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MAD2 HIV EPIDEMIOLOGIA E HISTÓRIA A primeira descrição do que veio posteriormente a ser conhecida por síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) se deu no início da década de 1980 quando Gottlieb e colaboradores relataram 5 casos de pneumonia por Pneumocistis carinii (atualmente P. jiroveci) acometendo homossexuais masculinos, jovens e previamente saudáveis, em 3 hospitais de Los Angeles, EUA. Uma característica comum entre esses casos era a evidência de depleção de linfócitos T circulantes. Desses 5 casos, 2 haviam ido a óbito, mesmo havendo sido administrada terapia específica para pneumonia por P. carinii. Nos meses que se seguiram, epidemiologistas dos Centros para Controle e Prevenção de Doenças (CDC, Centers for Disease Control and Prevention) de Atlanta, EUA, se depararam com o aumento significativo do número de novos relatos de pneumonia por P. carinii em outras cidades dos EUA, além de outras infecções oportunistas. Detectou-se, ainda, aumento da incidência entre homossexuais masculinos jovens de uma doença até então rara nos EUA, o sarcoma de Kaposi. A Europa Ocidental, ao mesmo tempo, se deparava com maior número de casos dessas mesmas entidades clínicas entre homossexuais masculinos e entre imigrantes de origem africana. 1979 - Casos isolados de Imunodeficiência Humana; Junho 1981 - Pneumonias severas e imunodeficiência em LGBTQI+ (90%Homens); 1982 - Centenas de casos semelhantes: • usuários de drogas injetáveis; • hemofílicos; • pacientes de transfusão; • heterossexuais caribenhos/africanos; • filhos de mães +; • parceiros de bissexuais. 1983 - HIV associado a AIDS, HIV associado a HHV8 e HTLV1; 1987 - Primeiro medicamento (AZT). Estatísticas globais sobre HIV em 2019 37,9 milhões [32,7 milhões- 44,0 milhões] de pessoas em todo o mundo vivendo com HIV; 23,3 milhões [20,5 milhões- 24,3 milhões] de pessoas com acesso à terapia antirretroviral; 1,7 milhão [1,4 milhão- 2,3 milhões] de novas infecções por HIV; 770.000 [570 000- 1,1 milhão] de pessoas morreram de doenças relacionadas à AIDS; 74,9 milhões [58,3 milhões- 98,1 milhões] de infectadas pelo HIV desde o início da epidemia; 32 milhões [23,6 milhões- 43,8 milhões] de mortes relacionadas à AIDS desde o início da epidemia; 8,1 milhões de pessoas não sabiam que estavam vivendo com HIV. HIV TIPO 1 E TIPO 2 São cepas diferentes e apresentam grandes diferenças genéticas, sendo que o tipo 2 é restrito ao continente Africano e é muito mais próximo ao vírus da imunodeficiência de primatas. Atualmente, há medicamentos mais eficazes contra o tipo 2 e o 1 se mostra mais agressivo. MORFOLOGIA E CARACTERÍSTICAS GERAIS O HIV é uma partícula esférica medindo de 100 a 120nm de diâmetro, pertencente ao gênero Lentivirus e à família Retroviridae, que apresenta em seu núcleo duas cópias de RNA de cadeia simples, encapsuladas por uma camada proteica ou nucleocapsídeo, um capsídeo e um envelope externo composto por uma bicamada fosfolipídica (ICTV, 2017). O envelope contém glicoproteínas virais e é adquirido pelo brotamento a partir da membrana plasmática. O vírion também contém entre 10 e 50 cópias das enzimas transcriptase reversa e integrase e dois RNAs de transferência celular (RNAts). Esses RNAts estão associados com cada cópia do genoma e podem ser utilizados como iniciadores (primers) para a RT. A morfologia do nucleocapsídeo difere entre os vírus e pode ser utilizada como forma de classificação dos retrovírus. O genoma do HIV inclui três principais genes que codificam as proteínas estruturais e enzimas virais: gag, pol e env. A nomenclatura das proteínas virais utiliza a abreviação “gp” para glicoproteína ou “p” para proteína, seguida de um número que indica o peso molecular em kilodaltons (kd). O gene gag codifica a p55, a partir da qual quatro proteínas estruturais do capsídeo são formadas: p6, p9, p17 e p24. O capsídeo que circunda o ácido nucleico viral contém p24, p6 e p9, enquanto a p17 se encontra em uma camada entre o núcleo proteico e o invólucro, denominada matriz proteica, a qual reveste a superfície interna da membrana viral (FANALES- BELASIO et al., 2010; MILLER, 2010; WATTS et al., 2009). O gene env codifica as glicoproteínas gp160, gp120 e gp41, encontradas no envelope viral. A gp160 é uma proteína precursora, clivada para formar a gp120 e a gp41. A gp120 se projeta na superfície viral na forma trimérica, enquanto a gp41 é uma glico-proteína transmembrana e se