qualquer atuação restritiva do Estado, abran- gendo tanto os atos do Poder Exe- cutivo, como também do Legislativo onde se condiciona a liberdade e propriedade em prol dos cidadãos. II. Estrito ou Especial: atuação concreta da Administração Pública que condi- ciona direitos (também denominada de Polícia Administrativa) e que se ex- pressa na sua qualidade de executora. 39Doutrina de Polícia • Capítulo 2 Em relação a isso, diferencia-se a polícia administrativa geral da polícia adminis- trativa especial. A primeira cuida gene- ricamente da segurança, salubridade e moralidade públicas. A segunda, por sua vez, atua diretamente com a atividade humana em setores específicos, a exem- plo do meio ambiente, da segurança pública e do trânsito, entre outros seto- res em que existe legislação específica e a atividade apresenta risco às pessoas, o que inclui, além da própria Polícia Mi- litar, os vários órgãos de fiscalização aos quais a lei atribua esse mister nas áreas da saúde, educação, trabalho, previ- dência e assistência social (MEIRELLES, 2002; DI PIETRO, 2002). Como, por exemplo, as fiscalizações de profissões, instalação e funcionamento de lojas comerciais, e até mesmo para as cons- truções residenciais ou comerciais. A gradual evolução e o reconhecimento da diferença entre os poderes de polícia pertencentes às Polícias Militares e aquele pertencente às demais organi- zações possui natureza constitucional, afinal as Polícias Militares estão em capítulo e título próprio da CF/88, sepa- radas dos demais órgãos constantes da administração pública do art. 37 (BRA- SIL, 1988). O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA ● PODER DE POLÍCIA 40Doutrina de Polícia • Capítulo 2 Polícia Administrativa A polícia administrativa manifesta-se no conjun- to de órgãos e serviços públicos incumbidos de fiscalizar, controlar e impor limites às liberda- des individuais que se revelem contrárias, in- convenientes ou nocivas ao interesse público ou social. De acordo com Carvalho (2016), a Polí- cia Administrativa pode ser classificada, como segue. a. Preventiva: quando trata de disposições genéricas e abstratas como, por exemplo, as portarias e regulamentos que se materializam nos atos que disciplinam horário para funcionamento de deter- minado estabelecimento, proíbem desmatar área de proteção ambiental, soltar balões, entre outros. b. Repressiva: ao praticar atos específicos, obser- vando sempre a obediência à lei e aos regula- mentos como, por exemplo, dissolver passeata tumultuosa, apreender revistas pornográficas, a apreensão de mercadorias, o fechamento de estabelecimentos comerciais que descumpram normas de segurança, o guinchamento de veículo que obstrua via pública, entre outros. c. Fiscalizadora: quando previne eventuais lesões aos administrados, como, por exemplo, vistoria de veículos, fiscalização de pesos e medidas, das condições de higiene dos estabelecimentos comerciais, da vistoria de veículos automotores como condição de renovação de documentação, a fiscalização da atividade de caça, entre outros. 41Doutrina de Polícia • Capítulo 2 Cumpre registrar, que a atua- ção da polícia administrativa é preponderantemente pre- ventiva e, excepcionalmente, repressiva, ou seja, deve evitar a perturbação da ordem pú- blica nas respectivas áreas em que atua a administração geral (VALLA, 2012). Nesse sentido, aplicando-se essa lógica à Polícia Militar, órgão incumbido da polícia ad- ministrativa de ordem pública, o ciclo da violência deve ser ata- cado de forma antecipada e não apenas reprimido com ações dirigidas àquelas pessoas que já delinquiram (VALLA, 2012; HIPÓLITO, TASCA, 2012). 4 Disponíveis em: <http://www.stj.jus.br/> e <http://www.stf.jus.br/>. 5 O abuso de poder desdobra-se em duas categorias: a) excesso de poder: quando o agente público atua fora dos li- mites de sua esfera de competência; b) desvio de poder (desvio de finalidade): quando o agente atua dentro de sua esfera de competência, porém de forma contrária à finalidade explícita ou implícita na lei que determinou ou autori- zou o ato (CARVALHO, 2016). O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA ● POLÍCIA ADMINISTRATIVA IMPORTANTE Cabe frisar que o poder de polícia pode ser exer- cido em todas as esferas de governo (União, Estados, Distrito Federal e municípios). Assim, a competência para disciplinar cada matéria vem sendo prevista na Constituição Federal, com base no princípio da predominância do interesse. Dessa forma, os assuntos de interesse nacional estão sujeitos à regulamentação e ao policiamen- to da União; as matérias de interesse regional sujeitam-se às normas e à polícia estadual; por fim, os assuntos de interesse local se subordinam aos regulamentos e policiamento administrativo municipal (ex.: Súmulas 19/STJ e 645/STF)4. Além disso, o princípio da supremacia do interes- se público justifica o exercício dos poderes admi- nistrativos na estrita medida em que sejam ne- cessários ao atingimento dos fins públicos. Logo, a aplicação de restrições deve ocorrer sempre às competências e limites previstos no ordenamen- to jurídico, sendo que o exercício ilegítimo carac- teriza, de forma genérica, como abuso de poder5. http://www.stj.jus.br/ http://www.stf.jus.br/ 42Doutrina de Polícia • Capítulo 2 Polícia Civil do Estado de Santa Catarina. Imagem: Polícia Civil SC. Polícia JudiciáriaA polícia judiciária visa, principalmente, reprimir a prática de ilícitos criminais e apresentar os infratores à justiça para a necessária punição, à exceção