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Educação, sexualidade e gênero Aula 02: Corpo, gênero e sexualidade – Foucault, Bozon e Bourdieu Apresentação Nesta aula, veremos algumas teorias importantes para que você possa aprofundar seus conhecimentos sobre gênero e sexualidade. Conheceremos um pouco do pensamento de três referências no assunto: Michel Foucault, Michel Bozon e Pierre Bourdieu. Veremos que os comportamentos ligados à sexualidade também são aprendidos e que este aprendizado se refere ao que a sociedade, em determinados tempo e cultura, entende como permitido ou não, puro ou impuro, lícito ou ilícito. Além do biológico, o corpo humano é culturalmente construído através de escolhas ou imposições sociais, e de valores que determinam o que é ser homem e o que é ser mulher. Essa construção social dos corpos e da sexualidade está relacionada com uma visão androcêntrica de mundo, ou seja, com uma tendência à supervalorização dos pensamentos e ideias masculinas, sem levar em conta o papel social da mulher. Objetivo Esclarecer o pensamento de Michel Foucault, Michel Bozon e Pierre Bourdieu sobre sexualidade e as questões de gênero; Identi�car o papel da construção social na elaboração da sexualidade humana; Explicar os conceitos antropológicos de androcentrismo, dominação masculina e violência simbólica propostos por Bourdieu. Palavras iniciais Para que você possa iniciar seus estudos nesta aula, é importante que você entenda que sexo, sexualidade e gênero não são sinônimos e que as abordagens desses temas estão sempre envolvidas em polêmicas discussões. Para nos ajudar a compreender este tema com tantas incertezas e questionamentos, escolhemos como guias de nossas re�exões: Michel Foucault (1926-1984) Filósofo francês conhecido por suas teorias acerca da relação entre poder e conhecimento, e como estes são usados para o controle social através das instituições. Michel Bozon Antropólogo de formação, tido como um dos maiores pesquisadores da atualidade sobre sexualidade dentro do campo das ciências sociais, com uma relação bastante próxima de pesquisadores no Brasil, como Maria Luiza Heilborn, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Pierre Bourdieu (1930-2002) Sociólogo que empreendeu uma investigação sociológica do conhecimento e detectou um jogo de dominação e reprodução de valores. Para que você possa iniciar seus estudos nesta aula, é importante que você entenda que sexo, sexualidade e gênero não são sinônimos e que as abordagens desses temas estão sempre envolvidas em polêmicas discussões. Para nos ajudar a compreender este tema com tantas incertezas e questionamentos, escolhemos como guias de nossas re�exões: Michel Foucault e a hipótese repressiva Não é de hoje que o tema sexualidade mexe com as fantasias das pessoas. Para alguns, ela está relacionada ao prazer e à luxúria. Para outros, é vista como algo sujo, inconveniente e impróprio. O fato é que que desde a antiguidade, apesar do fenômeno da revolução sexual, falar de sexo e sexualidade é um tabu. Se o espaço dessa fala é a escola, de um modo geral, o caminho aponta para o entendimento de que é seu papel alertar sobre gravidez precoce e doenças sexualmente transmissíveis. Ainda que a proposta seja muito importante, seria só isso? Certamente que não, mas muitas vezes a abordagem adequada da sexualidade na escola esbarre na falta de embasamento e de preparo para lidar com a complexidade do tema. Fonte: Shutterstock No primeiro volume da obra História da Sexualidade, que tem por subtítulo A vontade de saber, Foucault questiona a chamada hipótese repressiva em torno da sexualidade. Ele vai pôr em discussão a veracidade por trás da a�rmação comumente aceita de que seríamos reprimidos quanto à nossa sexualidade. Sobre isso, Foucault argumenta que, desde o século XVIII, evidenciava-se uma enorme proliferação dos discursos acerca da sexualidade: médicos, pedagogos, juristas, psiquiatras, psicanalistas, padres, todos