associa à gp120. Tanto a gp120 como a gp41 estão envol-vidas na ligação aos receptores de HIV nas células do hospedeiro e na fusão do envelope viral com a membrana celular (FANALES- BELASIO et al., 2010; MILLER, 2010; WATTS et al., 2009; ENGELMAN; CHEREPANOV, 2012). O gene estrutural, pol, codifica as enzimas p66 e p51, as quais são subunidades que compõem a enzima transcriptase reversa (RT), necessária à replicação do HIV. Outras enzimas codificadas pelo gene pol incluem a integrase (p31), que tem como função principal promover a integração do ácido desoxirribonucleico (DNA) do HIV ao genoma do hospedeiro, e a protease (p10), que realiza a clivagem de percursores proteicos em unidades ativas menores após a liberação da partícula viral da célula do hospedeiro (FANALES-BELASIO et al., 2010; MILLER, 2010; WATTS et al., 2009; ENGELMAN; CHEREPANOV, 2012). Vários outros genes no genoma do HIV codificam produtos com função reguladora ou assessória. Embora esses produtos não sejam parte integrante da estrutura viral, eles atuam no controle da replicação viral e infectividade. Um exemplo é o gene nef (fator negativo) codifica a p27, a qual apresenta múltiplas funções, incluindo a modificação da célula hospedeira para aumentar a replicação viral e torná-la menos suscetível de ser destruída pelo sistema imune do hospedeiro. Os principais componentes virais com utilidade diagnóstica incluem as proteínas do envelope viral (gp160, gp120 e gp41), as proteínas codificadas pelo gene gag (p55, p24 e p17) e as proteínas codificadas pelo gene pol (p66, p51, p31) (CLSI, 2011). • envelopado; • RNA Rt (RNA > DNA) • Latência (DNA); • leucotropismo (variabilidade celular infectada); • gag – p55 → promove brotamento; • env – gp 120 (SU - Superficie) e gp 41(TM - transmembrana) → promovem adesão a mol. CD4 e CCR5; • pol – p66 e p51 → compõe a enzima RT; p31 → integrasse, integração ao DNA humano; p10 → clivagem; • nef – Regula negativamente a expressão de CD4, MHC 1 e 2, CD3 e CD28, aumenta a infecciosidade; • infecção célula/célula. TROPISMO O vírus da imunodeficiência humana infecta principalmente células LTCD4+ e células da linhagem mieloide (p. ex., monócitos, macrófagos, macrófagos alveolares pulmonares, células dendríticas e células micróglias). BIOSSÍNTESE VIRAL O HIV se liga à CD4 e co-receptores de quimiocinas CCR5 (adsorção) e penetra por fusão. O genoma é transcrito de forma reversa em ácido desoxirribonucleico (DNA) no citoplasma, entra no núcleo e é integrado no DNA nuclear. A transcrição e tradução do genoma ocorrem como um gene celular. O vírus é montado na membrana plasmática e matura após o brotamento a partir da célula (apresentará proteínas da membrana do indivíduo). Ciclo de vida – biossíntese viral e fármacos A infecção de uma célula-alvo susceptível ao HIV começa com a adesão do vírus ao receptor CD4 da célula-alvo. O CD4 está presente na superfície de muitos linfócitos, que são uma parte essencial do sistema imunológico do organismo. Evidências recentes indicam que o HIV precisa de um co-receptor para entrar na célula. A identificação dos co-receptores do HIV e os progressos na compreensão do processo de fusão com a célula abriu novas possibilidades para a criação de medicamentos anti-retrovirais. Estão sendotestados alguns agentes para prevenir a infecção através do bloqueio da fusão do HIV com a célula-alvo. Realizada a fusão do vírus com a célula-alvo, o HIV entra na célula. O material genético do vírus (RNA) é liberado, passa pelo processo de transcrição reversa e se converte em DNA. Uma enzima do HIV chamada transcriptase é necessária para catalisar esta conversão do RNA viral em DNA. Os inibidores da transcriptase reversa, como o AZT, foram os primeiros medicamentos anti-HIV e continuam sendo essenciais no tratamento de pacientes portadores do HIV. Os inibidores da transcriptase reversa se dividem em duas classes — análogos de nucleosídeo e não- nucleosídeos — com base na sua estrutura e na maneira como eles inibem a transcriptase reversa. Uma vez que o material genético do HIV foi convertido em DNA, este DNA viral entra no núcleo, onde se integra ao material genético da célula. A enzima integrase catalisa este processo e os inibidores da integrase estão sob estudo como um novo caminho para o bloqueio da replicação do HIV. Depois de integrado ao material genético do hospedeiro, o HIV pode permanecer em estado latente por muitos anos. Esta habilidade que o HIV tem de se abrigar (e de permanecer