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Parasitoses intestinais DIFERENÇA ENTRE AS PRINCIPAIS PARASITOSES INTESTINAIS Os parasitas intestinais incluem um amplo grupo de microorganismos, dos quais os protozoários e os helmintas são os mais representativos. A via fecal-oral é a principal forma de transmissão, a partir da água ou alimentos contaminados. A sua prevalência é variável consoante a zona geográica considerada, dependendo das condições higieno- sanitárias e climatéricas. Em termos mundiais os parasitas mais frequentes são os do grupo dos helmintas nemátodes, principalmente o Ascaris lumbricoides, Trichuris trichiura e Ancilostomas. Os parasitas internos dos seres humanos são divididos em dois tipos: helmintos (vermes) e protozoários. Helmintos são organismos multicelulares que podem ser vistos a olho nu. Há dois filos: Platelmintos (vermes achatados) e Nematelmintos (vermes arredondados). Ambos os filos incluem alguns gêneros que amadurecem no trato gastrintestinal e outros que migram através dos tecidos após a ingestão ou penetração na pele . Transmissão Há duas formas principais de transmissão das parasitoses intestinais: por meio da contaminação oral e da ingestão das formas infectantes e pela penetração de larvas na pele (Tab. 69.1). Para os helmintos, organismos multicelulares, destaca-se a reprodução sexuada com produção de ovos. O ovo é embrionado, gerando uma larva no seu interior. Essa larva pode ser liberada no ambiente, fato que geralmente está associado às formas de transmissão por meio da pele. Quando a larva permance dentro do ovo, só há uma maneira de infectar um novo hospedeiro: pela de ingestão em alimentos, água ou devido a mãos contaminadas. Todos os protozoários enteroparasitas produzem cistos como formas de resistência no meio externo. Os cistos são produzidos apenas pelos protozoários do gênero Cryptosporidium e por outros enteroparasitos do mesmo grupo, os esporozoários. Esses organismos, além de reprodução assexuada, reproduzem-se sexuadamente, originado os oocistos. Cada parasita tem localização preferencial, o que explica, em parte, o tipo de manifestação clínica. Protozoários: • Giardia lamblia (Giardíase) • Entamoeba hystolítica (Amebíase) Metazoários: Com ciclo pulmonar • Ascaris lumbricóides (Ascaridíase) • Strongyloides stercoralis (Estrongiloidíase) • Ancylostoma duodenale (Ancilostomíase) • Necator americanus (Necatoríase) • Schistosoma mansoni (Esquistossomose) Sem ciclo pulmonar • Enterobius vermiculares (Enterobíase) • Trichura trichiuris (Tricuríase) • Taenia solium e saginata (Teníase) • Hymenolepis nana (Himenolepíase) – Entamoeba hystolytica Período de incubação: 2 a 4 semanas Transmissibilidade: enquanto persistir Ancylostoma duodenale ou Necator americanos Período de Incubação: 2 meses (maturidade da larva no intestino delgado) Ascaris lumbricoides - Ovos resistentes a temperaturas e permanecem viáveis no solo por Síndrome Disentérica ou Síndrome Febril Diarreica Síndrome diarreica ou gastrointestinal (diarreia+ náusea) + Síndrome Anêmica (palidez/ sonolência) Síndrome Obstrutiva Diretamente de pessoa a pessoa ou através da ingestão de água e/ou alimentos contaminados com cistos Contato direto com o solo contaminado com larvas (penetração pela pele) -> pequenas lesões (coceira e vermelhidão) Mãos e unhas sujas de terra ou água, solo e alimentos contaminados - - - Forma branda: desconforto abdominal, com sangue e muco nas dejeções até uma diarreia aguda e fulminante de caráter sanguinolenta e mucoide + febre + calafrios - Casos graves: abcesso hepático ou pulmonar ou cerebral (trofozoítos na corrente sanguínea) - Tríade Clássica: febre, dor em hipocôndrio direito e leucocitose - Agudo: prurido no local na lesão, febre baixa ou moderada, queda no estado geral, náuseas, vômitos, diarreia, dor abdominal e esplenomegalia - Crônico: anorexia + hábito de ranger os dentes + apetite exagerado - Complicações: anemia + hipoproteinemia (evoluir para IC) e migração da larva através do pulmão (pneumonite e hemorragias) - Manifestações pulmonares: Síndrome de Loeffer (pneumonite), tosse, febre baixa e dispneia Ingestão de cistos em água ou alimentos contaminados -> ultrapassam a barreira gástrica -> transformam-se em trofozoítos na luz intestinal, multiplicando-se no intestino grosso (ceco) -> trofozoítos aderem na mucosa intestinal -> podem se transformar em pré-cistos e então novamente nos cistos -> eliminados pelas fezes. Ovos eliminados nas fezes de indivíduos contaminados, eclodem em 1 a 2 dias (local úmido e aquecido) e liberam larvas rabditiformes, que evoluem e se tornam filariformes em 5 a 10 dias. - Anemia: perfuração da parede intestinal e consumo de sangue - Prurido: perfuração/ lesão - Dispneia: Síndrome de Loeffer . Migração de larvas através dos pulmões . Acúmulo de eosinófilos no pulmão 1- Ovos eliminados pelas fezes 2- Larvas eclodem e permanecem 3- Larvas desenvolvem-se 4- Penetração na pele 5- Por meio da corrente sanguínea chegam aos pulmões, são regurgitados e engolidos pelo hospedeiro 6- Chegam ao intestino, reproduzem-se produzindo ovos que serão eliminados pelas fezes. Ovos são deglutidos -> chegam até o intestino -> eclodem e liberam suas larvas -> atravessam ativamente a parede intestinal, caem na corrente sanguínea, ganham o sistema porta, veia cava - Parasitológico de fezes (EPF) - Cultura de fezes - Testes Sorológicos - Hemograma: leucocitose - Normalmente é clínico -> prurido característico - Laboratorial: EPF (presença de ovos) - Exames complementares: hematócrito, hemoglobina, VCM, leucócitos, plaquetas, glicose, sumário de urina - EPF - Hemograma: 50% dos casos - eosinofilia - Radiografia de tórax: infiltrados intersticiais difusos ou mistos, uni - Depende do cenário - Secnidazol - Metronidazol (750 mg) - Anti-helmínticos . Albendazol . Mebendazol . Nitozaxinamida . Pamoato de Pirantel . Controle de cura realizado no 7º, 14º e 21º após o tratamento - Obstrução: jejum, sonda nasogástrica, hidratação venosa e uso de óleo mineral até a eliminação do parasita - Protocolo de saneamento - Higiene pessoal - Tratamento dos doentes - Tratamento dos portadores/ infectados - Saneamento Básico - Educação Sanitária - Hábitos de higiene pessoal - Protocolo de saneamento básico - Tratamento do doente - Higiene pessoal Schistosoma