buscam incessantemente extrair a con�ssão a respeito da sexualidade de cada indivíduo. Foucault apresenta o cenário da sexualidade no início do século XVII, dizendo que ainda vigorava uma certa franqueza. "As práticas não procuravam o segredo; as palavras eram ditas sem reticência excessiva e, as coisas, sem demasiado disfarce; tinha-se com o ilícito uma tolerante familiaridade. Eram frouxos os códigos da grosseria, da obscenidade, da decência, se comparados com os do século XIX. Gestos diretos, discursos sem vergonha, transgressões visíveis, anatomias mostradas e facilmente misturadas, crianças astutas vagando, sem incômodo nem escândalo, entre os risos dos adultos: os corpos "pavoneavam." FOUCAULT, 1988. Mas logo a sexualidade ganha novo espaço, está dentro de casa, iniciando uma fase de repressão sexual. No lar das famílias, hipoteticamente, o sexo �ca restrito à sua função reprodutora, ou seja, passa a pertencer à família conjugal e ao casal que, como legítimo e procriador – passa a ser o modelo a ser seguido. Um silêncio em torno do sexo passa a ser proclamado. Não se deve falar de sexo e tudo que está fora desse padrão da família conjugal é expulso, negado e reduzido ao silêncio. "No espaço social, como no coração de cada moradia, um único lugar de sexualidade reconhecida, mas utilitário e fecundo: o quarto dos pais. Ao que sobra só resta encobrir- se; o decoro das atitudes esconde os corpos, a decência das palavras limpa os discursos. E se o estéril insiste, e se mostra demasiadamente, vira anormal: receberá este status e pagará as sanções." FOUCAULT, 1988. Porém, mesmo seguindo esse padrão, era preciso que a sociedade permitisse algumas coisas. Aceitava-se as sexualidades ilegítimas, mas somente caso fosse preciso. Assim, a hipocrisia da sociedade burguesa permitia que, fora do espaço familiar, nos lugares vistos como de tolerância, sexualidades consideradas ilegítimas, ou seja, fora do padrão, poderiam existir e gerar lucros. Foucault chama a atenção para o fato de que essa a�rmação de uma sexualidade reprimida acaba sendo acompanhada de um discurso destinado a dizer a verdade sobre o sexo. Partindo-se da premissa de que não se mente para Deus - o que por si só já é bastante contraditório já que a ideia é de um Deus onipresente (está em todos os lugares) e onisciente (que tudo sabe) está implícita ao cristianismo – nas sociedades cristãs, a sexualidade tornou-se algo que era preciso examinar, vigiar, confessar. Duas características se destacam na explosão discursiva dos séculos XVIII e XIX: A monogamia heterossexual deixa de estar no palco central, não sendo exigida e descrita o tempo todo; Todas as �guras secundárias e periféricas que vigoravam, até então, no silêncio (como a �gura do perverso, da criança onanista , da mulher histérica etc.), avançam para tomar a palavra e confessarem o que são. Em outras palavras, podia-se falar de sexualidade, desde que fosse somente para julgá-la e proibi-la. Foucault aponta que foi o próprio poder das instituições como a igreja, a escola, a família e mesmo da medicina que incitou a proliferação de discursos sobre sexualidade. O objetivo não era proibir ou reduzir a pratica sexual e sim controlar o indivíduo e a população. Assim, os discursos sobre a sexualidade produzidos e tidos como verdades, resultariam na formação de poderes especí�cos, e todos os elementos negativos ligados ao sexo (proibição, repressão etc.) fariam parte de uma manobra de poder e uma vontade de saber. 