latente) em células infectadas é o maior obstáculo para a erradicação ou a cura do HIV. Por esta razão, com base no conhecimento atual, os pacientes devem se manter em terapia anti- retroviral por toda a vida. A ativação da célula-alvo resulta na transcrição do DNA viral em RNA mensageiro (mRNA), que é então traduzido em proteínas virais. O novo RNA viral forma o material genético da próxima geração de vírus e as proteínas virais migram a membrana. O RNA viral e as proteínas virais se estruturam junto à membrana da célula para formar um novo vírus. Uma das proteínas do HIV é a protease, que é necessária no processamento de outras proteínas do HIV que, desse modo, adquirem sua forma funcional. Os inibidores de protease são um dos mais potentes tipos os de medicamento anti-viral e atuam bloqueando este estágio crítico da maturação do vírus. Após a estruturação na superfície da célula, o vírus se desprende desta e fica livre para infectar outra célula-alvo. Transcriptase reversa Se o ciclo de vida do HIV não for interrompido através do tratamento, a infecção por este vírus se espalha pelo corpo e resulta na destruição do sistema imunológico do organismo. Com os medicamentos anti-retrovirais em uso, como por exemplo os inibidores de transcriptase reversa e os inibidores de protease, a infecção pelo HIV pode ser contida. No entanto, é necessário fazer muito mais para controlar a epidemia de AIDS. Um objetivo imediato importante consiste em criar medicamentos novos, mais potentes, que sejam mais fáceis de administrar e que tenham menos efeitos adversos. De qualquer forma, os desafios decisivos são a utilização dos nossos conhecimentos a respeito do ciclo de vida do HIV para desenvolver medicamentos que possam erradicar este vírus do organismo de pessoas já infectadas e para criar uma vacina capaz de prevenir novas infecções. HISTÓRIA NATURAL • a infecção aguda ocorre nas primeiras semanas após o contágio pelo HIV; • a Viremia plasmática alcança níveis elevados e o indivíduo é altamente infectante (linha cinza); • inicialmente, ocorre queda importante da contagem de LTCD4+, com elevação em algumas semanas (controle imunológico), mas não há retorno aos níveis iniciais (linha preta); • na fase de latência clínica, o exame físico costuma ser normal, enquanto a contagem de LT-CD4+ permanece acima de 350 céls/mm³, com infecções semelhantes às da população imunocompetente; • o aparecimento de Infecções oportunistas (IO) e neoplasias são definidoras de AIDS; • se a TARV não for instituída, inevitavelmente o indivíduo evolui para a morte. Fases X Manifestações Clínicas A infecção pelo HIV, em sua fase aguda, pode ser acompanhada por um conjunto de manifestações clínicas, denominado Síndrome Retroviral Aguda (SRA). Os principais achados clínicos de SRA incluem febre, cefaleia, astenia, adenopatia, faringite, exantema e mialgia. A SRA pode cursar com febre alta, sudorese e linfadenomegalia, comprometendo principalmente as cadeias cervicais anterior e posterior, submandibular, occipital e axilar. Podem ocorrer, ainda, esplenomegalia, letargia, astenia, anorexia e depressão. Sintomas digestivos, como náuseas, vômitos, diarreia, perda de peso e úlceras orais podem estar presentes. Entretanto, o comprometimento do fígado e do pâncreas é raro na SRA. Cefaleia e dor ocular são as manifestações neurológicas mais comuns, mas pode ocorrer raramente quadro de meningite asséptica, neurite periférica sensitiva ou motora, paralisia do nervo facial ou síndrome de Guillain-Barré. A SRA e autolimitada e a maior parte dos sinais e sintomas desaparece em três a quatro semanas. Linfadenopatia, letargia e astenia podem persistir por vários meses. A presença de manifestações clínicas mais intensas e prolongadas (por período superior a 14 dias) pode estar associada a progressão mais rápida da doença. Os sinais e sintomas que caracterizam a SRA, por serem muito semelhantes aos de outras infecções virais, são habitualmente atribuídos a outra etiologia e a infecção pelo HIV comumente deixa de ser diagnosticada nessa fase inicial ou aguda. Fase de latência clínica: • exame físico geralmente normal; • linfadenopatia pode persistir; • pode ocorrer plaquetopenia; • anemia e leucopenias leves podem estar presentes; • enquanto a contagem de LT-CD4+ está acima de 350 céls/mm3 → infecções bacterianas, respiratórias, como TB; • progressão da infecção → apresentações atípicas de infecções, resposta tardia a antibioticoterapia e reativação de