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Autoras: Profa. Luciana Gavilan Dias Folchetti Profa. Milena Baptista Bueno Colaboradoras: Profa. Mônica Teixeira Profa. Carolina Kurashima Nutrição em Saúde Pública Professoras conteudistas: Luciana Gavilan Dias Folchetti / Milena Baptista Bueno Luciana Gavilan Dias Folchetti Graduada em Nutrição pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP) em 2008. Técnica em Informática pela Escola Técnica de São Paulo (Etec) em 2012. Mestre e doutora em Nutrição em Saúde Pública pela FSP/USP em 2012 e 2016, respectivamente. Professora titular na Universidade Paulista (UNIP) desde 2016 nos cursos de graduação de Nutrição e Enfermagem, ministrando disciplinas relacionadas à saúde pública e a técnicas de preparo e produção de alimentos. Atuou como nutricionista em saúde pública no Núcleo de Apoio à Família (Nasf) em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) da Zona Leste de São Paulo de 2016 a 2018 e atuou em consultório particular (2010 a 2015). Tem experiência em pesquisas epidemiológicas em saúde e informática médica, inclusive com a publicação de artigos. Faz parte do grupo de pesquisas da USP que estuda aspectos relacionados à prevenção de doenças em população de estudantes de Nutrição e nutricionistas do Brasil. Milena Baptista Bueno Graduada em Nutrição pela FSP/USP em 2000. Possui mestrado e doutorado em Saúde Pública pela mesma instituição, em 2003 e 2009, respectivamente. Professora titular da UNIP desde 2003, ministrando disciplinas relacionadas à saúde pública para cursos da área da saúde. É supervisora de estágio em saúde pública do curso de Nutrição da UNIP nas áreas de Atenção Primária à Saúde (APS) e alimentação escolar. Tem experiência em pesquisas em epidemiologia nutricional e artigos publicados nessa área de conhecimento. Integrante do grupo de pesquisa em saúde pública da UNIP no período de 2011 a 2020. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) F663n Folchetti, Luciana Gavilan Dias. Nutrição em Saúde Pública / Luciana Gavilan Dias Folchetti, Milena Baptista Bueno. – São Paulo: Editora Sol, 2021. 196 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Programas. 2. Alimentação. 3. Políticas. I. Folchetti, Luciana Gavilan Dias. II. Bueno, Milena Baptista. III. Título. CDU 613.2 U512.42 – 21 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcello Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Vitor Andrade Bruno Barros Sumário Nutrição em Saúde Pública APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................7 Unidade I 1 PROCESSO HISTÓRICO DOS PROGRAMAS DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO NO BRASIL .................................................................................................................................................................9 1.1 Ações estatais de alimentação e nutrição: de 1940 a 1980 ............................................... 11 1.2 Ações estatais de alimentação e nutrição: de 1990 a 2020 ............................................... 13 1.3 PNAN ......................................................................................................................................................... 16 2 FOME, POBREZA E DESNUTRIÇÃO ............................................................................................................ 23 2.1 Tendência temporal da desnutrição energético-proteica ................................................... 24 3 SEGURANÇA ALIMENTAR E DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA ...................... 31 3.1 Processo histórico da segurança alimentar e nutricional.................................................... 31 3.2 Direito humano à alimentação adequada ................................................................................. 35 3.3 Consea e Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisan) .................................................................................................................................... 38 3.4 Losan e Sisan .......................................................................................................................................... 41 3.5 CNSAN ...................................................................................................................................................... 43 3.6 Política e PNSAN ................................................................................................................................... 45 4 MAPEAMENTO E MONITORAMENTO DA SEGURANÇA ALIMENTAR NO BRASIL .................... 48 4.1 Escalas e indicadores de insegurança alimentar e nutricional .......................................... 50 4.2 Ebia ............................................................................................................................................................. 53 4.3 Pesquisas de monitoramento da segurança alimentar no Brasil ...................................... 55 Unidade II 5 AÇÕES INTERSETORIAIS RELACIONADAS À ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO ................................ 65 5.1 Política Nacional de Assistência Social (PNAS) ........................................................................ 65 5.2 PBF .............................................................................................................................................................. 75 5.3 Programa Brasil sem Miséria ........................................................................................................... 80 5.4 Políticas de incentivo à agricultura familiar ............................................................................. 86 5.5 Política Nacional de Redução de Agrotóxicos .......................................................................... 89 6 PROGRAMAS DE ACESSO A ALIMENTOS E CONTROLE DE DEFICIÊNCIAS DE MICRONUTRIENTES ............................................................................................................................................ 90 6.1 Programa Cisternas ............................................................................................................................. 91 6.2 PAA ............................................................................................................................................................. 94 6.3 Ação de distribuição de alimentos a grupos populacionais específicos ........................ 98 6.4 Equipamentos Públicos de Segurança Alimentar e Nutricional (EPSAN)...................... 99 6.4.1 Restaurantes populares ......................................................................................................................100 6.4.2 Cozinhas comunitárias .......................................................................................................................1026.4.3 Bancos de alimentos ...........................................................................................................................102 6.5 Políticas públicas de controle de deficiências de micronutrientes ................................105 6.5.1 Controle de deficiência do ferro .....................................................................................................106 6.5.2 Controle de deficiência de vitamina A ......................................................................................... 112 6.5.3 Controle de deficiência de iodo ...................................................................................................... 114 Unidade III 7 AÇÕES DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO DIRECIONADAS AOS ESCOLARES ............................121 7.1 PNAE ........................................................................................................................................................122 7.1.1 Histórico .................................................................................................................................................. 122 7.1.2 Normas para execução do PNAE: objetivos, diretrizes, beneficiários, gestão e participação social ...................................................................................................................................... 125 7.1.3 Normas para execução do PNAE: responsabilidades técnicas, planejamento de cardápios e teste de aceitabilidade ................................................................................................... 130 7.1.4 Normas para execução do PNAE: intersetoralidade com o Pronaf ................................. 138 7.2 A escola como promotora de hábitos saudáveis ...................................................................141 7.2.1 Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE)..................................................................... 142 7.2.2 PSE ............................................................................................................................................................. 143 7.2.3 Programas de promoção e proteção à alimentação saudável no âmbito escolar .................................................................................................................................................. 