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Comunidades afro-brasileiras e suas experiências no Atlântico

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
Instituto de Ciências Humanas (ICH)
Departamento de História (HIS)
História da África – Código: 139351 / HIS0252
Professor: Estevam Thompson
Evelyn Gonçalves da Silva Lopes / 190086904 / Turma B
 “BRASILEIROS” NO ATLÂNTICO
Comunidades afro-brasileiras e suas experiências no Atlântico
O presente trabalho tem como foco tratar das comunidades brasileiras no Atlântico. Para isso, farei uso de três artigos diferentes. O artigo de Robin Law e o de Elisée Soumonni tem como semelhança se tratarem da comunidade Ajudá, apesar do segundo ser sobre a comunidade Lagos também, ambos da África Ocidental. Diferentemente, o artigo de Estevam Thompson trata sobre traficantes de escravos na África Centro Ocidental, e se passa em um tempo anterior dos outros dois também. Apesar das diferenças, todos tem como fio condutor as comunidades de comerciantes brasileiros que são encontrados em diversas partes do Atlântico.
No artigo de Robin Law “A Comunidade Brasileira de Uidá e os últimos anos do tráfico atlântico de escravos, 1850-66” ele tem como foco a existência de uma comunidade de comerciantes de escravos na região do Golfo do Benin que tem profundas relações comerciais e culturais com o Brasil. Na época, o tráfico já tinha sido proibido pelos ingleses. Porém, portugueses e brasileiros ainda não consideravam a prática como algo ilegal e a seguiam fazendo. De início, ele começa expondo sobre a participação de brasileiros e portugueses no tráfico no Golfo de Benin entre 1820-1840, e que esse tráfico foi direcionado principalmente para a Bahia – Brasil, mas também para a Cuba.
“O período de comércio ilegal de escravos foi marcado pelo crescimento de uma significativa comunidade brasileira residente em Uidá” (Law, 2002, 42). Essa comunidade, foi por muito tempo liderada por Francisco Felix de Souza, ele se transformou em um patriarca da comunidade, e até hoje em dia é visto como uma figura religiosa. Inicialmente, ele era apenas um funcionário do forte de Ajudá, porém após a morte de seu irmão assumiu a direção e foi escolhido como o “chachá”. Souza foi o responsável pela criação de um bairro brasileiro em Uidá, chamado Brasil, onde brasileiros começaram a se fixar em 1835. 
A comunidade “brasileira”, que não era em si tão brasileira, se identificava dessa forma por conta da língua portuguesa e por conta da fidelidade a Igreja Católica. Apesar disso, existia também uma minoria de muçulmanos vindo do Brasil que também se estabeleceram em Uidá. “Um fator de coesão da comunidade foi, também, a influência suprema de Francisco Félix de Souza, ao qual praticamente todos os membros estavam ligados por laços de parentesco, parceria comercial ou clientelismo” (Law, 2002, 43-44)
Law se preocupa em falar mais do declínio e das consequências da morte de Souza do que de sua vida em si. Alguns dos motivos citados para seu declínio foi sua velhice, a descentralização do comércio, a acumulação de débitos e a aparição de novos traficantes brasileiros. Seu falecimento ocorreu em 1849 e com isso, houve uma fragmentação de sua família. A sucessão de seu cargo ficou para seu filho Isidoro, mas na época o cargo já era menos prestigiado do que na época de seu pai.
O fim do tráfico de escravos em Uidá ocorreu entre 1850-1852. A marinha britânica, frustrada com a continuidade do comércio, impôs um bloqueio naval em 1851, e o tráfico foi abolido finalmente em 1852 pelo rei Gezo. Diante disso, os comerciantes brasileiros não encerraram ligações comerciais, “A demanda por mercadorias brasileiras, especialmente tabaco e cachaça, permaneceu alta na costa africana” (Law, 2002, 53-54). 
Outra estratégia também, foi uma transferência para um comércio “legal”, o mercado de azeite de dendê. Inicialmente, esse comércio era apenas como um complementar ao de escravos, e teve que fazer uma reorientação comercial em direção à Europa por conta dos principais mercados estarem ali. Essa alteração para o azeite de dendê gerou queda nos rendimentos. “A longo prazo, na verdade, os comerciantes brasileiros não foram capazes de competir efetivamente com as firmas europeias e francesas, que dispunham de maiores recursos de capital, e sobreviveram somente tornando-se agentes destas” (Law, 2002, 68).