infecções antigas; • diminuição na contagem de LT-CD4+: à medida que a infecção progride, sintomas constitucionais (febre baixa, perda ponderal, sudorese noturna, fadiga), diarreia crônica, cefaleia, alterações neurológicas, infecções bacterianas (pneumonia, sinusite, bronquite) e lesões orais, como a leucoplasia oral pilosa, tornam-se mais frequentes, além do herpes-zoster. PATOGÊNESE Durante a transmissão sexual, o HIV infecta uma superfície de mucosa, entra e rapidamente infecta células do tecido linfóide associado com a mucosa (MALT), incluindo o intestino. Os estágios iniciais de infecção são mediados pelos vírus com tropismo às células mieloides (denominado M-trópico), que se ligam ao CD4 e ao receptor de quimiocinas CCR5 nas células dendríticas e em outras células da linhagem de monócitos-macrófagos, assim como em células memória, TH1, a maioria das células T associadas ao intestino e outras células T CD4. A ligação- alvo ao CCR5 ou às células T CD4 que expressam α-4 β-7 integrina, rapidamente esgota o tecido linfóide intestinal de células T CD4. A depleção da população intestinal de células T CD4 desarranja completamente a regulação imune da flora intestinal normal e a manutenção do epitélio da mucosa intestinal, levando a vazamentos e diarreia. Os macrófagos, as DCs, as células T de memória e as células estaminais hematopoiéticas são persistentemente infectados com HIV e são os principais reservatórios e meios de distribuição de HIV (cavalo de Troia). O HIV pode ligar-se à molécula de lectina de DC-SIGN e permanece sobre a superfície das células dendríticas (incluindo as DC foliculares). As células T CD4 podem ser infectadas com o HIV ligado às células ou por transmissão célula a célula do vírus por ligação à DC. No final da progressão da doença, a mutação no gene env para a gp120 ocorre em alguns dos vírus, e isso muda o seu tropismo de M-trópico (R5) a T--trópico (vírus X4). A proteína gp120 do vírus T-trópico liga-se a CD4 e ao receptor da quimiocina CXCR4. Alguns vírus podem utilizar ambos os receptores (vírus R5X4). Essefato expande a diversidade dos alvos virais, de modo a incluir quase todas as células T CD4. A morte de células T CD4 pode resultar da citólise direta induzida pelo HIV (incluindo a formação de sincícios) e citólise imune induzida por células T citotóxicas, mas muitas células T em repouso não permissivas cometem um tipo de suicídio celular inflamatório (piroptose) induzido pela presença de grandes quantidades de cópias de DNA circular não integradas do genoma. A piroptose é uma forma inflamatória de morte celular que pode atrair para o local a ser infectado mais células-T inativadas, que podem, por sua vez, também sucumbir à piroptose. IMUNIDADE A maioria das infecções pelo HIV-1 ocorre por meio das mucosas do trato genital ou retal durante a relação sexual. Nas primeiras horas após a infecção pela via sexual, o HIV e células infectadas atravessam a barreira da mucosa, permitindo que o vírus se estabeleça no local de entrada e continue infectando linfócitos T-CD4+, além de macrófagos e células dendríticas (MCMICHAEL et al.,2010; KAHN; WALKER, 1998). Após a transmissão do vírus, há um período de aproximadamente dez dias, denominado faz eclipse, antes que o RNA viral seja detectável no plasma (MCMICHAEL et al.,2010). Estudos que utilizaram técnicas avançadas de sequenciamento genético das primeiras partículas virais detectadas no plasma permitiram demonstrar que aproximadamente 80% das infecções sexuais pelo HIV-1 dos subtipos B e C são iniciadas por um único vírus. A homogeneidade do vírus, dito fundador, indica que o estabelecimento da infecção é resultado de um único foco de linfócitos T-CD4+ infectados da mucosa (KEELE et al., 2008; SALAZAR-GONZALEZ et al., 2009). A resposta imunológica inata que se estabelece no foco da infecção atrai uma quantidade adicional de células T, o que, por sua vez, aumenta a replicação viral (MCMICHAEL et al., 2010). A partir dessa pequena população de células infectadas, o vírus é disseminado inicialmente para os linfonodos locais e depois sistemicamente, em número suficiente para estabelecer e manter a produção de vírus nos tecidos linfoides, além de estabelecer um reservatório viral latente, principalmente em linfócitos T-CD4+ de memória. A replicação viral ativa e a livre circulação do vírus na corrente sanguínea causam a formação de um pico de viremia por volta de 21 a 28 dias após a exposição ao HIV. Essa viremia está associada a um