1 Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online https://estacio.webaula.com.br/cursos/go0212/aula2.html Fonte: Shutterstock Foucault e a disciplina corporal Clique no botão acima. Foucault descreveu vários processos de disciplinarização dos corpos em diferentes instituições, como colégios, fábricas, o�cinas, conventos e quartéis, a�rmando que a principal característica de tais instituições é a disciplina corporal. A escola se torna capaz de modi�car o corpo e a mente, tornando-se um importante espaço de produção e reprodução de regras e práticas particulares, as quaisse articulam a mecanismos de poder e saber que estabelecem uma suposta verdade a ser aceita e seguida. Se até a Idade Moderna os castigos físicos eram aceitos, por serem entendidos como necessários à educação, a partir dela as instituições deixam de ser lugares de suplício, como castigos corporais, para se tornarem locais de criação de corpos dóceis, que necessitam ser preparados para executar o trabalho. Assim, o corpo vai sendo educado, ou melhor, moldado segundo padrões para viver em sociedade. Muda-se a forma, mas permanece a relação de poder. Para alcançar a docilização do corpo, não é mais necessária a violência física que muitos de nossos pais e avós sofreram (castigos, palmatória, �car de joelhos no milho, palmadas etc.) e, ainda que infelizmente não tenha sido totalmente abolida da sociedade, é substituída por outro tipo de violência sobre o corpo – uma violência simbólica - um conceito que veremos mais adiante quando abordarmos o pensamento de Bourdieu. É o olhar de reprovação, a privação da palavra, a proibição da expressão do pensamento, a exigência da boa conduta que moldarão o comportamento, os corpos e as mentes. A partir dessa visão, é claro que a sexualidade também precisa ser disciplinada. É possível falar de um processo de escolarização do corpo e uma pedagogia da sexualidade que, mesmo sendo sutil, tende a ser e�ciente e duradoura. Essa pedagogia da sexualidade normatiza o binarismo e é capaz de produzir identidades, forjando modos de ser e deixando marcas permanentes nas identidades de gênero e sexual dos sujeitos a partir de proposições, imposições e proibições portadoras de efeitos de verdade, do que é normal. Para começar, é preciso de�nir o que é coisa de menino e coisa de menina para depois propor outras regras que, derivando delas, vão sendo aceitas como naturalizadas na sociedade. Michel Bozon e a sociologia da sexualidade Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Michel Bozon é um sociólogo que se debruçou nas pesquisas sobre sexualidade. Buscando analisar a contribuição que a sociologia pode dar aos estudos nesta área, re�rma o papel que a construção social tem na elaboração da sexualidade humana, partindo do entendimento de que a sexualidade tem uma função fundamental na legitimação da ordem estabelecida entre os sexos e na representação da ordem das gerações. Assim como Foucault e Bourdieu, Bozon também aborda a classi�cação dualista e binária dos sexos, da reprodução, oposição entre feminino e masculino e como esse modelo coloca em destaque a dependência social e sexual das mulheres em relação aos homens. Nesse sentido, aponta o que chama de a segunda revolução contraceptiva ou a revolução sexual, que já de�nimos anteriormente, caracterizando-a como uma reorganização do controle do corpo e a possibilidade de uma maior autonomia e controle do processo reprodutivo por parte da mulher. Uma mudança que causou impacto no modelo de família contemporânea. Fonte: Shutterstock Ainda que no cenário contemporâneo esteja se observando o contrário, Bozon destaca um suposto declínio do discurso religioso, a�rmando que a Medicina e a Psicologia estariam sendo cada vez mais utilizadas como suporte de uma nova normatividade, mais técnica, das condutas e funcionamentos sexuais. Michel Bozon e a teoria dos scripts sexuais Para iniciarmos esta abordagem é preciso entender o que está sendo chamado de script. O termo script se refere a uma redução da palavra inglesa manuscript, em português manuscrito, ou seja, escrito à mão. Seja no teatro, na televisão, no cinema ou na execução de um programa de computador, o script é um texto narrativo que contém informações necessárias aos atores ou apresentadores e que nortearão a sua prática. Bozon defende que todas as experiências sexuais são construídas como scripts sexuais, ou seja, em roteiros preestabelecidos