144 8 AÇÕES DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE (APS) .............147 8.1 ESF e Nasf ..............................................................................................................................................152 8.2 Níveis de intervenção em nutrição e alimentação na APS: PTS e matriciamento .........................................................................................................................................158 8.3 Atenção domiciliar no âmbito do SUS com foco na assistência nutricional ............162 8.4 Ações transdisciplinares, multidisciplinares e intersetoriais na APS: o papel do nutricionista ..........................................................................................................................169 7 APRESENTAÇÃO O objetivo desta disciplina é capacitar o aluno para a análise sobre a inserção do nutricionista na área de saúde pública, por meio do estudo da trajetória das políticas de alimentação e nutrição e dos programas atuais. Dessa maneira, serão analisadas as políticas e os programas de alimentação e nutrição planejados e desenvolvidos no Brasil, considerando o contexto histórico, político e social. Busca-se, por meio de reflexão crítica, capacitar o aluno para atuar em equipes multidisciplinares e na gestão de programas públicos na área de saúde, educação e assistência social, a fim de garantir ações que promovam a integralidade e a equidade em saúde. INTRODUÇÃO O nutricionista é um profissional com formação generalista, humanística e crítica, que atua para a promoção, a manutenção e a recuperação da saúde, com abordagem individual ou coletiva, de acordo com a realidade econômica, política, social e cultural (BRASIL, 2001). Portanto, a formação de um nutricionista que tenha a capacidade de ação interdisciplinar em diversas áreas de atuação é uma das metas a ser atingida. O Conselho Federal de Nutricionistas (CFN) estabelece a nutrição em saúde coletiva como uma das áreas de atuação do nutricionista e determina que as competências desse profissional são: [...] organizar, coordenar, supervisionar e avaliar os serviços de nutrição; prestar assistência dietoterápica e promover a educação nutricional a coletividades ou indivíduos, sadios ou enfermos, em instituições públicas ou privadas, e em consultório de nutrição e dietética; atuar no controle de qualidade de gêneros e produtos alimentícios; participar de inspeções sanitárias (CFN, 2018). Nutricionistas podem atuar como gestores de políticas e programas públicos que envolvam alimentação e nutrição. Há ações de combate às carências nutricionais específicas e de monitoramento da saúde populacional que necessitam de profissionais da área de nutrição para que as metas sejam alcançadas. Nutricionistas também têm a possibilidade de atuar na assistência individual e coletiva em unidades básicas de saúde (UBS), participando de atendimentos compartilhados, capacitação de profissionais de saúde, elaboração de projetos terapêuticos e ações de educação nutricional. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) está implantado em instituições educacionais públicas e filantrópicas e cada esfera gestora (municipal, estadual ou federal) necessita de um responsável técnico pela alimentação oferecida e que, obrigatoriamente, deverá ser graduado em nutrição. As escolas são ambientes propícios para ações educativas em alimentação e nutrição, que, em conjunto com a oferta de alimentos aos alunos de baixa renda, auxiliam na garantia da segurança alimentar e no acesso ao direito humano à alimentação adequada (DHAA). 8 Fica evidente a necessidade do conhecimento e consequente reflexão crítica do profissional em nutrição sobre as diversas ações promovidas pelo setor público nas áreas relacionadas à alimentação e nutrição, como saúde, educação, agricultura, trabalho e assistência social. Nesta disciplina, serão apresentadas políticas e programas que promovem a segurança alimentar da população, considerando que o acesso à alimentação adequada é um dos direitos sociais reconhecidos pela Constituição Federal. A fome, a pobreza e a desnutrição foram relevantes problemas de saúde pública ao longo da história, sendo que em alguns continentes ainda se mantêm como um desafio. Na primeira unidade deste material de estudo, será evidenciada a evolução dos programas de alimentação e nutrição no Brasil, contextualizando os problemas nutricionais e prioridades de cada época. Serão discutidos os avanços e retrocessos de cada ação implantada. A melhor efetividade das ações em alimentação e nutrição foi obtida a partir da publicação de leis, decretos e políticas específicas que estabeleceram o sistema nacional de segurança alimentar e o Plano Nacional de Segurança Alimentar. Na segunda unidade, serão apresentados os programas atuais que promovem a segurança alimentar e sua correlação com outras áreas além da saúde, como assistência social e agricultura. Também serão descritas ações realizadas em instituições de ensino públicas, privadas e filantrópicas, enfatizando o Programa Nacional de Alimentação do Escolar. Além disso, serão relatadas as principais estratégias de alimentação e nutrição no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e a atuação do nutricionista na Atenção Básica à saúde. Esperamos despertar o interesse do estudante sobre saúde pública e induzi-lo a uma avaliação crítica sobre políticas e programas públicos de alimentação e nutrição, a fim de que, em conjunto, possamos melhorar as condições de saúde e alimentação de toda a população. Bons estudos! 9 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA Unidade I 1 PROCESSO HISTÓRICO DOS PROGRAMASDE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO NO BRASIL Para compreender a trajetória das políticas de alimentação e nutrição no Brasil, é necessário conhecer o contexto econômico, político e social. Na época colonial no Brasil, há registros sanitários que demonstram uma preocupação por parte dos governantes com a saúde da população, como a fiscalização sanitária dos alimentos importados e exportados por navios, com o objetivo de minimizar epidemias no país (POLIGNANO, 2015). Os problemas relacionados à alimentação e nutrição assumiram grande importância mundialmente durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), pois o acesso aos alimentos tornou-se escasso como consequência da grande crise instalada, provocando o aumento da fome, a desnutrição e a mortalidade em diversos países (ABRANDH, 2013). O sistema sanitário existente até a década de 1930 no Brasil continuava sendo somente a fiscalização sanitária, que não era suficiente para impedir que epidemias acontecessem e que a população desfrutasse de uma boa saúde. As campanhas de sanitização e vacinação implementadas por Oswaldo Cruz e Carlos Chagas geraram grande insatisfação da população, que desconhecia o objetivo e as consequências dessas ações (POLIGNANO, 2015). No início do século XX, a crise econômica e a industrialização no país provocaram o aumento do processo de urbanização. No entanto, mesmo em centros urbanos, a população continuava a ter condições precárias de higiene, saúde e trabalho. Grande parte das famílias permanecia em situação de pobreza, vivendo em cortiços, aglomerados, o que propiciava o aumento de doenças transmissíveis. O acesso aos serviços de saúde era praticamente inexistente, sendo possível apenas para aqueles que pertenciam à alta burguesia, que podia pagar pelo atendimento médico. As famílias eram grandes e a fome e a desnutrição predominavam naquela época. Existe uma relação bastante clara, senão óbvia, entre o desempenho econômico de uma sociedade e as chamadas doenças da pobreza, como as infecções e a desnutrição, resultado direto do impacto da situação econômica de um país, e de seu estágio de desenvolvimento, sobre as condições de vida e o bem-estar de sua população [...] (IUNES, 2000, p. 33). Josué de Castro, um dos pioneiros na discussão sobre a relação entre a escassez alimentar, saúde e progresso econômico de um país, afirmava que a fome não era um fenômeno natural, pois era provocada pelo próprio homem contra outros homens. Assim, destacava que a fome era um problema econômico e social de toda uma sociedade. 10 Unidade I Observação Josué de Castro (médico, cientista social e deputado federal) nasceu em Pernambuco em 1908, em uma família sertaneja de classe média, e faleceu em 1973 na cidade de Paris. Em 1933, Josué de Castro realizou um inquérito para avaliar as condições de saúde da classe operária de Pernambuco, demonstrando a insuficiência de consumo calórico proteico desse grupo social. A alimentação do trabalhador era baseada em feijão, açúcar, café, pão, farinha e charque em quantidade menor que a necessária para o bom estado nutricional, diminuindo sua capacidade de trabalho e aumentando as taxas de morbidades e mortalidade. Este e outros estudos posteriores sobre essa temática serviram de base para a criação do salário mínimo em 1940, com o objetivo de garantir o indispensável para o sustento do trabalhador e seus dependentes e, consequentemente, aumentar o progresso do país (VASCONCELOS, 2005). Josué de Castro publicou vários livros sobre a fome e sua relação com aspectos geográficos, sociais e políticos, com ampla repercussão nacional e internacional. Foi nomeado presidente do conselho executivo da Food and Agricultural Organization (FAO – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) em 1951 e, em 1958, elegeu-se como deputado federal. Com o golpe de Estado pelos militares em 1964, teve seus direitos políticos cassados e foi exilado (ANDRADE, 1997). Saiba mais Para conhecer mais sobre a trajetória de Josué de Castro, assista ao documentário a seguir: JOSUÉ de Castro – cidadão do mundo. 2013. 1 vídeo. (50m18s). Publicado por Manguebaby. [Documentário dirigido por Silvio Tendler, 1994]. Disponível em: https://bit.ly/3g4D1AN. Acesso em: 2 jun. 2021. A partir da década de 1940, políticas e programas sociais de alimentação e nutrição começaram a ser implantados no país, caracterizados por ações estatais relacionadas à produção, à comercialização e ao consumo de alimentos, com foco em grupos sociais específicos e com diversificadas metodologias de abordagens. As distintas formas de intervenção estatal na área de alimentação e nutrição são construídas, desconstruídas e/ou reconstruídas a partir do jogo de interesses econômicos, sociais e políticos que se opera entre os distintos segmentos sociais de cada conjuntura examinada [...] (VASCONCELOS, 2005, p. 439). 