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DISCURSOS SOBRE 
A INCLUSÃO
DISCURSOS SOBRE 
A INCLUSÃO
Eliana Lucia Ferreira
Eni P. Orlandi
(organizadoras)
Niterói
Intertexto
2014
© 2014 by Eliana Lucia Ferreira, Eni P. Orlani 
Direitos desta edição reservados à Editora Intertexto.
É proibida a reprodução total ou parcial por quaisquer meios, 
sem autorização expressa da editora.
Capa: André Luiz da Fonseca Junior
Projeto gráfico, diagramação e editoração: Camilla Pinheiro
Os textos são de responsabilidade total de seus autores.
Intertexto Editora e Consultoria Ltda
Telefax: (21) 2613-3732
e-mail: intertextoeditora@terra.com.br
Dados internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
D611 Discursos sobre a inclusão / Eliana Lucia Ferreira,
 Eni P. Orlandi (organizadoras) – Niterói :
 Intertexto, 2014. 
 286 p. : il. ; 21 cm. 
 
 
 Inclui bibliografias. 
 ISBN 978-85-7964-046-9 
 
 1. Educação especial. 2. Educação inclusiva. 
 I. Ferreira, Eliana Lucia. II. Orlandi, Eni P. 
 
 CDD 371.9 
SUMÁRIO
 APRESENTAÇÃO ...................................................9
 EQUÍVOCOS QUE CONSTITUEM 
O MACRODISCURSO POLÍTICO-
EDUCACIONAL DA INCLUSÃO
 Juliana Santana Cavallari ............................................ 11
1 INTRODUÇÃO ...........................................................13
2 SOBRE O EQUÍVOCO NA PRODUÇÃO DE 
SENTIDOS OUTROS .................................................17
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .............. 20
4 ANÁLISE DOS REGISTROS ..................................... 23
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................... 39
 REFERÊNCIAS ........................................................... 47
 O DISCURSO DA INCLUSÃO 
PELA DIFERENÇA NA RELAÇÃO 
MÍDIA E SOCIEDADE
 CaCiane Souza de MedeiroS ..........................................51
1 INTRODUÇÃO .......................................................... 53
2 UMA INCLUSÃO PARTIDA ..................................... 54
3 AS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO 
DA INCLUSÃO .......................................................... 62
4 OS SENTIDOS DA INCLUSÃO 
NEOLIBERAL: A CONSTRUÇÃO 
DO SUJEITO ENGAJADO ........................................77
5 POR UMA RETOMADA DA DISCUSSÃO 
SOBRE O CONCEITO DE INCLUSÃO .................. 82
 REFERÊNCIAS ........................................................... 87
 DISCURSIVIDADES DE 
INCLUSÃO E A MANUTENÇÃO 
DA EXCLUSÃO
 GreCiely CriStina da CoSta ......................................... 89
1 INTRODUÇÃO ...........................................................91
2 DISCURSO: SENTIDOS E SUJEITOS .................... 94
3 A SOCIEDADE DA SEGREGAÇÃO ......................... 96
4 SENTIDOS PARA A DIFERENÇA ...........................101
5 CONCLUSÕES .........................................................133
 REFERÊNCIAS ..........................................................135
 FORMAÇÃO OU CAPACITAÇÃO?: 
DUAS FORMAS DE LIGAR 
SOCIEDADE E CONHECIMENTO
 eni PuCCinelli orlandi ...............................................141
1 INTRODUÇÃO ........................................................ 143
2 SOCIEDADE DO CONHECIMENTO E/OU 
SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO? ........................ 148
3 EDUCAR É FORMAR: A LÍNGUA 
ENTRA EM CENA .....................................................153
4 O SUJEITO E O SENTIDO OUTRO: 
A FORMAÇÃO NA RELAÇÃO DA 
LINGUAGEM COM A SOCIEDADE .......................161
5 HISTORICIDADE, ALTERIDADE .......................... 170
6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS ......................178
 REFERÊNCIAS ......................................................... 183
 ACESSIBILIDADE: SENTIDOS 
EM MOVIMENTO
 débora MaSSMann .......................................................191
1 INTRODUÇÃO ........................................................ 193
2 DIVERSIDADE E ACESSIBILIDADE .......................197
3 DO SENTIDO POSTO AO SENTIDO 
FLUIDO .....................................................................202
4 SOBRE O(S) SENTIDO(S) DE 
ACESSIBILIDADE ....................................................208
 REFERÊNCIAS ..........................................................221
 TRAÇO, CORPO, SENTIDO: SOBRE A 
ESCOLA, A CRIANÇA E A ESCRITA
 renata ChryStina bianChi de barroS ........................ 225
1 INTRODUÇÃO ........................................................ 227
2 A ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL 
CONTEMPORÂNEA: A PEDAGOGIZAÇÃO 
DO CORPO ..............................................................234
3 DO CORPO BIOLÓGICO AO 
CORPO-SENTIDO ..................................................246
4 O SUJEITO DA ESCOLA 
CONTEMPORÂNEA ............................................... 255
5 DO APRISIONAMENTO À SUBVERSÃO: 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................260
 REFERÊNCIAS .........................................................265
 EDUCAÇÃO FÍSICA: 
EM BUSCA DE UMA NOVA 
A RE-SIGNIFICAÇÃO
 eliana luCia Ferreira .................................................269
1 INTRODUÇÃO .........................................................271
2 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................... 281
 REFERÊNCIAS .........................................................285
9
APRESENTAÇÃO
Atualmente, o processo de inclusão escolar e 
social é um “movimento em movimento”, com ra-
mificações em compromissos individuais em prol de 
compromissos coletivos, com a pretensão de resol-
ver as insuficiências de um sistema social, se posi-
cionando como um desejo de completude político/
educacional.
Portanto, os discursos sobre a inclusão aqui 
apresentados inserem-se em um contexto de de-
bates e posicionamentos trazidos pela legislação, 
pela educação e pela política na sua dimensão so-
cial mais ampla.
O que se percebe é que há um jogo de diver-
gências e convergências entre os movimentos so-
ciais legitimados para se instaurarem na diversidade, 
mas há também uma resistência silenciada. E é nes-
te contexto que o movimento da inclusão recobre-
-se de sentidos, agregando valoração simbólica. 
10
Portanto, as questões, aqui, não somente con-
tribuem para a inclusão social, mas também encon-
tram ressonância em práticas inclusivas voltadas 
para a educação de um modo geral.
Sendo assim, esta obra é marcada pela plura-
lidade de discursos que recolocam a questão da 
inclusão em um universo mais amplo de possibili-
dades de compreensão das marcas históricas e dos 
sentidos das relações sociais.
Juliana Santana Cavallari**
EQUÍVOCOS QUE 
CONSTITUEM O 
MACRODISCURSO 
POLÍTICO-
EDUCACIONAL 
DA INCLUSÃO*
* Uma versão primeira deste trabalho foi publicada na Revista Brasileira de Linguística 
Aplicada (RBLA). 
** Doutora e pós-doutora pela UNICAMP. Professora do Programa de Mestrado em 
Ciências da Linguagem da Universidade do Vale do Sapucaí (UNIVÁS).
Não há verdade que, ao passar 
pela atenção, não minta.
laCan
13
1 INTRODUÇÃO
Na tentativa de promover a democratização da 
escola e do ensino, uma série de ações políticas foi 
adotada pelo governo, sobretudo a partir da déca-
da de 1990 (VIZIM, 2003). Através da Declaração da 
Educação para Todos (1990), da Política Nacional de 
Educação Especial (1994), dentre outras propostas, 
buscou-se, por meio da adoção depráticas inclusi-
vas, atender às necessidades dos excluídos, isto é, 
daqueles que sofrem algum tipo de privação social, 
física ou cognitiva. Assim sendo, o macrodiscurso 
político-educacional, difundido não só por gover-
nantes ou representantes legais, mas, em especial, 
por agentes educacionais1 tende a reforçar e a asse-
gurar a aplicação de políticas inclusivas, o que, ima-
ginariamente, possibilitaria um processo de ensino e 
aprendizagem mais justo e igualitário.
Recentemente, o Governo Federal anunciou 
um grande investimento na Educação Especial, com 
vistas à efetivação de práticas inclusivas e à oferta 
de educação de qualidade para todos. Vale desta-
car que o enunciado “educação para todos” exerce 
o efeito de slogan ou propaganda do atual gover-
1 Neste estudo, 
adotamos o termo 
“agente educacional” 
não no sentido 
de agenciar ou de 
agenciadores, mas 
sim para designar os 
sujeitos que exercem 
funções que incidem 
diretamente no 
ato educativo, 
como professores, 
diretores, 
coordenadores, 
supervisores etc.
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Realce
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Realce
14
no, além de ser frequentemente empregado como 
promessa primordial de campanha de futuros go-
vernantes, de modo geral. Não é por acaso que, ao 
longo deste texto, adotamos o termo “macrodiscur-
so político-educacional da inclusão” para nos re-
ferirmos ao objeto de análise deste texto, graças a 
aparente fusão, ou melhor, (con)fusão que parece 
afetar o discurso político e o discurso da educação 
formal acerca da inclusão, já que passam a funcionar 
quase que indistintamente, na tentativa de viabilizar 
a educação inclusiva e suas diretrizes já anunciadas 
e prescritas em documentos oficiais. Tomamos essa 
(con)fusão de discursividades que, por sua vez, nos 
remete a uma mesma formação discursiva acerca da 
inclusão, como um macrodiscurso que se apresen-
ta como verdadeiro e já legitimado e que, portanto, 
incide direta e indiretamente nos diversos âmbitos 
sociais e, sobretudo, no contexto educacional.