que foram aprendidos, codi�cados e inscritos na consciência dos indivíduos. Esses roteiros são estruturados e elaborados como relatos, narrativas e exercem uma função construtiva para o imaginário sexual de grupos, para os relacionamentos e para os indivíduos. Por exemplo, namorar, noivar e casar foi, durante muito tempo, o roteiro entendido como legitimador de uma prática sexual que tinha a família e o casal heteronormativo como modelo. Assim, a sexualidade deveria cumprir etapas de: Conhecer (namoro) Aprofundar o compromisso (noivar) Legitimar a união (casar) para que o sexo fosse permitido O script ou roteiro sexual estabelece também o cenário, os personagens envolvidos e o desfecho esperado. Retomando o exemplo anterior, teríamos: Cenário - a casa, mais especi�camente o quarto do casal. Personagens principais – o casal. Desfecho esperado - a reprodução, geração de �lhos (que, dependendo do roteiro, pode ou não ter amor e prazer). Vamos entender melhor a perspectiva dos scripts sexuais? A perspectiva dos scripts sexuais Clique no botão acima. A teoria dos scripts sexuais não foi uma ideia inovadora de Bozon. Ele se baseou na teoria de John Gagnon e William Simon, publicada em 1973, que entendiam que não há um estado natural da sexualidade humana e que todas as experiências sexuais são construídas como scripts, ou seja, foram aprendidas, codi�cadas e inscritas na consciência humana. Portanto, as experiências sexuais se constituíam de aprendizados sociais através de múltiplos relatos com os quais os indivíduos são impregnados e que fazem com que eles acabem interiorizando modos de funcionamento das instituições. A ideia de controle do corpo, a habilidade e capacidade para perceber e interpretar estados corporais de caráter sexual – como a excitação – são internalizados e naturalizados. Um exemplo bem claro são os scripts sexuais relacionados ao carnaval, que são interiorizados e compreendidos mesmo por quem não participa da festa. Conhecer alguém no carnaval e ter relações sexuais quase imediatamente é interpretado com um tipo de relacionamento particular, destinado a durar pouco tempo (um amor de carnaval). A teoria dos scripts sexuais de Gagnon e Simon teve um impacto signi�cativo nos movimentos de liberação feministas. Também ajudou a compreender os roteiros sexuais construídos na sociedade contemporânea e permitiu que os investigadores identi�cassem os riscos de infecção por HIV nas atividades sexuais e desenvolvessem estratégias de prevenção. No Brasil, as campanhas o�ciais de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis no carnaval partem da ideia de um script sexual que envolve a liberdade sexual e que pode implicar em não prevenção de doenças (DSTs) e gravidez. A sexualidade na ordem do mundo Na maioria das culturas, a iniciação sexual é um marco da entrada de jovens na sexualidade e uma etapa marcante da construção social do masculino e do feminino. São os parentes e os mais velhos que estabelecem regras para a entrada na vida adulta. Iniciação sexual feminina No que diz respeito à sexualidade feminina, fora das sociedades contemporâneas, dois modelos podem ser identi�cados: 1. As mulheres devem entrar o mais cedo possível na vida sexual para que seu trabalho reprodutivo aconteça mais perto da puberdade. Em geral, seus parceiros devem ser homens muito mais velhos para que a dominação seja tanto de sexo quanto de idade; Sempre que este tema é abordado, são utilizados como referência países árabes, a Índia e as comunidades africanas. No entanto, estudos recentes da UNICEF apontam a América Latina e o Caribe como os únicos lugares do mundo onde a prevalência do casamento infantil e da união precoce não reduziu nas últimas décadas. Estima-se que se não houver nenhuma mudança nesse cenário até 2030, 20 milhões de meninas dessas regiões terão se casado. Infelizmente, o Brasil é líder no número de casamentos infantis na América Latina. 