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GESTÃO DE PESSOAS Eliane Dalla Coletta Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Listar alguns dificultadores à implementação do autodesenvolvimento nas organizações. Desenvolver um olhar crítico e particular acerca do que é preciso aprimorar para ter êxito no processo de construção da aprendizagem nas organizações. Comparar os estudos dos principais autores do assunto relacionados à aplicabilidade do processo de aprendizagem nas empresas. Introdução Com a necessidade de integrar as competências individuais com as com- petências requeridas pelo negócio, a gestão de pessoas está direcionando os seus esforços de desenvolvimento para um perfil empreendedor da força de trabalho e de uma cultura de aprendizagem. Nesse sentido, o perfil da liderança passa a ter um atributo a mais, que é o de educadores, implantando processos de aprendizagem que motivem as pessoas ao de- senvolvimento e estabeleçam um padrão de competências a ser atingido. Neste capítulo, você irá conhecer como as empresas estão se estru- turando para enfrentar a grande concorrência e os avanços tecnológicos que caracterizam o mundo do trabalho desde a década de 1990, com o evento da globalização. A necessidade de ter os conhecimentos ne- cessários atualizados requer um processo de aprendizagem contínua, assim como o desenvolvimento de uma cultura de aprendizagem, co- munidades de prática e universidades corporativas. Por isso, você vai ver como estimular a aprendizagem organizacional e como o conhecimento organizacional pode ser regido para atender às estratégias, bem como deverá ser difundido e utilizado, desafios para administração do negócio. Finalmente, você vai conhecer os vários pontos de vista de autores que se dedicaram ao estudo da aprendizagem nas organizações desde a década de 1990. Autodesenvolvimento nas organizações O desenvolvimento das competências, das capacidades, do potencial da força de trabalho sempre esteve na pauta de todas as organizações e, em especial, para a área de gestão de pessoas, no seu subsistema de treinamento e desenvol- vimento. Com as novas exigências do mundo do trabalho, cenário complexo, o crescimento exponencial das tecnologias, a elevação do padrão de expectativas dos clientes, há a necessidade de profi ssionais com perfi l diferenciado. Ser inovador, proativo e fl exível são atributos básicos nesta nova ordem organi- zacional. Segundo Fonseca et al. (2016), o profi ssional que se desejava que fosse obediente e disciplinado no passado cede lugar a um profi ssional que atue mais autonomamente e seja empreendedor. As grandes mudanças no decorrer das décadas de 1980 e 1990 afetaram o cerne do trabalho operacional nas indústrias, com grande terceirização nas áreas produtivas com a expansão da contratação dos serviços e uma expressiva participação das mulheres no mercado de trabalho. Os postos de trabalho operacional sofreram uma redução, as exigências do trabalho especializado se intensificaram e o antigo chefe passou a ser chamado de líder, com mudanças significativas no seu modo de atuação. Para Fonseca et al. (2016, documento on-line): Atualmente, existe uma grande pressão para que a gestão de pessoas seja orientada para a ideia de desenvolvimento mútuo; maior participação das pessoas no sucesso do negócio ou da empresa: as pessoas são vistas como depositárias do patrimônio intelectual da empresa, bem como da capacidade e da agilidade de resposta da organização aos estímulos do ambiente e, ainda, da capacidade de visualização e exploração de oportunidades de negócios. A transformação de uma administração tradicional para uma gestão flexível produziu grande repercussão no modo de agir e atuar das organizações. As estruturas verticais com forte centralização passaram para estruturas horizontais com grande descentralização, e a divisão do trabalho intelectual e manual cedeu lugar à capacidade de pensar e executar simultaneamente. No novo modelo de Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional2 gestão, a produção é alicerçada na flexibilidade, distinção e na autossuficiência, com o desenvolvimento da automação e com o perfil do trabalhador como empreendedor. Nesse ambiente de trabalho, as empresas esperam de seus colaboradores e gestores uma postura direcionada ao