declínio acentuado no número de linfócitos T-CD4+ (MCMICHAEL et al.,2010; KAHN; WALKER, 1998). Na fase de expansão e disseminação sistêmica, há a indução da resposta imunológica, mas esta é tardia e insuficiente em magnitude para erradicar a infecção. A ativação imune, por outro lado, produz uma quantidade adicional de linfócitos T-CD4+ ativados que servem de alvo para novas infecções. Ao mesmo tempo, o número crescente de linfócitos T-CD8+ exerce um controle parcial da infecção, mas não suficiente para impedir, na ausência de terapia, a lenta e progressiva depleção de linfócitos T-CD4+ e a eventual progressão para a síndrome da imunodeficiência adquirida (aids) (MCMICHAEL et al.,2010). A progressão da infecção pelo HIV se relaciona com a disseminação do vírus a partir do sítio inicial de infecção para os tecidos linfoides de todo o corpo. A resposta imune controla temporariamente a infecção aguda, mas não evita o estabelecimento da infecção crônica das células do tecido linfoide. O estímulo de citocinas induzido por outros microrganismos atua para aumentar a produção do HIV e a progressão para a AIDS. A ativação de linfócitos T-CD8+ específicos contra o HIV ocorre normalmente antes da soroconversão. O aparecimento de uma resposta imune celular HIV-específica e a subsequente síntese de anticorpos anti-HIV levam a uma queda da carga viral plasmática (viremia) – até um nível (set point) que é específico de cada indivíduo – e à cronicidade da infecção pelo HIV. A resposta imune mediada por células é mais importante do que a resposta imune humoral no controle da replicação viral durante a infecção aguda, mas os anticorpos têm um papel relevante na redução da disseminação do HIV na fase crônica da infecção (MCMICHAEL et al.,2010; KAHN; WALKER, 1998; SALAZAR-GONZALEZ et al., 2009). A resposta imunológica humoral contra vários antígenos virais é vigorosa. A maioria das proteínas do HIV é imunogênica, mas uma resposta de anticorpos precoce e preferencial é induzida contra as glicoproteínas do envelope, a gp120 e a gp41, e contra a proteína do capsídeo viral, a p24 (MCMICHAEL, et al., 2010; GANDHI; WALKER, 2002). As glicoproteínas virais são produzidas pela clivagem proteolítica da poliproteína codificada pelo gene env. O tamanho das glicoproteínas difere entre cada grupo de vírus. Por exemplo, a (glicoproteína) gp62 do HTLV-1 é clivada em gp46 e p21, e a gp160 do HIV é clivada em gp41 e gp120. Essas glicoproteínas formam espículas trímeras com a ponta arredondada (em formato de pirulito) que são visíveis sobre a superfície do vírion. A maior glicoproteína do HIV, a gp120, se liga aos receptores da superfície celular, determina o tropismo tecidual primário do vírus e é reconhecida por anticorpos neutralizantes. A subunidade menor (gp41 do HIV) forma o cabo do pirulito e promove a fusão célula a célula. A gp120 do HIV é extremamente glicosilada; por conseguinte, sua antigenicidade pode ser alterada. Além disso, a especificidade ao receptor pode sofrer alterações por mutações ocorridas durante infecção crônica por HIV. Esses fatores impedem a eliminação do vírus pelo anticorpo. DIAGNÓSTICO Testes para detectar a infecção por HIV são realizados por uma de quatro razões: (1) identificar indivíduos com a infecção nos quais a terapia medicamentosa antiviral possa ser iniciada; (2) identificar portadores que possam transmitir a infecção a outros (especialmente doadores de sangue ou órgãos, gestantes e parceiros sexuais); (3) acompanhar o curso da doença e confirmar o diagnóstico de AIDS; ou (4) avaliar a eficácia do tratamento. Como em qualquer infecção viral, observa-se primeiramente um predomínio de IgM e posteriormente de IgG. Entretanto, ao contrário de outras doenças infecciosas, a presença da IgM não permite diferenciar uma infecção recente de uma infecção crônica, tendo em vista que a IgM pode reaparecer em outros momentos durante o curso da infecção. A IgG anti-HIV atinge níveis séricos elevados e persiste por anos, enquanto os níveis séricos de IgM tendem a desaparecer com o tempo ou apresentar padrão de intermitência (MCMICHAEL, et al., 2010). Linfócitos TCD4+: quantificar os linfócitos. Anticorpos: detectar Ig presente (IgM e IgG). Carga viral: quantidade de material genético observado (Ag. Viral; p24). Uma compreensão detalhada do tempo de curso da viremia e da soroconversão durante a infecção primária pelo HIV é pré-requisito importante para entender e aper-feiçoar fluxogramas diagnósticos. Nesse