11 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA 1.1 Ações estatais de alimentação e nutrição: de 1940 a 1980 Por influência de Josué de Castro, em 1940 foi instituído o Serviço de Alimentação e da Previdência Social (Saps), subordinado ao Ministério do Trabalho. O Saps tinha como finalidade recuperar e manter o adequado estado nutricional de trabalhadores com o propósito de manter a força de trabalho e impulsionar a economia do país. O Saps consistia em prover instalações físicas adequadas para o preparo e a distribuição de refeições balanceadas aos trabalhadores formais (restaurantes populares), comercializar alimentos básicos a preços mais acessíveis para esse grupo populacional, capacitar profissionais para as atividades envolvidas na produção de refeições seguras e realizar ações de educação nutricional para familiares desses trabalhadores, por meio de visitas nas residências pelas visitadoras da alimentação. O Saps existia somente nos grandes centros urbanos e foi extinto em 1967 (TADDEI et al., 2011). A Comissão Nacional de Alimentação (CNA) foi criada em 1945, porém apenas em 1951 foi regulamentada como órgão de assessoria do governo para a formulação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), além de desenvolver e incentivar estudos sobre o estado nutricional e consumo alimentar da população brasileira e realizar campanhas educativas. Naquela época, foi aprovada a implantação do primeiro Plano Nacional de Alimentação e Nutrição (1953), voltado para a assistência alimentar de crianças, gestantes, nutrizes, escolares e trabalhadores, com destaque para o início da Campanha Nacional de Merenda Escolar (CNME), em 1954, posteriormente renomeada para PNAE, e a fortificação obrigatória do sal com iodo em 1953. O período de 1968 a 1974 (governo militar) foi caracterizado por elevado crescimento econômico, no entanto, aumentaram as desigualdades sociais, pois a riqueza concentrava-se cada vez mais em um grupo pequeno da população. O Estudo Nacional de Despesas Familiares (Endef), realizado entre 1974 e 1975, evidenciou que 67% da população tinha consumo energético inferior às suas necessidades. A desnutrição mostrava-se como importante problema de saúde pública, com prevalências de, aproximadamente, 41% entre menores de 5 anos e 25% entre adultos (VASCONCELOS, 2005). No âmbito internacional, ampliou-se a discussão sobre a fome e sua relação com o desenvolvimento de um país. Entidades como a Organização Mundial da Saúde (OMS), a FAO e o Fundo das Nações para a Infância (Unicef) recomendaram a implantação de ações nos diversos países, especialmente para os menos desenvolvidos, para melhorar as condições nutricionais da população. A CNA foi extinta em 1972 e substituída pelo Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (Inan), autarquia do Ministério da Saúde. O primeiro Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (Pronan-I) foi instituído pelo Inan em 1973, constituído por 12 programas envolvendo alimentação e nutrição. Devido às dificuldades normativas e operativas, teve curta duração e não apresentou resultados efetivos, sendo substituído em 1975pelo Pronan-II, com duração até 1984, após prorrogação em 1979. 12 Unidade I O Inan era composto de três linhas de atuação: • suplementação alimentar (doação de alimentos) aos grupos mais vulneráveis (crianças, gestantes, nutrizes e trabalhadores de baixa renda); • otimização da produção e comercialização de alimentos, com ênfase no pequeno produtor; • subsídios para a fortificação de alimentos específicos, pesquisas, programas de capacitação profissional e de instalações para a distribuição de alimentos. O quadro a seguir sumariza os programas implantados entre as décadas de 1970 e 1980. Quadro 1 – Características dos programas governamentais de alimentação e nutrição implementados no Brasil nas décadas de 1970 e 1980 Programa Período de vigência Público-alvo Benefícios Programa de Nutrição e Saúde (PNS) 1975-1985 Gestantes, nutrizes, crianças < 5 anos de baixa renda Distribuição de alimentos básicos Programa de Complementação Alimentar (PCA)* 1976-1990 Gestantes, nutrizes, crianças < 2 anos de baixa renda Distribuição de alimentos industrializados e leite em pó Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) 1976-atual Trabalhadores de baixa renda Fornecimento de refeições nas empresas; distribuição de vale-alimentação e cestas básicas Programa de Abastecimento de Alimentos Básicos (Proab)* 1979-1989 População de baixa renda Comercialização subsidiada de alimentos básicos Programas de Combate às Carências Específicas (PCCE) 1977-atual População em geral Fortificação de alimentos, distribuição de medicamentos etc. Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno (PNIAM) 1981-atual Gestantes, nutrizes e crianças Ações educativas, regulamentações para a proteção do aleitamento materno, bancos de leite, treinamento de profissionais de saúde etc. Programa de Suplementação Alimentar (PSA) 1985-1993 Gestantes, nutrizes, crianças < 2 anos de baixa renda Distribuição de alimentos básicos Programa de Abastecimento Popular (PAP)* 1985-1988 População de baixa renda Comercialização subsidiada de alimentos básicos Programa Nacional de Leite para Crianças Carentes (PNLCC) 1986-1991 Crianças < 7 anos de baixa renda Distribuição de cupons para aquisição mensal de 30 litros de leite integral *Apenas em algumas regiões brasileiras Adaptado de: Vasconcelos (2005). 13 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA O PSA substituiu o PNS, diferenciando-se apenas pelo público-alvo (a faixa etária das crianças incluídas foi reduzida). O PCA apresentava benefícios e público-alvo semelhantes ao PSA, em um mesmo período de vigência, sendo que o PCA era vinculado ao Ministério da Previdência e Assistência Social/Legião Brasileira de Assistência (LBA) e era implantado somente em algumas regiões brasileiras. Já o PSA, vinculado ao Ministério da Saúde, tinha abrangência em todo o território nacional. Por sua vez, o Proab foi um programa existente apenas em capitais e centros urbanos do Nordeste, enquanto o PAP abrangeu as outras capitais e regiões metropolitanas do país. O PNIAM, instituído em 1981, foi agregado à Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança em 2015, estruturada em sete eixos de atuação, sendo um deles a promoção do aleitamento materno e da alimentação complementar saudável (BRASIL, 2017b). No fim da década de 1980, a Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN) evidenciou tendência declinante da desnutrição no país em todas as regiões, apesar de que ainda havia diferenças importantes entre regiões e área de moradia (urbana ou rural). O aumento moderado da renda familiar e a expansão dos programas sociais, como os de alimentação e nutrição, contribuíram para a melhoria do estado nutricional da população. Apesar da redistribuição indireta de renda promovida pelos programas de doação de alimentos, estes apresentavam aspectos claramente assistencialistas, paternalistas e de interesse político-eleitoral. Algumas indústrias de alimentos foram beneficiadas para fornecer alimentos ao setor público e desvios de verbas foram revelados posteriormente. Com o fim da ditadura militar no país e o início de uma nova fase político-econômica, denominada Nova República, ressurgiu a esperança do brasileiro para a solução definitiva dos problemas sociais. 1.2 Ações estatais de alimentação e nutrição: de 1990 a 2020 No início da década de 1990, mantinham-se vigentes os programas PNAE, PAT, PCCE, PNLCC (até 1991) e PSA (até 1993). Foi uma época de grande instabilidade política devido ao impeachment do presidente Fernando Collor em 1993, primeiro eleito por votação popular direta, devido a evidências de corrupção em diversos programas sociais, inclusive os de alimentação e nutrição. Houve brutal redução de alocação de recursos públicos para programas de alimentação e nutrição durante a década de 1990, não sendo a prioridade política daquele momento. Concomitantemente, a discussão sobre a fome ressurgia, liderada por organismos internacionais como FAO e ONU (Organização das Nações Unidas). A Cúpula Mundial da Alimentação, que reuniu representantes de 186 países em Roma em 1996, estabeleceu a meta de reduzir a prevalência de desnutrição pela metade até 2015 e a FAO iniciou o monitoramento da fome no mundo. No Brasil, criou-se o movimento social “Ação da cidadania contra a fome, a miséria e pela vida” com o objetivo de sensibilizar a sociedade para mudanças capazes de transformar a realidade econômica, social e política. Hebert José de Sousa, conhecido como Betinho, era sociólogo e ativista dos direitos sociais, especialmente o da alimentação, sendo um dos idealizadores desse movimento social. Como resultados, um novo Mapa da Fome foi apresentado, o Plano de Combate à Fome e à 14 Unidade I Miséria foi proposto e houve a criação do Conselho Nacional de Alimentação e Nutrição (Consea) em 1993, extinto após dois anos. Saiba mais Para conhecer mais sobre a trajetória de Hebert José de Sousa, assista ao documentário a seguir: BETINHO: o artista da cidadania – bloco 1. 2015. 