O objetivo específico deste estudo é desve-
lar o modo como intra e interdiscursivamente2 o 
discurso da inclusão – que se materializa em prá-
ticas inclusivas tidas como politica e moralmente 
corretas – produz efeitos de sentido e de verda-
de em nosso meio sócio-histórico. Para tanto, nos 
2 De acordo com a 
Análise de Discurso 
de linha francesa, 
que fundamenta 
este estudo, o 
intradiscurso se 
refere à aparente 
linearidade do 
dizer, ao passo que 
o interdiscurso, 
que atravessa o 
fio discursivo à 
revelia do sujeito 
de linguagem, nos 
remete ao “conjunto 
de formulações 
feitas e já esquecidas 
(já-ditos) que 
determinam o que 
dizemos” (ORLANDI, 
1999, p. 33).
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Realce
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Realce
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15
pautamos nos seguintes questionamentos: como 
as noções de inclusão e diferença (con)formam e 
engendram o dizer-fazer de agentes educacionais? 
Como educação e inclusão se relacionam e afetam 
as práticas discursivo-pedagógicas? Partindo do 
pressuposto de que a prática e política inclusivas 
evocam noções e representações que significam 
em oposição e por meio de pares dicotômicos (in-
clusão x exclusão; igualdade x diferença) já natura-
lizados no contexto escolar, levantamos a hipótese 
de que a educação inclusiva (EI) silencia e apaga 
a(s) diferença(s) e o diferente, já que “incluir” pro-
duz o efeito de sentido de “normalizar” ou de “tor-
nar o outro meu semelhante”.
Como material de pesquisa foram utilizados 
alguns depoimentos proferidos por agentes edu-
cacionais (professores, assistentes, coordenadores 
de cursos, diretores, pedagogos e psicólogos), por 
ocasião de algumas palestras e seminários realiza-
dos em um congresso nacional cujo tema era “in-
clusão e diversidade”. Trata-se de um amplo even-
to realizado anualmente, no estado de São Paulo, 
e que reúne profissionais da educação de diversos 
campos do saber e de diversas áreas de atuação.
klevi
Realce
16
Do ponto de vista teórico, os pressupostos da 
Análise de Discurso de linha francesa (ADF), que 
postula a determinação inconsciente e ideológica 
do sujeito e da linguagem, fundamentam a análise 
dos registros e as considerações aqui propostas.
Em última instância, o presente estudo sugere o 
acolhimento das diferenças e da ingovernabilidade 
que, vez por outra, irrompem no contexto escolar, 
de modo que possamos atuar como agentes edu-
cacionais, no sentido de não temermos ou ficarmos 
passivos diante do inesperado, mas de concebermos 
a diferença e o diferente como fatores produtivos 
que provocam transformações em todos os partici-
pantes do contexto escolar, independentemente da 
função exercida, deslocando saberes pré-construí-
dos ou já normalizados sócio-historicamente.
 A seguir, abordamos o conceito de equívoco 
que se mostrou bastante produtivo para o desenvol-
vimento da parte analítica deste estudo.
17
2 SOBRE O EQUÍVOCO NA 
PRODUÇÃO DE SENTIDOS 
OUTROS
Tendo em vista a problemática levantada neste 
estudo “o equívoco no discurso da inclusão”, faz-
-se necessário adentrarmos o conceito de equívoco 
que viabilizou o recorte discursivo efetuado no ma-
terial de análise.
 De acordo com a perspectiva discursiva, o 
equívoco produz uma falha materializada na/pela 
língua, à revelia do sujeito enunciador. Essa falha não 
pode ser recoberta, levando à produção de sentidos 
outros, por vezes indesejáveis, e que denunciam a 
posição discursiva, portanto ideológica, ocupada 
pelo sujeito de linguagem, bem como as formações 
discursivas em que seu dizer se inscreve para pro-
duzir efeitos de verdade e de evidência enunciativa. 
Nesse prisma, não é o sujeito que fala a língua, mas 
sim a língua que fala e (d)enuncia o posicionamento 
do sujeito enunciador, uma vez que aponta para as 
suas formações ideológicas e para os vários discur-
sos que legitimam seu dizer. 
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18
Convém ressaltar que o sujeito constituído na/
pela linguagem, tal como postula Pêcheux, não 
é causa nem origem dos sentidos que produz ao 
enunciar, pois surge como efeito do assujeitamento 
à linguagem que, por sua vez, não pode ser tomada 
como mero instrumento de comunicação, dada sua 
opacidade e não transparência. Estabelecendo um 
possível diálogo entre as perspectivas que embasam 
este estudo, tanto para a AD como na Psicanálise, o 
dizer não é transparente ao enunciador, pois o sen-
tido lhe escapa, irrepresentável, em sua determina-
ção pelo inconsciente e pelo interdiscurso. 
Essa duplicidade, que faz referir um discur-
so a um discurso outro para que ele faça 
sentido, na psicanálise, envolve a questão 
do inconsciente. Na análise de discurso, 
essa duplicidade, esse equívoco, é trabalha-
do como a questão ideológica fundamen-
tal, pensando a relação material do discurso 
à língua e a da ideologia ao inconsciente 
(ORLANDI, 1996, p. 81-82).
A noção de equívoco ou de equivocidade que 
suporta o duplo, o heterogêneo ou, ainda, tudo 
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19
aquilo que ultrapassa a vontade do sujeito enun-
ciador, também se faz presente na psicanálise. Em 
ambas as perspectivas teóricas, a verdade não se 
apresenta na aparente unidade discursiva, mas se dá 
a escutar através de formações do inconsciente ou 
da equivocidade que é própria da linguagem. Nas 
palavras de Lacan (1986, p. 302), “nossas palavras 
que tropeçam são as palavras que confessam. Elas 
revelam uma verdade de detrás”.
Com base nas considerações arroladas é pos-
sível afirmar que, estruturalmente, todo e qualquer 
dizer é tomado pelo equívoco ou pela possibilida-
de de deriva de sentidos, uma vez que o sujeito de 
linguagem é duplamente marcado: pela ideologia e 
pelo inconsciente. Ao encontro de tais afirmações, 
Mariani (2006, p. 8) postula que o equívoco se ins-
taura nos sentidos produzidos por um determinado 
acontecimento discursivo, à revelia do sujeito enun-
ciador, e “faz falhar a vontade de unidadee trans-
parência da comunicação, pois incorpora o real em 
suas análises do simbólico e do imaginário”. São 
justamente esses pontos de equívoco ou de deslize 
de sentidos que se dão a escutar na materialidade 
posta, que buscamos resgatar e problematizar na 
klevi
Realce
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20
análise dos acontecimentos discursivos, de modo a 
melhor compreender como a prática inclusiva signi-
fica no contexto escolar.
3 PROCEDIMENTOS 
METODOLÓGICOS
Como já mencionado anteriormente, lança-
mos um olhar discursivo ao corpus, para entendê-
-lo não como conteúdo ou testemunho de verda-
de, mas para desvelar, nos enunciados analisados, 
a formação discursiva em que o sujeito de lingua-
gem se inscreve, para que suas palavras tenham 
sentido (ORLANDI, 1996). Em suma, a abordagem 
discursiva ancora a análise dos registros na ma-
terialidade linguística, “desnudando” os aspectos 
sócio-histórico-ideológicos que atuam na consti-
tuição dos sentidos e que são “esquecidos” pelo 
sujeito que enuncia.
Vale salientar, ainda, de que forma os pressu-
postos da ADF e da psicanálise dialogam entre si, 
fornecendo as balizas teórico-metodológicas des-
te estudo. Para a AD, o funcionamento discursivo é 
21
engendrado pela articulação entre a ideologia e as 
condições de produção do discurso, isto é, o con-
texto sócio-histórico de sua enunciação e o lugar 
discursivo ocupado pelo falante. Na teoria psica-
nalítica, por sua vez, a determinação dos sujeitos e 
dos sentidos é inconsciente e atemporal e só se faz 
acessível por meio da linguagem que comporta fa-
lhas ou buracos. Feitas essas colocações, postula-
-se uma relação da ideologia com o inconsciente, 
por meio da linguagem, ou seja, a ideologia, assim 
como o inconsciente, embora oculta ao sujeito 
enunciador, se mostra no funcionamento do discur-
so: da estrutura ao acontecimento. Pêcheux (1997) 
reflete sobre a materialidade da linguagem como 
região de equívoco em que se ligam materialmente 
o inconsciente e a ideologia. Dito de outro modo, 
o sujeito da estrutura é afetado pela determinação 
inconsciente que faz com que as redes de memória 
e as formações ideológicas, às quais o discurso e o 
sujeito se filiam para produzir sentidos, escapem ao 
saber consciente do eu. Observa-se, portanto, que o 
funcionamento da ideologia não constitui um saber 
consciente, embora seja condição de existência do 
sujeito e do discurso, uma vez que governa e atribui 
sentidos ao fazer-dizer.
22
Nas análises que se seguem, foram destacadas 
algumas regularidades que constituem equívocos 
de ordem ideológica e que, em função dos senti-
dos que produzem, para além do saber consciente 
do enunciador, apontam para a posição discursiva 
e ideológica do sujeito de linguagem em relação à 
proposta de educação inclusiva.
Convém retomar que os excertos analisados 
foram coletados durante um congresso nacional, 
sediado em uma instituição particular de ensino su-
perior do Estado de São Paulo, cuja proposta era dis-
cutir questões acerca da inclusão e da diversidade. 