das infrações militares (art. 144, §§1º e 4º da CF/88). A sua atuação, de caráter preparatório, é exercida pelas polícias civis estaduais, pela Polícia Federal, e por outros órgãos do poder público vin- culados à estrutura do Executivo. Em termos práticos, a polícia judiciária investiga os delitos que a polícia ad- ministrativa não conseguiu evitar que fossem cometidos, reunindo provas e identificando autores (autoria e ma- terialidade), procedimentos regidos pelo Direito Penal e Direito Processual Penal. Essa característica difere, confor- me visto anteriormente, da atuação da polícia administrativa, que incide sobre bens (uso da propriedade) e direitos (exercício de liberdades), condicionando esses bens e direitos à busca pelo inte- resse da coletividade, objeto, principal- mente, do Direito Administrativo. Dessa forma, as polícias judiciárias assumem o papel de auxiliares e pre- paratórias na repressão criminal no sistema da Justiça Criminal, exercida, preponderantemente, pelo Ministério Público e Poder Judiciário (MOREIRA NETO, 1988). SC POLÍCIA ADMINISTRATIVA Age sobre ilícito administrativo; Age sobre bens/coisas e atividades/direitos; Atua por vários órgãos. Age sobre ilícito penal; Age sobre pessoas; Atua por PC e PF (+ PM crimes militares). POLÍCIA JUDICIÁRIA 43Doutrina de Polícia • Capítulo 2 A CF/88, no art. 144 §§1 ao 5º-A, esta- beleceu critérios de competência sob o prisma da “destinação funcional”, ou seja, em virtude da função ou atividade reservada para cada órgão, seja federal ou estadual (BRASIL, 1988). A polícia administrativa, quando exerci- da pelas Polícias Militares, geralmente incide sobre coisas/bens e atividades/ direitos, de forma preventiva ou re- pressiva imediata. Nesse sentido, elas estão voltadas para o caráter individual e coletivo de suas ações. Citamos, como exemplos, prevenção, controle e re- pressão de pessoas e tumultos, guarda e segurança de instalações públicas, controle de trânsito, resgates, além de muitas outras atribuições. A polícia judiciária, a exemplo da Polícia Ci- vil, atua diretamente sobre as pessoas cuja conduta possa caracterizar infração penal, ou seja, repressivamente nos abusos praticados pelos indivíduos considerados como unidades isoladas. São exemplos: investigação criminal, prisão, indiciamento e custódia de indiciados ou suspeitos. Características das Polícias Administrativas e Judiciárias Comparativo entre a Polícia Administrativa e Polícia Judiciária. Imagem: Produção do autor, 2020. PODER DE POLÍCIA Amplo / Geral Restrito / Especial (Administrativo) Polícia de Segurança Polícia de Setores Específicos Polícia Administrativa Preventiva ou de Ordem Pública Polícia Judiciária 44Doutrina de Polícia • Capítulo 2 O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA ● CARACTERÍSTICAS DAS POLÍCIAS ADMINISTRATIVAS E JUDICIÁRIAS Por se tratar de tema bastante controverso, não abor- daremos neste material as discussões a respeito das disfunções que esta divisão adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, influencia na gestão e eficiência do sistema policial brasileiro. Classificações do Poder de polícia – Polícia Administrativa de Ordem Pública e Polícia Judiciária. Imagem: Produção do autor, 2020. 45Doutrina de Polícia • Capítulo 2 Ambos os ciclos estão organizados de forma integrada e sistêmica, sendo inconveniente tratá-los isoladamente (LAZZARINI, 1995; VALLA, 2012; VIEI- RA, 2016). O ciclo de polícia possui três fases (tam- bém chamado de segmentos), sendo elas: 1. Situação de ordem pública normal (Polícia Ostensiva); 2. Momento da quebra da ordem pú- blica e sua restauração (repressão imediata/ações de contenção – Polícia de Preservação da Ordem Pública); 3. Fase investigatória (lavratura de auto de prisão em flagrante ou a instaura- ção de Inquérito Policial ou Inquérito Policial Militar). O ciclo de persecução criminal, por sua vez, é composto por 4 fases (segmen- tos), sendo que há interseção com o primeiro já na segunda fase. a. Momento da quebra da ordem públi- ca ocorrendo ilícito penal. b. Fase investigatória. c. Fase processual. d. Fase das penas. Assim sendo, a linha de diferenciação entre a polícia administrativa e a polícia judiciária, está na ocorrência ou não de ilícito penal. Vale lembrar que as Polícias Militares são as únicas instituições estaduais que atuam no ciclo de polícia como, também, estão presentes no ciclo de persecução criminal, como segue. • No ciclo de polícia: atuam como Polí- cia Ostensiva (preventiva/preserva- ção da ordem pública), como Polícia de Preservação da Ordem Pública (restauração/repressão imediata) e em investigações dos crimes milita- res, elaboração de Termo Circunstan- ciado nos crimes de menor potencial ofensivo, e no apoio ao MP (grupo de atuação especial de combate ao crime organizado - GAECCO). O Ciclo de Polícia e o Ciclo de Persecução Criminal PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA CICLO DE POLÍCIA CICLO DE POLÍCIA (ASSEGURANDO) BOA ORDEM PÚBLICA SEGURANÇA TRANQUILIDADE SALUBRIDADE (DIREITO ADMINISTRATIVO) (DIREITO PROCESSUAL PENAL) POLÍCIA OSTENSIVA (Polícia de Ordem Pública) DISSUAÇÃO PRESENÇA CONTENÇÃO INVESTIGAÇÃO ZONA DE INTERSECÇÃO DE COMPETÊNCIAS DAS POLÍCIAS ESTADUAIS PREVENÇÃO REPRESSÃO IMEDIATA REPRESSÃO MEDIATA REPRESSÃO PODER JUDICIÁRIO / MIN. PÚBLICO ECLOSÃO DURAÇÃO FLAGRÂNCIA Ac id en te N at ur al Pe rtu rb a- çã o bo ns co st um es In fra çã o Ad m in is - tra tiv a (RESTAURANDO) CICLOS DA PERSECUÇÃO CRIMINAL FASES NORMALIDADE POLÍCIA ADMINISTRATIVA