1 vídeo. (17m58s). Publicado por TV Senado. Disponível em: https://bit.ly/3g1Tg1N. Acesso em: 2 jun. 2021. Avaliar resultados e identificar as demandas da população é de extrema importância para a gestão de qualquer programa social. O Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) foi testado em Pernambuco no fim da década de 1970, mas não foi implantado no país, sua regulamentação e implantação nacional ocorreram apenas em 1990, com a promulgação da Lei Orgânica de Saúde, que instituiu o SUS. Este sistema tem como objetivo identificar e acompanhar a evolução do estado nutricional da população e seus determinantes, fornecendo subsídios para a tomada de decisão (COUTINHO et al., 2009). Com a extinção do Inan em 1997, criou-se a Área Técnica de Alimentação e Nutrição (Atan) no âmbito da Secretaria de Políticas de Saúde. Posteriormente, foi integrada ao Departamento de Atenção Básica como Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição (CGPAN). A proposta da nova PNAN, coordenada pela CGPAN e elaborada com o auxílio de consultores técnicos dos setores da saúde, educação e agricultura, foi discutida com representantes de entidades acadêmicas, de classes profissionais e organizações não governamentais. A Portaria do Ministério da Saúde n. 710, de 10 de junho de 1999, promulgou o texto final da PNAN, que integrava a Política Nacional de Saúde, sendo atualizada pela Portaria n. 2.715, de 17 de novembro de 2011 (BRASIL, 2011d). O Programa Bolsa Alimentação (2001-2003) apresentava uma concepção e operacionalização inovadoras, pois consistia em um programa de transferência de renda às famílias mais pobres, que também tinham responsabilidades, estimulando a autonomia para a escolha dos tipos de alimentos adquiridos, proporcionando uma dieta mais diversificada e de acordo com hábitos alimentares locais. Além disso, a transferência de renda estimulava a economia local, dado que o recurso financeiro recebidoseria utilizado na própria comunidade. A operacionalização dessa nova modalidade de benefício apresentou melhor custo-benefício. Com o início de uma nova gestão do governo federal em 2003, as ações relacionadas à segurança alimentar e nutricional tornaram-se prioridade a fim de garantir quantidade, qualidade e regularidade ao acesso aos alimentos. O Programa Fome Zero não se resumia às ações assistencialistas, pois políticas 15 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA estruturais que combatiam as causas da fome e pobreza também foram inseridas nessa estratégia, como as que envolviam políticas relacionadas ao trabalho (geração de renda), educação, agricultura e habitação. O Programa Fome Zero fortaleceu a participação social, com a retomada do Consea. Políticas locais, propostas e coordenadas por Estados e Municípios aumentaram naquele momento. Os percalços operativos na condução do Fome Zero, que na época já relacionava 81 ações, induziram a um reposicionamento do governo em relação às diretrizes fixadas. O desdobramento foi a unificação dos quatro programas de transferência de renda: Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e Cartão-Alimentação e a instituição [...] do Programa Bolsa Família [...] no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (TADDEI et al., 2011, p. 404). O Programa Bolsa Família (PBF) consiste no repasse de valores monetários para famílias em pobreza e extrema pobreza, que devem atender às condicionalidades das áreas da saúde e educação para que recebam o benefício, bem como ações intersetoriais e complementares que priorizam as famílias inclusas nesse programa. A alocação de recursos públicos para o PBF aumentou consideravelmente durante a primeira década do século XXI, tornando-o um dos programas sociais de maior abrangência e magnitude. Há evidências de que o PBF foi um dos determinantes para a diminuição da desigualdade social e, consequentemente, da fome (VASCONCELOS et al., 2019). Lembrete Programas públicos compensatórios, como o PBF, amenizam as consequências da pobreza e da fome, mas não interferem nos macrodeterminantes desses problemas sociais. A doação de alimentos mantém-se em caráter exclusivamente emergencial para famílias que já sofrem dos efeitos da fome (pobreza extrema) ou que estejam em situações de alta vulnerabilidade transitória, provocada, por exemplo, por catástrofes naturais (enchentes e incêndios) ou conflitos violentos. Ações específicas permanecem de forma ampliada, como PNAE, PAT, programas específicos para combate às carências nutricionais, banco de alimentos e restaurantes populares. O Programa de Aquisição Alimentar (PAA) foi criado em 2003 como parte da estratégia de aumento do acesso a alimentos de qualidade e incremento da renda de pequenos produtores. Refere-se à compra institucional (por órgãos públicos) de alimentos produzidos por agricultores inseridos no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) para serem distribuídos à população por outros programas públicos, como o PNAE. 16 Unidade I Outros eventos importantes ocorreram entre 2003 e 2010, como a divulgação do primeiro Guia Alimentar para População Brasileira, o maior incentivo à pesquisa na área de segurança alimentar e nutricional e a criação do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf), possibilitando o aumento da inserção do nutricionista na Atenção Básica à saúde. O Programa Brasileiro de Erradicação da Miséria (Brasil sem Miséria), implantado em 2011, teve como meta a erradicação da extrema pobreza até 2014 com a articulação de três eixos: inclusão produtiva, garantia de renda e acesso a serviços públicos de proteção e promoção social, incluindo os de alimentação e nutrição. Outras estratégias relevantes da política social de alimentação e nutrição do primeiro mandato do governo Dilma merecem destaque: a divulgação do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (2012-2015); a atualização da PNAN; a publicação do Referencial de Educação Alimentar e Nutricional para Políticas Públicas; a instituição da Estratégia Nacional de Promoção ao Aleitamento Materno e Alimentação Complementar Saudável no Sistema Único de Saúde (SUS); e o lançamento da nova edição do Guia Alimentar para a População Brasileira (VASCONCELOS et al., 2019, p. 7). Em 2015, o Brasil viveu um período de intensa recessão econômica e crise política, o que resultou na diminuição dos investimentos em programas públicos assistenciais e estruturantes. A situação se agravou com o impeachment da presidente em 2016 – Dilma Rousseff – e as primeiras projeções de aumento da fome e pobreza começam a surgir, concomitantemente aos já elevados índices de excesso de peso e doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes e hipertensão arterial. Observação Em 2011, foi lançado o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis, com metas a serem atingidas até 2022 e ações para enfrentamento desse grupo de doenças. 1.3 PNAN O acesso regular e permanente aos alimentos de qualidade, na quantidade suficiente, é um direito social previsto no art. 6º da Constituição Federal, promulgada em 1988. Assim, a alimentação é essencial para uma vida digna, interligada a outros direitos sociais como a saúde. A promoção da segurança alimentar e nutricional contribui para a garantia do direito humano à alimentação adequada. Para tal, é necessário uma conjunção de políticas públicas, entre elas a PNAN. O processo de formulação e implementação de qualquer política pública tem diversas etapas, como apresentado na figura a seguir. 17 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA Identificação do problema Definição da agenda Seleção de soluções Monitoramento e avaliação Implementação Tomada de decisão Figura 1 – Ciclo de políticas públicas Fonte: Jaime (2019, p. 5). A definição da agenda pública de nutrição (prioridades) deverá ser baseada no diagnóstico da situação nutricional da população. A tomada de decisão sobre as ações que serão desenvolvidas será feita após a análise crítica e minuciosa das propostas para a solução dos problemas identificados. Após a implementação, é essencial o monitoramento e a avaliação das mudanças promovidas pelas ações e reanálise da situação (JAIME, 2019). Políticas públicas são um conjunto de normas e princípios que nortearão as ações do poder público. Instrumentos de implementação da política pública são leis, decretos, portarias, planos, programas, normas, resoluções etc. (JAIME, 2019). Nos últimos anos da década de 1990, em uma época caracterizada pelo enfraquecimento das discussões sobre segurança alimentar no meio político, surgiu a proposta da PNAN, elaborada com a participação de instituições governamentais e não governamentais que atuavam na área de alimentação e nutrição e promulgada pela Portaria do Ministério da Saúde n. 710, de 10 de junho de 1999. Os propósitos da primeira versão da PNAN foram (BRASIL, 2008a): • garantia da qualidade dos alimentos; • promoção de práticas alimentares saudáveis e prevenção e controle dos distúrbios nutricionais; • estímulo às ações intersetoriais. 18 Unidade I Para o alcance desses propósitos, foram definidas sete diretrizes (BRASIL, 2008a): • estímulo às ações intersetoriais com vistas ao acesso universal aos alimentos; • garantia da segurança e da qualidade dos alimentos e da prestação dos serviços nesse contexto; • monitoramento da situação alimentar e nutricional; • promoção de práticas alimentares e estilos de vida saudáveis; • prevenção e controle dos distúrbios nutricionais e de doenças associadas à alimentação e nutrição; • promoção do desenvolvimento de linhas de investigação; • desenvolvimento e capacitação de recursos humanos. A intensa modificação do perfil nutricional observada nos anos seguintes à publicação da primeira versão da PNAN, com a diminuição da desnutrição e o aumento da obesidade, ocasionou a publicação da segunda versão, por meio da Portaria do Ministérioda Saúde n. 2.715 (BRASIL, 2011d), atualizada às novas demandas da população brasileira. A nova PNAN foi resultado de um amplo processo de discussão entre representantes de entidades da sociedade civil, instituições de ensino e pesquisa e governo. O propósito da segunda versão da PNAN é a: [...] melhoria das condições de alimentação, nutrição e saúde da população brasileira, mediante a promoção de práticas alimentares adequadas e saudáveis, a vigilância alimentar e nutricional, a prevenção e o cuidado integral dos agravos relacionados à alimentação e nutrição (BRASIL, 2013b, p. 21). É de responsabilidade dos gestores das três esferas do governo viabilizar o alcance dos propósitos determinados na PNAN de forma articulada. A PNAN atende aos princípios do SUS (universalidade, integralidade, equidade, descentralização, regionalização, hierarquização e participação social) e estabelece outros, tais como (BRASIL, 2013b): • A alimentação como elemento de humanização das práticas de saúde: valorização do ser humano considerando todos os aspectos envolvidos na promoção, na manutenção e na recuperação da saúde, não apenas o biológico. • Respeito à diversidade e à cultura alimentar: reconhecer, respeitar, preservar e resgatar hábitos alimentares locais. 