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ADRIANA PACHECO DA SILVA SANTOS

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ADRIANA PACHECO DA SILVA SANTOS
MEMÓRIAS DE UMA EDUCADORA
SINOP
2017
MEMÓRIAS...
Ando devagar
Porque já tive pressa
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais
[...]
Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si
Carrega o dom de ser capaz
E ser feliz.
(Almir Sater – Música Tocando em frente)
Cada um de nós construiu a própria história, cabe a nós carregar em si o dom de ser capaz e ser feliz. Um sonho: ser professora! Sinto, enfim, que chegou o momento de socializar as ideias suscitadas por este trabalho. Resta a memória de muitas tramas que carregamos conosco, testemunho de lembranças significativas vividas e significadas pela educadora. Compartilhamos a ideia de Freire (1996):
Carregamos conosco a memória de muitas tramas, o corpo molhado de nossa história, de nossa cultura; a memória, às vezes difusa, às vezes nítida, clara, de ruas da infância, da adolescência; a lembrança de algo distante que, de repente, se destaca límpido diante de nós, em nós, um gesto tímido, a mão que se apertou, o sorriso que se perdeu num tempo de incompreensões, uma frase, uma pura frase possivelmente já olvidada por quem a disse. Uma palavra por tanto tempo ensaiada e jamais dita, afogada sempre na inibição, no medo de ser recusado que, implicando a falta de confiança em nós mesmos, significa também a negação do risco. (FREIRE, 1996, p. 32-33).
Com as palavras do grande educador, passo a recordar e trazer, para o presente, momentos jamais esquecidos e vivenciados em diferentes situações e nas diversas etapas de minha vida. Como nos afirma Guimarães Rosa “A lembrança de vida da gente se guarda em trechos diversos; uns com os outros acho, que nem se misturam (...) têm horas antigas que ficaram muito perto da gente do que outras de recentes datas”.
Considerando essas memórias, inicio minhas escritas dizendo que nasci em setembro de 1975, no distrito de Canoas, município de Dois Vizinhos – PR, onde vivi por muitos anos. Recordando sobre um passado adormecido, as histórias contadas pela minha mãe acerca de minha chegada ao mundo pelas mãos de uma “parteira” tornam-se interessantes maneiras de pensar o cotidiano vivido pelas populações em espaços diferenciados e revelam como a cultura de determinada época realiza os seus rituais de nascer e morrer, por exemplo. Quando eu nasci meus pais eram muitos jovens, minha mãe tinha apenas 17 anos e meu pai 21. Eles eram primos irmãos. Eu imagino e também recordo dos tantos murmurinhos que esta união entre primos fazia em nossa família. Ao que afirmam, minha chegada ao mundo foi muito comemorada, pois era a primeira neta dos avós maternos e a terceira dos avós paternos, fui considerada uma menina linda, paparicada por todos, principalmente pelos meus avós, com os quais sempre estabeleci grande vínculo afetivo. Em situações de doenças havia uma “curandeira”, considerada na época como “benzedeira”, expressão de cuidados na vivência de uma infância que me permitiu perceber o carinho, a atenção e o amor que embalaram os meus dias de criança.
Entre as lembranças, recordo-me de uma das aventuras vividas aos cinco anos de idade na casa de meus avós paternos quando arrancava as rosas de seu jardim, uma das flores que minha avó mais cuidava e cultivava com carinho, para fazer das pétalas a cama de minhas bonecas! Minha avó, quase chorando ao ver a cena, disse: minhas rosas lindas! Oh não! Sorridente, olhei para ela e disse: já fiz uma caminha cheirosa para minha neném! Ela, então, sorri e comove-se com minhas doces palavras. Apesar das rosas serem significativas para minha avó, ela percebeu que o ato de viver aquele momento na minha infância para mim foi muito mais significativo. 
Também uma das maravilhas de minha infância foi poder fazer aquilo que eu acredito que toda criança gosta: tomar banho de chuva! Lembro-me até hoje de vários banhos de chuva que tomei, mas o que ficou mais marcado nas lembranças foi aquele em que minha mãe deixou escorregar nos valetões de água que escorriam durante a chuva, que de fato era uma água escura, pois a terra do estado do Paraná é considerada barro vermelho. Foi maravilhoso, para mim uma das brincadeiras mais importantes de minhas lembranças. 