No artigo de Elisée Soumonni, ele também trata da região de Ajudá. Em “A comunidade afro-brasileira de Ajudá e Lagos no século XIX: Uma análise comparativa” ele faz uma comparação entre Ajudá e Lagos. A história da construção dessas duas comunidades está ligada a participação no comércio atlântico de escravos. Segundo o autor, a comunidade de Ajudá “é um exemplo vivo da longa participação de portugueses e brasileiros no comércio de escravos nessa parte da costa da África Ocidental” (Soumonni, 2015, 251)
Ajudá já era importante em 1727 quando foi incorporada ao reino de Daomé durante sua expansão. Ela era um centro importante do comércio transatlântico, e em relação a população, cresceu continuamente com o regresso de africanos libertos do Brasil. Diferente de Ajudá, os comerciantes de Lagos só começaram a se envolver mais na exportação dos cativos no século XIX, nisso, tornou-se uma atividade importante. Assim como Law, Soumonni também trata da imposição imperialista inglesa do fim do comércio de escravos. Como os governantes de Lagos não aderiram a proibição, houve bombardeamento na cidade pelo esquadrão britânico da África Ocidental. Em Ajudá não houve tais medidas severas, apenas o bloqueio.
“Lagos e Ajudá tornaram-se portos estratégicos no contexto das campanhas para a supressão do tráfico transatlântico de escravos e de tensa rivalidade entre franceses e britânicos” (Soumonni, 2015, 254). O autor comparando as duas comunidades, diz que Ajudá era um ambiente muito mais estável para moradia. Nela já estava sendo constituída uma comunidade brasileira e eles contavam com Francisco Felix de Souza como protetor da comunidade durante a primeira metade do século XIX. Somente na década de 1850 que a comunidade de Lagos estava parecida com a de Ajudá.
Apesar das diferenças, os habitantes de Ajudá e Lagos tinham um apreço pela língua portuguesa em comum. Eles também financiaram a construção de igrejas por entender a importância do vínculo com a Igreja Católica tanto para eles, como para seus filhos. Com a inclusão do português, os afro-brasileiros acabaram perdendo seu próprio idioma, mas a influência da cultura que eles levaram para a África é visível até hoje, principalmente na arquitetura. Resumidamente, as duas comunidades se absorveram na sociedade local, porém sem terem perdido a identidade afro-brasileira.
O último artigo “Sociedade negreiras: a comunidade de comerciantes “brasileiros” em Benguela em fins do século XVIII” de Estevam Thompson é uma pesquisa sobre traficantes de escravos na África Centro Ocidental. Trata-se da relação entre Rio de Janeiro e Benguela em fins do século XVIII. Essas duas cidades cultivavam relações físicas, as correntes marítimas atlânticas. Relações econômicas, comércio de escravos. E relações sociais, de parentes e compadres.
Benguela tornou-se um dos maiores portos exportadores de escravos do Atlântico Sul por conta de seu crescimento comercial ao longo das décadas do século XVIII. Na época, se desenvolvia redes comerciais privadas com negreiros que vinham das mais diversas partes do Atlântico. Existe uma discussão sobre o fato de existir ou não uma comunidade de brasileiros em Benguela, e segundo o autor “falar de uma comunidade de “brasileiros” em Benguela não é procurar entre seus habitantes aqueles nascidos em terras americanas, mas antes falar sobre uma comunidade de comerciantes profundamente associados aos mercados brasileiros, independentemente de suas origens ou da cor de sua pele” (Thompson, 2015, 109).
Neste trabalho abordamos diferentes comunidades brasileiras no Atlântico e suas particularidades, com foco principalmente na parte comercial. Discutimos sobre a imposição inglesa e como ela era imperialista, sobre o chachá de Ajudá, Francisco Félix de Souza. Também fizemos uma comparaçãoentre a comunidade de Ajudá e a de Lagos, assim como falamos da relação comercial que existia entre o Rio de Janeiro e Benguela. Concluindo que apesar das diferenças, todas as comunidades teriam o mesmo fio condutor, e seus artigos se focaram nos comerciantes brasileiros que ali residiam. 
Bibliografia
LAW, Robin. “A comunidade brasileira de Uidá e os últimos anos do tráfico atlântico de escravos, 1850-66”, Afro-Asia, No. 27 (2002)
SOUMONNI, Elisée. “A comunidade afrobrasileira em Ajudá e Lagos no século XIX: uma análise comparartiva”, in LIBERATO, Carlos; CANDIDO, Mariana; LOVEJOY, Paul; SOULODRELA FRANCE, Renée (orgs.). Laços Atlânticos: África e africanos durante a era do comércio transatlântico de escravos (Luanda: Ministério da Cultura, 2016)
THOMPSON, Estevam C. “Sociedades negreiras: a comunidade de comerciantes ‘brasileiros’ em Benguela em fins do século XVIII”, in RIBEIRO, Alexandre; GEBARA, Alexsander & BERTHET, Marina. África: histórias conectadas (Rio de Janeiro: PPGHIS-UFF, 2015)

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