Durante a realização de algumas palestras e semi-
nários, agentes educacionais que exercem funções 
distintas no contexto escolar como: professores, re-
presentantes do MEC, diretores, pedagogos, entre 
outros, formularam algumas considerações sobre o 
referido tema. Algumas dessas formulações foram 
transcritas e, posteriormente, selecionadas para este 
estudo, a fim de elucidarmos alguns questionamen-
tos aqui propostos. A análise empreendida não tem 
a pretensão de concordar ou discordar com o teor 
do que está sendo dito, tampouco de acusar ou cul-
par os sujeitos de pesquisa pelos equívocos desta-
23
cados em suas formulações, mas sim de compre-
ender como essas formulações produzem sentidos, 
ao evocarem outros domínios discursivos. Dito de 
outro modo, não se trata de individualizar ou res-
ponsabilizar o sujeito de pesquisa por suas supostas 
falhas ou equívocos de ordem inconsciente, mas de 
compreendermos como as práticas discursivas fun-
cionam e provocam efeitos de legitimidade.
4 ANÁLISE DOS REGISTROS
De modo a elucidar as perguntas de pesquisa que 
direcionam a análise dos registros discursivos – como 
os conceitos de inclusão e diferença (con)formam e 
engendram o dizer-fazer de agentes educacionais? 
Como “educação” e “inclusão” se relacionam e afetam 
práticas discursivo-pedagógicas? – faz-se necessário 
rastrearmos a presença do interdiscurso que interpela 
e legitima os depoimentos proferidos pelos sujeitos 
pesquisados. Passemos à análise do corpus.
Por ocasião da palestra de abertura do referido 
congresso, o reitor da universidade onde o evento 
foi sediado proferiu:
24
[RD 1]3 Incluir na pauta um congresso de in-
clusão e diversidade visa a resolver melhor 
esta situação no Brasil. De mãos dadas pre-
tendemos caminhar neste tema com a par-
ticipação efetiva da universidade. A inclusão 
é abrangente e parece imposta. Podemos 
dar uma contribuição social, ao propor o 
desmonte de mecanismos de exclusão.
Com base no excerto acima, observa-se que 
o sujeito de linguagem, ocupando o lugar de reitor 
de uma instituição de ensino superior, inicia sua fala 
reiterando a necessidade de promover a inclusão 
“com a participação efetiva da universidade”. A ma-
terialidade posta põe em evidência a função política 
e social que a escola e seus agentes devem exercer 
e que parece se sobrepor, ou até mesmo se impor, 
à função de ensinar e de transmitir saberes. Mais 
especificamente, a universidade e seus represen-
tantes passaram a exercer a função de hospedar o 
diferente sem, de fato, incluí-lo de modo significa-
tivo, tendo em vista que é para os normais e para os 
profissionais que têm seu saber cientifica e social-
mente legitimado que é dado o direito e o poder de 
construir saberes, julgamentos e verdades sobre os 
3 RD 1, 2, 3… é o 
símbolo adotado 
para representar os 
recortes discursivos 
analisados.
25
que são representados e marcados como anormais 
e excluídos. Nesse sentido, o processo de constru-
ção do saber sobre o excluído acaba por exclui-lo 
dessa construção, pois este é tomado como objeto 
do olhar e do saber do outro, cujo lugar enunciativo 
tem certo valor e reconhecimento social. 
Ferre (2001) salienta a contradição inerente ao 
saber produzido na/pela universidade, via práticas 
discursivo-pedagógicas. Nas palavras da autora 
(FERRE, 2001, p. 199),
O que na Universidade se produz pode ser 
tudo ao contrário: nenhuma reflexão sobre 
um sujeito próprio, nenhum saber ou sabor 
acerca de nossa intimidade e um acúmulo 
de conteúdos sobre o outro que o define, 
o identifica e o encerra em um opaco en-
voltório tecnicista que faz dos demais os 
especiais, os descapacitados, os diferentes, 
os estranhos, os diversos e de nós os ob-
viamente normais, os capacitados, os nati-
vos, os iguais; e, por isso, dois são os tipos 
de identidade que a Universidade segue 
produzindo ao transmitir o conhecimento 
26
acadêmico, científico e técnico que alude 
à diferença e à diversidade na educação: a 
identidade normal e a identidade anormal; é 
a esta segunda a que se passou a chamar de 
diferente, especial ou diversa.
A repetição redundante do termo “incluir”, que no 
recorte acima é pronunciado três vezes, sem que haja 
qualquer questionamento do tipo: incluir o que, quem 
e como? sugere a naturalização de verdades discur-
sivamente construídas e que se materializam no/pelo 
macrodiscurso político-educacional, ao representar a 
proposta de educação inclusiva como um compromis-
so de todos ou, segundo o enunciador, como um meio 
de “dar uma contribuição social e de resolver melhor 
esta situação no Brasil”. Na formulação em questão, 
o sujeito de linguagem deixa escapar que a inclusão é 
uma situação problemática que ainda não se resolveu 
no Brasil, tendo em vista que o que já está resolvido 
não requer melhoras,nem necessita de compreensão. 
O vocábulo “resolver”, empregado na formulação “in-
cluir na pauta um congresso de inclusão e diversida-
de visa a resolver melhor esta situação no Brasil”, nos 
remete a um problema a ser endereçado, no caso: a 
inclusão que “parece imposta”, segundo o enunciador.
27
Ao formular “incluir na pauta”, o enunciador atri-
bui um efeito de formalidade e de certa superficia-
lidade ao tema abordado no congresso: inclusão e 
diversidade, tendo em vista que o vocábulo “pauta” 
costuma ser empregado para se referir aos assuntos 
a serem tratados em uma reunião de trabalho e que 
podem ser sanados ou pelo menos endereçados até 
o seu término. Além disso, a inclusão ou educação 
inclusiva é um assunto que está em pauta ou na or-
dem do dia, em especial, no contexto escolar, em 
função das últimas diretrizes da política nacional da 
educação.
O uso da primeira pessoa do plural, no trecho: 
“de mãos dadas pretendemos caminhar neste tema; 
podemos dar uma contribuição social”, provoca um 
efeito de convocação e de participação de todos 
os agentes educacionais, de modo a viabilizar a in-
clusão que ainda parece não ter sido alcançada, já 
que se trata, ainda, de um “tema” a ser discutido em 
um congresso da área. Esse efeito de convocação é 
produzido pelo discurso progressista e da união so-
cial que versa sobre a união de todos (unidos ven-
ceremos!) como forma de se atingir o progresso e 
a ordem.
28
Embora o enunciador proponha “o desmon-
te de mecanismos de exclusão”, deixando entrever 
certa noção dos mecanismos de poder engendra-
dos pela ideologia vigente, o enunciador parece não 
se dar conta de que a viabilização da inclusão no 
contexto escolar não depende única e exclusiva-
mente da “boa” vontade dos agentes educacionais 
ou de seu poder transformador, uma vez que os tais 
mecanismos de exclusão, bem como o modelo de 
escola excludente que ainda é predominante em 
nosso meio, foram legitimados ao longo de uma 
longa trajetória político-econômica que, por meio 
de práticas discursivas e de jogos de poder-saber, 
segundo uma visão foucaultiana, foram construindo 
verdades sobre os excluídos e sobre a necessida-
de de incluí-los. Nos últimos anos, a insignificância 
e a (in)fâmia4 daqueles que foram discursivamente 
marcados como excluídos parece ganhar relevân-
cia político-social, se tornando alvo das instituições 
“normalizadoras” que atuam como aparelho ideoló-
gico do estado, segundo Althusser (1992), uma vez 
que a exclusão e os excluídos passaram a represen-
tar certa ameaça à acomodação social e ao exercí-
cio da cidadania.
4 Segundo Foucault 
(1992, p. 90), os 
(in)fames não 
são apenas os 
personagens de 
nossa história 
que cometem 
algum ato vil, mas, 
sobretudo, aqueles 
“cuja existência 
foi ao mesmo 
tempo obscura e 
desafortunada”.
29
Ainda em relação ao excerto anterior [RD1], ape-
sar de tentar modalizar o seu dizer sobre a proposta 
da inclusão, ao formular “a inclusão é abrangente e 
parece imposta”, o equívoco que produz sentidos 
“indesejados” marca a posição ideológica do sujeito 
em relação ao tema abordado. O caráter impositivo 
da educação inclusiva se materializa nessa formula-
ção, apontado para o fato de que a inclusão é bas-
tante complexa e não é um procedimento natural, 
pois, se assim o fosse, não precisaria ser apresen-
tada na forma de lei ou de proposta pedagógica a 
ser seguida e nem seria tomada, pelos educadores, 
como uma imposição. Nesse prisma, é significativo 
ressaltar que a natureza humana é mais seletiva do 
que inclusiva, uma vez que, segundo Skliar (2006), 
a diferença tende a ser vista negativamente, pois 
aponta para o intolerável ou para fora da normali-
dade. Em outras palavras, é mais fácil e “natural” ex-
cluir do que tentar incluir. Ao encontro dessas ideias, 
Ferre (2001, p. 197) enfatiza que o mundo dos ditos 
“normais” é um mundo onde “a presença de seres 
diferentes aos demais, diferentes a esses demais ca-
racterizados pelo espelhismo da normalidade, é vi-
vida como uma grande perturbação”.
30
A menção ao caráter impositivo da educação 
que prega a inclusão de todos, preferencialmente 
em turmas de escolas regulares, a despeito da dife-
rença e, por vezes, da deficiência física marcada no 
corpo, também foi observada no excerto a seguir, 
formulado por uma diretora de uma escola pública 
de ensino fundamental:
[RD 2] A inclusão é um susto, um espanto. 
Ela chegou de repente e a gente tem que 
saber o que fazer. Na verdade, ela está entre 
nós desde 71, com a lei 5.692/71.