mansoni - HD: homem - HI: caramujo (gênero Biomphalaria) Período de Incubação: 1 a 2 meses após a infecção Transmissibilidade: ovos viáveis nas fezes a partir de 5 semanas após a infecção e por um período de 10 anos Giardia lamblia Período de Incubação: 1 a 3 semanas Transmissibilidade: enquanto persistir a doença Síndrome febril diarreica aguda + Síndrome abdominal Síndrome gastrointestinal + Síndrome diarreica + Síndrome de má absorção (complicação) Penetração pela pele -> causa prurido Ingestão oral de cistos presentes em água ou alimentos contaminados ou por via fecal-oral (de pessoa para pessoa) . Estertores, roncos e sibilos podem ser ouvidos à ausculta pulmonar - Manifestaçõesgastrointestinais: dor abdominal, náuseas, borborigmo, diarreia e alterações do apetite - Depende do estado de evolução - Fase aguda: assintomática ou apresentar como dermatite cercariana (micro pápulas eritematosas e pruriginosas) - Febre de Katayama-> dura de 2 a 10 semanas, febre elevada (39º) + calafrios + cefaleia + prostração + mialgia + anorexia + mal estar + dor abdominal + diarreia + sintomas respiratórios (tosse, dor torácica e dispneia) - Fase crônica: fadiga, dor abdominal intermitente e diarreia + hepatomegalia (presença de granuloma- níveis das transaminases normais) - Possíveis Complicações . Hepatomegalia . Esplenomegalia . Hemorragia digestiva . Hipertensão pulmonar e portal - Fezes malcheirosas, flatulência, perda de peso (anorexia), cólicas abdominais, náuseas, síndrome de má-absorção, esteatorreia, fadiga e anorexia - Início: diarreia líquida e profusa (até 10 dejeções ao dia) - Fezes tornam-se gordurosas e flutuantes (Esteatorreia) . Categorias: má digestão intraluminal, má absorção pela mucosa intestinal e má direito -> larvas são levadas ao pulmão, rompem a parede alveolar e são deglutidas novamente para o intestino para se tornarem vermes adultos - Ovos do parasita liberados na água produzem miracídeos (forma infectante dos caramujos), nos caramujos transformam-se em cercarias, estágio móvel do parasita que é liberado e infecta os humanos. Ao penetrarem na pele, as cercarias deixam uma pequena lesão superficial e migram para os pulmões e para o fígado, fazendo com que o verme estabeleça uma infecção de longa duração nos vasos sanguíneos do hospedeiro. - A partir do fígado, o parasita infecta a bexiga urinária, os rins e a uretra, e a fêmea produz uma grande quantidade de ovos. Os ovos são excretados na urina e passam pela parede intestinal, sendo excretados nas fezes. Há ingestão oral dos cistos que entram em contato com a acidez do estômago, liberando um a dois trofozoítos que infectam o intestino delgado, caminham para o cólon, sofrem novo encistamento e são eliminados pelas fezes. - Obs: em caso de relato de eliminação do verme pelas fezes -> diagnóstico confirmado - Diagnóstico diferencial: febre tifoide, forma aguda de calazar e geo- helmintíases agudas - Hemograma: leucocitose com intensa eosinofilia - Radiografia de tórax: pode revelar infiltrado nodular difuso - EPF -> identificação de cistos ou trofozoítos -> ao menos 3 amostras de fezes para detecção - Hemograma: ausência de eosinofilia - Mebendazol, Albendazol, Ivermectina, Levamizol (exclusivo para áscaris/ mais usado) e Nitazoxanida - Prazinquantel ou Oxamniquina (exclusivo S. mansoni) - Secnidazol - Tinidazol - Metronidazol - Protocolo de saneamento básico - Eliminação do caramujo hospedeiro das cercarias - Protocolo de Saneamento - Higiene Pessoal - Evitar Sexo Oroanal e Orogenital - Diagnóstico Diferencial: diarreia por mais de 8 dias Trichuris trichiura Enterobius vermiculares (Oxyurus vermiculares) - Pequeno, coloração branca e aspecto de linha - Período de Incubação: 2 a 6 sintomas Síndrome Disentérica Síndrome diarreica Água, solo e alimentos contaminados com os ovos - Fecal-oral (retroinfecção ou autoinfecção) ou indireta (alimentos, poeira ou roupas contaminadas com ovos) - Infecção leve: anorexia, irritabilidade, insônia ou sonolência, palidez - Infecção moderada a grave: sintomas gastrointestinais, dores abdominais, diarreia (podendo ser disentérica), desconforto abdominal e prolapso retal - Irritabilidade, diarreia, náuseas, anorexia, vômitos, dor abdominal e prurido na região anal - Sexo feminino: vulvovaginite devido à proximidade com o ânus - Obs: sintomas apenas quando há infecções sucessivas Ingestão dos ovos -> ação das secreções digestivas -> saída das larvas na porção final do intestino delgado -> penetram nas criptas glandulares do ceco, onde permanecem por 2 dias -> mucosa do intestino grosso -> vermes adultos -> parte cefálica do corpo mergulhada na mucosa intestinal - > irritação, hemorragias e ulcerações - Ciclo evolutivo direto -> não há passagem de formas larvárias pelo fígado e pelo pulmão - Ciclo: ingestão de ovos -> eclodir na luz do intestino delgado -> liberação das larvas -> migração lenta até a região do ceco -> vermes adultos -> no ceco copulam e cada fêmea produz cerca de 11000 ovos - Diagnóstico Diferencial: ascaridíase, giardíase, amebíase e teníase . Quando associado à anemia: diferencial com ancilostomíase - Hemograma: ausência de eosinofilia ou pouco expressiva - Anemia hipocrômica e microcítica é achado comum em crianças - EPF (técnica de ovos pesados) - Teste da fita adesiva: presença dos ovos e fêmeas na região anal do paciente, com auxílio de uma fita adesiva transparente, que retirará uma amostra nas primeiras horas do dia, antes do indivíduo defecar ou tomar banho. . Este material é analisado em microscópio, para confirmação da presença do parasita. - Albendazol - Mebendazol - Nitazoxanida - Pamoato de Pirvínio – 1ª opção de tratamento - Mebendazol - Albendazol - Nitazoxanida - Protocolo de saneamento básico - Higiene Pessoal - Tratamento do doente - Protocolo de saneamento básico - Higiene Pessoal - Tratamento do doente MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O quadro clínico geral das parasitoses intestinais, na grande maioria dos casos, é oligossintomático ou assintomático. A intensidade das manifestações clínicas depende de vários fatores, individuais, parasitários e ambientais. Embora a maioria das parasitoses intestinais apresente quadro clínico indistinguível, há algumas particularidades em sua morbidade que as diferenciam. As manifestações clínicas mais