POLÍCIA JUDICIÁRIA ANORMALIDADE QUEBRA DE ORDEM FORMALIZAÇÃO INQUISITÓRIA, VALOR INFORMATIVO D ilig ên ci as , Ex am es e O iti va s R el at ór io Fi na l In qu ér ito P ol ic ia l C om um e M ilit ar Au to d e Pr is ão em F la gr an te FASE INVESTIGATÓRIA MIN. PÚB./DEFESA/JUIZ VALOR JURÍDICO CONTRADITÓRIO AMPLA DEFESA FASE PROCESSUAL D E C I S à O P E N A SISTEMA PRISIONAL FUNÇÃO: RECUPE- RAÇÃO FASE DA PENA I L Í C I T O P E N A L 46Doutrina de Polícia • Capítulo 2 • No ciclo de persecução criminal: executam apoio a es- coltas de réus (fase processual) e possuem responsabili- dades de guarda externa de estabelecimentos prisionais nos estados e intervenções em rebeliões (fase de pena). Feitas essas distinções, veja na sequência o quadro que resume como todo esse processo ocorre na prática: O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA ● O CICLO DE POLÍCIA E O CICLO DE PERSECUÇÃO CRIMINAL Ciclos de Polícia e Persecução Criminal. Imagem: VALLA, 2012, p. 20. 47Doutrina de Polícia • Capítulo 2 O DIREITO ADMINISTRATIVO E A POLÍCIA ● O CICLO DE POLÍCIA E O CICLO DE PERSECUÇÃO CRIMINAL IMPORTANTE A linha de diferenciação entre as duas áreas de atuação das polícias estaduais, está na ocorrência ou não de ilícito penal. Assim, quando se atua na área do ilícito puramente administrativo (preven- tiva ou repressivamente), a polícia é administrati- va. Quando o ilícito penal é praticado, inicia-se a polícia judiciária. Dito isso, é possível dizer que a Polícia Civil, nos crimes comuns, exerce a polícia judiciária imedia- ta e mediata. São exemplos da atuação mediata a realização de Inquéritos Policiais e a lavratura de Autos de Prisão em Flagrante. E, ainda, o termo "polícia judiciária imediata" pode ser exercido, teoricamente, pela Polícia Mi- litar quando, atuando em crimes comuns, realiza uma atividade pós-delito, como, por exemplo, a preservação do local de crime, a prisão em fla- grante de infratores ou, ainda, a elaboração de Termos Circunstanciados. S A I B A M A I S Sugestão de vídeos: https://youtu.be/ZpyVYo9LoXw https://www.youtube.com/ watch?v=lDkhpxz7TVs https://www.youtube.com/ watch?v=EH3UPQmHp4M https://www.youtube.com/watch?v=_ho_bYHrT0c https://youtu.be/ZpyVYo9LoXw https://www.youtube.com/watch?v=lDkhpxz7TVs https://www.youtube.com/watch?v=lDkhpxz7TVs https://www.youtube.com/watch?v=EH3UPQmHp4M https://www.youtube.com/watch?v=EH3UPQmHp4M https://www.youtube.com/watch?v=_ho_bYHrT0c https://www.youtube.com/watch?v=_ho_bYHrT0c Im ag em : P M SC , 2 02 0. A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR C A P Í T U L O 3 49 Historicamente, dois foram os modelos que mais influenciaram a polícia moderna ocidental e, inclusive, a nossa polícia no Brasil: um de regime jurídico militar, desenvolvido na França, e um segundo de regime jurídico civil, originado na Inglater- ra. Com isso, é válido observar que embo- ra haja convivência entre os modelos em diversos países6, o modelo de polícia mais presente7 é o francês, de natureza militar. Aliás, mesmo nas polícias de natureza civil, vários aspectos da natureza militar estão presentes, como nas nomenclaturas, na estética e estruturação hierárquica/ organizacional (HIPÓLITO, TASCA, 2012). A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR 6 São exemplos: França – a Gendarmeria Nacional (militar) e a Polícia Nacional (civil); Portugal – a Guarda Nacional Re- publicana (militar), a Polícia de Segurança Pública (civil) e a Polícia Judiciária (civil); Espanha – Guarda-civil (militar) e o Corpo Nacional de Polícia (civil); Itália – os Carabineiros (militar), Guarda de Finanças (militar) e Polícia de Estado (civil); Chile – os Carabineros (militar) e Polícia Judiciária (civil); Argentina – a Gendarmeria (militar), a Polícia Federal (civil) e Polícia da Província (civil). 7 Dentre os diversos países que adotaram o modelo francês como matriz para o desenvolvimento de suas polícias es- tão a Argentina, Bélgica, Chile, Espanha, Holanda, Itália, Luxemburgo, Polônia, Portugal, Romênia e Brasil. Doutrina de Polícia • Capítulo 3 R E F L I T A Em regra, nos países onde há mais de uma organização policial, a re- partição de competências das polí- cias é territorial. Aliás, mesmo na- quelas que existem sobreposição de competência territorial, não há divi- são da tarefa ostensiva/preventiva e judiciária/repressiva. Já no Brasil, isso ocorre de maneira diferente, pois o ciclo de polícia é fragmenta- do e incompleto, quando compara- do à realidade internacional. 50 ...A Polícia de um Estado não se confunde com o Exército nacional, mas, também, não se confunde com uma Organização Civil. É uma força armada que só pode subsistir com ordem e disciplina.” (Pedro Lessa, STF - Voto em acór- dão de 30/09/1909) Há um princípio consagrado em inú- meros textos legais internacionais de que toda a força colocada ao serviço do Direito deve ser limitada, disciplinada e hierarquizada. Não obstante seja evidente que atuem em campos diferentes e com funções e habilidades também diversas, as forças armadas e forças policiais conservam naturalmente características especiais comuns, a exemplo do culto a valores como a honra, a coragem e o pundonor profissional, assim como um ordena- mento jurídico especial mais rígido (AFFONSO, 1986; VALLA, 2012). Esses pontos de convergência decorrem da necessidade de se garantir que as organizações policiais sejam capazes de atuarem de forma controlada e coordenada, em proveito da sociedade, em circunstâncias anormais, a exemplo de tumultos