autodesenvolvimento e à aprendizagem contínua. Assim, as empresas desenvolvem sistemas educacionais para preparar e estruturar uma cultura voltada ao desenvolvimento das competências para atingir resultados, e espera-se que as pessoas possam ser capacitadas para contemplar a realidade criticamente, concatenando-a e tornando-a competitiva e voltada para o sucesso do negócio (EBOLI, 2002). Nessa perspectiva, há a necessidade de que as pessoas tenham amadure- cimento suficiente e conhecimento de si mesmas para o comprometimento com a aprendizagem e o desenvolvimento de competências fundamentais para o sucesso do negócio. Além disso, também o RH e a empresa devem estar voltados e alinhados com o objetivo de desenvolvimento de talentos para o alcance das estratégias do negócio. Para enfrentar essa nova reali- dade, todas as pessoas da organização necessitam ter “[...] desenvolvida sua capacidade de criar trabalho e conhecimento organizacional, contribuindo de maneira efetiva para o sucesso do negócio” (EBOLI, 2002, p. 191). Às organizações compete desenvolver seus líderes, modificar estruturas, processos de comunicação e tomada de decisão, instituir novas políticas e práticas e, especialmente, desenvolver a mentalidade, os valores e a cultura organizacional. Com o autodesenvolvimento, é possível que os profissionais amplifiquem as suas potencialidades e competências por meio de seus próprios esforços, buscando recursos e condições para sua evolução, o que pode ser com uma pós-graduação, um curso técnico, um treinamento ou uma sessão de coaching. Para Eboli (2002, p. 190), “[...] a postura voltada à aprendizagem contínua e ao autodesenvolvimento é um estado de espírito, um processo de constante desenvolvimento e fortalecimento de indivíduos talentosos e competentes. Cabe à organização, entretanto, criar um ambiente favorável para sua manifestação”. Um requisito fundamental para o autodesenvolvimento é o autoconheci- mento e, por meio da busca constante de feedback, o profissional compreende suas deficiências e limitações e, a partir disso, institui metas profissionais e pessoais de desenvolvimento. Para Salvagni (2016, documento on-line), “[...] o autodesenvolvimento é a interação entre o universo interior e exterior do indivíduo, em um movimento cíclico de experiência e reflexão em prol de um contínuo aprimoramento individual”. 3Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional Um das grandes barreiras a serem ultrapassadas na implementação do auto- desenvolvimento é a cultura organizacional. Se há o desejo de que as pessoas se comprometam com o autodesenvolvimento, as organizações necessitam mudar seus padrões de gestão, tornando-os claros e definindo as competências críticas para o sucesso do negócio e o consequente alinhamento entre as competências pessoais e organizacionais, seus valores, suas políticas e práticas, a começar pelo desenvolvimento das lideranças. Nesse novo modelo organizacional pau- tado em competências, as lideranças devem cumprir um novo papel, que é o de educadores, implantando processos de aprendizagem que motivem as pessoas ao desenvolvimento e estabeleçam um padrão de competências a ser atingido. Também devem criar um ambiente de aprendizagem organizacional, desenvol- vendo as pessoas e as equipes em suas capacidades e elevando os padrões de desempenho. Para Cavazotte, Moreno Junior e Turano (2015, documento on-line): Ambientes de trabalho permeados pela cultura de aprendizagem contínua possuem características que claramente denotam a ênfase no conhecimento, como valores associados à inovação,qualidade e competitividade, e políticas voltadas para o desenvolvimento de funcionários [...], o desenvolvimento con- tínuo de habilidades e competências é também uma necessidade e proporciona aos trabalhadores o senso de segurança e empregabilidade. Pode-se esperar que indivíduos imersos em organizações com forte cultura de aprendizagem contínua tenham maiores oportunidades para desenvolvimento pessoal e profissional. Segundo Antonello (2010), empreendimento e investimento em processos de autodesenvolvimento não terão sucesso se a cultura da organização não entender a busca de crescimento e de progressão de carreira que as pessoas desejam como atreladas ao desenvolvimento organizacional ou quando o implementam somente para fins de