sentido, Fiebig et al. (2003) propuseram um sis-tema de estagiamento laboratorial da infecção recente pelo HIV-1 que inclui também projeções da duração de cada estágio, com base no padrão de reatividade de diferentes ensaios – RNA viral, antígeno p24, imunoensaio (IE) de terceira geração e western blot (WB) (Figura 13) (FIEBIG et al., 2003). Uma primeira observação importante é a de que a reatividade dos diferentes tipos de ensaios para a detecção da infecção pelo HIV progride sequencialmente e permite que a cada aparecimento de um marcador na circulação seja atribuído um estágio à in-fecção. Assim, cada um dos seis estágios é definido por um padrão único de reatividade a um ou mais ensaios (FIEBIG et al., 2003; COHEN et al., 2010). Material genético continua detectável sempre Abordagem inicial A abordagem laboratorial no início do acompanhamentoclínico auxilia a avaliação da condição geral de saúde, a pesquisa de comorbidades, a presença de coinfecções e a urgência no início da TARV. Também fornece informações laboratoriais basais pré-tratamento, bem como orienta sobre a necessidade de imunizações ou profilaxias. O Quadro abaixo indica os exames que devem ser solicitados na primeira consulta. CUIDADO CONTÍNUO O cuidado contínuo em HIV pode ser entendido como o processo de atenção aos usuários que vivem com HIV, passando pelos seguintes momentos: Esses cinco momentos são representados como uma sequência de degraus na chamada “Cascata de cuidado contínuo do HIV” e têm sido usados globalmente para estabelecer metas e monitorar os avanços relativos ao cuidado das PVHIV (pessoas vivendo com HIV). No que diz respeito ao cuidado clínico e a atuação nos serviços brasileiros, definem-se os momentos de “vinculação”, “retenção” e “adesão” da seguinte forma: Vinculação: é o processo que consiste no acolhimento, orientação, direcionamento e encaminhamento de uma pessoa recém-diagnosticada com HIV ao serviço de saúde para que ela realize as primeiras consultas e exames o mais brevemente possível e desenvolva autonomia para o cuidado contínuo. O desfecho principal para considerar uma PVHIV vinculada e a realização da 1a consulta no serviço de atenção para o qual foi encaminhada e, de preferência, seu início de tratamento o mais rápido possível. Retenção: é o processo que consiste no acompanhamento clínico regular e contínuo da pessoa que vive com HIV já vinculada ao serviço de saúde, garantindo que ela compareça às consultas, faca exames regularmente e, se estiver em terapia, realize também o seguimento do seu tratamento, respeitando a sua autonomia. Um paciente retido no serviço é aquele que realiza exames e/ou retira os medicamentos antirretrovirais sistematicamente, sem faltar as consultas. Adesão ao tratamento: consiste na utilização ideal dos medicamentos ARV da forma mais próxima possível aquela prescrita pela equipe de saúde, respeitando as doses, horários e outras indicações. A adesão também e um processo colaborativo que facilita a aceitação e a integração de determinado esquema terapêutico no cotidiano das pessoas em tratamento, pressupondo sua participação nas decisões sobre a terapia (MCCP). PREVENÇÃO O termo Prevenção Combinada do HIV refere-se a diferentes ações de prevenção, tanto as diretamente voltadas ao combate do HIV quanto aos fatores associados à infecção. Assim, sua definição parte do pressuposto de que diferentes ações devem ser conciliadas em uma ampla estratégia, mediante a combinação dos três eixos de intervenções para prevenção ao HIV: as biomédicas, as comportamentais e as estruturais. A associação dessas diferentes abordagens não encerra, contudo, todos os significados e possibilidades do termo “Prevenção Combinada”. Intervenções biomédicas: aquelas cujo foco está na redução do risco à exposição dos indivíduos ao HIV. Intervenções comportamentais: aquelas cujo foco está na abordagem dos diferentes graus de risco a que os indivíduos estão expostos. Intervenções estruturais: remetem às estratégias voltadas a interferir nos aspectos sociais, culturais, políticas e econômicos que criam ou potencializam vulnerabilidades dos indivíduos ou segmentos sociais em relação ao HIV. PrEP Determinados segmentos populacionais, devido a vulnerabilidades especificas, estão sob maior risco de se infectar pelo HIV, em diferentes contextos sociais e tipos de epidemia. Essas populações, por estarem sob maior risco, devem ser alvo prioritário para o uso de PrEP. Esses subgrupos populacionais são gays