generalizados (desordens e pânico), calamidades públicas e si- tuações de alto risco, inclusive com um juramento de “vida” ou “morte”. Convém registrar que o caráter militar, comparativo entre as forças armadas e policiais, pode ser definido em quatro planos, os quais auxiliam a entender o qualificativo militar atribuído ao policial (AFFONSO, 1986; VALLA, 2012), con- forme segue. a. Ético: comum nas duas forças (arma- das e policiais). b. Educacional: comum na filosofia e metodologia; divergente no conteúdo, em virtude dos próximos dois itens. c. Jurídico: comum na tutela dos valo- res e interesses fundamentais à insti- tuição militar; divergente nos limites e atribuições legais de competência. Investidura e Caráter Militar das Forças Estaduais Doutrina de Polícia • Capítulo 3 51Doutrina de Polícia • Capítulo 3 d. Técnico**: divergência na especialização das atividades e missões fins e, assim como nos elementos essenciais de atuação, conforme subdivi- são que segue. I. As Forças Armadas têm como ênfases as ciências exatas, o inimigo, o clima e o terreno. Esses elementos corroboram com o foco de atuação em ambiente de guerra e combate, no qual há o envolvimento de um inimigo, utilização de força bélica e defesa da pátria. II. As Forças Policiais têm como ênfases as ciências comportamentais, as ações delituosas, o cumprimento da lei e a prestação de serviço à sociedade. Esses elementos conduzem ao foco na pacificação de conflitos, no fenômeno do crime lei e na garantia dos direitos humanos. A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR ● INVESTIDURA E CARÁTER MILITAR DAS FORÇAS ESTADUAIS Os dois quadros comparativos a seguir, apre- sentam uma sistematização das convergências e divergências entre as Forças Armadas e Polí- cias Militares: FORÇAS ARMADAS E POLÍCIA MILITAR Planos Valores (Subjetivo) Conteúdo (Objetivo) Ético = Educacional = Filosofia e metodologia ≠ Jurídico Interesses fundamentais ≠ Atribuições legais e de competências Técnico ≠ Diferença entre Forças Armadas e Polícia Militar. Imagem: Produção do autor, 2020. Comparativo no plano técnico. Imagem: Produção do autor, 2020. FORÇAS ARMADAS | POLÍCIAS MILITARES Ên fa se Inimigo, clima e terreno Delito, lei e sociedade Ciências exatas Ciências comportamentais Fo co Guerra Pacificação de conflitos Homem / Inimigo Crime (ato pratica-do, não o homem) Armas / Combate Lei Defesa da Pátria Direitos humanos 52Doutrina de Polícia • Capítulo 3 Em síntese, mesmo após a divergência no plano técnico, decorrente da dispare especialização das atividades, de acordo com Valla (2012), podemos apontar as seguintes características essenciais como patrimônio comum entre as Forças Armadas e as forças militares estaduais, conforme segue. I. Culto a um conjunto harmônico de valores: honra, o sentimento do dever, a coragem e o destemor, o patriotismo, a dignidade e a honestidade. II. Sistema de educação sui generis: formação continuada durante a carreira profissional na ascensão nos postos e graduações. III. A integral e total dedicação aos serviços da sociedade e da pátria. IV. Proibição de atuação, na ativa, político-partidária. V. Proibição de sindicalização e greves. VI. Ordenamento jurídico especial: regula relações dentro e fora da caserna. VII. Preservação do passado histórico. VIII. Valorização permanente dos prin- cípios de hierarquia e disciplina. IX. Dever profissional: sentimento de cumprimento do serviço que lhe é confiado. X. Pronta obediência: imposição de- corrente de ordem legal e de deter- minada conduta para bem cumprir o juramento que prestou (inclusive com o risco da própria vida). XI. Estética: mesmo atuando isolada- mente, o policial militar fardado re- presenta toda a instituição e sua con- duta é vista (expectativa de terceiros) como modelo pela opinião pública. XII. Operacionalidade: grau de aptidão das corporações. 8 Legitima, de fato, o monopólio do uso da força pelo Estado. A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR ● INVESTIDURA E CARÁTER MILITAR DAS FORÇAS ESTADUAIS 53Doutrina de Polícia • Capítulo 3 Nesse sentido, vale ressaltar que uma força policial, embora orga- nizada militarmente, não se con- funde com as forças armadas, haja vista não terem idêntica configuração no plano técnico. O regime jurídico militar das forças policiais, em verdade, traduz-se numa garantia para a sociedade contra o arbítrio e o despotismo de uma força sem os controles apropriados8 (CORDEIRO, 1995; VALLA, 2012). A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR ● INVESTIDURA E CARÁTER MILITAR DAS FORÇAS ESTADUAIS R E F L I T A O caráter militaré uma garantia para a sociedade contra o arbítrio e o despotismo de um grande contingente armado sem os controles apropria- dos. Nesse sentido, a condição militar torna mais céleres os processos de sanções dos profissionais infratores, seja na via judicial ou administrati- va-disciplinar. Nesse contexto, quais seriam os pontos negativos ou inconvenientes da desmilita- rização? Quais as reais intenções por detrás dos discursos dos ataques contra o caráter militar da polícia? Excessos e abusos no exercício das ati- vidades policiais militares seriam menores com a frouxidão da disciplina e hierarquia na polícia? As respostas a essas questões permeiam as discus- sões e debates no Congresso Nacional nas inú- meras propostas de emendas à Constituição que versam sobre o sistema policial brasileiro. 