comuns incluem: Grande parte dos pacientes com infecções por enteroparasitas são oligossintomáticos ou apresentam predomínio de sintomas inespecíficos, tais como: • Diarreia • Dor abdominal • Mal-estar • Náuseas • Vômitos • Perda de peso • Distúrbios do apetite Dependendo, em parte, da carga parasitária e especialmente em crianças desnutridas, os enteroparasitas podem espoliar e contribuir significativamente para que haja déficit ponderal e dificuldade de aprendizado. Irritabilidade, hiperatividade e distúrbios do sono podem ser manifestações de hipotética ação tóxica de substâncias produzidas pelos vermes. Manifestações alérgicas cutâneas ou broncopulmonares podem estar associadas à fase aguda de infecções parasitárias. Substâncias alergênicas de Ascaris sp. por exemplo, já estão bem caracterizadas. No local de estabelecimento da infecção por larvas que penetram pela pele (ancilostomídeos e Strongyloidessp.), pode ocorrer dermatite puntiforme, com prurido, popularmente conhecida como “coceira da terra”. A passagem pelo pulmão de larvas de Ascaris sp., Necator americanus ou Ancylostoma duodenale (ancilostomídeos) e Strongyloides sp. pode desenvolver tosse, febrícula, eosinofilia no hemograma e opacidades evanescentes no exame radiológico do tórax. A anemia e todas as suas manifestações e complicações podem ocorrer concomitantemente à infecção por ancilostomídeos, os quais se fixam pela cápsula bucal à mucosa intestinal e sugam sangue. O “amarelão” foi consagrado no Brasil por Monteiro Lobato por meio do personagem Jeca Tatu: o caboclo de pés descalços, acocorado e cansado,de tez amarelada. O prurido anal é a manifestação característica da enterobíase: as fêmeas são eliminadas com o útero cheio de ovos, arrebentam no canal anal, e os ovos pegajosos se espalham e irritam o períneo. Os proglotes de Taenia sp., também cheios de ovos, podem realizar processo semelhante e são a segunda causa significativa desse sintoma. A maioria das parasitoses intestinais é bem tolerada pelo hospedeiro imunocompetente, cursando de forma assintomática ou com sintomas gastrointestinais inespecíicos (dor abdominal, vómitos e diarreia), frequentemente associados a perda de peso. Contudo, há aspectos particulares de alguns parasitas que podem orientar o diagnóstico etiológico e que devem ser considerados: ➢ Giardia lamblia: Possui um amplo espectro clínico incluindo ausência de sintomas, diarreia aguda com ou sem vómitos e diarreia crónica. A diarreia crónica associa-se frequentemente a sintomas de mal absorção intestinal (fezes fétidas, latulência, distensão abdominal), anorexia, má progressão ponderal ou perda de peso e anemia. Na giardíase, além da diversidade de variações da apresentação da dor abdominal, pode ocorrer síndrome disabsortiva, manifestada por fezes diarreicas abundantes, com massa fecal luzidia, espumosa e fétida. ➢ Enterobius vermicularis: Predomina o prurido anal noturno, por vezes com agitação importante. São causa frequente de vulvovaginite. A eventual relação causal com alguns sintomas como bruxismo, enurese noturna e perda de peso nunca foi confirmada. ➢ Ascaris lumbricoides: Pode cursar com queixas inespecíficas de dor ou desconforto abdominal e sintomas de mal absorção quando a infecção é prolongada. Na fase de migração larvar pode haver envolvimento pulmonar, sob a forma de pneumonite transitória aguda, com febre e eosinofilia (Síndrome de Löfler), que pode ocorrer semanas antes da sintomatologia gastrointestinal. A obstrução intestinal alta é a complicação mais frequente em parasitações volumosas. A migração dos vermes adultos através da parede intestinal pode provocar colecistite, colangite, pancreatite de causa obstrutiva e peritonite. ➢ Trichuris trichiura: Os indivíduos afetados podem manter-se assintomáticos, desenvolver um quadro disentérico (dor abdominal, tenesmo, diarreia mucosanguinolenta) ou colite crónica, frequentemente com tenesmo e prolapso rectal. Pode manifestar-se por anemia. ➢ Entamoeba histolytica: A infecção pode variar de estado de portador assintomático (até 90% dos casos) a doença invasiva grave. A forma aguda pode cursar com diarreia sanguinolenta, associada a dor abdominal, tenesmo e desidratação. Nesta fase podem surgir complicações graves incluindo megacólon tóxico, colite necrosante fulminante e perfuração intestinal. As formas crónicas manifestam-se por queixas intermitentes de dor abdominal e diarreia não sanguinolenta, associadas a perda de peso. Pode ainda ocorrer ameboma ou abcesso hepático. A amebíase intestinal provoca disenteria, causando múltiplas evacuações de volume reduzido, com muco, pus ou sangue. Além disso, a invasão da submucosa pelas amebas propicia disseminação hematogênica e os quadros de amebíase extraintestinal, com abscessos localizados principalmente no fígado e no cérebro. ➢ Cryptosporidium: Manifesta-se por diarreia aquosa profusa, por vezes com muco, sem sangue, com vómitos, náuseas, dor abdominal tipo cólica e por vezes febre. A infecção pode ser assintomática, auto- limitada ou arrastada. Cryptosporidium sp., Isospora sp., Cyclospora sp. e microsporídios passaram a ter mais destaque como causadores de diarreia com a epidemia de Aids. Em indivíduos imuno-competentes, eles são atualmente reconhecidos como importantes patógenos de transmissão hídrica, ocasionando sintomas de curta duração e com remissão espontânea. ➢ Ténias: A infecção é frequentemente assintomática, mas pode cursar com sintomas gastrointestinais ligeiros incluindo náuseas, diarreia e dor abdominal1. A passagem das proglótides através do ânus, pode originar desconforto e sensação de tenesmo. A infecção por Diphyllobotrium latum pode manifestar-se com sintomas de anemia por carência de vitamina B12 como fadiga, palidez, glossite ou parestesias. ➢ Ancilostomas: A infecção habitualmente ocorre pela penetração da larva através da pele, podendo posteriormente atingir os pulmões, originando pneumonite normalmente ligeira. A infecção também pode ocorrer por ingestão, sendo que a presença de vermes adultos no tubo digestivo se manifesta de forma inespecífica por dor abdominal. A infecção intestinal pode levar à formação de úlceras com consequente perda crónica de sangue e anemia microcística hipocrômica moderada a grave. Pode também associar-se a hipoproteinemia e edema. ➢ Strongyloides stercoralis: A infecção ocorre por penetração da larva através da pele, atingindo posteriormente os pulmões. As queixas intestinais assemelham-se ao síndrome do cólon irritável, alternado períodos de diarreia com períodos de obstipação, associados a dor abdominal intermitente. A infecção intestinal crónica cursa com diarreia crónica, associada a sintomas de má-absorção. O Strongyloides stercoralis apresenta peculiaridades importantes. Os adultos vivem no interior das criptas do duodeno e são vivíparos: do interior do útero não saem ovos, mas sim as larvas de primeiro estágio. Geralmente essas larvas desenvolvem-se apenas no meio externo, para produzir as formas infectantes, larvas de terceiro estágio (L3). Entretanto, sob a influência de vários fatores estressantes e imunodepressores, especialmente o uso de corticoides, pode ocorrer uma aceleração da maturação das larvas para o terceiro estágio ainda dentro do intestino. Com isso, as larvas penetram na pele e atingem a circulação. Elas podem migrar pelo caminho habitual em direção ao pulmão, com saída no espaço alveolar e retorno ao tubo digestivo após deglutidas, o que se denomina hiperinfecção. Esse fenômeno parece explicar casos em que a infecção se mantém por muitos anos. ➢ Anisakis simplex: A infecção por este parasita, que ocorre através da ingestão de peixe cru ou mal cozinhado, por originar um quadro de gastrite com epigastralgias, náuseas e vómitos. Pode estar também na origem de reações alérgicas (urticária aguda ou anailaxia). ➢ Schistosomas: A infecção ocorre por penetração das larvas através da pele. O envolvimento gastrointestinal manifesta-se habitualmente por quadro de diarreia mucosanguinolenta, associada a dor abdominal intensa e hepatomegália dolorosa. Pode associar-se a polipose cólica. A infecção por este parasita deve ser considerada, em crianças que viajaram para áreas endémicas, que incluem a África subsaariana, América Latina e Caribe. A esquistossomose pode apresentar-se na fase aguda e na fase crônica da infecção com comprometimento do intestino grosso, manifestando-se como diarreia ou disenteria, inclusive com fezes contendo muco e sangue. O fator mais característico é o comprometimento hepático, geralmente associado às formas intestinais. Ocorre também hepatite granulomatosa que pode desenvolver lentamente um quadro de fibrose, resultando em insuficiência hepática e hipertensão portal grave. No doente imunocomprometido a clínica costuma ser mais exuberante, com diarreia crónica, por vezes com grande repercussão sistémica e complicações extra-intestinais, podendo ser eventualmente fatal. Os parasitas mais frequentemente encontrados nestes doentes são: Cryptosporidium, Isospora belli, Cyclospora cayetanensis, Amebas, Giardia lamblia e Strongyloides stercoralis Por vezes é possível visualizar os parasitas ou parte deles. Os oxiúros (Enterobius vermicularis), pequenos vermes esbranquiçados de 2,5 a 12 mm, podem ser observados nas margens do ânus, nas fezes e por vezes na urina das meninas, por arrastamentodurante a micção. Os Ascaris lumbricoides, de 15 a 31 cm, podem ser expelidos pela boca, nariz ou ânus. As proglótides das Ténias, segmentos rectangulares de até 12 x 6mm, têm movimentos de reptação e podem ser visualizados nas margens anais. No caso de Ancilostomas, Strongyloides stercoralis e Schistosomas é possível visualizar o trajeto de migração subcutâneo das larvas. CONDUTA DIAGNÓSTICA Salvo em situações raras em que os parasitas são visualizados, é necessário apoio do laboratório para o diagnóstico. O diagnóstico das parasitoses, além do aspecto clínico, pode ser complementado pelo laboratorial. Existem vários métodos coproparasitológicos utilizados pelos laboratórios. Quando o médico solicita parasitológico de fezes sem especificar o método ou o parasita de maior suspeita clínica no caso, o laboratório realiza em média 2 a 3 testes mais abrangentes, mas que, por vezes, podem não ser os métodos ideais para a parasitose em questão. Por isso, um exame negativo não afasta, e um exame positivo confirma. Sendo assim, cabe ao pediatra dirigir a investigação apontando a parasitose de maior suspeita do caso e solicitar ao laboratório uma pesquisa dirigida do parasita. ANAMNESE A anamnese deve incluir informações detalhadas sobre: • Características das fezes (por exemplo, aquosas, sanguinolentas ou gordurosas. Também a consistência, cor, volume, frequência. • Frequência das crises de diarreia (contínua, intermitente). • Início (congênito, abrupto, gradual). • Duração dos sintomas (contínua, intermitente). • Presença de sintomas entéricos associados (por exemplo, náusea/vômito, febre, dor abdominal). • Histórico de ingestão de alimentos (por exemplo, alimentos crus/contaminados, intoxicação alimentar). • Condições predisponentes (por exemplo, hospitalização, uso de antibióticos, estado imunocomprometido). • Fatores epidemiológicos (história de viagem, exposição a alimentos contaminados, história de membros da família apresentando o mesmo quadro). • Presença de perda de peso (objetivamente mensurada). • Fatores agravantes (p. ex., dieta e estresse). • Fatores atenuantes (p. ex., dieta e medicações). • Investigação de doenças sistêmicas (intolerância à lactose, hipertireoidismo, DM, imunodeficiências, etc.) • A caracterização de sintomas noturnos, de manifestações extraintestinais envolvendo boca, pele, olhos, articulações, episódios de abscessos perianais ou fissuras e fístulas ou prolapsos anais também devem estar descritos na história da moléstia atual. EXAME FÍSICO O exame físico deve avaliar: • O estado geral • Peso e Índice de Massa Corporal • Coloração de mucosas (a evidência de mucosas com aspecto pálido compõe o quadro da anemia causada pelos ancilostomídeos). São comuns alterações relacionadas à desnutrição e anemia. O exame físico não evidencia sinais específicos. Abaulamento do abdome pode indicar ascite devido à desnutrição grave, em geral associado à infecção parasitária. Dor localizada no epigástrio e no hipocôndrio direito, que sugere duodenite, pode indicar giardíase ou estrongiloidíase. Se houver dor localizada, deve-se considerar as etiologias conforme o local preferencial de cada parasita, como indicado na figura. Sequência para exame: inspeção, ausculta, percussão e palpação. Atentar: Decúbito