e outros HSH, pessoas que usam drogas, profissionais do sexo e pessoas trans. Pessoas em parceria soro discordante para o HIV também são consideradas prioritárias para uso da PrEP. As evidências cientificas já indicam a baixa transmissibilidade de HIV por via sexual quando uma pessoa HIV positiva está sob terapia antirretroviral (TARV) há mais de seis meses, apresenta carga viral indetectável e não tem nenhuma outra IST. Adicionalmente, entende-se que a PrEP pode ser utilizada pelo(a) parceiro(a) soronegativo(a) como forma complementar de prevenção para casos de relato frequente de sexo sem uso de preservativo, múltiplas parcerias e/ou para o planejamento reprodutivo de casais soro discordantes. No entanto, outros fatores devem ser considerados e não apenas o pertencimento a um desses grupos, como busca repetida por PEP, histórico e episódios de ISTs, repetição de práticas sexuais anais e/ou vaginais com penetração sem uso de preservativo, entre outros. PrEP faz parte das estratégias de prevenção combinada do HIV. Dentro do conjunto de ferramentas da prevenção combinada, inserem-se também: 1. Testagem para o HIV; 2. Profilaxia Pós-Exposição ao HIV (PEP); 3. Uso regular de preservativos; 4. Diagnostico oportuno e tratamento adequado de infecções sexualmente transmissíveis (IST); 5. Redução de danos; 6. Gerenciamento de vulnerabilidades; 7. Supressão da replicação viral pelo tratamento antirretroviral; 8. Imunizações. Profilaxia Pré Exposição: a PrEP é a combinação de dois medicamentos (tenofovir desoproxila + entricitabina) que bloqueiam alguns “caminhos” que o HIV usa para infectar seu organismo. Se você tomar PrEP diariamente, a medicação pode impedir que o HIV se estabeleça e se espalhe em seu corpo. Mas ATENÇÃO: a PrEP só tem efeito se você tomar os comprimidos todos os dias. Caso contrário, pode não haver concentração suficiente do medicamento em sua corrente sanguínea para bloquear o vírus. PEP A Profilaxia Pós-Exposição (PEP) ao HIV, hepatites virais, sífilis e outras infecções sexualmente transmissíveis (IST) consiste no uso de medicamentos para reduzir o risco de adquirir essas infecções. Profilaxia Pós Exposição: A PEP é uma medida de prevenção de urgência à infecção pelo HIV, hepatites virais e outras infecções sexualmente transmissíveis (IST), que consiste no uso de medicamentos para reduzir o risco de adquirir essas infecções. Deve ser utilizada após qualquer situação em que exista risco de contágio, tais como: • Violência sexual; • Relação sexual desprotegida (sem o uso de camisinha ou com rompimento da camisinha); • Acidente ocupacional (com instrumentos perfurocortantes ou contato direto com material biológico). O primeiro atendimento após a exposição ao HIV e uma urgência. A PEP deve ser iniciada o mais precocemente possível, tendo como limite as 72 horas subsequentes a exposição. No atendimento inicial, após a exposição ao HIV, e necessário que o(a) profissional avalie como, quando e com quem ocorreu a exposição. Didaticamente, quatro perguntas direcionam o atendimento para decisão da indicação ou não da PEP. A PrEP não protege das outras IST ou das hepatites virais. Recomenda-se orientar os usuários sobre as estratégias de redução de risco, sendo o uso do preservativo a melhor proteção para as IST. Existem materiais biológicos sabidamente infectantes e envolvidos na transmissão do HIV. Assim, a exposição a esses materiais constitui situação na qual a PEP está recomendada. Existem exposições com risco de infecção envolvidas na transmissão do HIV. Assim, a exposição constitui situação na qual a PEP está recomendada. Exposição com risco de transmissão do HIV: • Percutânea – Exemplos: lesões causadas por agulhas ou outros instrumentos perfurantes e/ou cortantes; • Membranas mucosas – Exemplos: exposição sexual desprotegida; respingos em olhos, nariz e boca; • Cutâneas envolvendo pele não integra – Exemplos: presença de dermatites ou feridas abertas; • Mordeduras com presença de sangue – Nesses casos, os riscos devem ser avaliados tanto para a pessoa que sofreu a lesão quanto para aquela que a provocou. Exposição sem risco de transmissãodo HIV: • Cutâneas, exclusivamente, quando a pele exposta se encontra íntegra; • Mordedura sem a presença de sangue. IMUNIZAÇÕES Adultos e adolescentes vivendo com HIV podem receber todas as vacinas do calendário nacional, desde que não apresentem deficiência imunológica importante. À medida que aumenta a imunodepressão, eleva-se também o risco