54 Exército Brasileiro. Imagem: Exército Brasileiro / Facebook. Com base no pacto federativo, as mis- sões das polícias militares, além de ex- tensas, são complexas. Na qualidade de forças auxiliares e reserva do Exército, elas integram a defesa nacional, compe- tindo-lhes, nas situações de segurança integrada e defesa territorial, as missões de proteção pública e privada de forma precedente ao eventual emprego das Forças Armadas, evitando o seu emprego prematuro (BRASIL, 1988; 2007; 2001). As PM e BM como Forças Auxiliares e Reserva do Exército Doutrina de Polícia • Capítulo 3 55Doutrina de Polícia • Capítulo 3 A INSTITUIÇÃO POLÍCIA MILITAR ● AS PM E BM COMO FORÇAS AUXILIARES E RESERVA DO EXÉRCITO Muitos críticos consideram que essa disposição constitucional representa, por meio da Polícia Ostensiva, a ado- ção de atitudes militares no policia- mento. Todavia, como demonstrado anteriormente, os conteúdos progra- máticos de formação, especialização e aperfeiçoamento relativos às técnicas, táticas e as estratégias da Polícia Ostensiva e da Polícia de Preservação da Ordem Pública são completamente diferentes daquelas previstas para uma força militar. Quanto à particularidade de ser “re- serva do Exército”, vale frisar que todo o cidadão, pela legislação vigente, é reservista, é um soldado, é defensor da Pátria, independentemente da cate- goria que pertença, conforme art. 143 da CF/88 e Lei Federal n. 4.375/1964. A diferença reside no fato das corpo- rações (PM e BM), no seu conjunto – e não consideradas individualmente –, serem alçadas como reserva do Exérci- to (VALLA, 2012). Dito isso, diante das crises, existem mecanismos constitucionais para o restabelecimento da normalidade, quais sejam, a possibilidade de decre- tação do estado de defesa, do estado de sítio e o papel das Forças Armadas e órgãos de segurança pública (Título V, CF/88). Nessa toada, a CF/88 define situações em que o emprego se dá em conjunto com o Exército, em atri- buições relativas à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem (art. 142), o que será visto adiante (BRASIL, 1988). Im ag em : C ar lo s Eb er t / F lic k. DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES C A P Í T U L O 4 57Doutrina de Polícia • Capítulo 4 Im ag em : P M SC , 2 02 0. Neste tópico, apresentam-se as descrições sumárias a respeito da competência e emprego das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros nos campos da defesa pública e nacional, os quais permeiam a segurança pública, a segu- rança integrada, defesa territorial, defesa civil e residual. DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES 58 M I S S Õ E S P R I M Á R I A S As PMs assumem um papel relevante como Polícia Ostensiva e Polícia de Preservação da Ordem Pública, caracte- rizadas pelo exercício do poder de polícia administrativa, tendo em legislação espe- cífica o detalhamento da missão síntese, que consiste em assegurar o cumprimen- to da lei, a preservação da ordem pública e o exercício dos poderes constituídos (BRASIL, 1988; 1983; 1969). Convém registrar que a competência de Polícia Ostensiva das Polícias Militares se trata de competência original indivisí- vel, indelegável e inconveniável, segundo a lógica da CF, nos termos do art. 45 do Decreto Federal n. 88.777/83 (BRASIL, 1983, 1969). Aliás, a competência de polícia ostensiva das PMs só admite exceções constitucionais expressas: aquelas referentes às Polícias Rodoviária e Ferroviária federais, que estão auto- rizadas ao exercício do patrulhamento ostensivo, respectivamente, das rodovias e ferrovias federais, não incluindo outra atividade além da fiscalização de polícia (art. 144, §§ 2º e 3º) (BRASIL, 1988). Segurança Pública Doutrina de Polícia • Capítulo 4 S A I B A M A I S Leia o Título V da Constituição do Esta- do de SC, especialmente o Capítulo III – da Polícia Militar IMPORTANTE A “polícia ostensiva” é uma expressão nova no texto constitucional e representa uma expansão da competência policial das Po- lícias Militares para além do “policiamento ostensivo”. Isso porque o “policiamento” corresponde apenas à atividade de fisca- lização, sendo esta apenas uma fase da atividade de polícia (TEZA, 2011; VIEIRA, 2016). O adjetivo “ostensivo” refere-se à ação de dissuasão, característica do poli- cial fardado e armado que, reforçado pelo aparato militar utilizado, evoca o poder de uma Corporação unificada pela hierarquia e disciplina militar (VALLA, 2012). 59Doutrina de Polícia • Capítulo 4 DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES ● SEGURANÇA PÚBLICA Como Polícia de Preservação da Ordem Pública, a atuação se dá na restauração da ordem pública, ou seja, na repressão imediata de infrações penais ou administrativas para a de- vida aplicação da lei. São nas hipóteses de agravamento do quadro da quebra da ordem e na atuação sob essas condi- ções de alteração do clima pacífico de convivência social que as corporações fazem valer o caráter e a condição de forças militares estaduais, mediante o restabelecimento da ordem pública, ainda sob direção do governo estadual, por meio da repressão por contenção (VALLA, 2012; TEZA, 2011). Quanto aos Corpos de Bombeiros Militares, muito embora não exerçam ativi- dades típicas de segurança pública, integram a segurança pública mediante a gama de atividades que dizem respeito à tranquilidade pública e à salubridade pública, ambas integrantes do conceito de ordem pública (BRASIL, 1988; VALLA, 2012). 