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Responsabilidade Profissional e Documentação Odontológica INTRODUÇÃO - A vida em sociedade é regulamentada por normas que buscam harmonizar o convívio social, garantindo direitos e deveres aos cidadãos em todas as esferas, inclusive no exercício profissional. As leis e os códigos de ética profissionais são diretrizes que norteiam o desempenho das atividades laborais e exigem do profissional conhecimentos, habilidades e responsabilidades no desempenho de suas funções. No Brasil, o exercício da Odontologia é regulamentado pela lei n° 5.081 de 1966. Dentre os dispositivos legais que envolvem a profissão estão, ainda, a Constituição Federal (CF), o Código de Ética Odontológica (CEO), Código Civil (CC), Código de Defesa do Consumidor (CDC) e o Código Penal (CP). Segundo o CEO , a Odontologia é uma profissão que se exerce em benefício da saúde do ser humano, da coletividade e do meio ambiente, sem qualquer discriminação. Assim, o cirurgião dentista tem o compromisso de contribuir para a saúde bucal das pessoas, estando sujeito a ser responsabilizado por seus atos ou suas omissões. Dentre as esferas nas quais podem ocorrer essa responsabilização estão a ética, civil e penal. Ao longo dos anos, a sociedade e a relação profissional- paciente tem se modificado. Com o advento do CDC, introduzido na legislação brasileira em 1990, a sociedade está mais consciente dos seus direitos e amparada na sua busca. O referido código, visando proteger o consumidor, polo hipossuficiente nas relações de consumo, assegurou maior equilíbrio nas relações jurídicas travadas entre fornecedores de produtos e serviços e consumidores. Com tal característica, os pacientes têm reivindicado judicialmente, de forma mais incisiva os seus direitos. Outro fator fundamental na modificação desse comportamento é a atuação da mídia, que contribui com a disseminação do conhecimento sobre os direitos do consumidor e dedica grande espaço aos casos chamados “erros médicos”. Outrossim, a atual realidade do mercado de trabalho, altamente competitivo, faz com que alguns profissionais adotem condutas de risco, como horas exaustivas de trabalho e condições operatórias inadequadas, que podem resultar em falhas. Em decorrência disso, tem-se observado o crescimento acentuado de litígios envolvendo cirurgião-dentista e paciente, seja por acusação de erro profissional, iatrogenia, cobrança de honorários, ou qualquer outro motivo que leve à desarmonia entre as partes. Está definido no Código Civil Brasileiro, que ainda que o dano causado seja involuntário, é de responsabilidade do profissional, que deverá responder por: 1- Dolo: quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; 2- Culpa: quando o resultado indesejado ocorreu por negligência, imperícias ou imprudência; Segundo o Código de defesa do Consumidor o profissional poderá responder: 1-Ação Civil: Indenizatória ou reparadora; 2-Ação Penal: Tratar como crime; 3-Ação Administrativa: Punição exercício profissional; Diante esse novo cenário, faz-se necessário uma nova postura profissional: a “Odontologia defensável”, que não se trata de uma nova especialidade odontológica, mas sim de uma nova maneira de conduzir as práticas de trabalho, com a adoção de medidas preventivas capazes de resguardar o profissional em eventuais processos. Neste contexto, destacamos a documentação odontológica como instrumento de prova da conduta profissional. 1-Registro da Anamnese: Tendo em vista que a prestação de serviços do cirurgião-dentista se inscreve na área da saúde, não se pode compreender que essa atuação se faça desconhecendo o estado geral de saúde do paciente, face às suas implicações no tratamento odontológico. Mesmo em um consultório em que o movimento de pacientes seja considerável, esse problema pode ser contornado com a adoção de questionário respondido e preenchido diretamente pelo paciente, reservando-se um segundo momento para o contato direto com o profissional, quando se procederá ao aprofundamento das questões relacionadas com a sua saúde geral. 2-Ficha Clínica: Não se pode mais admitir que uma ficha clínica contenha apenas as condições bucais representativas do “orçamento” apresentado ao paciente. Ela é parte integrante do prontuário e deve estar apta a representar não apenas o planejamento do tratamento contratado, mas também fundamentar eventuais alegações relativas às intercorrências da execução do tratamento. Assim, o estado geral bucal apresentado pelo paciente antes de iniciado o tratamento, mesmo quando se trate da intervenção de especialista que o recebeu por encaminhamento de colega, deve constar da ficha clínica, até para resguardar eventual responsabilidade por atos operacionais não realizados pelo profissional. Por outro lado, o fato de a população brasileira submeter-se à identificação para expedição da cédula de identidade geralmente ao completar maioridade, torna a ficha clínica importante subsídio para o reconhecimento de menores em casos de catástrofes em que não se possa contar com outros meios de reconhecimento. O mesmo se diga na eventualidade de o cirurgião-dentista ser chamado a colaborar com a Justiça, apresentando esse documento para ser confrontado com as condições bucais encontradas em corpo ou restos mortais submetidos a processo de identificação. 