dorsal, Posição que relaxe a musculatura abdominal. Inspeção cicatrizes, estrias. movimentos peristálticos visíveis, veias dilatadas, hérnias. Se está simétrico e qual a sua formal Normal: abdome de forma globosa. Abdome protuberante é sinal de acúmulo de gordura som à percussão é normal, isto é timpânico! Atenção! Não realizar o exame com bexiga cheia ou logo após a alimentação. Observar reações do paciente: sinais faciais de dor ou desconforto. ■ Ausculta: verificar presença de ruídos intestinais ruídos hidroaéreos - som normal que se apresentam como borbulhamentos e cliques. ■ Percussão: normalmente timpânica, mas em alguns locais pode ser localizado sons maciços devido à presença de líquidos e fezes. Abdome protuberante: com flancos abaulados pode haver presença de líquido - ascite. Percussão apresenta submaciçez. Apendicite: normalmente a dor inicia-se perto do umbigo e se desloca para o quadrante inferior direito. A dor aumenta quando se pede para o doente tossir. ■ Palpação: superficial e profunda. Na superficial procurar por hipersensibilidade, resistência muscular e possível presença de massa abdominal. Já na palpação profunda, verificar os órgãos e definir massa já palpável. Enovelamento de ascariadiase causando obstrução - Ao exame físico, pode-se palpar tumoração de consistência mais amolecida no quadrante inferior direito do abdome. EXAMES COMPLEMENTARES DIAGNÓSTICO LABORATORIAL A colheita de sangue tem pouca utilidade para o diagnóstico. Mas pode ser detectada: → Eosinofilia (> 500 eosinófilos/mm3) ou hipereosinofílica (>1500 eosinófilos/mm3) quando se trata de helmintos com envolvimento extra intestinal, especialmente Strongyloides stercoralis, Ancilostomas, Schistosomas e em menor grau o Ascaris lumbricoides na sua fase larvar. A Giardia lamblia e os outros protozoários não provocam eosinoilia, bem como o helminta Enterobius vermicularis. → Pode haver anemia por espoliação no caso dos Ancilostomas e Trichuris trichiura ou por défice de vitamina B12 e folato como na parasitação por Strongyloides stercoralis e Diphyllobotrium latum4,15. As serologias podem ter utilidade em casos pontuais (Entamoeba histolytica, Strongyloides stercoralis, Schistosomas), em combinação com outras técnicas de laboratório. Nos casos de suspeita de reação alérgica ao Anisakis simplex deve recorrer-se ao doseamento da IgE especíica. As amostras de fezes devem ser adequadamente coletadas, conservadas e examinadas. Devem ser colhidas em três dias não consecutivos e cobertas para evitar desidratação ou contaminação. Se não puderem ser entregues para análise até uma hora após a coleta, devem ser conservadas em mertiolato, iodo, formol ou álcool de polivinila. Existem vários métodos para detecção dos parasitas nas fezes e para que haja maior sensibilidade e especificidade nos resultados é necessário que se utilize a técnica adequada para cada parasita. Os métodos podem ser agrupados em: • Diretos: identifica as formas vegetativas de protozoários • Enriquecimento ou concentração: • Hoffman, Lutz, Pons e Janer (eficiente na pesquisa de cistos de protozoários e de ovos pesados de helmintos como: áscaris, esquistossoma e cestóides) • Método quantitativo de Kato modificado por Katz (fornece o número de ovos pesados/por grama de fezes; preconizado para ovos pesados de helmintos e de Trichura trichiuris). • Método de Willis (pesquisa de ovos leves de ancilostomídeos, oxiúros e Trichura trichiuris). • Método da centrífugo-flutuação em sulfato de zinco (Faust) ou da centrífugo-sedimentação em formol-éter (pesquisa de cistos de protozoários em fezes formadas e de ovos leves de helmintos). • Método de Baerman-Morais ou de Rugai (pesquisa de estrongilóides). Outros métodos: • Tamização das fezes (diagnóstico de teníase) • Swab anal (oxiuríase) • Biópsia de válvula retal (esquistossomose) • Biópsia duodenal e análise direta e após coloração pela hematoxilina férrica das fezes, raspado retal ou do mucoduodenal (giardíase ou amebíase). • Intradermorreação e determinação de anticorpos séricos (esquistossomose, amebíase e giardíase). • Pesquisa de oócistos de criptosporideo e de isospora (coloração pela safranina e azul de metileno). A colheita de fezes deve ser feita em três dias consecutivos e conservar-se as amostras no frigoríico, a 4ºC, até serem entregues no laboratório. A sensibilidade melhora se o intervalo entre cada colheita for de 48 horas. Na presençade diarreia não se deve desperdiçar a fase líquida porque é a que contém mais trofozoítos. A transmissão da informação clínica ao laboratório é de extrema importância porque são utilizadas diferentes técnicas de preparação das fezes (coloração, concentração, etc.) consoante a hipótese diagnóstica colocada. ➢ Giardia lamblia: O exame direto das fezes permite o diagnóstico em 85-95% dos casos, quando analisadas 2 ou mais amostras. Se existe forte suspeita clínica e o exame parasitológico de fezes é negativo pode recorrer-se a técnicas de ELISA ou imunoluorescência para a detecção de antigénios nas fezes, com uma sensibilidade e especificidade muito próximas de 100%. Estudos recentes revelam a técnica de PCR como promissora para o diagnóstico de giardíase. Quando os trofozoítos e os cistos não são detectados nas fezes devido ao carácter intermitente da sua eliminação, pode haver necessidade de proceder à sua pesquisa em conteúdo de aspirado duodenal ou material de biópsia. ➢ Enterobius vermicularis: Os oxiúros podem ser detectados ocasionalmente nas fezes, mas raramente os seus ovos (5% dos casos), não sendo, portanto, recomendado o exame parasitológico de fezes para o diagnóstico desta infecção. A forma mais simples de fazer o diagnóstico é identificar os ovos mediante a colocação de uma fita-cola sobre o ânus durante a noite (altura em que as fêmeas saem para pôr os ovos), que será retirada de manhã e colada numa lâmina de vidro para ser visualizada ao microscópio. Outra possibilidade é utilizar a técnica de Graham (fig. 1) que consiste no toque das margens anais com a parte aderente da ita-cola com a ajuda de uma espátula, logo de manhã e antes de qualquer manipulação, para fazer a recolha dos ovos. ➢ Ascaris lumbricoides: Normalmente basta apenas uma amostra de fezes para detectar os ovos. A clínica pulmonar é provocada por larvas, pelo que não se encontram ovos