19 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA • Fortalecimento da autonomia dos indivíduos: ter mais autonomia para as escolhas alimentares, ou seja, conhecer as várias perspectivas, poder experimentar, tornar-se consciente de suas escolhas e consequências. • Reconhecimento da determinação social e natureza interdisciplinar e intersetorial das ações de alimentação e nutrição: para atingir a segurança alimentar e nutricional são necessárias ações de diversos setores governamentais e não governamentais, considerando os diferentes determinantes sociais da saúde. • Ações de segurança alimentar e nutricional com soberania: referem-se ao direito e à autonomia dos povos de decidirem seu próprio sistema alimentar. As diretrizes são as linhas de ações para o alcance dos propósitos, considerando os princípios determinados. Foram determinadas nove diretrizes (BRASIL, 2013b), as quais serão estudadas a seguir. Organização da atenção nutricional A atenção nutricional para a promoção, manutenção e recuperação à saúde está integrada à Rede de Atenção à Saúde (RAS), sendo a Atenção Básica a coordenadora das ações realizadas. Ressalta-se que esse nível de atenção à saúde tem maior capacidade de identificação das demandas de saúde da população por ser a “porta de entrada” do usuário ao sistema de saúde brasileiro. A fim de atingir ao princípio de integralidade, ações propostas para a atenção nutricional deverão ser intersetoriais, ou seja, serão desenvolvidas em conjunto com diferentes setores (governamentais ou não), e não restritas à área da saúde. As equipes de referência em saúde deverão ser apoiadas por equipes multiprofissionais que contenham profissionais da área de alimentação e nutrição. Pressupõe-se a humanização do atendimento para indivíduos de todos os ciclos de vida, priorizando aqueles mais vulneráveis à insegurança alimentar. No atendimento nutricional individual, da família ou da comunidade, deve-se considerar a incorporação de práticas integrativas e complementares definidas em políticas públicas de saúde. São prioritárias ações de prevenção e controle de obesidade, desnutrição, carências nutricionais específicas e doenças crônicas não transmissíveis. No entanto, a atenção nutricional de indivíduos portadores de doenças que necessitam de cuidados especiais relacionados à alimentação não devem ser comprometidos, tais como casos de alergias e intolerâncias alimentares, transtornos alimentares e erros inatos do metabolismo. Promoção da Alimentação Adequada e Saudável (PAAS) Para que a alimentação seja adequada e saudável, deve-se atender às demandas nutricionais individuais ou da coletividade, respeitando hábitos alimentares e uso sustentável do meio ambiente. 20 Unidade I Entre as estratégias para a PAAS destacam-se ações de educação alimentar e nutricional, regulação de alimentos e a criação de ambientes institucionais (escolas, trabalho, instituições de longa permanência para idosos etc.) promotores da saúde, incluindo a oferta de alimentos saudáveis. Vigilância alimentar e nutricional O monitoramento contínuo do estado nutricional e de seus determinantes é de grande relevância para o planejamento e a avaliação das ações, subsidiando a tomada de decisão. A coleta de dados ocorrerá nos serviços de saúde e em estudos epidemiológicos por meio de inquéritos populacionais. O Sisvan está vinculado à Atenção Básica à saúde e tem como meta obter dados, de forma contínua e permanente, sobre o estado nutricional de indivíduos de todos os ciclos de vida atendidos pelo SUS. A análise desses dados deverá ser em conjunto com outras informações de saúde da população, como natalidade, mortalidade e cobertura dos serviços em saúde. Gestão das ações de alimentação e nutrição A PNAN deve estar articulada ao SUS e ao Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) e as ações previstas devem ser implementadas e financiadas pelas três esferas de governo (federal, estadual e municipal). Estratégias de planejamento e avaliação das ações devem ser constantemente aperfeiçoadas. São eixos prioritários: • aquisição e distribuição de insumos para o controle de carências nutricionais específicas; • adequação de equipamentos e estrutura física das unidades de saúde responsáveis pela vigilância alimentar; • educação permanente em alimentação e nutrição para trabalhadores da saúde; • garantia de processos adequados para a organização da atenção nutricional no SUS. No âmbito internacional, o país deve cooperar para o desenvolvimento de políticas de alimentação e nutrição de outros países e participar de ações colaborativas promovidas por organizações internacionais, a exemplo do desenvolvimento de recomendações e das metas globais relacionadas à alimentação e nutrição. Lembrete A definição da agenda pública de nutrição (prioridades) deverá ser baseada no diagnóstico da situação nutricional da população. 21 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA Participação e controle social No âmbito das políticas públicas de saúde, é prevista a participação social nos conselhos e conferências existentes nas três esferas de governo. A população, por meio de seus representantes, participará dos processos decisórios e deliberativos sobre os diversos aspectos que envolvem a saúde. O Consea, o Conselho de Alimentação Escolar (CAE) e o Conselho Nacional de Saúde (CNS), nas três esferas de governo e conferências e fóruns sobre diversas temáticas envolvendo alimentação e nutrição, são possibilidades para que a população exerça o princípio de controle social, contribuindo democraticamente para a construção e avaliação de políticas e programas públicos relacionados à alimentação e nutrição. Qualificação da força de trabalho Uma das diretrizes dessa política é a capacitação e sensibilização de profissionais da saúde que atuam no SUS. A educação permanente em saúde é uma estratégia para o aprimoramento do trabalho, considerando a realidade de cada região. Os Centros Colaboradores em Alimentação e Nutrição (Cecan) vinculados ao Ministério da Saúde participam desse processo e são representados por instituições públicas de ensino e pesquisa. Esses centros articulam projetos de formação sobre práticas de cuidados nutricionais na RAS do SUS. Controle e regulação dos alimentos Uma alimentação adequada e saudável é composta de alimentos e preparações culinárias com alto teor de nutrientes, sem contaminantes de origem biológica, química ou física. A adequação de toda a cadeia alimentar (produção, processamento, industrialização, distribuição e comercialização) para o acesso e o consumo de alimentos de qualidade sanitária e nutricional é uma responsabilidade compartilhada entre diferentes setores do governo, indústria e sociedade. Nos últimosanos observou-se aumento do uso de agrotóxicos, aditivos e organismos geneticamente modificados, assim como do consumo de alimentos ultraprocessados, que são formulações industriais resultantes de uma série de processamentos, acréscimo de substâncias químicas e, em geral, com baixa qualidade nutricional (excesso de açúcar, sódio e gorduras). Nesse contexto, a regulação de alimentos visa proteger a saúde do consumidor. Órgãos de controle sanitário do alimento analisam e monitoram riscos de efeitos adversos à saúde em consequência do consumo alimentar, considerando aspectos sanitários, como microbiológico e toxicológico, e do perfil nutricional. A publicidade e a propaganda de alimentos também são objeto de estudo e ação dos órgãos reguladores. É direito dos consumidores o acesso à informação clara e precisa, e cabe ao Estado protegê-los de práticas enganosas e abusivas da indústria de alimentos, fortalecendo a autonomia de escolha alimentar consciente do cidadão. Rótulos de alimentos são veículos de informação ao 22 Unidade I consumidor e, por isso, houve expressivo avanço nas regulamentações sobre rotulagem obrigatória, que ainda é tema de discussões para seu aprimoramento. Pesquisa, inovação e conhecimento em alimentação e nutrição Sistemas de informação em saúde, principalmente o Sisvan, bem como inquéritos populacionais, são fontes de dados e, consequentemente, geram conhecimentos sobre as demandas de uma sociedade. O fortalecimento e a manutenção das ações de monitoramento da saúde nutricional da população estão associados à produção de evidências científicas. Pesquisas sobre intervenções nutricionais e de avaliação de programas públicos são prioritárias, a fim de subsidiar a tomada de decisão por gestores públicos. Os Cecan fornecerão apoio técnico-científico, produzindo evidências científicas que aprimorem a gestão e a atenção nutricional da RAS do SUS. Cooperação e articulação para a segurança alimentar e nutricional A garantia da segurança alimentar e nutricional, interligada ao direito à saúde e ao direito à alimentação adequada, não depende exclusivamente da área da saúde, pois outros setores governamentais e não governamentais são vitais, como agricultura, trabalho, social, lazer, esporte, economia etc. A intersetoralidade permite a discussão e a tomada de decisão compartilhada entre a sociedade, os diversos setores do governo e as instituições privadas ou filantrópicas. A PNAN está articulada com a Política Nacional de Segurança Alimentar (PNSAN) e outras políticas relacionadas à promoção de uma alimentação adequada e saudável. Deve também cooperar e interagir com o SUS. As estratégias prioritárias nas ações de alimentação e nutrição estão apresentadas na figura a seguir. Melhoria da saúde e nutrição das famílias beneficiárias de programas de transferência de renda Promoção da alimentação adequada e saudável em ambientes institucionais Apoio à produção de alimentos advindos da agricultura familiar, dos assentamentos agrários e de comunidades tradicionais Interlocução entre todos os setores do sistema alimentar Articulação com as redes de educação, de assistência social e vigilância sanitária Figura 2 – Estratégias prioritárias nas ações de alimentação e nutrição Adaptada de: Brasil (2013b). 