No recorte em questão, o enunciador deixa es-
capar seu espanto diante da proposta da inclusão, 
apesar de enunciar a partir do lugar de dirigente de 
uma instituição escolar que, em conformidade com 
as leis vigentes, deveria garantir a política de educa-
ção inclusiva. Ao se dar conta do equívoco de ordem 
ideológica que seu dizer produziu, o enunciador faz 
alusão à lei que garante a aplicação de práticas in-
clusivas, por mais espantosas ou assustadoras que 
possam parecer. Assim sendo, apesar de toda in-
segurança vivenciada pelos agentes educacionais 
diante do estranho e do diferente que, na maioria 
31
das vezes, vira sinônimo de deficiente, a necessida-
de de tudo saber e de fornecer respostas acertadas 
para situações inesperadas constitui a identidade do 
sujeito educador, além de governar seu fazer peda-
gógico, tal como sugere a formulação: “a gente ‘tem 
que’ saber o que fazer”.
A formulação posta acima parece dialogar com 
o próximo excerto, formulado por uma pedagoga 
que, no evento em questão, representava o MEC e 
suas propostas:
[RD 3] A dona inclusão não está só batendo 
na porta, ela está dentro da sala de aula. A 
postura do MEC é essa: todos na sala de aula 
e aí a gente vai caprichando na qualidade.
A formulação “a postura do MEC é essa: todos 
na sala de aula e aí a gente vai caprichando na qua-
lidade” reflete as políticas públicas brasileiras que 
se caracterizam pelo improviso e despreparo dos 
profissionais envolvidos em sua implementação, no 
caso: dos agentes educacionais que, mesmo sem a 
formação necessária para trabalhar com os alunos 
ditos especiais, devem acolhê-los no espaço de sala 
32
de aula, ainda que isso implique na má qualidade da 
educação oferecida. Como já sugerido por Coraci-
ni (2007, p. 107), o fato de partilhar do mesmo es-
paço físico não significa “por si só e por força da 
lei, ausência de discriminação, in-clusão, in-serção 
social”. A autora (CORACINI, 2007, p. 109) conclui 
que “a vontade de igualar, de homogeneizar na me-
lhor das intenções [...] é que cava um abismo ainda 
maior entre uns e outros”, ou seja, entre os alunos 
“ditos” normais e os representados como excluídos 
ou especiais. Assim sendo, a própria escola que se 
diz inclusiva acaba construindo muros que marcam 
e segregam a diferença, excluindo ainda mais.
Partindo da premissa de que todos são iguais 
ou, ainda, de que a igualdade é um ideal a ser al-
cançado, a educação inclusiva silencia as diferen-
ças que poderiam provocar transformações produ-
tivas e significativas no contexto escolar. Em nome 
de uma prática pedagógica mais justa e igualitária, 
igualam-se, também, os sujeitos, suas demandas e 
desejos, confinando-os a um mesmo espaço e prá-
tica discursivo-pedagógica, em que o aluno só pa-
rece ser considerado ou endereçado como objeto 
do saber do outro (professor, coordenador, peda-
33
gogo etc.) que, por sua vez, deve sempre saber o 
que fazer diante do inesperado. Essa noção de que 
todos são iguais ou de que “devem” ser iguais ganha 
sentidos a partir da ideologia religiosa e jurídica, se-
gundo as quais os homens são iguais perante Deus 
e perante a Lei. Nesse prisma, a aplicabilidade da lei, 
neste caso, das premissas da educação inclusiva, as-
segura os direitos de todos, ganhando estatuto de 
compromisso moral e social. 
No recorteanterior (RD 3), diversos efeitos de 
sentidos são produzidos, a partir da personificação 
da “inclusão”, na seguinte formulação: “a dona in-
clusão não está só batendo na porta, ela está dentro 
da sala de aula”. O sujeito de linguagem sugere que 
a inclusão já está sendo contemplada pelo simples 
fato de permitir que o aluno diferente permaneça no 
mesmo espaço dos alunos tidos como “normais”. 
Em outras palavras, a inclusão se personifica na fi-
gura do aluno “diferente”, muitas vezes confundido 
e entendido como “deficiente”, e parece perder o 
seu caráter de proposta transformadora que deve-
ria incidir, de forma significativa, na prática pedagó-
gica. Evocando a questão da hospitalidade, tratada 
por Derrida (2003), para adentrar a temática levan-
34
tada neste estudo, é possível afirmar que aos agentes 
educacionais, em especial ao professor, é dada a di-
fícil tarefa de hospedar e ser hospitaleiro, isto é, não 
hostil, com esse estranho que foi inserido – mas não 
totalmente incluído – no espaço de sala de aula da 
escola regular, na ilusão de ser possível se atingir e 
viabilizar uma hospitalidade universal: “sem reservas, 
sem limites, sem fronteiras” (CORACINI, 2007, p. 110). 
Propondo um alinhavo entre a leitura de Lacan 
(1992), a temática aqui abordada e a materialidade 
destacada anteriormente, observa-se que “a inclu-
são do diferente” é metaforizada como uma visita 
inesperada ou como um hóspede desconhecido que 
“bate à porta” em momento inoportuno, adentrando 
e ameaçando a estabilidade de um mundo já norma-
lizado, com fronteiras bem demarcadas. Nas palavras 
de Lacan (1992, p. 87), “esse hóspede é o que já pas-
sou para o hostil [hostile] [...]. No sentido corriqueiro, 
esse hóspede não é heimlich, não é o habitante da 
casa, é o hostil lisonjeado, apaziguado, aceito”. 
É justamente essa posição de “hostil aceito e li-
sonjeado” que é assumida pelo aluno diferente e/
ou deficiente, na escola regular, tendo em vista que 
35
tal aceitação está prevista em lei, além de tornar os 
agentes educacionais mais tolerantes e generosos, 
em conformidade com a ideologia em funciona-
mento no discurso religioso e que também atribui 
efeitos de sentido para as práticas inclusivas. Em um 
estudo anterior (CAVALLARI, 2011) enfatizei, com 
base no princípio responsabilidade proposto por 
Forbes (2010), que a criação de saídas singulares e 
criativas para cada situação de inclusão – que não 
passe pela compaixão, mas que parta do universal 
para o particular de cada caso, tratando diferente-
mente as diferenças, ao invés de tentar igualá-las – 
é que poderá propiciar uma inclusão menos “nor-
malizante” e mais significativa.
O último excerto abordado foi formulado por 
uma professora de ensino fundamental e médio da 
rede pública, que trabalha com alunos especiais em 
turmas regulares. O equívoco que possibilita a deri-
va de sentidos indesejados também se fez presente 
na materialidade posta. Vejamos:
[RD 4] Temos que resgatar um erro. Trata-
mos as pessoas diferente porque elas são 
diferente de nós. Nós é que excluímos as 
36
pessoas. Temos que deixar de fixar a ima-
gem nos estereótipos.
O esquecimento número dois5, da ordem da 
enunciação, segundo Pêcheux (1988), provoca di-
ferentes efeitos de sentido na referida formulação. 
Em outras palavras, ao empregar o verbo “resgatar”, 
ao invés de “corrigir”, o sujeito de linguagem nos 
permite entrever sua posição discursiva, portanto, 
ideológica, segundo a qual o aluno diferente ou de-
ficiente é visto como um erro que deve ser resgata-
do ou corrigido por nós, “os normais”, que temos o 
poder de construir um saber sobre o outro.
 Nos depoimentos dos agentes educacionais, 
de modo geral, as noções de “diferente” e de “de-
ficiente” se confundem, justificando a necessidade 
da aplicação de práticas pedagógicas igualitárias e 
simplificadoras das diferenças. Lembrando que a in-
clusão se faz necessária para além das deficiências, 
podemos afirmar que um equívoco de ordem ide-
ológica está em funcionamento nos depoimentos 
abordados, bem como na proposta de EI, conforme 
ratifica Vizim (2003, p. 52), na citação a seguir:
5 O esquecimento 
número dois, 
segundo Orlandi 
(1999, p. 35) faz 
o enunciador 
acreditar que “há 
uma relação direta 
entre pensamento, 
a linguagem e o 
mundo, de modo 
que pensamos que 
o que dizemos só 
pode ser dito com 
aquelas palavras e 
não outras”.
37
O tema educação inclusiva, apontado na 
década de 1990, ficou restrito, por vezes, 
à educação de pessoas com deficiências. 
Cabe ressaltar que esta é uma situação la-
mentável diante da complexidade de se 
criar uma política pública de educação para 
todos. Não se trata única e exclusivamente 
do segmento das pessoas com deficiência, 
no sentido de incluí-los nas escolas regu-
lares, deve-se incluir também toda criança, 
jovem e adulto que vive a condição de anal-
fabeto ou de analfabeto funcional, de dife-
rença étnica, cultural, religiosa, de condição 
social, enfim, de marginalização diante da 
hegemonia social.
Em um trecho do recorte anterior: “tratamos as 
pessoas diferente porque elas são diferente de nós” 
[sic.], nota-se uma fala pouco significativa, circular 
e esvaziada de sentidos, uma vez que apenas evoca 
representações e discursos já naturalizados em nos-
so contexto sócio-histórico. Esse esvaziamento de 
sentidos também foi abordado por Coracini (2007), 
partindo da análise de depoimentos de professores. 
38
Nas palavras da autora (CORACINI, 2007, p. 101-
102), “o que se percebe é uma repetição redundante 
de termos que parecem esvaziados de sentidos ou 
tão plenos de sentido – naturalizados pela ideologia 
dominante – que não precisam de explicitação [...]”. 
Nesse prisma, podemos afirmar que a naturalização 
é desastrosa e infértil, já que não promove transfor-
mações e/ou deslocamentos, pois acaba por sim-
plificar e igualar as diferenças. Em larga medida, o 
equívoco de ordem ideológica que irrompe nos de-
poimentos acerca da EI, nos permite entrever que 
o foco das práticas inclusivas está no apagamento 
da diferença e na deficiência e não no acolhimento 
da diversidade como algo que pode ser produtivo 
no processo de ensino-aprendizagem, uma vez que 
requereria a (trans)formação não só do aluno dito 
“especial”, mas de todos os envolvidos no processo 
em questão.