nas fezes durante essa fase, mas sim cerca de quatro semanas depois. ➢ Trichuris trichiura: Os seus ovos podem ser encontrados nas fezes. ➢ Entamoeba histolytica: Embora os trofozoítos e quistos possam ser identiicados nas fezes, é difícil distinguir da Entamoeba dispar, que é mais frequente e não invasiva (contudo, a presença de trofozoítos contendo glóbulos vermelhos ingeridos é a favor de Entamoeba histolytica). Algumas técnicas como a PCR, métodos enzimáticos e o uso de anticorpos monoclonais ajudam a fazer esta distinção. ➢ Cryptosporidium: Os oócistos podem ser visualizados nas fezes ou na superfície de tecido de biópsia, exigindo, contudo, técnicas especíicas de coloração, como a coloração de Ziehl-Neelsen ou Kinyoun modificadas. Estão também disponíveis técnicas de imunoluorescência (IFA) ou imunoenzimáticas (EIA) para detecção de antigénios nas fezes. ➢ Ténias: A visualização das proglótides é patognomônico. ➢ Strongyloides stercoralis: As larvas poderão ser procuradas nas fezes (cultura de larvas durante 1-7 dias), no conteúdo duodenal e na expectoração. ➢ Schistosomas: O esfregaço espesso de Kato nas fezes é a técnica mais adequada para a pesquisa dos ovos. CONDUTA TERAPÊUTICA PEDIATRICO Todos os medicamentos usados para o tratamento das verminoses dependem da idade da criança (cuidados especiais para os menores de 1 ano), do tipo de parasitose intestinal e do quadro clínico. Às vezes, existe a necessidade do tratamento de toda a família pela alta chance de transmissão, como o caso da oxiuríase. O tratamento profilático é discutível, tem sido preconizado para locais com alta prevalência (superior a 50% em pré-escolares e escolares) em dois ciclos anuais com intervalo de seis meses. Em casos de poliparasitismo, recomenda-se utilizar drogas polivalentes e iniciar o tratamento para parasitas com risco de migração e para os que comprometem mais o estado geral da crianças. Os pacientes que serão submetidos a anestesia geral, devem tratar previamente os parasitas com capacidade migratória (por exemplo, Ascaris lumbricóides). Para os pacientes que serão submetidos à terapêutica com imunossupressor, deve-se optar pelo tratamento de parasitas com capacidade de disseminação (Strongilóides stercolaris). As opções de tratamento das parasitoses intestinais mais frequentes na infância são apresentadas no Quadro 1. ATENÇÃO!!! Não se pode esquecer de tratar a anemia por deficiência de ferro com o emprego de ferroterapia oral após o tratamento da parasitose intestinal. A suplementação vitamínica só deve ser feita mediante diagnóstico de deficiência de vitaminas ou outros nutrientes, exceto nas crianças menores de 2 anos, que já fazem a suplementação preventiva de vitamina D e ferro. ADULTO O tratamento das parasitoses intestinais deve ser indicado a partir de manifestações clínicas e do diagnóstico etiológico. O tratamento “preventivo” periódico deve ser descartado, pois é uma conduta que ignora a diversidade dos agentes, que podem ser protozoários ou vermes, cilíndricos ou chatos, com peculiaridades quanto à droga de escolha em cada caso (Tab. 69.2). A administração de medicamentos sem evidência de doença expõe o indivíduo a efeitos adversos e tóxicos. Além disso, eliminar infecções assintomáticas pode agravar estados de hipersensibilidade e lesões autoimunes, o que tem sido objeto de estudos atualmente em torno da “hipótese da higiene”. De maneira geral, em indivíduos imunocompetentes, as infecções por Cryptosporidium, Cyclospora, Isospora e microsporídeos são de remissão espontânea. Em qualquer situação, mais importante que o tratamento específico são as medidas de correção dos distúrbios hidreletrolíticos, pois a principal causa de morte em pacientes com essas infecções é a desidratação. ATUAÇÃO PERANTE A SUSPEITA DE PARASITOSE INTESTINAL → Na presença de sintomatologia sugestiva de oxiúros (Enterobius vermicularis), como prurido anal nocturno, agitação nocturna ou vulvovaginite, recorrer ao teste da fita-cola perianal como diagnóstico. Se positivo, tratar a criança e o seu agregado familiar, não esquecendo a higiene pessoal (banho, unhas) e da casa (lençóis, toalhas, roupas), de forma a evitar re-infestações. Se negativo, excluir outras causas para a sintomatologia apresentada (dermite perianal, hemorróides ou outra patologia anorrectal, abuso sexual, etc.). Caso haja dificuldade para efectuar o teste, poderá ser feita prova terapêutica com todos os cuidados adicionais. → Nos casos de sintomatologia gastrointestinal inespecífica deve recorrer-se ao exame parasitológico de fezes (três amostras, de preferência em dias alternados). Se positivo, tratar a criança de acordo com o parasita identificado. Se o teste parasitológico de fezes for negativo, mas a suspeita de parasitose for importante nomeadamente em viajantes, crianças em infantário ou em zona endémica, repetir o exame parasitológico ou, no caso de suspeita de Giardia lamblia, fazer pesquisa de antigénios nas fezes. Perante um segundo exame parasitológico de fezes negativo e pesquisa de antigénios também negativa, parece-nos lícita a realização de uma prova terapêutica antes de avançar para procedimentos mais agressivos (aspirado duodenal, biopsia), que devem ficar reservados para situações de resistência ao tratamento. → O albendazol parece ser o fármaco mais adequado para utilizar como terapêutica empírica, uma vez que é activo contra o maior número de parasitas intestinais, incluindo os mais frequentes no nosso país (Giardia lamblia, Enterobius vermicularis, Trichuris trichiura, Ascaris lumbricoides). → Em situações específicas, como na diarreia prolongada do doente imunocomprometido, está indicado exame parasitológico de fezes com coloração de Ziehl-Neelsen modificada e pesquisa de antigénios nas fezes (para identiicação do Cryptosporidium)e cultura de larvas por incubação de fezes (para diagnóstico de Strongyloides stercoralis). → Em viajantes de áreas endémicas para Schistosomas está indicada a técnica do esfregaço espesso de Kato nas fezes. A serologia pode ser útil em casos de suspeita de Schistosomas com exame de fezes negativo ou de Amebíase extra-intestinal. → Em crianças oriundas de áreas endémicas de cisticercose deve ser excluída previamente esta patologia antes da administração de terapêutica desparasitante (como