23 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA 2 FOME, POBREZA E DESNUTRIÇÃO Em meados da década de 1930, Josué de Castro evidenciou a magnitude da fome no Brasil. Sua obra literária sobre o tema é extensa e foi traduzida para diversos idiomas. O homem, assim como qualquer outro animal, torna-se descontrolado quando se sente faminto. É uma situação que provoca intensos sentimentos de tristeza, impotência, injustiça e angústia, debilitando o organismo gradativamente, com consequências duradouras que envolvem aspectos biológicos e mentais. A fome crônica é causada pela insuficiência parcial ou total de alimentos consumidos por longos períodos, resultando em deficiência energética e de, praticamente, todos os nutrientes no organismo (RANGEL, 2018). Observação A fome crônica, permanente, é a que tem maior relevância na área de saúde pública, diferentemente da fome aguda, momentânea e esporádica, que rapidamente é sanada pela ingestão de alimentos. Nas últimas décadas, devido à queda da mortalidade e ao aumento da expectativa de vida, houve intenso crescimento populacional. Nesse contexto, foram previstos o aumento da demanda por alimentos e a necessidade de aumento da capacidade de produção do país. O aumento do número de famintos poderia ocorrer por insuficiência de produção de alimentos, porém isso não foi observado na maioria dos países, inclusive no Brasil. A produção agropecuária e industrial cresceu em proporções maiores que a própria população. No entanto, a maior disponibilidade de alimentos não foi suficiente para a erradicação da fome, pois não é suficiente ter o alimento disponível para venda se não houver dinheiro para sua aquisição. Conclui-se que a fome tem como causa principal a pobreza extrema, com violação ao acesso a direitos humanos que assegurem uma vida digna, configurando-se como um problema social de uma população. Como é possível medir a fome em uma população? A fome crônica resulta em um dos tipos de desnutrição, provocada pela deficiência de energia e proteínas, que frequentemente se associa às outras carências nutricionais (ferro, vitamina A e outros micronutrientes). Doenças infecciosas são mais frequentes em indivíduos desnutridos devido à menor imunidade, gerando a diminuição do apetite, da absorção e utilização de nutrientes, além do aumento das necessidades nutricionais, agravando ainda mais a situação. [...] seja por seus efeitos diretos ou por consequências associadas, a desnutrição energético-proteica correlaciona-se negativamente com o desempenho físico e mental, deixando em seus portadores sequelas e restrições funcionais que se prolongam por toda a vida, implicando comprometedora inferioridade biológica para as demandas de um mundo que exige crescente capacidade competitiva [...] (TADDEI et al., 2011, p. 168). 24 Unidade I Para o diagnóstico do estado nutricional populacional, utilizam-se medidas antropométricas (peso e estatura) que exigem procedimentos de baixa complexidade e custo. Entre crianças, a desnutrição crônica é identificada pelo déficit de estatura para a idade e nas demais faixas etárias é comum avaliá-la pelo índice de massa corpórea (IMC), que considera a relação entre peso e altura (IMC = peso (kg) / altura (m)2). O objetivo é identificar a magnitude do problema, mudanças ao longo do tempo, delimitação espacial e grupos populacionais mais vulneráveis. Com a análise desses dados, será possível avaliar e planejar medidas para melhorar as condições de vida de toda a sociedade. Pobreza, fome e desnutrição estão relacionadas. O indivíduo que tem fome é o mesmo que vive em condições de pobreza e apresenta desnutrição energético-proteica. No entanto, o inverso não é verdadeiro, pois nem todos que possuem baixa renda estão desnutridos e privados do acesso aos alimentos. Apenas aqueles abaixo da linha da pobreza extrema, baseada no custo estimado para acesso aos alimentos, apresentarão a fome crônica, assim como a desnutrição energético-proteica não é restrita àqueles que têm fome e são pobres, dado que diversas patologias podem ocasionar a redução do peso corporal (desnutrição secundária), seja por diminuição do apetite, seja por aumento das demandas nutricionais, conforme figura a seguir. Fome Pobreza Desnutrição Figura 3 – Relação entre pobreza, fome e desnutrição Fonte: Monteiro (2003, p. 9). Apenas em situações muito específicas e por tempo limitado, como guerras e catástrofes naturais, a fome não estará associada à pobreza e à desnutrição (MONTEIRO, 2003). 2.1 Tendência temporal da desnutrição energético-proteica Garantir uma vida com dignidade é a meta primordial estabelecida na agenda de desenvolvimento sustentável proposta pela ONU, e o Brasilé um dos signatários. Em 2015, chefes de Estado e governo propuseram 17 objetivos e 169 metas a serem atingidos até 2030, sendo que aspectos relacionados à pobreza e à fome estão apresentados no primeiro e no segundo objetivos. Até 2030, os países pactuaram em erradicar a pobreza extrema (renda per capita menor de 1,90 dólares/dia), a fome e a desnutrição, além de reduzir pelo menos à metade a população que vive em pobreza (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2020). Antes mesmo da definição dos objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS) em 2015, já se observava a diminuição da desnutrição, como mostra a figura a seguir. 25 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA 1990 1992 1990 1992 1990 1992 1990 1992 2014 2016 2014 2016 América latina e Caribe América do Sul América Central Caribe 2014 2016 2014 2016 0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% Figura 4 – Evolução percentual da prevalência de desnutrição na América Latina e no Caribe (1990-1992 e 2014-2016) Adaptada de: FAO/Opas (2017, p. 14). Apesar da diminuição percentual da desnutrição, cerca de 37,4 milhões de pessoas ainda não suprem suas necessidades diárias de energia (FAO/OPAS, 2017). Crianças menores de 5 anos são mais vulneráveis aos primeiros sinais e sintomas da desnutrição crônica, apresentando comprometimento do crescimento e desenvolvimento que podem ser irreversíveis. Corroborando com os dados apresentados na figura anterior, o percentual de crianças desnutridas também diminuiu significantemente em 15 anos (figura a seguir). 19901990 1990 199020152015 América latina e Caribe América do Sul América Central Caribe 2015 2015 0% 5% 10% 15% 20% 25% 35% 30% 40% Figura 5 – Evolução percentual da prevalência da desnutrição crônica em crianças menores de 5 anos na América Latina e no Caribe (1990 e 2015) Adaptada de: FAO/Opas (2017, p. 15). 26 Unidade I A primeira pesquisa com representatividade nacional com o objetivo de realizar o diagnóstico nutricional da população brasileira foi o Endef, entre 1974-1975. O quadro a seguir sintetiza os inquéritos populacionais domiciliares e telefônicos com abrangência nacional, os quais tiveram coleta de dados antropométricos e/ou de consumo alimentar. Quadro 2 – Inquéritos antropométricos e alimentares no Brasil Pesquisa Amostra Consumo alimentar Antropometria Endef (1974-1975) 55 mil domicílios Pesagem direta dos alimentos por sete dias consecutivos Peso Altura Perímetro do braço Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição (PNSN – 1989) 14.455 domicílios Não foi avaliado Peso Altura Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS – 1996 e 2006) 1996: 13.283 domicílios (análise de mulheres, homens e crianças < 5 anos) 2006: 14.617 domicílios (análise de mulheres e crianças < 5 anos) Questionário de frequência alimentar Peso Altura Perímetro da cintura (mulheres) em 2006 Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF – 2002-2003; 2008-2009; 2017-2018) 2002-2003: 48.470 domicílios 2008-2009: 55.970 domicílios 2017-2018: 57.920 domicílios Aquisição domiciliar de alimentos 2008-2009 e 2017-2018 Registro alimentar de dois dias não consecutivos Peso Altura Pesquisa Nacional de Saúde (PNS – 2013) 62.986 domicílios Marcadores do consumo alimentar Peso Altura Perímetro da cintura Vigilância dos fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico (Vigitel – 2006-2019) Em torno de 54.000/ano/ adultos residentes nas capitais e Distrito Federal por inquérito telefônico Marcadores do consumo alimentar Peso e altura relatados pelos pesquisados Adaptado de: Sperandio e Priore (2017). A análise dos resultados desses inquéritos populacionais revela a evolução temporal da desnutrição no país, como mostram as figuras 6 e 7. 