Ainda em relação ao excerto anterior, nota-se 
que o sujeito de linguagem convoca os agentes 
educacionais para o seu dizer, quando emprega a 
primeira pessoa do plural (nós, temos que), atribuin-
do a eles e a si mesmo a culpa pela exclusão prati-
cada no contexto escolar “nós é que excluímos as 
39
pessoas”. Na formulação destacada, engendra-se a 
individualização e responsabilização do sujeito por 
seus atos e escolhas. Dito de outro modo, o enun-
ciador não se vê afetado por outros discursos que 
circulam em nosso meio e que produzem “verda-
des” ou efeito(s) de evidência discursiva, mas como 
o único agente capaz de fazer escolhas acertadas 
que possibilitem a inclusão. Segundo Kehl (2001, 
p. 59), dentro da modalidade subjetiva contempo-
rânea, “o sujeito não se dá conta de suas filiações 
simbólicas e passa a se considerar como um indiví-
duo isolado”. Daí advém sentimentos diversos como 
culpa e angústia diante do insucesso da EI e da apa-
rente inviabilidade de suas propostas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora, à primeira vista, tudo se baseie na di-
versidade, no que tange à Educação Inclusiva (EI) e/
ou Especial e suas propostas, os recortes analisados 
reforçam a hipótese inicialmente levantada neste 
estudo de que a EI silencia a(s) diferença(s) e o dife-
rente, já que “incluir” produz o efeito de sentido de 
“normalizar” ou de “tornar o outro meu semelhante”. 
40
Em outras palavras, o modo como a diversidade é 
significada no macrodiscurso político-educacional 
da inclusão acaba por promover a diluição,apaga-
mento e até mesmo o silenciamento da diferença 
e daquilo que o sujeito dito excluído apresenta de 
mais singular e distintivo.
Em todas as formulações analisadas o enfoque 
está na inclusão enquanto proposta e não no su-
jeito a ser incluído ou nas especificidades de sua(s) 
diferença(s). Em suma, o sujeito dito especial parece 
ficar fora ou excluído da discussão sobre como in-
cluí-lo e, portanto, se objetifica, ao ocupar, ainda que 
à revelia, a posição de objeto do olhar, das ações, do 
fazer e do suposto poder-saber do outro. Tal como 
sugere Balocco (2006, p. 83), só há referência ao su-
jeito, “enquanto objeto de representações discursi-
vas, ou construções identitárias”, lembrando que os 
discursos produzem sujeitos que não são nem estão 
na origem de sua enunciação. Trazendo as conside-
rações arroladas para este estudo, podemos con-
cluir que o sujeito da EI aparece como assujeitado 
ou como efeito do assujeitamento ao macrodiscurso 
político-educacional da inclusão e às verdades que 
esse discurso parece evocar e disseminar.
41
Como já destacado anteriormente, as práticas 
e política inclusivas significam ao evocarem pares 
dicotômicos e imaginariamente excludentes como: 
diferença x igualdade; exclusão x inclusão. São essas 
noções extremamente simplificadoras e homoge-
neizantes, geralmente pensadas em oposição, que 
incidem na constituição identitária do sujeito mar-
cado e representado como excluído, uma vez que 
passam a constituir as imagens nas quais esse sujeito 
se reconhece e se identifica. Segundo Souza (1995), 
as práticas discursivo-pedagógicas, de modo geral, 
e os conceitos que as fundamentam são tratados de 
forma unívoca: sem equívocos, falhas ou enganos. 
As práticas discursivo-pedagógicas, desencadeadas 
pelo macrodiscurso político-educacional da inclu-
são e também concebidas de forma unívoca, se pau-
tam na busca de igualdade e tendem a criar identida-
des narcísicas, isto é, idênticas às daqueles que são 
tidos como normais e que têm o poder de construir 
um saber sobre o outro dito excluído ou especial.
A materialidade posta nos recortes analisados 
também possibilitou a problematização do modo 
como o macrodiscurso político-educacional da in-
clusão e as práticas “ditas” inclusivas concebem a 
42
diferença e a singularidade que são constitutivas da 
identidade de todo e qualquer sujeito de linguagem 
e não apenas daqueles que têm a diferença marca-
da no corpo. Skliar (2006, p. 29) reforça que “aca-
bamos reduzindo toda alteridade a uma alteridade 
próxima, a alguma coisa que tem de ser obrigato-
riamente parecida a nós – ou ao menos previsível, 
pensável, assimilável”. Em consonância com as afir-
mações anteriores salientei (CAVALLARI, 2008, p. 5) 
que a resistência em acolher as diferenças se atrela 
ao fato de que tudo o que nos parece estranho ou 
não familiar expõe o não saber ou o não contro-
le, desestabilizando o lugar de suposto-saber que é 
constitutivo da identidade de agentes educacionais, 
sobretudo de professores. Essa redução do estra-
nho em familiar, do diferente em normal, entretanto, 
inviabiliza uma prática inclusiva que, de fato, con-
temple a singularidade do sujeito-aluno e a diversi-
dade inevitavelmente presente em todo e qualquer 
contexto escolar.
Outro equívoco de ordem ideológica, bastante 
recorrente nos excertos abordados, deriva da con-
fluência de sentidos entre “diferente” e “deficiente”, 
que parece resultar da igualação ou da fusão esta-
43
belecida entre educação regular e educação espe-
cial, de acordo com a política de educação especial. 
No entanto, é significativo problematizarmos de 
que modo “educação” e “inclusão” de fato se rela-
cionam e afetam as práticas discursivo-pedagógicas 
na contemporaneidade. A análise dos depoimentos 
nos sugere que educação e inclusão só se implicam 
mutuamente no macrodiscurso político-educacio-
nal da inclusão, mas não nas práticas discursivo-
-pedagógicas em que parece haver uma hiância ou 
uma lacuna imaginariamente intransponível entre 
a educação tradicionalmente concebida e ainda 
praticada e as premissas da EI. Resta-nos questio-
nar, portanto, como tocar ou afetar esse sujeito que 
ocupa a posição de agente educacional para além 
do imaginário ou do politicamente correto acerca 
da inclusão? Um primeiro passo seria promover uma 
reflexão sobre como as políticas públicas de inclu-
são são construídas e significadas.
Recorrendo aos personagens (in)fames da his-
tória e salientando a importância de resistir e con-
frontar o poder hegemônico, Foucault (1992, p. 
98) enfatiza a necessidade de “transpor os limites, 
de passar para o outro lado, escutar e fazer ouvir a 
linguagem que vem de fora ou de baixo [...]. Estas 
44
vidas, por que não ir escutá-las lá onde falam por si 
próprias?” Trazendo essas indagações para as prá-
ticas inclusivas, conclui-se que os mecanismos de 
poder-saber, muitas vezes engendrados e sustenta-
dos pelo discurso universitário que, segundo Lacan 
(1992), formaliza e legitima o modo de se organi-
zar as relações interpessoias, devem ser descons-
truídos ou, pelo menos, desnaturalizados, a fim de 
promover uma inclusão que acolha as diferenças e 
as especificidades de todo e qualquer sujeito de lin-
guagem e não apenas daqueles ditos ou represen-
tados como “anormais”. Ao encontro de tais consi-
derações, Skliar (2003) propõe uma “pedagogia do 
acontecimento” que acolha o estranho, o diferente 
e o inesperado sem temê-los ou silenciá-lo.
Em última instância, sugerimos que as noções 
de inclusão e diferença, já sedimentadas no macro-
discurso político-educacional da inclusão, sejam 
(re)pensadas e (re)significadas no interior de nos-
sas experiências educacionais, para que provoquem 
transformações e desloquem o saber instituciona-
lizado e historicamente determinado sobre o outro 
dito e marcado como “especial”. Vale destacar que 
se há algo de “natural” na inclusão é sua desarmonia. 
45
Desse modo, para que as práticas inclusivas sejam 
tomadas de forma menos romantizada ou menos 
afetada pelo imaginário de compaixão e igualdade, 
precisamos nos lembrar de que o semelhante e o 
dessemelhante, a ordem e o conflitual se implicam 
mutuamente na desarmonia natural da EI e da Edu-
cação que se pretende para Todos e que, graças a 
sua natureza universalizante, não é de ninguém, pois 
não leva em conta a singularidade que diferencia os 
sujeitos de linguagem.
47
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* Jornalista/professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Linguagem da 
Universidade do Vale do Sapucaí (UNIVÁS). Doutora em Letras – Estudos Linguísticos na 
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
CaCiane Souza de MedeiroS*
Sem o antagonismo entre incluídos e excluídos, 
poderemos nos encontrar em um 
mundo em que Bill Gates é o principal humanista, 
lutando contra a pobreza e as 
doenças, e Rupert Murdoch o maior ambientalista, 
mobilizando milhões de pessoas 
por meio de seu império da mídia.
SlavoJ zizek
O DISCURSO DA 
INCLUSÃO PELA 
DIFERENÇA NA 
RELAÇÃO MÍDIA E 
SOCIEDADE
53
1 INTRODUÇÃO
A sociedade e seus modos de organização, fun-
cionamento, movimento de sentidos, sujeitos e suas 
práticas é um lugar de interesse em meu percurso 
de estudo da relação mídia e sociedade. Dentro do 
espaço social constituído por seus antagonismos, 
regularidades, falhas e práticas sociais de (re)produ-
ção de sentidos destaco a mídia em uma posição 
instituída (legitimada) onde questões sociais, que 
mobilizam sentidos na história, são retomados para 
significar de outro jeito o que já está lá, o que já faz 
sentido (ORLANDI, 1999). 