albendazol, praziquantel). PROFILAXIA As desparasitações sistemáticas não evitam as reinfestações. As únicas medidas preventivas que devem ser adoptadas são as direccionadas para interromper o ciclo epidemiológico. Para isso, é fundamental o controe das águas com saneamento básico, controle do solo com técnicas de rega e fertilização adequadas e controle dos animais tendo em atenção o consumo de carne e peixe e a existência de animais domésticos. A nível individual, a lavagem das mãos, a preparação adequada dos alimentos como lavagem de frutas e vegetais e evitar carne e peixe mal cozinhados, bem como o consumo de água filtrada e clorada são a melhor forma de proteção. Não se justificam as desparasitações “de rotina”, sem evidência de parasitação. Aliás, o uso generalizado dos anti-parasitários pode conduzir ao desenvolvimento de resistências, com redução da eicácia dos fármacos usados actualmente como primeira linha. Por outro lado, estudos recentes têm focado a importância da Teoria da Higiene em que é realçado o papel simbiótico entre hospedeiro e helmintas, considerado potencialmente benéico na presença de poucos parasitas. . No caso especial de crianças emigrantes, vindas de áreas endémicas para certos parasitas, poderá estar indicada a realização de exame parasitológicos de fezes nas primeiras consultas de rotina, mesmo na ausência de sintomas. As recomendações atuais da OMS incluem a desparasitação profiláctica de rotina com anti-helmínticos (albendazol) apenas nos países com taxas de prevalência de parasitismo intestinal superiores a 20% e principalmente superiores a 50%. As crianças com infecção sintomática por Giardia lamblia, que frequentam infantário, deverão manter-se em casa, sem ir a escolar até ao desaparecimento da diarreia. Todos os doentes sintomáticos deverão ser tratados incluindo crianças, trabalhadores do infantário e familiares, não esquecendo o reforço das medidas de higiene como a lavagem das mãos antes das refeições, após muda de fraldas ou ida aos sanitários. Os portadores assintomáticos não têm indicação para fazer tratamento, com excepção dos familiares das crianças com fibrose quística ou hipogamaglobulinémia e dos filhos pequenos de mães grávidas. De acordo com o número e local dos casos diagnosticados poderá ser conveniente informar a Secretária de Sáude da área. CONDUTA EDUCACIONAL Para a prevenção de parasitoses intestinais recomenda-se: → Lavar as mãos antes do consumo de alimentos e após o uso do banheiro, lavar bem as frutas e verduras, sempre lavar as frutas antes de comê-las, usar o banheiro para destino adequado das fezes, e andar calçado em locais arenosos que tenham acesso por animais; → Ingerir água clorada, filtrada ou fervida (não ingerir água e alimentos de fontes duvidosas); → Usar água filtrada ou fervida para higienizar os alimentos, lavar bem e utilizar os métodos adequados como colocar de molho em água sanitária e bicarbonato, proteger os utensílios e alimentos contra poeira e insetos, consumir carnes bem cozidas, e não oferecer às crianças alimentos crus, defumados ou malcozidos; → Depositar as fezes humanas em locais adequados e não as utilizar como adubo. → Manter os animais domésticos vacinados e vermifugados, além de recolher as fezes dos animais para locais seguros, já que podem ser fontes de contaminação; → Amamentar exclusivamente até os seis meses de idade, e complementado até os dois anos de idade; promover uma boa nutrição faz toda a diferença para minimizar as alterações causadas pelos parasitas. Manter domicílio sem insetos (moscas, baratas, pulgas); evitar varredura na casa, utilizando-se de limpeza com pano úmido, sobretudo quando há oxiurus. → Manter as unhas curtas e limpas, não compartilhar roupas intimas, não roer a unha, levar dedos ou objetos à boca; → Pesquisar portadores assintomáticos entre familiares, pessoas que manipulam alimentos e trabalhadores de instituições como creches, asilos, presídios e escolas. Imagem educativa na última página EPIDEMIOLOGIA As parasitoses intestinais ainda são um grave problema de saúde, principalmente nos países em desenvolvimento. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), perfazem o conjunto de doenças mais comuns do globo terrestre. A ascaridíase é a segunda infecção mais comum do planeta, com 807 a 1.221 milhões de pessoas acometidas, sendo a infecção dentária (cárie) a primeira. Além disso, na atualidade, há um incremento das parasitoses intestinais à custa das protozooses, com o surgimento do HIV (protozoários emergentes como o Cryptosporidium parvum). De modo geral, as parasitoses intestinais ocorrem principalmente nas áreas mais quentes, úmidas e desprovidas de saneamento básico. Elas afetam mais as crianças e os adultos jovens, seja por apresentarem maior exposição ou suscetibilidade. Em várias parasitoses, o desenvolvimento de mecanismos de resistência a novas infecções torna os adultos gradativamente menos suscetíveis. Possivelmente por algum efeito modulador da resposta imune a longo prazo, o convívio com parasitas parece reduzir a frequência e a intensidade de doenças alérgicas ou autoimunes. Em alguns estudos em populações de países mais desenvolvidos e com menor prevalência de parasitoses, tem sido observado gradativo aumento de ocorrência de doenças associadas a hipersensibilidade ou autoimunidade. Em termos mundiais os parasitas mais frequentes são os do grupo dos helmintas nemátodes, principalmente o Ascaris lumbricoides, Trichuris trichiura e Ancilostomas. Alguns enteroparasitas apresentam característica distribuição focal, como o Enterobius vermicularis e a Giardia intestinalis, afetando simultaneamente vários membros da família ou de grupo, como em escolas e creches. Isso acontece devido ao significativo processo que ocorre nesses parasitas: transmissão direta com desenvolvimento rápido da forma infectante logo após eliminação nas fezes. A Giardia sp. e o Cryptosporidium são protozoários com potencial zoonótico: além da transmissão inter-humana, animais domésticos ou silvestres podem ser reservatórios importantes desses organismos. As parasitoses intestinais determinam várias consequências; sua maior importância relaciona-se ao efeito nocivo sobre a nutrição das crianças, seu crescimento e o desenvolvimento cognitivo, o que reduz a escolarização e exerce impacto