27 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA Masculino Feminino 0% 5% 10% 15% 20% 25% 35% 30% Endef 1974-1975 PNSN 1989 POF 2008-2009 Figura 6 – Evolução de déficit de altura entre crianças de 5 a 9 anos de idade segundo sexo Fonte: IBGE (2010a). A desnutrição entre crianças de 5 a 9 anos ultrapassou 25% no período de 1974-1975. A diminuição observada em mais de trinta anos foi significativa, com prevalência de 7,2% entre meninos e 6,3% entre meninas no último inquérito apresentado na figura 6. Por sua vez, a figura 7 ilustra a evolução de déficit de peso entre adultos. Masculino Feminino 0% 2% 4% 6% 8% 10% 14% 12% Endef 1974-1975 PNSN 1989 POF 2002-2003 POF 2008-2009 Figura 7 – Evolução de déficit de peso entre adultos maiores de 20 anos de idade segundo sexo Fonte: IBGE (2010a). Prevalências inferiores a 5% de desnutrição são esperadas e não caracterizam um grande problema de saúde pública, pois correspondem a indivíduos constitucionalmente magros. Dessa maneira, entre adultos, desde o final da década de 1980, a desnutrição já apresenta evidências de que está controlada na população brasileira. 28 Unidade I O déficit de estatura atingiu 32,9% das crianças brasileiras menores de 5 anos entre 1974 e 1975. Em 1989, esse índice foi de 15,7%, uma redução significativa, porém não equitativa entre regiões brasileiras. A queda foi mais intensa nas áreas urbanas do país nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. A tendência de diminuição da desnutrição infantil permaneceu nos anos seguintes, com prevalências de 13,5% em 1996 e 6,8% em 2006-2007 (MONTEIRO et al., 2009; TADDEI et al., 2011; JAIME, 2019). Destaca-se que entre 1996 e 2006-2007 também diminuíram as diferenças regionais, pois a redução da prevalência de déficit de estatura entre menores de 5 anos foi maior nas regiões Norte e Nordeste, principalmente o Nordeste, cuja frequência aproximou-se da observada em outras regiões brasileiras (JAIME et al., 2014). Monteiro et al. (2009), ao analisar os determinantes da diminuição do déficit de estatura entre crianças menores de 5 anos analisadas na PNDS (1996 e 2006-2007), constataram que a melhora da situação de vida do brasileiro em diversos aspectos esteve associada à modificação do estado nutricional, e a participação relativa dos principais fatores está acentuada na figura a seguir. Poder aquisitivo 22% Escolaridade materna 26% Outros fatores 37% Assistência à saúde 11%Saneamento 4% Figura 8 – Participação relativa (%) dos fatores associados ao declínio da desnutrição infantil em crianças menores de 5 anos. Brasil: 1996 e 2006-2007 Adaptada de: Monteiro et al. (2009). Outros fatores que interferiram na queda da desnutrição infantil (figura anterior) foram paridade materna, número de irmãos vivos, ordem de nascimento, vacinação de crianças etc. (MONTEIRO et al., 2009). Programas de transferência de renda, como o PBF, estiveram associados ao aumento do poder aquisitivo das famílias em vulnerabilidade social nos últimos anos. Além do complemento de renda mensal, o PBF tem condicionalidades relacionadas às áreas de saúde e educação. Beneficiários 29 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA do programa que sejam gestantes ou menores de 7 anos devem ser acompanhados em relação à evolução de dados antropométricos, possibilitando o monitoramento do estado nutricional desses grupos populacionais. Jaime et al. (2014) avaliaram o estado nutricional de 1.901.370 e 2.365.276 crianças menores de 5 anos beneficiadas pelo PBF em 2008 e 2012, respectivamente, e os resultados da frequência de déficit de estatura por região brasileira estão ilustrados na figura a seguir. 25% 15% 5% 20% 10% 0% Sudeste Centro-Oeste NordesteSudeste Norte Brasil 2008 2012 Figura 9 – Prevalência de déficit de estatura em crianças menores de 5 anos beneficiadas PBF segundo região. Brasil: 2008 e 2012 Adaptada de: Jaime et al. (2014). Observa-se uma significativa redução do déficit de estatura em crianças menores de 5 anos beneficiadas pelo programa (exceção na região Centro-Oeste). Contudo, quando comparada com a prevalência obtida na Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) de 2006 nessa faixa etária (6,8%), os valores observados entre beneficiados do programa mantêm-sesuperiores em todas as regiões, especialmente Norte e Nordeste (JAIME et al., 2014). No Brasil, a taxa de mortalidade por desnutrição em crianças menores de 5 anos de idade diminuiu de 1 óbito/10 mil habitantes em 2003 para 0,2 óbito/10 mil habitantes em 2016, sendo que nas regiões Norte e Nordeste essa taxa de mortalidade foi maior que a média nacional nos dois períodos avaliados (Norte: 1,1 óbito/10 mil habitantes em 2003 e 0,6 óbito/10 mil habitantes em 2016; Nordeste: 1,7 óbito/10 mil habitantes em 2003 e 0,3 óbito/10 mil habitantes em 2016). Ao comparar os estados brasileiros, as maiores taxas de mortalidade por desnutrição no período de 2013 a 2016 ocorreram em Roraima (7,1 óbitos/10 mil habitantes), Acre (6 óbitos/10 mil habitantes) e Amazonas (3,2 óbitos/10 mil habitantes) (RISSI et al., 2019). 30 Unidade I Assim, apesar da significativa diminuição da desnutrição infantil no país, algumas populações específicas mais vulneráveis, incluindo indígenas e quilombolas, ainda mantêm frequências importantes dessa doença, portanto, devem ser tratadas com prioridade nas ações públicas intersetoriais de segurança alimentar e nutricional (JAIME et al., 2019). A FAO analisa a extensão da desnutrição no mundo desde 1974. Desde a década de 1970, ocorreram mudanças importantes que interferiram diretamente no estado nutricional das diversas populações, tais como o aumento da urbanização, o crescimento populacional, o desenvolvimento tecnológico e a globalização. A tendência de desnutrição no mundo é de diminuição, assim como no Brasil. No entanto, de 2015 a 2017, observou-se estagnação da prevalência mundial de desnutrição, em torno de 11%, representando 811 milhões de pessoas. Conforme apresentado na figura a seguir, no continente africano o percentual de desnutrição é de, aproximadamente, 20%, e aumentou no período de 2015 a 2017 (FAO, 2019). 25% 15% 5% 20% 10% 0% 2004 2008 2012 20162006 2010 2014 2018 Total África Ásia América Latina e Caribe Figura 10 – Prevalência de desnutrição em alguns continentes de 2005 a 2017 Adaptada de: FAO (2019). Desde 2014 (e até 2020), o Brasil mantém-se “fora” do Mapa da Fome por apresentar prevalência de desnutrição na população menor que 5%, assim como ocorre em países mais desenvolvidos (EUA, Canadá, Austrália, China, Japão, Rússia e a maioria dos países europeus). Saiba mais Anualmente, a FAO divulga dados sobre desnutrição nos diversos países por meio do Mapa da Fome. Para mais informações, acesse o site e consulte suas várias publicações. Disponível em: https://bit.ly/3cLiyjV. Acesso em: 2 jun. 2021. 31 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA O estado nutricional adequado é uma estratégia para interromper o ciclo da pobreza, que está associada à maior frequência de doenças transmissíveis, diminuição da qualidade de vida, capacidade intelectual e produtiva do indivíduo. Uma boa alimentação está associada ao peso adequado ao nascer, ao desenvolvimento e crescimento infantil otimizado e a adultos e idosos mais saudáveis; envolve uma sociedade com melhores condições de saúde para compor uma nação mais desenvolvida social e economicamente. 3 SEGURANÇA ALIMENTAR E DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA O conceito de segurança alimentar e nutricional (SAN) está em constante processo de mudança e aprimoramento. Esse termo se vincula tanto a questões alimentares e nutricionais como a aspectos militares, sociais, culturais, políticos, econômicos, sendo tema permanentemente debatido tanto no Brasil como no mundo. A Losan (Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional) é vista como o principal marco legal de luta e busca pela SAN no Brasil. Da mesma forma, o Sisan tem grande importância por ser um sistema público de gestão participativa e intersetorial que possibilita a articulação entre os três níveis de governo para a implementação e execução da PNSAN. Desde a instituição da Losan, temos como definição de SAN: Consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, economica e socialmente sustentáveis (BRASIL, 2006b). 3.1 Processo histórico da segurança alimentar e nutricional O termo segurança alimentar começou a ser construído logo após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), estando associado com a segurança nacional no contexto europeu. Naquela época, o bloqueio estratégico da distribuição de alimentos aos países que não produziam seus próprios alimentos os deixou expostos às carências nutricionais, mais especificamente à fome, gerando perdas de combatentes e até mesmo de batalhas (ABRANDH, 2013). Isso gera impactos não só na segurança e na alimentação, como também no sistema econômico, político e militar do país. Com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), alguns anos mais tarde, houve um agravamento do sistema econômico mundial. A disputa por controle geopolítico mundial ampliou o debate ao tema da pobreza e da fome e o termo segurança alimentar ganhou mais força (SILVA, 2014). Em 1945, a FAO foi constituída com o intuito de atuar como um fórum neutro de discussão entre os países (FAO, 2019). Foi o início da discussão sobre o direito humano à alimentação, principalmente em 1948 (ONU, 1948), quando foi promulgada a Declaração dos Direitos Humanos (FREITAS; SALDIVA, 2007). 