O objetivo deste trabalho é discutir e dar visibi-
lidade aos sentidos que constituem o conceito de 
inclusão postos em circulação na/pela mídia, a partir 
de uma leitura discursiva de campanhas produzidas 
no Brasil sobre a questão da inclusão social. Para isto 
me detenho em observar as condições de produção 
onde habitam os sentidos em torno do conceito de 
inclusão que são (re)produzidos na mídia para pro-
blematizar a ancoragem ideológica que marca este 
discurso em nossa sociedade e que está edificado 
em um modo de estruturar o social sustentado em 
klevi
Realce
54
uma formação ideológica neoliberal de ver, de fazer, 
de significar o mundo e os sujeitos.
Parto do princípio de leitura de que a questão da 
inclusão em seu espaço de significação social tem, 
inevitavelmente, uma história, um movimento de 
sentidos que vêm sendo mobilizados e que busco 
problematizar neste capítulo como possibilidade de 
compreender, à guisa dos preceitos teóricos de Fou-
cault (2002, 2007, 2008), no tocante aos conceitos 
de sociedade, poder e de neoliberalismo; e da teoria 
discursiva de Pêcheux (1990, 1993, 1998, 2009, ) e 
Orlandi (1993, 1999, 2001) a que me filio, a costura 
ideológica e as condições de produção que consti-
tuem o conceito de inclusão e seus modos de signi-
ficar deflagrados na/pela mídia. Tracei um caminho 
de leitura discursiva que propõe, a partir da análise 
teórica que mobilizo, uma retomada do conceito de 
inclusão e suas formas de significação na sociedade.
2 UMA INCLUSÃO PARTIDA
Um dos temas mais publicizados na mídia da 
atualidade é, de fato, o da inclusão social e neste 
55
entorno de significação os sujeitos marcados pela 
diferença passam a figurar em posição “destaca-
da” no projeto social que apregoa uma inclusão de 
superfície discursiva horizontalizada, sem deslizes, 
sem conflitos e arranjada em um imaginário de “boa 
vontade” coletiva que ressoa um modo de discur-
sivizar a inclusão de sujeitos identificados pela di-
ferença determinado por uma formação ideológica 
neoliberal1 que retoma sentidos individualizantes 
que já estão naturalizados.
A posição teórica que me orienta nesta leitura e 
análise é determinante para que se compreenda que 
o discurso existe no social e na relação dos sujei-
tos com a linguagem que os subjetiva. Parto da pre-
missa teórica elaborada por Michel Pêcheux (2009), 
que define o discurso como sendo constituído e 
constitutivo do social e dado à materialização na lin-
guagem. Esse conceito tem sido largamente citado 
e retomado no âmbito dos estudos discursivos é o 
amparo vital para um estudo que entende a neces-
sidade de compreensão da linguagem para além de 
sua materialidade pragmática ou mesmo conteudís-
tica de leitura e interpretação. 
1 A questão do 
neoliberalismo e sua 
relação discursiva 
com a questão 
da inclusão na 
sociedade será 
explicitada na 
sequência da seção.
56
Minha proposta de reflexão está, assim, com-
prometida com uma leitura da sociedade atual em 
seus modos, discursos e práticas, que só se justifi-
cam e se legitimam no bojo teórico que entende o 
discurso como “efeito de sentidos entre interlocu-
tores” (PÊCHEUX, 1993, p. 170). Esta noção de dis-
curso representa, em sua materialidade simbólica, o 
encontro entre linguagem, história e ideologia. Em 
um mesmo movimento, o discurso materializa-se 
em mecanismo constitutivo de sujeito e de sentido, 
ilusões e esquecimentos (ORLANDI, 1999), e este 
processo ganha corpo em diferentes formas, ou 
seja, na materialidade discursiva que se (re)produz 
na mídia. De acordo com o que Pêcheux (1998, p. 
58) assevera, ao localizar a Análise de Discurso (AD) 
como dispositivo de leitura, há um caminho de es-
tudo determinado
[...] pelo campo dos espaços discursivos 
não estabilizados logicamente, dependen-
do dos domínios filosófico, sócio-histórico, 
político ou estético, e também, portanto, 
dos múltiplos registros do cotidiano não es-
tabilizado (cf. a problemática dos -universos 
de crença, a dos - mundos possíveis, etc.).
57
Nesta perspectiva, a linguagem é entendida 
como ação, transformação, como um trabalho sim-
bólico em que tomar a palavra é um ato social com 
todas as suas implicações, conflitos, reconhecimen-
tos, relações de poder, constituição de identidade 
etc. (ORLANDI, 1993, p. 17).
Seguindo no percurso discursivo de produção 
de sentido proposto por Pêcheux, saliento que o su-
jeito é atravessado tanto pela ideologia quanto pelo 
inconsciente, o que produz não mais um sujeito 
uno, mas umsujeito cindido, clivado, descentrado, 
(re)partido, não se constituindo na fonte e origem 
dos processos discursivos que enuncia, uma vez 
que estes são determinados pela formação discur-
siva na qual o sujeito está inscrito e que determina 
o que pode e o que não pode ser dito (PÊCHEUX, 
2009). Mais que isso, a formação discursiva na qual 
o sujeito está identificado é regida por uma rede de 
memória já instituída e “acionada” (posta em funcio-
namento) no momento da formulação do dizer. O 
conceito de memória postulado por Pêcheux (2009) 
é, doravante, uma memória do discurso, ou seja, 
uma memória interdiscursiva, onde habita um con-
junto de já-ditos que sustenta todo dizer. De acordo 
58
com este conceito, os sujeitos estão filiados a um 
saber discursivo que não se aprende, mas que pro-
duz seus efeitos através da ideologia e do incons-
ciente. O interdiscurso está articulado ao complexo 
de formações ideológicas: algo já foi dito antes, em 
outro lugar, independentemente. Essa relação se dá 
em continuidade histórica de produção discursiva. 
O interdiscurso é, pois,
[...] definido como aquilo que fala antes, em 
outro lugar, independentemente. Ou seja, é o 
que chamamos de memória discursiva: o sa-
ber discursivo que torna possível todo dizer e 
que retoma, sob a forma do pré-construído, 
o já-dito que está na base do dizível, susten-
tando cada tomada de palavra. O interdiscur-
so disponibiliza dizeres que afetam o modo 
como o sujeito significa em uma situação 
discursiva dada (ORLANDI, 1999, p. 31).
A determinação discursiva do sujeito em socie-
dade é um importante alce para minha observação 
acerca dos objetos de mídia e os sentidos da inclu-
são que funcionam nesta discursividade, pois sina-
liza traços da implicação ideológica do discurso na 
59
aparência simbólica da obviedade. Essas questões 
apontam para o fato de que, na constituição do su-
jeito do discurso, intervêm dois aspectos que não 
podem ser deixados de lado: primeiro, o sujeito é 
social, interpelado pela ideologia, mas se acredita 
livre, individual; e, segundo, o sujeito é dotado de 
inconsciente, contudo acredita estar o tempo todo 
consciente ou, pelo menos, dotado de uma cons-
ciência social comum entre seus pares e dotada de 
intenção. Afetado por esses aspectos e assim cons-
tituído, o sujeito (re)produz o seu discurso. 
Na mídia, o processo de formulação e circula-
ção discursivo está localizado em um lugar de (re)
produção permanente. Em sua prática de produ-
ção, a mídia tem, portanto, um lugar de seleção e de 
permanência desse acervo de saberes sobre, bem 
como um lugar de circulação de sentidos, a partir 
das escolhas do que é dito (e mostrado) e do que 
é silenciado ou deixado de lado; de quem partici-
pa efetivamente na definição desses saberes e de 
quem não está presente. De acordo com o que Or-
landi (1999) teoriza, há um duplo jogo de memória 
quando a observamos em uma relação discursiva. 
Nas palavras da autora, 
60
[...] saber como os discursos funcionam é 
colocar-se na encruzilhada de um duplo 
jogo da memória: o da memória institucional 
que estabiliza, cristaliza, e, ao mesmo tempo, 
o da memória constituída pelo esquecimen-
to, que é o que torna possível a diferença, a 
ruptura, o outro (ORLANDI, 1999, p. 10).
A compreensão de como os lugares sociais e a 
ideologia são estabelecidas nas relações simbólicas 
entre os sujeitos é uma contribuição ímpar, espe-
cialmente no tocante à questão em uma análise dis-
cursiva: a ideologia se materializa em discurso, que, 
por sua vez, dá-se na materialidade textual. Sujeito e 
sentido constituem-se simultânea e historicamente 
nas relações de força e conflitos ideológicos. 
Retomar o caráter histórico do discurso e do 
sujeito, percebendo aquele como lugar de consti-
tuição deste, é permitir a compreensão das lutas so-
ciais, visto que as composições biopsicológicas são 
politicamente conformistas. É permitir, por exem-
plo, o entendimento do fato de que as assimetrias 
sociais e de poder são delineadoras das identidades 
subjetivas: questões de lugar, raça, nacionalidade, 
61
religião... inclusão/exclusão, ganham materialidade 
a partir da heterogeneidade própria às formações 
discursivas e das posições-sujeito no acontecimen-
to discursivo. Sem a intermediação do discurso, visto 
em sua heterogeneidade, não é possível compreen-
der a constituição do ser-sujeito em sua pluralidade, 
como materialização na/pela história.
As ideologias só fazem sentido para o sujeito na 
sua relação de constituição com a sociedade, ca-
bendo a este compreendê-las e observar as pos-
síveis posições que se coadunam em determinado 
contexto histórico. Assim sendo, entendo que a 
mídia atua no social a partir de uma formação ide-
ológica e histórica determinada que delineia a (re)
produção de sentidos mobilizada em suas práticas. 