9 Art. 13. §4º - As polícias militares, instituídas para a manutenção da ordem e segurança interna nos Estados, nos Territórios e no Distrito Federal, e os corpos de bombeiros militares são considerados forças auxiliares reserva do Exército (...) (BRASIL, 1967). IMPORTANTE A ordem pública é uma realidade bem mais ampla do que a habitual concentração de ações con- tra o crime (foco na infração penal). Além disso, conforme já dito no item 2.19, a expressão cons- titucional anterior à CF/1988 era “manutenção” (BRASIL, 1967)9, de menor amplitude quando comparado com o texto atual. A expressão “pre- servação” engloba a restauração da ordem públi- ca quando infringida e, ainda, a competência resi- dual (TEZA, 2011; HIPÓLITO e TASCA, 2012). 60Doutrina de Polícia • Capítulo 4 E S F O R Ç O S D A S P M S E M R E L A Ç Ã O A O C I C L O D E P O L Í C I A Além dos esforços na prevenção (polícia ostensiva) e repressão imediata (polícia de preservação da ordem pública), destaca-se a investigação preliminar como ação de apoio aos dois primeiros esforços, mediante a aplicação intensiva da pesquisa e da inteligência. Nesse sen- tido, o policiamento velado, para o apoio de esforços do policiamento ostensivo, é de evidente utilidade (VALLA, 2012). A investigação preliminar, na qual se in- sere o policiamento velado, não pode ser confundida com a apuração de infrações penais, cuja atividade, nas unidades fe- derativas (Estados e DF) é de responsa- bilidade das polícias civis, resguardadas, também, às ações reservadas à polícia judiciária federal e à políciajudiciária mi- litar, estas nas esferas federal e estadual. M I S S Õ E S N A D E F E S A ( G A R A N T I A ) D A L E I E D A O R D E M A “garantia da lei e da ordem” é atri- buição constitucional tanto das Forças Armadas quanto dos órgãos de seguran- ça pública (arts. 142 e 144 da CF/88), sendo que as forças de segurança têm a competência primária (originária/ essencial), com base no Princípio da Especialidade (VALLA, 2012). Nesse sentido, com base no “Princípio da Crise Crescente”, procedente do Princípio da Proporcionalidade, quando frustradas e esgotadas as ações primá- rias dos órgãos de segurança pública na garantia da lei e da ordem, há o respaldo do emprego das Forças Armadas no contexto interno como atribuição/ missão subsidiária (art. 15, §§2º e 3º da LC n. 97/9910 c/c Decreto n. 3.897/0111) (BRASIL, 1999, 2001). 10 §2º A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitu- cionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instru- mentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal (BRASIL, 1999). §3º Consideram-se esgotados os instrumentos relacionados no art. 144 da Constituição Federal quando, em deter- minado momento, forem eles formalmente reconhecidos pelo respectivo Chefe do Poder Executivo Federal ou Esta- dual como indisponíveis, inexistentes ou insuficientes ao desempenho regular de sua missão constitucional (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004) (BRASIL, 1999). 11 Art. 3º Na hipótese de emprego das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem, objetivando a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, porque esgotados os instrumentos a isso previstos no art. 144 da Constituição, lhes incumbirá, sempre que se faça necessário, desenvolver as ações de polícia ostensiva, como as demais, de natureza preventiva ou repressiva, que se incluem na competência, constitucional e legal, das Po- lícias Militares, observados os termos e limites impostos, a estas últimas, pelo ordenamento jurídico (BRASIL, 2001). DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES ● SEGURANÇA PÚBLICA 61Doutrina de Polícia • Capítulo 4 As “Operações de Garantia da Lei e da Ordem” caracterizam-se como opera- ções de “não guerra”, pois, embora em- pregando as Forças Armadas no âmbito interno, elas não envolvem o combate propriamente dito. Assim sendo, uma operação militar determinada pelo Pre- sidente da República e conduzida pelas Forças Armadas de forma episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado, que tem por objetivo a preservação da ordem pública e da inco- lumidade das pessoas e do patrimônio em situações de esgotamento das forças de segurança descritos no art. 144 da CF/88 (BRASIL, 1998, 2001). DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES ● SEGURANÇA PÚBLICA Imagem: PMSC, 2020. 62 A Constituição de 1988 buscou uma coordenação de forças do Estado em prol da presença, preparo e atuação conjunta, integrada, no enfrentamento de eventuais desafios, a exemplo de ações criminosas violentas, subversivas ou terroristas que sejam atentatórias à lei e à ordem, aos poderes constituídos e à paz social. Nas situações de normalidade (ex: eventuais quebras da ordem pública, contenção de movimentos de massa, ou de tumultos localizados de baixa ou média intensidade) e em casos de perturbação da ordem (ex: dissolução de reuniões tumultuosas e focos de agitação), cabe às forças auxiliares a competência original ou primária fren- te a ações de forças adversas e outros fatores internos graves. Em outras pa- lavras, as Polícias Militares precedem, a depender da intensidade da crise instalada, o eventual emprego das For- ças Armadas, restando a estas apenas o acompanhamento dos acontecimentos e o desenvolvimento de atividades, se Segurança Interna (Segurança Integrada) Constituição de 1988. Imagem: Almanaque Lusofonista / Wikipedia. Doutrina de Polícia • Capítulo 4 63Doutrina de Polícia • Capítulo 4 for o caso, de inteligência e de apoio (BRASIL, 2007, 2018; VALLA, 2012). Nesse sentido, as Forças Armadas somente atuam na garantia da lei e da ordem quando há um quadro de agra- vamento e