negativo sobre a produtividade no trabalho, com geração de barreira econômica e piora nos níveis de pobreza. Desta forma, mais do que um problema para a saúde, as enteroparasitoses representam um entrave ao desenvolvimento humano e econômico das nações. Outros aspectos são os custos gerados por cuidados médicos e as alterações nos ciclos biológicos dos parasitas em imunocomprometidos”, diz trecho do documento. As parasitoses intestinais representam as doenças mais comuns, com alta prevalência em países em desenvolvimento, associadas a múltiplos fatores socioeconômicos e ambientais, como o acesso limitado ao saneamento básico. Em países desenvolvidos ocorrem sob a forma de surtos, geralmente relacionados à contaminação da água. Estas parasitoses afetam um bilhão de pessoas no mundo e 49 milhões de crianças abaixo dos 15 anos em trinta países da América Latina e no Caribe estão em risco para aquisição de parasitosesintestinais. Apesar da grande relevância das parasitoses dentro do contexto de saúde pública, poucos estudos epidemiológicos são realizados, principalmente pelo fato de essas doenças estarem mais ligadas a países em desenvolvimento, onde a pobreza e as condições precárias de saúde e a falta de recursos em pesquisas interferem nos estudos epidemiológicos. Aliados à dificuldade da realização dos exames coproparasitológicos, poucos dados etiológicos são fidedignos. No Brasil observa-se uma diminuição da prevalência das parasitoses intestinais, possivelmente em decorrência da melhora de fatores sociais, sanitários e da organização dos serviços de saúde. A terapêutica medicamentosa é bastante satisfatória, mas as medidas profiláticas são indispensáveis. O último grande levantamento populacional sobre a prevalência das parasitoses no Brasil foi realizado em 2005, no qual foram analisados 26 trabalhos de maior relevância. Os resultados foram: • Prevalência geral das parasitoses de 15 a 80%; • Parasitoses em lactentes com 15%; • Parasitoses em escolares de 23,3 a 66,3%; • Poliparasitismo de 15 a 37%. FATORES DE RISCO Fatores predisponentes Idade – escolar Fatores precipitantes Condições socioeconomicas desfavoráveis Baixa escolaridade materna Instalações sanitárias inadequadas Ausência de saneamento básico Moradias aglomeradas Poluição fecal da água e de alimentos consumidos Fatores socioculturais Contato com animais Locais institucionalidos (ex. abrigos, orfanatos creches). COMPLICAÇÕES Um alto número de parasitos pode causar complicações nas crianças, principalmente naquelas que são desnutridas ou que apresentam imunidade diminuída. Além disso, aqueles que ocasionam perda de sangue nas fezes podem provocar anemia ferropriva. Vale lembrar que a deficiência de ferro pode se associar com possível alteração no aprendizado da criança. • Agravamento da desnutrição da criança • Anemia • Infecções maciças Ascaridíase. Obstrução intestinal, perfuração intestinal, volvo, colecistite, pancreatite, abscesso hepático, manifestações pulmonares (broncospasmo, hemoptise, pneumonite – síndrome de Löefler –, eosinofilia importante). Tricuríase. Anemia severa, em grandes infestações, e o decorrente atraso no desenvolvimento de crianças, em condições crônicas. Giardíase. Síndrome de má absorção. Enterobíase. Vulvovaginites, salpingites, infecções devido às escoriações provocadas pela coçadura, granulomas pélvicos. Estrongiloidíase. Síndrome de má absorção, síndrome de Löefler. Em imunocomprometidos, em uso de corticoides ou com desnutrição grave: edema pulmonar, superinfecção, infecção oportunística. Formas sistêmicas: sepse. Ancilostomíase. Anemia, hipoproteinemia (insuficiência cardíaca, anasarca), hemoptise, pneumonite (quando larvas migram para os pulmões). Amebíase. Granulomas (amebomas) no intestino grosso, abscesso hepático, abscesso cerebral, abscesso pulmonar, colite fulminante, empiema, pericardite. Teníase/cisticercose. Quando há ingesta, pelo homem, de ovos da tênia adulta, os embriões podem migrar para o SNC, causando a neurocisticercose, sendo considerada a mais grave das infecções parasitárias do sistema nervoso humano, podendo causar convulsões, hipertensão intracraniana, cefaleia e meningite. A cisticercose pode localizar-se também no globo ocular, causando cegueira, e no tecido muscular, causando cãibras. A neurocisticercose é considerada a causa isolada mais comum de epilepsia. Esquistossomose. A partir da penetração das larvas cercárias na pele ou nas mucosas e todo o ciclo realizado na circulação sanguínea, fígado, intestino, a doença apresenta a forma aguda, e a crônica, a partir de 120 dias do início do ciclo. A forma aguda se caracteriza por diarreias sanguinolentas, e a fase crônica pode apresentar a forma hepatoesplênica, que pode causar cirrose, aumento do fígado e baço; em situações descompensadas, ascite. Pode causar também hipertensão porta, com o aparecimento de varizes esofágicas que podem provocar hemorragia digestiva alta, além de anemia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BELO, Vinícius Silva et al. Fatores associados à ocorrência de parasitoses intestinais em uma população de crianças e adolescentes. Rev. paul. pediatr., São Paulo, v. 30, n. 2, p. 195-201. 2012. BRASIL. Linha de cuidado criança: manual de acompanhamento da criança. 3ª ed. São Paulo: Secretaria da Saúde, 2018. FERNANDES, Sofia et al. Protocolo de parasitoses intestinais. Acta Pediátrica Portuguesa, v. 43, n. 1, p. 35-41, 2012. FOCHESATTO, Filho L; BARROS, E. Medicina Interna na Prática Clínica. Porto Alegre: Artmed; 2013. GUSSO, Gustavo; LOPES, José MC, DIAS, Lêda C, organizadores. Tratado de Medicina de Família e Comunidade: Princípios, Formação e Prática. Porto Alegre: ARTMED, 2019. KASPER, Dennis L. Medicina interna de Harrison. 19 ed. Porto Alegre: AMGH Editora, 2017. PORTO, Celmo Celeno; PORTO, Arnaldo Lemos Porto. Exame clínico. 8ª Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. SBP. SBP divulga documento sobre parasitoses intestinais. Sociedade Brasileira de Pediatria. 2020. Tratado de pediatria: Sociedade Brasileira de Pediatria. 4ª ed. São Paulo: Manole, 2017. ZATERKA, Schlioma; EISIG, Jaime Natan. Tratado de gastroenterologia da graduação à pós-graduação. 2ª ed. São Paulo: Atheneu, 2016. Imagem educativa na próxima página →
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