2. O controle social tem como foco retardar a entrada das mulheres na sexualidade a �m de preservar sua virgindade até o casamento. Cabe destacar que em ambas as situações o ônus paras as mulheres tende a serbem maior. Você deve estar pensando que atualmente não é mais assim, mas, infelizmente, esses modelos ainda persistem em muitas culturas, até por que a entrada das mulheres na sexualidade está relacionada diretamente à construção tradicional da feminilidade e ao que se espera do seu comportamento. Sendo assim, fertilidade, pertencimento a um único homem e ausência de iniciativa sexual são aspectos que fazem parte dos scripts sexuais de diferentes grupos sociais. Em países africanos, por exemplo, a mutilação genital feminina faz parte dos rituais de iniciação na idade fértil ou madura. O objetivo é privar a mulher de qualquer sensibilidade ou sensação de prazer. A maior di�culdade encontrada para impedir que aconteça esse ato brutal é a conscientização, pois muitas pessoas ainda pensam que essa é uma prática necessária para que as meninas sejam aceitas em suas comunidades. Iniciação sexual masculina Ao contrário do que acontece com as mulheres, para os homens a entrada na sexualidade é submetida e regulada por outros homens. Ela está associada à virilidade e ao desempenho sexual precoce, entre outros aspectos que reforçam o modelo de ser homem. Nesse sentido, o corpo das mulheres é percebido como um objeto, algo que os homens tomam posse através do ato sexual. À medida que existe uma repetição desse ato, acontece a con�rmação da apropriação inicial, ou seja, a mulher passa a pertencer àquele homem. A expressão minha mulher tem muito menos de afetivo e muito mais de posse, e a objetivação sexual das mulheres permite aos homens, não só tomar posse do corpo da mulher, mas também da descendência gerada por ela. Essa relação é naturalizada e aceita pela sociedade, verdade muitas vezes justi�cada pelo discurso religioso. Mesmo diante das transformações que acontecerem no cenário contemporâneo com a difusão de métodos contraceptivos e na distinção entre sexualidade voltada para a procriação e as não destinadas à procriação, persiste em diferentes instâncias sociais a ideia de um corpo feminino pertencente ao homem que dele pode dispor da maneira que melhor lhe convier. O Brasil possui a quinta maior taxa de feminicídio do mundo e os números que re�etem os casos de violência doméstica, cárcere privado e estupros são impressionantes. O fato é que ao reforçar estereótipos de gênero, a escola leva os alunos a absorvê-los e reproduzi-los no cotidiano. É preciso pensar sobre isso, antes de fechar os olhos às supostas brincadeiras e piadas presentes no cotidiano da escola que desquali�cam a mulher e reforçam a ideia de que ela é um objeto. Pierre Bourdieu e a construção social dos corpos Você já deve ter percebido que, ao longo desta aula, por várias vezes os discursos de Foucault e Bozon se interligaram para abordar o tema sexualidade. Para que nossa abordagem atenda a proposta inicial, vamos inserir mais um elemento indispensável a nossa re�exão. Pierre Bourdieu produziu um conjunto de estudos no campo da sociologia da educação e da cultura que in�uenciou decisivamente algumas gerações de intelectuais, obtendo o reconhecimento de pesquisadores, estudantes e ativistas que atuam em várias outras esferas da sociedade. No entanto, aqui nos interessa colocar em destaque alguns conceitos que nos ajudarão a pensar as relações de gênero como relações de poder e de dominação. A divisão entre os sexos, segundo Bourdieu, parece estar na ordem das coisas, ou seja, é entendida como normal, natural, a ponto de ser considerada inevitável. Esta divisão se faz presente nos espaços, nos corpos e nos habitus dos agentes, que funcionam como esquemas de percepção, de pensamento e de ação. 2 Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online https://estacio.webaula.com.br/cursos/go0212/aula2.html Fonte: Shutterstock Comentário Esse habitus