a falência operacional do sistema de segurança pública de cada Estado (art. 144 da CF), ou seja, para pôr a termo o grave comprometimento da ordem pública12 (art. 142 da CF; art. 15 e seus parágrafos da Lei Complementar n. 97/1999), causa esta, determinante de atuação da União nos Estados e no DF, adotando ou não as medidas polí- ticas extraordinárias previstas no arts. 34, III13 (Intervenção Federal), 13614 (Estado de Defesa) e 13715 (Estado de Sítio) (BRASIL, 1988). Frisa-se que, na garantia da lei e da ordem (GLO), o emprego das Forças Armadas será episódico e temporário, sendo que o Exército poderá exercer as atividades atri- buídas às Polícias Militares, ou seja, com poder de polícia. A sua execução ficará a cargo das Forças Armadas e também das instituições de segurança pública, porém sob o controle operacional das forças militares federais (BRASIL, 2007, 2018). Nas situações de garantia dos poderes constitucionais, ameaçados por grave e iminente instabilidade institucional (poderes constitucionais), ou por cala- midades de grandes proporções (ex.: evolução da crise interna), a compe- tência primária passa a ser das Forças Armadas. Com a decretação ou não do Estado de Defesa, as forças auxiliares poderão ser convocadas, subordinan- do-se ao Comando Militar de Área, para emprego em suas atribuições específi- cas de polícia militar e de bombeiro mili- tar (BRASIL, 2007, 2018; VALLA, 2012). DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES ● SEGURANÇA INTERNA (SEGURANÇA INTEGRADA) 12 §Entende-se como grave comprometimento da ordem pública, aquele que não pôde ser eficientemente reduzido ou controlado a nível estadual. 13 Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: III - pôr termo a grave comprometimento da ordem pública (BRASIL, 1988). 14 Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, de- cretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza (BRASIL, 1988). 15 Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, soli- citar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de: I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira (BRASIL, 1988). 64Doutrina de Polícia • Capítulo 4 Assim, quanto às Forças Armadas, a missão essencial é a defesa da Pátria, enquanto missão subsidiária e caráter excepcional a garantia dos poderes constitucionais e a defesa da lei e da ordem (área da segurança pública). O grande desafio reside, assim, em con- trolar, ao mesmo tempo, a criminalidade comum e aquelas decorrentes de ações de alta intensidade e periculosidade, razão pela qual uma organização policial civil dificilmente teria como responder a todas essas exigências (BRASIL, 1998, 2007, 2018; VALLA, 2012). O Decreto Presidencial nº 3.897, de 2001, prevê que os meios de segurança pública serão considerados esgotados quando, em determinado momento, forem reconhecidos indisponíveis pelo respectivo Chefe do Poder Executivo Federal ou Estadual, ou ainda inexis- tentes ou insuficientes ao desempenho regular de sua missão constitucional (BRASIL, 2001). Ressalta-se, ainda, conforme prescrito no art. 5ºdo mesmo decreto, que as For- ças Armadas poderão ser empregadas na garantia da lei e da ordem nas situações em que se presuma ser possível a pertur- bação da ordem, tais como as relativas a eventos oficiais ou públicos, particular- mente os que tiverem a participação de chefe de Estado ou de governo estran- geiro, e à realização de pleitos eleitorais, mediante solicitação do Tribunal Supe- rior Eleitoral (BRASIL, 2001). DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES ● SEGURANÇA INTERNA (SEGURANÇA INTEGRADA) 65 O emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria constitui a atividade finalística das instituições militares e visa primordialmente à garantia da soberania, da integridade territorial e patrimonial e à consecução dos inte- resses estratégicos nacionais (BRASIL, 1988, 2007). Assim, nas hipóteses de declaração de estado de guerra ou resposta à agres- são armada estrangeira (art. 137, II da CF; art. 3º, alínea “d” do Decreto-lei n. 667/6916; artigos 5º e 6º do Decreto n. 88.777/8317), isto é, em caso de confli- tos externos, as forças auxiliares parti- cipam, como competência secundária, na defesa territorial e se subordinam à Força Terrestre, apoiando as ações des- tinadas à salvaguarda do potencial de guerra da nação brasileira, incluindo-se a preservação da ordem pública. As forças auxiliares (PM e CBM), ao atender à convocação e à mobilização do governo federal, atuarão integradas ao Exército, com missões de apoio no con- trole de instalações, vias de transportes e populações, na tomada e retomada de pontos sensíveis e, pela participação na defesa civil, minimizando os efeitos dos danos provocados pelos combates, além de outras missões e objetivos planejados, orientados e coordenados por meio dos Comandos Militares (BRASIL, 1969, 1988, 2007, 2018). Defesa Territorial 16 Art. 3º - d) atender à convocação, inclusive mobilização, do Governo Federal em caso de guerra externa ou para prevenir ou reprimir grave perturbação da ordem ou ameaça de sua irrupção, subordinando-se à Força Terrestre para emprego em suas atribuições específicas de polícia militar e como participante da Defesa Interna e da Defesa Territorial (BRASIL, 1969). 