32 Unidade I Nesse período pós-guerra, a questão da carestia e da segurança alimentar passou a ser compreendida como produção e distribuição insuficiente de alimentos. Com isso, iniciaram-se várias ações de apoio e assistência à alimentação, em geral utilizando os excessos de produção de países ricos para os países em dificuldades (ABRANDH, 2013). A partir de 1950, o movimento Revolução Verde cresceu mundialmente, o qual se caracterizava pela promoção do uso de sementes geneticamente modificadas com alto rendimento, da aplicação de insumos químicos (como pesticidas e fertilizantes) e maior uso de tecnologias na agricultura, com o aumento do uso de maquinários, desde o plantio até a colheita da produção agrícola (ANDRADES; GANIMI, 2007). Diante disso, a produção alimentícia foi notoriamente acelerada, porém sem grandes impactos na questão da fome e da miséria. Por outro lado, importantes consequências ambientais, econômicas e sociais ocorreram, como a contaminação do solo e dos alimentos com agrotóxicos, a redução da biodiversidade e o êxodo rural (ABRANDH, 2013). Observação Nos dias atuais, pode-se ainda observar sequelas desse movimento chamado Revolução Verde, principalmente em se tratando do uso de agrotóxicos. Já na década de 1970, a escassez de alimentos em vários países ocasionou a realização da I Conferência Mundial de Segurança Alimentar, que reforçou a compreensão de que era preciso, além de maior disponibilidade de alimentos, a regularidade de acesso, sendo importante investir em uma política de armazenamento. Nota-se que o foco ainda era o produto, e não o fator humano relacionado à problemática alimentar e o direito humano à alimentação adequada (ABRANDH, 2013; FREITAS; SALDIVA, 2007). Foi nesse contexto que a Revolução Verde se intensificou por todo o mundo, inclusive no Brasil, em especial na produção de soja do país. Contudo, o aumento exponencial da produção não gerou redução na pobreza; paradoxalmente, houve um avanço no número de famintos e excluídos, ou seja, não ocorria o acesso a essa produção excedente. Mundialmente, o contínuo aumento da produtividade agrícola gerava redução dos preços no mercado; contudo, a questão da miséria permanecia em ascensão. A partir dos anos 1980, o conceito de segurança alimentar foi ampliado para além da capacidade produtiva, de armazenamento e de oferta, e passou a ser relacionado à garantia de acesso físico e econômico em quantidade suficiente e de forma permanente (ABRANDH, 2013). Nesse período,observou-se importante evolução no entendimento do conceito de segurança alimentar, que passou a ser considerado como um direito básico, conforme previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Pidesc) (1966), além de incorporar o aspecto nutricional e sanitário, sendo então denominado SAN (MACEDO et al., 2009). Conforme descrito anteriormente, no Brasil, foi Josué de Castro que denunciou a fome como fenômeno de violação de um direito humano e produto de uma sociedade com problemas sociais que deveria ser debatida nas esferas política, econômica e social. 33 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA Posteriormente, em 1986, ocorreu a I Conferência Nacional de Alimentação e Nutrição como parte da 8ª Conferência Nacional de Saúde. Esse foi um marco para a saúde do país, mas também para o debate e entendimento, no sentido mais amplo, de segurança alimentar. Nesse evento foi proposto o conceito de SAN, consolidada apenas em 1994, com a I Conferência Nacional de Segurança Alimentar, como sendo: [...] a garantia, a todos, de condições de acesso a alimentos básicos de qualidade, em quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades básicas, com base em práticas alimentares que possibilitem a saudável reprodução do organismo humano, contribuindo, assim, para uma existência digna (ABRANDH, 2013, p. 13). Essa definição articula dois componentes diferentes que se complementam: as dimensões alimentar e nutricional. Conforme a figura a seguir, a dimensão alimentar diz respeito à produção, comercialização e disponibilidade de alimentos e a dimensão nutricional refere-se às práticas alimentares, isto é, escolha, preparo e consumo alimentar, além de sua utilização biológica e da relação com a saúde humana (ABRANDH, 2013; FREITAS; SALDIVA, 2007; SILVA, 2014). Atendendo aos aspectos de sustentabilidade do meio Promoção da saúde no contexto familiar e de comunidade Oferta permanente, estável e continuada Consumo alimentar adequado e saudável Autônoma para alcançar a autossuficiência nacional dos alimentos básicos Utilização de técnicas de preparo adequadas para preservação dos aspectos nutricionais Equitativa e atendendo o acesso às necessidades nutricionais Escolha de alimentos saudáveis Suficiente para atender a demanda de forma adequada Promoção de fatores ambientais, psicossociais, financeiros e culturais que interfiram na saúde e na nutrição Dimensão alimentar Dimensão nutricional Segurança alimentar e nutricional Figura 11 – Principais aspectos que caracterizam a segurança alimentar e nutricional Adaptada de: ABRANDH (2013). 34 Unidade I Saiba mais Para saber mais sobre a SAN, leia o artigo a seguir: RIBEIRO, C. S. G.; PILLA, M. C. B. A. Segurança alimentar e nutricional: interfaces e diminuição de desigualdades sociais. Demetra: Alimentação, Nutrição & Saúde, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, 2014. Disponível em: https://bit. ly/3paPYxk. Acesso em: 2 jun. 2021. Em 1993 foi criado o Consea, por meio do Decreto n. 807 (BRASIL, 1993a), para articular as três esferas de governo (municipal, estadual e federal) e a sociedade civil para elaborar programas federais e revisar os existentes. Contudo, sua atuação era pequena, e o conselho foi desativado em 1995. Em 1996, no âmbito mundial, a FAO organizou em Roma a Cúpula Mundial da Alimentação, que estabeleceu de forma permanente o direito humano à alimentação adequada e a garantia da segurança alimentar e nutricional (ABRANDH, 2013; SILVA, 2014). Em 1998, aconteceu o Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN), seguindo a linha de debates internacionais (ABRANDH, 2013). Assim como esta, muitas outras iniciativas e eventos aconteceram até o ano de 2003, quando o Consea foi recriado e renomeado para a incorporação do termo nutricional (FREITAS; SALDIVA, 2007). Em 2004, realizou-se a II Conferência Nacional de SAN, importante marco histórico, pois propôs a Losan, aprovada em 2006, que estabelece o Sisan (BRASIL, 2006b). Esse evento também teve grande relevância ao propor a incorporação de duas novas dimensões ao conceito de SAN, além da alimentar e nutricional: a soberania alimentar e a sustentabilidade no âmbito ambiental, econômico e social. De acordo com o Consea (MACHADO, 2017), soberania alimentar: [...] diz respeito ao direito que têm os povos de definirem as políticas, com autonomia sobre o que produzir, para quem produzir e em que condições produzir. [...] significa garantir a soberania dos agricultores e agricultoras, extrativistas, pescadores e pescadoras, entre outros grupos, sobre sua cultura e sobre os bens da natureza. A dimensão de soberania alimentar foi construída no início dos anos 1990 por articulação de movimentos de camponeses pelo mundo que tinham o intuito de reconhecer a liberdade e/ou autonomia de um povo, para decidir sobre a diversidade e as formas de produção de alimentos, garantindo a preservação do meio ambiente e a proteção da biodiversidade (VINHA; SCHIAVINATTO, 2015; BERNSTEIN, 2015). 35 NUTRIÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA Esse conceito se contrapõe aos princípios da Revolução Verde, pois além de valorizar o direito à alimentação saudável com respeito ao meio ambiente e biodiversidade, busca recuperar o poder do cultivo e produção de alimentos saudáveis, isento de agrotóxicos e sem origem transgênica, independentemente das demandas dos mercados e corporações (CIDAC, 2019). A incorporação dessa dimensão foi de extrema relevância política, já que fortaleceu a agricultura familiar, sendo defendida e incentivada por vários órgãos internacionais para o processo de erradicação da fome e da miséria, como também para a implantação de um sistema agrícola social e ambientalmente sustentável. Contudo, a busca pela soberania alimentar ainda não obteve grandes progressos, uma vez que contraria produções de grandes empresas agroalimentares baseadas em latifúndios monocultores. Já no ano de 2007, a III Conferência Nacional de SAN propôs diretrizes e prioridades para a PNSAN (FREITAS; SALDIVA, 2007), instituída em 2010 pelo Decreto n. 7.272, o qual também estabeleceu os critérios e as normas para a elaboração do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PlanSAN) (BRASIL, 2010a). Durante todo o processo histórico relacionado à SAN, fatores envolvidos com a fome foram determinantes e motivaram o surgimento de movimentos para combater a carestia alimentar. Atualmente, agregou-se a discussão de temas como a qualidade do que se come, a forma como se come e a sustentabilidade do meio em que são produzidos os alimentos. 3.2 Direito humano à alimentação adequada Segundo a ONU: [...] os direitos humanos são comumente compreendidos como aqueles direitos inerentes ao ser humano. O conceito de direitos humanos reconhece que cada ser humano pode desfrutar de seus direitos humanos sem distinção de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outro tipo, origem social ou nacional ou condição de nascimento ou riqueza. Os direitos humanos são garantidos legalmente pela lei de direitos humanos, protegendo indivíduos e grupos contra ações que interferem nas liberdades fundamentais e na dignidade humana (ONU, 2020). Assim, os direitos humanos são universais, indivisíveis e inalienáveis a todas as pessoas e de vital importância para garantir uma vida digna, sendo interdependentes e inter-relacionados. Observe alguns exemplos: direito à vida, à moradia, à liberdade de crença, à educação, à saúde, à previdência social, à alimentação (BRASIL, 1988). 36 Unidade I O direito humano à alimentação adequada (DHAA) é uma necessidade básica do ser humano e está contemplado no art. 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) (MACHADO, 2017). Internacionalmente, esta declaração marca a formalização dos conceitos que estavam sendo articulados pelos representantes mundiais. Desde então, uma
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