3-Plano de Tratamento: Na medida em que estamos trabalhando na área da saúde, é inadmissível a utilização do termo “orçamento” para definir as fases de diagnóstico. É por essa razão que preferimos a expressão “plano de tratamento”, mais condizente com a realidade da atuação odontológica e que permite, quando necessário, modificações ao plano inicial, impostas pelas mais diversas razões. Por outro lado, a situação econômica da maioria da população brasileira impede, muitas vezes, a realização do tratamento técnica e cientificamente mais adequado, de acordo com o avanço experimentado pela odontologia nas últimas décadas. Assim, ao mesmo tempo em que sugerimos a adoção da expressão “plano de tratamento”, a possibilidade de alternativas para alguns procedimentos pode e deve ser objeto de anotações que permitam ao profissional resgatar as condições em que o tratamento foi realizado. É evidente que as restrições e limites relativos a cada hipótese devem ser minuciosamente debatidos entre profissional e paciente. Finalmente, além das anotações relativas ao estado anterior do paciente, a ficha clínica deve refletir não apenas os atos clínicos realizados e materiais utilizados, mas também detalhar as ocorrências, como faltas, falta de colaboração, condições de higienização e outras que, de alguma forma, possam interferir no resultado esperado pelo paciente ou mesmo pelo profissional, principalmente porque poderão corroborar as alegações do profissional quanto à responsabilidade do paciente na não-obtenção de determinado resultado. 4-Receitas: As receitas serão analisadas como pertinentes ao prontuário odontológico e, como tal, analisadas como um documento odonto- legal, cuja cópia deverá ser anexada ao prontuário do paciente. O Código de Ética Odontológica, define as informações obrigatórias e as facultativas a serem inseridas no papel receituário. De acordo com os Artigos 29 e 30 do CEO e 1° referida Decisão, essas informações restringir-se-ão a: a) Nome completo do cirurgião- dentista. b) Profissão. c) Número de inscrição no CRO sob cuja jurisdição esteja exercendo sua atividade. 5-Atestados Odontológicos: Assim como as receitas, os atestados constituem documentos legais e, a fim de que não surjam problemas legais, o cirurgião- dentista deve tomar alguns cuidados com a sua redação e sobre a oportunidade de oferecê-lo. Conhecido o papel receituário onde costumeiramente os cirurgiões-dentistas e médicos fazem a redação dos seus atestados, vamos nos ater, agora, ao modus faciendido mesmo. Um atestado é constituído por várias partes, sendo a primeira delas aquela relativa às qualificações do profissional, que, como vimos, faz parte do impresso (papel receituário) no qual vai redigir o atestado. Em seguida virão a qualificação do paciente, sua identificação e a finalidade a que se destina, isto é, se para fins trabalhistas, escolares, esportivos ou militares (e nunca para os devidos fins), podendo ser incluída a informação de que foi formulado a pedido do interessado. Finalmente, na sua terceira parte, o cirurgião-dentista declarará que o paciente esteve sob seus cuidados profissionais, sem especificar a natureza do atendimento (quando exigida a sua natureza, o profissional deve valer-se do Código Internacional de Doenças, seguindo-se uma breve conclusão relativa às suas consequências (impossibilidade de comparecer ao trabalho; que esteve sob seus cuidados profissionais de tal hora a tal hora ou, então, que o mesmo deve guardar repouso por tanto tempo quanto necessário). Cada caso é um caso. Assim, o profissional irá concluir sobre o tipo de afirmação que fará no caso concreto, tendo em vista que uma afirmação que não corresponda à verdade poderá acarretar-lhe a imputação de falsidade ideológica, crime previsto no Artigo 299 do Código Penal. 6-Modelos: Ao lado da sua função odontológica, os modelos podem constituir elementos de prova judicial. Diante da dificuldade de serem arquivados todos os modelos de prótese ou outros serviços odontológicos, recomenda-se a guarda, pelo menos, dos casos mais complicados, tirando-se uma xerox do modelo em gesso dos demais casos, e anexando-a ao prontuário do paciente. 7-Radiografias: Um dos exames complementares mais realizados pelo cirurgião- dentista é o exame radiográfico. As radiografias estão presentes, na maioria dos processos, como matéria de prova. Frequentemente, porém, ao ser requisitado o material radiográfico pelos peritos ou assistentes técnicos, ou mesmo quando necessária a sua juntada para corroborar as alegações do cirurgião-dentista, este não as encontra no seu arquivo, porque “estão soltas dentro da gaveta do arquivo” e ele não pode precisar a quem pertencem, ou porque não foram reveladas e fixadas adequadamente, tornando-se imprestáveis para esse fim. Porque constituem, na maioria das vezes, importante matéria de prova, chamamos a atenção dos profissionais para a necessidade de adotarem o sistema de duplicação das mesmas, preventivamente, ou na eventualidade de serem requisitadas pela Justiça ou quando pedidas pelo paciente, fazendo a entrega da cópia, uma vez que representam o embasamento de atos operacionais realizados pelo profissional. 8-Orientação para o Pós-Operatório ou sobre Higienização: Também representam provas sobre o dever de cuidado. Podem ser elaboradas em impressos próprios ou não, sendo importante que sejam entregues mediante assinatura de recebimento, na cópia ou em livro de protocolo. Com relação aos prazos, o Código de Processo Ético Odontológico, Resolução CFO nº. 183/92, define o prazo de 05 anos para guarda dos prontuários, tempo para prescrição de infrações ética também. Podemos afirmar que o prontuário preconizado é passível de ser realizado por todo e qualquer profissional, podendo ser modificado ou adaptado à sua administração do consultório, desde que atenda às exigências legais para poder ser reconhecido judicialmente. No caso de profissionais cuja clínica seja diferenciada economicamente, podem ser acrescentadas ao prontuário básico radiografias panorâmicas, fotografias, vídeos, enfim, tudo o que constituir documentação odonto-legal. Sabendo de sua importância, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) disponibiliza em seu site um modelo que pode ser adaptado à realidade de cada profissional.
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