17 Art. 5º - As Polícias Militares, a critério dos Exércitos e Comandos Militares de Área, participarão de exercícios, manobras e outras atividades de instrução necessárias às ações específicas de Defesa Interna ou de Defesa Terri- torial, com efetivos que não prejudiquem sua ação policial prioritária. Art. 6º - Os Comandantes-Gerais das Polícias Militares poderão participar dos planejamentos das Forças Terres- tres, que visem à Defesa Interna e à Defesa Territorial (BRASIL, 1983). Im ag em : M ila n W ul f / P ix ab ay . Doutrina de Polícia • Capítulo 4 66 As ações de defesa civil visam, basi- camente, a prestação de socorro e assistência à população atingida pelas calamidades públicas ou em decorrência dos efeitos indesejáveis da guerra. Como missões primárias, às forças mili- tares estaduais competem atuar (BRA- SIL, 1988; SANTA CATARINA, 198918; VALLA, 2012), conforme segue. I. Com efetivo policial em ações de policiamento em geral, de interdição de áreas sinistradas, de isolamento de zonas críticas ou perigosas, nas comunicações e colaboração nas ações de socorro, de salvamento e de evacuação da população. II. Com o efetivo dos CBMs em ações de socorro, salvamento e na interdição de áreas ou locais comprometidos em termos de salubridade pública. III. Após as calamidades, auxiliando no atendimento à população desabriga- da e aos flagelados, inclusive preve- nindo o cometimento de ilícitos nas áreas atingidas. Como missões secundárias/subsidiárias, atuar na redução de desastres mediante cooperação à prevenção de desastres, preparação para emergências, respostas aos desastres e atividades de recons- trução e recuperação. Nessa mesma esteira, as Forças Armadas, conforme o art. 16 da Lei Complementar n. 97/99, também têm a atribuição subsidiária ge- ral de cooperar com o desenvolvimento nacional e a defesa civil (BRASIL, 1988, 1999; VALLA, 2012). Defesa Civil 18 Art. 107. À Polícia Militar, órgão permanente, força auxiliar, reserva do Exército, organizada com base na hierarquia e na disciplina, subordinada ao Governador do Estado, cabe, nos limites de sua competência, além de outras atri- buições estabelecidas em Lei: I. exercer a polícia ostensiva relacionada com (...); II. cooperar com órgãos de defesa civil; e III. atuar preventivamente como força de dissuasão e repressivamente como de restauração da ordem pública (SANTA CATARINA, 1989). Doutrina de Polícia • Capítulo 4 67 Em decorrência de suas extensas competências na preservação da ordem pública, cabe às PMs uma “competência residual” que engloba (LAZZARINI, 1993; TEZA, 2011; VALLA, 2012) I. o exercício de toda a ativi- dade policial de segurança pública não atribuída aos demais órgãos; II. a competência específica dos demais órgãos poli- ciais, no caso de falência operacional deles (ex.: gre- ves ou outras causas que os tornem inoperantes). Com base no texto constitu- cional, Moreira Neto (1994, p. 48) esclarece a amplitude da competência conferida às polícias militares: Emprego Residual ou Remanescente 5 – Preservação e restabelecimento policial militar da ordem pública Essa terceira e especial modalidade, a policial militar, se define por remanência: caberá, sempre que não for o caso da preser- vação e restabelecimento policial da ordem pública, competência específica e expressa dos demais órgãos policiais do Estado. Em outros termos, sempre que se tratar de atuação policial de preservação e resta- belecimento da ordem pública, e não for o caso previsto na competência constitucio- nal da polícia federal (art. 144, I), da polícia rodoviária federal (art. 144, II), da polícia ferroviária federal (art. 144, III) nem, ainda, caso em que a lei específica venha a definir uma atuação conexa à defesa civil para o Corpo de Bombeiros Militar (art. 144, §5º), a competência é policial militar. Observe-se que a atuação da polícia civil não é, direta e imediatamente, de preven- ção e restabelecimento da ordem pública e, por isso, não se confunde com a competên- cia constitucional da polícia militar (grifos do autor). Doutrina de Polícia • Capítulo 4 68Doutrina de Polícia • Capítulo 4 DOUTRINA DE EMPREGO DAS FORÇAS AUXILIARES ● EMPREGO RESIDUAL OU REMANESCENTE Em outras palavras, a com- petência será da PM sempre que não for o caso da pre- servação e restabelecimen- to policial da ordem pública de competência específica e expressa (não for atribuição prevista) dos demais órgãos policiais do Estado. T E O R I A N A P R Á T I C A O Supremo Tribunal Federal (STF), em análise de uma ação direta de inconstitucionalidade que tratava a respeito da competência constitucional e poder de polícia conferido às Polícias Milita- res, consolidou esse entendimento, conforme a seguinte ementa: “Polícia militar: atribuição de "radiopatrulha aérea": constitucionalidade. O âm- bito material da polícia aeroportuária, privativa da União, não se confunde com o do policiamen- to ostensivo do espaço aéreo, que – respeitados os limites das áreas constitucionais das polícias federal e aeronáutica militar – se inclui no poder residual da polícia dos Estados” (Supremo Tribunal Federal – STF. Ação Direta de Inconstitucionalida- de – ADI n. 132. Relator Ministro Sepúlveda Per- tence Diário da Justiça de 30/5/2003). Im ag em : w w w .sl on .p ic s / Fr ee pi k O SISTEMA BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA C A P Í T U L O 5 70Doutrina de Polícia • Capítulo 5 Título / legenda da foto Imagem: Autor / Banco de Imagens. Segundo a CF/88, os órgãos que com- põem a polícia no âmbito federal são: polícia federal, polícia rodoviária fede- ral, polícia ferroviária federal e polícia penal federal. A polícia federal é instituída por lei como órgão permanente, organizado
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