Da casa de meus avós maternos, guardo muitas recordações. Lembro-me do fogo no fogão à lenha, preto, sempre aceso, com um bule de café, muito brilhoso, pois a minha avó o areava todos os dias. Ainda, no mesmo fogão, minha avó fritava os deliciosos bolinhos de chuva, que comíamos com açúcar e canela. O meu avô, sempre em seus momentos de descanso, ouvia as notícias em um rádio de mesa, com muitos botões, e a minha avó o acompanhava, enquanto fazia crochê ou bordado. Eu sorria quando ele me chamava pelo inesquecível apelido carinhoso: “pezinho de pazinha”! Para ele era significante este chamado, pois me considerava como pezinhos arteiros, pezinhos que se movimentavam.
A partir do momento em que iniciei minha vida escolar, etapa que considero importantíssima, porque foi a base de toda minha aprendizagem, minhas brincadeiras de infância passaram a ser voltadas para a escola, às bonecas eram as crianças e eu a professora. Ser professora era uma brincadeira que refletia a dedicação e o carinho que a minha primeira professora cultivava com sua turma. Nesse contexto podemos acrescentar que o interesse pela profissão com foco na criança teve suas raízes em minha trajetória pessoal e profissional. 
Assim, voltando as memórias da minha infância, relembro que aos seis anos, iniciei meu processo de alfabetização através da cartilha “Caminho Suave”, apostilado utilizado na década de 1980 no estado do Paraná. Posso afirmar que me intriga até hoje o fato de não ter tido a oportunidade de participar de uma turma de educação infantil, iniciando meus estudos já na primeira série do ensino fundamental, em uma sala de alfabetização na qual comecei as primeiras aprendizagens de leitura e de escrita, a partir de um método sintético, que consiste na apresentação de letras, sílabas e formação de frases. Isso se realizava de maneira descontextualizada e mecânica, fazendo com que a criança memorizasse as “famílias silábicas” para formar palavras e lê-las, momento em que a criança era considerada alfabetizada. Essa sistematização rigorosa é contrária ao que afirma Freire (1996, p. 62) “aprender a ler e escrever não significa a memorização de sílabas, palavras ou frases, mas refletir criticamente sobre esse processo e sobre o verdadeiro significado da linguagem”.
Particularmente, foi muito difícil para mim a fase da alfabetização, porque não conseguia aprender as letras do alfabeto, nem decodificar as sílabas e isso me inquietava muito. Mas, como era uma criança dedicada, ao final do ano letivo, sabia ler e escrever devido a um grande esforço pessoal e familiar, pois tinha que estar alfabetizada. Dois anos após iniciar minha alfabetização, aos oito anos, nos mudamos para uma comunidade rural em outro Estado, Rio Grande do Sul, na qual não havia escola na comunidade e dependia de transporte escolar para ir à cidade mais próxima frequentar a terceira série. Nos primeiros dias de aula, fui à escola de ônibus acompanhada de minha mãe, pois tinha apenas oito anos e não conhecia o percurso de casa para a escola e da escola para casa. Alguns dias após, comecei a ir sozinha à escola, o que me deixou muito feliz. Estava me sentindo mais autônoma e responsável, pois seria diferente da outra escola que, em menos de 10 minutos, eu chegava em casa. Outro fato inovador para mim foi a quantidade de professores, pois no ano anterior era apenas um para todas as disciplinas. Gostei muito da escola e dos professores, esta foi uma das melhores escolas em que estudei. Eu me sentia feliz em estudar e ter muitos amigos naquela instituição. Acabava comparando com a escola do outro estado e no sítio aonde morávamos, aproximadamente uns 30 km da cidade em que eu estudava, as minhas brincadeiras naquele contexto rural eram subir nas árvores frutíferas para colher e vender as frutas para minha família, realidade na qual presenciava, poismeus pais trabalhavam com venda das verduras colhidas em sua horta em feiras na cidade. Estudar nesta outra escola passava a representar novos vínculos de amizade e abertura para novas brincadeiras. 