O discurso é, desse modo, efeito de sentido tam-
bém do lugar da mídia no social e das relações de 
poder aí imbricadas que repercutem nas instituições 
sociais (como na escola, por exemplo) que regulam 
a prática dos sujeitos em seu meio. Observar em que 
sociedade (com)vivemos é ponto de partida e che-
gada na compreensão discursiva dos sentidos. E é 
sobre a sociedade e as condições de produção que 
encaminho a discussão sobre a inclusão.
62
3 AS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO 
DA INCLUSÃO 
A promoção e divulgação de sentidos materiali-
zados como campanhas, propagandas e outras ma-
terialidades dadas à discursividade midiatizada tem 
ocupado um espaço amplo em nossa sociedade 
marcada pela profusão de imagens. No caso especí-
fico das materialidades discursivas deflagradas pela 
mídia a respeito da questão da inclusão, o universo 
de possibilidades versadas para o consumo é de-
terminado por uma conjuntura sócio-histórica que 
precisa ser considerada em sua base constitutiva: 
as condições de produção que situam os sentidos 
que significarão de um modo e não de outro. Con-
sideradas num sentido mais amplo, as condições de 
produção incluem o contexto sócio-histórico e o 
aspecto ideológico de produção discursiva. A pro-
posta de (re)definição de condições de produção 
entende que exista um alinhamento à análise histó-
rica das contradições ideológicas na materialidade 
dos discursos e uma articulação teórica ao concei-
to de formação discursiva que é próprio da teoria 
discursiva que trago para sustentar um questiona-
mento sobre a questão da inclusão. A somatória dos 
63
valores ideológicos constitui o imaginário que de-
signa o lugar que os sujeitos do discurso se atribuem 
mutuamente. Nas palavras de Pêcheux (1990, p. 77), 
“um discurso é sempre pronunciado a partir de con-
dições de produção dadas”, portanto, importa não 
somente o que se diz, mas também o que não se diz 
sobre inclusão. Neste ponto, é importante salientar 
que não interessa aqui analisar especificamente o 
papel das mídias ao constituir um palco para viabili-
zar uma pretensa conscientização sobre a inclusão. 
O objetivo é trazer à problematização um aspecto 
que vejo como sendo emblemático no tempo pre-
sente: a relação de sentidos da inclusão à prática 
de engajamento social que vem sendo mobilizada 
como modelo de vida em sociedade; as idas e vindas 
do cenário midiático montado para criar estas for-
mas de engajamento enfatizando a diferença como 
caminho regular de uma possibilidade já instituída 
de promover uma espécie de “consciência prática 
de inclusão”; as textualidades mobilizadas para tais 
práticas e seus efeitos na produção de modelos de 
conduta frente a sujeitos ditos especiais. 
Para adentrar nesta leitura das condições de 
produção, faz-se necessário retomar a noção de in-
64
clusão que mobilizo. Por inclusão, entendo mais do 
que um paradigma educacional ou social; tomo in-
clusão como um princípio de organização da socie-
dade, propulsionado pela lógica de uma formação 
ideológica neoliberaltomada por sentidos pré-cons-
truídos que se atualizam em “novas” formas de dizer/
mostrar e simbolizar os sujeitos. Neste sentido, trago 
para o centro do debate as condições que ancoram 
o movimento discursivo da inclusão, com o propó-
sito de compreender seu funcionamento e discutir 
seus efeitos de legitimidade, entendendo que:
[...] as palavras têm um sentido porque têm 
um sentido, e os sujeitos são sujeitos por-
que são sujeitos: mas, sob essa evidência, há 
o absurdo de um círculo pelo qual a gente 
parece subir aos ares se puxando pelos pró-
prios cabelos (PÊCHEUX, 2009, p. 32).
Para tanto, estou embasada na posição teórico-
-discursiva de Pêcheux que entende que a ideologia 
é constitutiva do sujeito, “não há sujeito sem ideo-
logia” (PÊCHEUX, 2009), ou seja, não é ocultação é, 
isso sim, “produção de evidências” (ORLANDI, 2001, 
p. 104) e que a sociedade é essencialmente cons-
65
tituída por relações de poder. Poder que se movi-
menta no que eu prefiro chamar de sociedade da 
imagem por dispositivos de visibilidade elencados e 
agenciados ideologicamente.
Considerar o caráter da visibilidade em seu me-
canismo histórico de organização vem ao encontro 
da relação mídia e poder que é constitutiva da nossa 
sociedade. A mídia tem papel determinante no pro-
cesso de difusão de saberes e valores na sociedade 
contemporânea. No caso da mídia, como lugar de 
circulação de sentidos, se o controle não ocorre pela 
via da vigilância repressora da presença e da orde-
nação do olhar de sujeitos em presença, se dá na 
emergência de modelos de realidade; no agencia-
mento da consciência, como promotora de gestos 
de interpretação, (re)produtora de fatos de lingua-
gem, de posições-sujeito atuantes na esfera de or-
ganização social. Retomando Foucault (2007, p. 8), 
[...] se o poder fosse somente repressivo, se 
não fizesse outra coisa a não ser dizer não, 
você acredita que seria obedecido? O que 
faz com que o poder se mantenha e que 
seja aceito é simplesmente que ele não pesa 
66
só como uma força que diz não, mas que 
de fato ele permeia, produz coisas, induz ao 
prazer, forma saber, produz discurso. 
A instituição midiática (recortada em nosso tra-
balho como mídia dada à divulgação de saberes e 
ideias em curso na sociedade brasileira se autoriza a 
mobilizar – sob a égide de seu papel instituído como 
serviço social, lugar instituído como instrumento 
democrático, reconhecido na esfera da liberdade de 
expressão e de direito dos cidadãos – seu lugar (po-
lítico, econômico e comercial) através do discurso. 
Este é um mote essencial para a compreensão des-
te lugar midiático, pois entre os direitos declarados 
pela Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu 
art. 5º (Dos Direitos e Deveres Individuais e Coleti-
vos), temos o direito à comunicação, à informação. 
O dado constitucional de direito em si mostra que 
esse lugar institucional coloca a comunicação em 
uma relação gregária e social que, ao incluir as ne-
cessidades de autoexpressão e de troca de informa-
ções, sustenta um lugar de poder para esta mídia. 
A mídia, nesta posição de comunicação, no es-
paço social de produção discursiva, investe espe-
67
cialmente no que tange os aportes tecnológicos – e, 
portanto ideológicos –, na manutenção e legitima-
ção de seu lugar social. Essa legitimidade não é uma 
invenção da mídia, como se ela configurasse uma 
entidade independente e manipuladora, tampouco 
será abordada neste texto em uma relação simplista 
de influência, já que o discurso da mídia é parte do 
complexo sociopolítico do Estado democrático que 
é legitimado como sistema organizador em nossa 
sociedade; ou seja, é o social que determina a pro-
dução de práticas e ideias mobilizadas nas esferas 
institucionais (entre as quais temos a mídia na sua 
posição informativa), e não o contrário. No mesmo 
sentido e com maior especificidade, minha posi-
ção teórica justifica-se pela própria concepção de 
linguagem que adotamos, a saber, a da linguagem 
constituída por um aspecto material, a língua (o que 
pode ser visto “a olho nu”) atravessada pela história 
e pela ideologia, as quais caracterizam relações es-
senciais para compreendermos a manifestação do 
sentido e de seus efeitos na leitura e nas práticas so-
ciais do sujeito.
Compreender o que se diz sobre inclusão, por 
exemplo, precede uma observação da mídia, ou seja, 
68
na posição discursiva que me atenho, a mídia é ob-
servada em seu lugar singular de poder, não o poder 
que vigia ou ameaça, mas o poder que regulariza a 
versão possível – já condicionada em uma prática 
(técnica e ideológica) instituída, que tem lugar so-
cial definido. Com esse pensamento, dispomo-nos 
a observar o leque que relaciona o discurso da mí-
dia e suas relações sociais, entendendo que o poder 
não é da mídia – como detentora manifesta das ver-
sões escolhidas ou dotada de um lugar de intenção 
lógico e claro, mas é exercido e regulado por forças 
ideológicas que são, antes, políticas, econômicas e 
sociais que otimizam a (re)produção de alguns sen-
tidos em detrimento de outros.
Para Foucault (2007), o processo de otimização 
do poder, pela economia política, que implica em 
estratégias que tem como efeito o máximo controle 
pelo mínimo investimento de poder, seria uma ten-
dência. Nesta lógica, produzir condutas que relacio-
nam o sujeito com os demais – por meio de proce-
dimentos que visam gerir a população – aliadas a 
práticas que o sujeito empreende com ele mesmo 
– pela ética, por exemplo – além da amenização do 
risco, permite a autogestão da sociedade. Mas, para 
69
que essa lógica seja eficiente, algumas táticas e téc-
nicas precisam ser inventadas/acionadas.
Trazendo a teorização disciplinar dos séculos 
XVIII e XIX para a atualidade, entendemos que é nes-
se regime que a inclusão, como elemento de parti-
cipação e acesso de todos, toma corpo. Não basta 
ser parte da sociedade, é preciso participar. Mais do 
que isso, é preciso querer participar de certos espa-
ços e ações e incentivar que todos participem. As 
formas de publicizar este ideal relacionam modos 
de subjetivação já instituídos e as ressonâncias in-
terdiscursivas dessa relação numa sociedade que se 
pretende inclusiva dentro de um projeto ideológico 
legitimado em práticas de engajamento regulares.
Para dar visibilidade ao entorno teórico que venho 
propondo até aqui, recortei materialidades midiáticas2 
que me chamaram a atenção para o modo como tex-
tualizam a questão da inclusão e, a partir delas, enfa-
tizo a observação de sentidos filiados a uma determi-
nada formação ideológica e à (re)tomada de sentidos 
(o parafraseamento discursivo) que propagandeiam a 
prática de engajamento como solução anunciada e 
simbolizada como garantia de avanço social.