deve ser entendido como uma bagagem individual que se constituiu a partir do processo de socialização. Assim, ao pensarmos a relação entre o indivíduo e a sociedade a partir dessa perspectiva, poderemos perceber que o individual e o social estão intimamente ligados e se in�uenciam mutuamente. Assim, certos modos relacionados a ser homem e a ser mulher na sociedade, ao serem analisados utilizando-se a categoria habitus, podem ser melhor compreendidos. Nesse sentido, a força da masculinidade hegemônica se evidencia no fato de que não precisa ser justi�cada, já que a visão androcêntrica naturaliza a superioridade masculina e a legitima, permitindo que ela se imponha na divisão do trabalho e nas atividades atribuídas a cada um dos sexos. Da mesma forma, a visão androcêntrica da reprodução biológica e da reprodução social, que naturaliza a dominação masculina, está inserida no senso comum como habitus e mesmo as mulheres acabam por reproduzir essa visão em diferentes realidades que experimentam relações de poder. Bourdieu e a violência simbólica De um modo geral, quando pensamos em violência, imediatamente nos vem à cabeça a violência física, corporal. Bourdieu amplia essa visão ao abordar o tema violência simbólica e sua relação com a dominação e o poder, onde há um tipo de adesão por parte do dominado. Trata-se da dominação consentida, que ocorre pela aceitação das regras e crenças partilhadas como se fossem naturais. O dominado, nessa situação, na maioria das vezes não possui uma incapacidade crítica que o ajude a reconhecer o caráter arbitrário das regras que lhes são impostas pelos dominantes, alguém que detém autoridade sobre ele. Para Bourdieu, a violência simbólica é um meio de exercício do poder. Ela não se restringe a questões de gênero, dá-se, também, nas questões étnicas, de cultura, de educação etc. Agora que você já conheceu um pouco do pensamento de Michel Foucault, Michel Bozon e Pierre Bourdieu sobre sexualidade e as questões de gênero e é capaz de compreender o papel central da construção social na elaboração da sexualidade humana e nos modos de ser homem e de ser mulher, vamos revisar alguns conceitos que foram apresentados no desenvolvimento desta aula. Mapa conceitual Clique nos botões para ver as informações. Relaciona-se à noção de patriarcado, porém não diz respeito somente ao privilégio dos homens, mas também à forma com a qual as experiências masculinas são consideradas como as experiências de todos os seres humanos e tidas como uma norma universal, tanto para homens quanto para mulheres, sem dar o reconhecimento completo e igualitário à sabedoria e experiência feminina; Androcentrismo Foucault a�rma que a repressão sexual coloca em evidência a hipocrisia burguesa, que apenas faz concessões às sexualidades ilegítimas limitadas a espaços circunscritos. Nesse sentido, a própria repressão sexual estaria associada ao surgimento da ordem da dominação burguesa; Hipótese repressiva Diz respeito ao sistema social em que homens adultos mantêm o poder e predominam em funções de liderança política, autoridade moral, privilégio social e controle das propriedades. No domínio da família, o pai (ou �gura paterna) mantém a autoridade sobre as mulheres e as crianças; Patriarcado Trata-se de uma teoria que traz uma nova metáfora e imagem para entender a atividade sexual humana como interações sociais e aprendidas; Scripts sexuais O conceito foi de�nido por Bourdieu como uma violência que é cometida com a cumplicidade de quem a sofre sem que, frequentemente, os envolvidos tenham consciência do que estão sofrendo ou exercendo. Violência simbólica Atividades 1. O �lósofo Michel Foucault a�rma que a repressão sexual coloca em evidência a hipocrisia burguesa, que apenas faz concessões às sexualidades ilegítimas limitadas a espaços circunscritos. Nesse sentido, ele se refere à: a) Hipótese repressiva. b) Hipótese androcêntrica. c) Hipótese sexista. d) Hipótese machista. e) Hipótese feminista. 