Os anos se seguiram e nos mudamos para o Estado de Mato Grosso, local onde residimos até os dias de hoje. Iniciei o ginásio, como era referido na época dos anos 80, e também cursei o 2° grau, hoje denominado ensino médio, onde tive a oportunidade de optar pelo Curso de Magistério, sendo que minha paixão foi aumentando ainda mais pela profissão de professora. Adorava as disciplinas do curso, onde comecei a me dedicar mais, e assim decidi que seria uma professora. Porém, algo resolveu atrapalhar meus sonhos, porque logo no ano seguinte mudamos de cidade, e lá não havia o mesmo curso, apenas o curso técnico em contabilidade era ofertado e tive que mudar de curso. Confesso que não gostei desta formação, conclui o 2° grau descontente e não tive mais interesse pelos estudos, encerrando temporariamente a vida escolar. Como a letra da música de Almir Sater “todo mundo ama um dia, todo mundo chora, um dia a gente chega e no outro vai embora”.
Contudo, o tempo passa e as pessoas mudam, as experiências que vão sendo vividas ao longo da vida compõem a nossa própria essência, condiciona e provoca os nossos sonhos, são referências para as nossas perspectivas. Foi assim que, quase 20 anos fora da escola, tempo que me dediquei à composição de minha própria família, resolvi realizar o Curso de Pedagogia na UNEMAT, Campus Sinop/ MT. Este período acadêmico foi de extrema relevância para a minha formação e retomada de sonhos antigos relacionados ao “ser professora”. As leituras realizadas nas disciplinas, os debates em sala de aula, a realização dos estágios de docência e o Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “O desenvolvimento corporal na educação infantil” (UNEMAT, 2011) foram fundamentais para a minha formação acadêmica e os processos de identificação com a etapa da educação infantil.
Cabe destacar que durante a realização do Curso de Pedagogia, já nos semestres finais, tive o prazer em participar, como bolsista, da importante pesquisa a respeito das crianças do campo. A pesquisa “Caracterização das práticas educativas com crianças de 0 a 6 anos residentes em áreas rurais”, relevante pesquisa no âmbito educacional.
Assim, a vivência no campo por um pequeno período e a participação de uma importante pesquisa a respeito das crianças do campo, me colocaram numa submersa reflexão, qual seja, a de admitir quão importante é ouvir a criança numa posição de igualdade e alteridade, de não superioridade ao privilegiar a perspectiva adulta, procurando respeitar a ideia de que a criança vê o mundo dentro da sua própria lógica e assim deve ser compreendida.
“Cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz”. Foi essa a força mobilizadora para ampliar os estudos a respeito da educação infantil do campo a qual me levou a ingressar no Curso de Mestrado em Educação. Ressalto também que devido a constatação do esquecimento e o desinteresse histórico nas populações camponesas, algo preocupante, aumentou o meu interesse em escolher as crianças pequenas, abrindo espaço nessa pesquisa para dar vez e voz as crianças de um Assentamento de Reforma Agrária, pequenos silenciados pelo mundo capitalista em que vivemos. Evidenciamos a necessidade de aprofundar os estudos a respeito das políticas da educação infantil do e no campo, assim como, o melhor entendimento sobre o currículo elaborado para as crianças do campo e as práticas pedagógicas vividas com elas no cotidiano da turma de educação infantil de um espaço camponês.
Esse exercício de retomar a memória para compor este texto me faz perceber os entrelaçamentos que mobilizam os meus conhecimentos, valores e energias, para dizer quem fui, quem sou e o que serei. Nesse movimento, percebo que coisas que pareciam tão corriqueiras do dia a dia, ou até insignificantes se tornaram, sob o olhar de hoje, uns menos e outros mais importantes do que nos momentos vividos. Esse movimento exigiu relembrar e ressignificar o passado, desde o mais antigo momento que me vinha à lembrança. E, quanto mais longe no tempo eu ia, mais fatos, mais lembranças, mais perguntas, mais respostas, mais dúvidas e indagações tomavam conta da minha existência. As imagens vinham à minha cabeça de modo desorganizado e aleatório e logo davam espaço a outras lembranças de outros tempos. Foi assim que me senti, ao rememorar a minha trajetória, em um emaranhado de fios do passado, presente e futuro, em um ir e vir nas lembranças. Assim, pude apresentar minhas mermórias, a partir dos seguintes “nós”: os lugares, as pessoas e os cenários da infância e adolescência, a escola e a vivência, enfim um processo intelectual e profissional em constante constituição.

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