2 As campanhas 
que versam sobre 
a inclusão pela 
diferença serão 
tomadas como 
objeto de leitura e 
análise na sequência 
da seção. 
70
Os recortes trazidos para discussão referem-se 
a campanhas3 divulgadas nos últimos cinco anos 
em diferentes formas midiáticas de (re)produção e 
foram sequenciadas (em recortes) para dar visibili-
dade a aspectos analíticos em torno do conceito de 
inclusão e sua relação significante com uma orde-
nação social de divulgação. Observemos a sequên-
cia discursivo-parafrástica de recortes:
Recorte 1(R1) – Campanha publicitária
Fotografia 1 – Imagem divulgada pelo Instituto MetaSocial 
cujo slogan de campanha é “Ser diferente é 
normal”
“Ser diferente é normal”
Fonte – Disponível em: <http://www.inclusive.org.br/?p=21677>
3 Peças publicitárias 
(impressas e 
audiovisuais) 
amplamente 
divulgadas.
71
Recorte 2 (R2)4 – Campanha publicitária
Fotografia 2 – Imagem referente ao filme da campanha 
do Instituto MetaSocial cujo slogan é “Ser 
diferente é normal”
“Ser diferente 
é normal”
Fonte – Disponível em: <www.facebook.com/
sindromededown8?hc_location=timeline>4 A imagem do recorte refere-se à sexta campanha desenvolvida para a 
ONG MetaSocial fundada por Helena Werneck. No filme publicitário, 
de 2011, com versões de 60 e 30 segundos, Paula Werneck, uma atriz 
que já protagonizou outras campanhas do MetaSocial, está em casa e 
declara, em uma narrativa, ser uma menina diferente. A suposição leva 
a crer que essa “diferença” seria por outros motivos até que ela de-
clara que é por gostar de tocar bateria. A cena seguinte mostra Paula 
tocando bateria num parque gramado (as filmagens ocorreram no 
Parque da Marinha do Brasil, em Porto Alegre) ao som de “Kids of the 
Future”, da banda inglesa Jonas Brothers. Aos poucos, outros jovens 
se aproximam e cantam com ela. Ao final, todos abraçam a baterista e 
o enunciado “Ser diferente é normal” entra em cena. Como recursos 
de acessibilidade, o filme conta com legendas e audiodescrição para 
versar sobre questão da diferença. O vídeo pode ser visto no endere-
ço eletrônico: <http://www.youtube.com/watch?v=mjLpJboOQy4>.
72
Recorte 3 (R3) – Campanha publicitária
Fotografia 3 – Imagem da campanha “Ser diferente é normal”
“E daí que diferença faz?!
Ser diferente é normal”
Fonte – Disponível em: <www.facebook.com SerDiferenteENormal2012> 
Recorte 4 (R4) – Campanha publicitária
Fotografia 4 – Imagem de campanha divulgada em comemora-
ção ao dia internacional da Síndrome de down.
Fonte: Disponível em: <www.deficienteciente.com.br> 
“Não sou diferente, 
eu faço a diferença.”
73
Recorte 5 (R5) – Campanha publicitária
Fotografia 5 – Imagem de campanha da Federação das Ações 
do Estado do Rio de Janeiro
“O que nos faz especial 
são exatamente as 
nossas diferenças”
Fonte – Disponível em: <www.blogclientesa.clientesa.com.br>
 Ao ler, ver e/ou ouvir, em diferentes mídias, em 
diferentes materialidades discursivas, o enunciado: 
“Ser diferente é normal”, deparei-me tocada a pro-
blematizar os sentidos no tempo presente: os sen-
tidos de engajamento na causa inclusiva, a partir da 
espetacularização da diferença/diversidade – sua 
produção e seu consumo simbólico na e pela lin-
guagem midiática. Nesse registro, retomo questões 
pertinentes à minha reflexão: Como os sentidos da 
chamada inclusão social vem sendo movimentados 
na mídia? 
74
Se observarmos a sequência de materialidades 
(os recortes) enunciativas nas campanhas supra-
mostradas podemos explicitar o deslize de senti-
dos constitutivo do parafraseamento5 dos enuncia-
dos instaurados em um antagonismo histórico que 
constitui a subjetividade dos que são e dos que não 
são considerados diferentes e sua possibilidade de 
inclusão social pela diferença. O reforço enunciativo 
que deflagra que “ser diferente é normal” só pode 
ser dito e fazer sentido na relação com uma me-
mória interdiscursiva num espaço que nos lembra 
(traz à atualidade) da segregação historicamente 
construída e discursivizada dos sujeitos (os deficien-
tes, os especiais, os diferentes...) que ainda estão 
imersos na esteriotipia social da deficiência, da falta, 
da estagnação como sujeitos (desen)formados dos 
moldes sociais vigentes. 
Desta forma, a tentativa discursiva que a mídia 
(re)produz nas campanhas é a de um (re)posiciona-
mento direto, horizontal dos sentidos da diferença, 
inclusive pelo não-uso da designação “deficiência” 
que carrega, em sua história e memória, sentidos 
ainda atuantes do esquecimento, da desvalia e do 
não-pertencimento social. Os enunciados parafrás-
5 Tomo o conceito 
de paráfrase 
na perspectiva 
discursiva que 
entende que 
os processos 
parafrásticos são 
aqueles pelos quais 
em todo dizer há 
sempre algo que se 
mantém, isto é, o 
dizível, a memória. 
A paráfrase está do 
lado da estabilização 
(ORLANDI, 1999).
75
ticos recortados das campanhas (R1, R2, R3, R4 e R5) 
marcam esta memória discursiva histórica em que 
as diferentes práticas relacionadas ao cuidado com 
pessoas com deficiência permitem problematizar o 
modo como cada período histórico, especialmente 
o de agora, atualiza a questão da diferença. Dife-
rentes atores sociais em suas posições-sujeito estão 
envolvidos nessas práticas que vão da caridade e as-
sistência6 até às práticas ditas integrativas e inclusi-
vas que marcam a questão da deficiência na con-
temporaneidade, mas que vem produzindo sentidos 
há muito tempo. 
Segundo Foucault (2002), desde o início do sé-
culo XIX, os sujeitos com deficiência eram vistos a 
6 A prática assistencial está diretamente relacionada ao surgimento 
das instituições de confinamento. Nesse modelo e intervenção 
o atendimento aos carentes constitui objeto de práticas 
especializadas. Assim surgem diferentes equipamentos sociais – 
tais como hospitais, asilos, orfanatos, hospícios – que oferecerão 
atendimento especializado a certas categorias da população que 
outrora eram assumidos, sem mediação, pelas comunidades. 
Vão surgindo estruturas cada vez mais complexas e sofisticadas 
de atendimento assistencial, esboço de uma profissionalização 
futura desse tipo de prática. Foucault (2002) produz um trabalho 
denso sobre a sociedade suas formas de regulação e pontua 
historicamente a mudança das práticas sociais de cuidado (para 
ele formas de ordenação) social.
76
partir de suas deficiências: elas deveriam ser medi-
das e classificadas e seus corpos tornados objetos 
de controle, já que se opunham à ordem social. Essa 
dominação exercida pelas disciplinas, a partir dos 
séculos XVII e XVIII, se institui através deformas sutis 
por técnicas minuciosas e íntimas. Através de uma 
política do detalhe, de atenção às minúcias, esse 
corpo doente passa a ser estudado, analisado, co-
nhecido, para ser recuperado e tratado... Este cená-
rio discursivo movimentou-se e tem agregado no-
vos sentidos para significar o sujeito diferente (e não 
só deficiente). Considerando o fracasso das institui-
ções em integrar o sujeito com deficiência à socie-
dade e ao mercado de trabalho produtivo a partir de 
um modelo social de normalidade, iniciou-se, em 
vários setores sociais, e a mídia ocupa uma posição 
importante neste processo, um questionamento e 
pressão para a desinstitucionalização das pessoas 
com deficiência.
No modelo da inclusão discursivizado na atua-
lidade, onde a diversidade é proclamada como má-
xima do ser/estar na orientação certa (àquela jus-
tificada e assentada nas formas de dizer e fazer do 
“politicamente correto”), materializa-se um movi-
77
mento de sentidos que identifica e conclama à inte-
gração a sociedade e as pessoas com necessidades 
especiais, isso como forma de minimizar os proble-
mas encontrados por ambas no convívio social his-
toricamente estruturado. São práticas distintas que 
ora colocam todo o peso sobre a pessoa com de-
ficiência, ora procuram distribuir a responsabilidade 
pela inclusão para todo o conjunto social propondo 
o engajamento como única (melhor) opção. 
4 OS SENTIDOS DA INCLUSÃO 
NEOLIBERAL: A CONSTRUÇÃO DO 
SUJEITO ENGAJADO
Como parte da proposta de debate sobre a ma-
terialidade discursiva e suas implicações, considero 
importante apontar algumas condições históricas de 
produção dos discursos da inclusão. Compreendo 
que há na sociedade um movimento que deflagra a 
inclusão enquanto incentivo à participação e aces-
so de todos a determinados espaços sociais, como 
uma grande rede que se tece em torno de políticas e 
práticas conectadas aos interesses e conveniências 
do modo de vida neoliberal. 
78
Por neoliberalismo, a partir de Foucault (2008), 
compreendo a lógica que vem se empreendendo 
desde meados da década de 1970, em que o mer-
cado assume posição centralizadora na formulação 
de significados. Com isso, o papel do Estado na di-
nâmica social se reconfigura e há um incentivo à 
autocondução. Assim, se no liberalismo clássico o 
Estado gerenciava o mercado, no neoliberalismo, 
a relação inverte-se. O mercado cria e monitora o 
funcionamento do Estado e das suas relações

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