relacionado a administração de vacinas de agentes vivos, bem como se reduz a possibilidade de resposta imunológica consistente. Sempre que possível, deve-se adiar a administração de vacinas em pacientes sintomáticos ou com imunodeficiência grave (contagem de LT-CD4+ abaixo de 200 células/mm3), até que um grau satisfatório de reconstituição imune seja obtido com o uso de TARV, o que proporciona melhora na resposta vacinal e redução do risco de complicações pós-vacinais. A administração de vacinas com vírus vivos atenuados (poliomielite oral, varicela, rubéola, febre amarela, sarampo e caxumba) em pacientes com imunodeficiência esta condicionada a análise individual de risco-benefício e não deve ser realizada em casos de imunodepressão grave (quadro 9). Adiar vacinas em sintomáticos ou com imunodeficiência grave até que um grau satisfatório de reconstituição imune seja obtido com o uso de TARV. O quadro 10 aborda o esquema vacinal básico para adultos e adolescentes vivendo com HIV: EXISTE CURA? Controladores de elite: menos de 0,5% podem controlar a infecção de forma espontânea. Nesses casos, o vírus é suprimido pelas defesas da pessoa e é indetectável, sendo que a transmissão por via sexual, assim como nos pacientes com carga viral indetectável, não ocorre. Referências Não há fontes bibliográficas no documento atual. O desenvolvimento de uma vacina é prioridade em laboratórios de todo o mundo. Referências MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Para Manejo da Infecção Pelo HIV Em Adultos. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2013/protocolo-clinico-e-diretrizes- terapeuticas-para-manejo-da-infeccao-pelo-hiv-em-adultos MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Para Profilaxia Pós-Exposição (Pep) de Risco À Infecção Pelo HIV, IST e Hepatites Virais. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt- br/pub/2015/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-profilaxia-pos-exposicao-pep-de-risco MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Para Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) de Risco À Infecção Pelo HIV. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/protocolo- clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-profilaxia-pre-exposicao-prep-de-risco MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018. Manual Técnico para o Diagnóstico da Infecção pelo HIV em Adultos e Crianças. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/node/57787 ABBAS, Abul K.; Imunologia Celular e Molecular, 9ed. Capítulo 20 – Imunodeficiências Congênitas e Adquiridas. MURRAY, Patrick R. et al.; Microbiologia Médica, 8ed. Capítulo 54 – Retrovírus. CDC – Center for Disease Control and Prevention. HIV, How can I protect my partners?. Disponível em: https://www.cdc.gov/hiv/basics/index.html Hoffmann CJ, Gallant JE. HIV and Aids. ACP Medicine. 2007;1-33. SANTOS, Norma Suely de Oliveira; ROMANOS, Maria Teresa Villela; WIGG, Marcia Dutra; Virologia Humana, 3ed. Capítulo 19 – Síndrome da Imunodeficiência Adquirida/AIDS. Timothy Ray Brown, ou Tim Brown, também conhecido como ‘Paciente de Berlim’ em 2008 após transplante de medula para tratar um linfoma. Loreen Willenber contraiu o vírus em 1992 e nunca manifestou um período de viremia detectável, mesmo sem medicamento. Controlador de Elite. Adam Castillejo declarado curado em 2019 após tratamento de transplante por conta de um câncer. Em 2020 paciente brasileiro encontra se a 17 meses sem detecção através de um tratamento experimental com fármacos (porém pouco tempo depois invalidou o estudo). http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2013/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-manejo-da-infeccao-pelo-hiv-em-adultos http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2013/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-manejo-da-infeccao-pelo-hiv-em-adultos http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2015/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-profilaxia-pos-exposicao-pep-de-risco http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2015/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-profilaxia-pos-exposicao-pep-de-risco http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-profilaxia-pre-exposicao-prep-de-risco http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-profilaxia-pre-exposicao-prep-de-risco https://www.cdc.gov/hiv/basics/index.html
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