2. Leia com atenção as a�rmativas abaixo. I. Foucault descreveu vários processos de disciplinarização dos corpos em diferentes instituições, como colégios, fábricas, o�cinas, conventos e quartéis, demonstrando que a principal característicade tais instituições é a disciplina corporal. II. Bozon a�rma que, se a ordem da procriação faz parte dos princípios fundamentais da organização social, a diferenciação entre o corpo da mulher e do homem precisa ser considerada como elemento fundamental. III. Segundo Bozon, a diferenciação entre o corpo da mulher e do homem pode ser explicada a partir de uma linguagem binária e hierarquizada que põe em destaque a superioridade masculina. IV. Bourdieu aponta que a divisão entre os sexos parece estar na ordem das coisas, ou seja, é entendida como normal, natural, a ponto de ser considerada inevitável. Marque a alternativa que correta: a) Somente as alternativas I e II estão corretas. b) Somente as alternativas I e III estão corretas. c) Somente as alternativas II e IV estão corretas. d) Todas as afirmativas estão incorretas. e) Todas as alternativas estão corretas. 3. Bozon entende que a sexualidade tem uma função fundamental na legitimação da ordem estabelecida entre os sexos, como também na representação da ordem das gerações, sendo esta forjada pelo contexto cultural. Essa visão está relacionada com a ideia de: a) Ideologia de Gênero. b) Sexismo. c) Construção social. d) Hipótese repressiva. e) Percepção de gênero. Notas Onanista1 O termo onanismo é considerado sinônimo de masturbação uma vez que, da mesma forma que o coito interrompido praticado por Onan (personagem bíblico do qual deriva o termo), considera-se que o sêmen é desperdiçado e não usado para procriar. Habitus2 Segundo Pierre Bourdieu, habitus signi�ca uma matriz cultural que predispõe os indivíduos a fazerem suas escolhas.Referências BOZON, M. Sociologia da sexualidade. Rio de Janeiro: FGV, 2004. BOZON, M. Amor, sexualidade e relações sociais de sexo na França contemporânea. In: Revista Estudos Feministas, v. 3, n. 1, p. 122, Florianópolis, 1995. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/16925/15480 <https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/16925/15480> . Acesso em: 12 jul. 2019. FOUCAULT, M. História da sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 1988. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/plugin�le.php/2940534/mod_resource/content/1/Hist%C3%B3ria-da-Sexualidade-1-A-Vontade-de- Saber.pdf <https://edisciplinas.usp.br/plugin�le.php/2940534/mod_resource/content/1/Hist%C3%B3ria-da-Sexualidade-1-A- Vontade-de-Saber.pdf> . Acesso em 12 jul. 2019. FOUCAULT, M. Vigiar e punir - Nascimento da prisão. 20. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. LIMA, A. C. L. M. Onde há poder há resistência: questões de gênero e sexualidade em uma escola carioca. Rio de Janeiro: UFRJ / NUTES, 2013. LOURO, G. Gênero, sexualidade e educação - uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis: Vozes, 2013. Próxima aula Christine Pisan e a valorização da mulher pela educação e pela aprendizagem; Simone Beauvoir e a construção do feminino; Joan Scott e Judith Butler - as questões de gênero. Explore mais Assista aos vídeos: Entrevista com Michel Foucault na Universidade Católica de Louvain em 1981 - Legendado em PT/BR <https://www.youtube.com/watch?reload=9&v=yO_F4IH-VqM> ; Quem Foi Pierre Bourdieu? <https://www.youtube.com/watch?v=VbiA29A4mDk> Campanha do Ministério da Saúde <https://www.youtube.com/watch?v=NI4xlk3S-Jk> para o Carnaval de 2012. https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/16925/15480 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2940534/mod_resource/content/1/Hist%C3%B3ria-da-Sexualidade-1-A-Vontade-de-Saber.pdf https://www.youtube.com/watch?reload=9&v=yO_F4IH-VqM https://www.youtube.com/watch?v=VbiA29A4mDk https://www.youtube.com/watch?v=NI4xlk3S-Jk
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