redução de custo. Além disso, se o ambiente de trabalho não oportunizar autonomia e delegação de poder, será difícil comprometer as pessoas com o autodesenvolvimento, pois haverá uma carência de feedbacks sobre o desempenho para direcionar os seus objetivos e fixar metas de desenvolvimento. Nas organizações de hoje, os funcionários são levados a reconhecer que a aprendizagem é um processo que ocorre ao longo da carreira [...] a organização deve provê-los com recursos tais como: feedback, coaching e experiência de desenvolvimento para dar suporte ao autodesenvolvimento e à aprendizagem contínua (ANTONELLO, 2010, p. 48). Outra barreira são as resistências do próprio indivíduo em assumir seu próprio desenvolvimento, pois isso requer sair da zona de conforto, autoco- Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional4 nhecimento, reflexão e experimentação, assim como uma maior autodisciplina na busca de seus objetivos de desenvolvimento e o comprometimento com a aprendizagem contínua para estar no mesmo nível e ritmo das transformações organizacionais (BITENCOURT, 2010). Veja, a seguir, no Quadro 1, tendências para a aplicação do autodesenvolvimento. Fonte: Adaptado de Pedler (1994 apud Bitencourt, 2010). Gerenciamento da própria aprendizagem Programas como ensino a distância, aprendendo a aprender, comunidades de aprendizagem e autogerenciamento da aprendizagem. Igualdade de oportunidade no trabalho Grupos com mulheres, negros, minorias étnicas. Desenvolvimento de carreira Sessões de autoavaliação, planejamento de carreira, atividades com biografia, etc. Learning company Expressão que causa polêmicas, mas tenta dar uma noção mais holística ao autodesenvolvimento. Utiliza-se de programas tais como Avaliação dos Efeitos Organizacionais, Desenvolvendo Pequenos Negócios via Autodesenvolvimento. Quadro 1. Tendências para a aplicação do autodesenvolvimento Processo de construção da aprendizagem nas organizações A capacidade para aprender continuamente a partir de suas experiências e trans- por esse conhecimento para padrões de alto desempenho tem sido um grande diferencial para que as empresas sejam bem-sucedidas nas atuais condições de incerteza, ambientes em mudança e forte competitividade. Sob o enfoque de aprendizagem, fl exibilizam-se as relações e os erros são encarados como uma possibilidade de construção de conhecimento. Segundo Bitencourt (2010, p. 18) “[...] torna-se fundamental que as organizações aprendam a aprender, ou seja, que a partir de uma mudança de mentalidade, atitude e percepção elas aprendam a construir novos caminhos baseados na aquisição, disseminação e interpretação de informações”. 5Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional A aceleração dos processos produtivos, das mudanças e dos avanços tec- nológicos reflete a velocidade com que o conhecimento está sendo produzido e, ao mesmo tempo, demonstra como ele fica ultrapassado de forma rápida. Isso requer que as organizações tenham mais pessoas aprendendo em tempo reduzido e, assim, um espiral sem fim caracteriza o processo contínuo. As estratégias organizacionais são as que definem o conjunto de competências e conhecimentos necessários para enfrentar os desafios e a concorrência e, dessa forma, envolvem todos os funcionários, suas cadeias de valor e suas interações (SCHERER, 2009). Bitencourt (2010) destaca a diferença entre aprendizagem organizacional e organizações de aprendizagem. Quando se menciona organização de aprendiza- gem, a referência é quanto à descrição de mecanismos, concepções e atributos da organização que aprende coletivamente. Já a aprendizagem organizacional é como ocorre a aprendizagem na organização, com as competências e os processos pelos quais o conhecimento é construído e aplicado. Para Scherer (2009), a cultura de aprendizagem pode ser identificada nas empresas quando se verifica que os funcionários talentosos abandonam velhas convicções e são receptivos com seus colegas, buscam compreender como a empresa funciona, possuem uma visão compartilhada e trabalham em equipe. Ou seja, para que a aprendizagem aconteça, é fundamental que a cultura seja penetrável por novas práticas. Assim, [...] a cultura organizacional é a dimensão intangível a ser trabalhada per- manentemente, de forma que o espírito empreendedor esteja presente para promover, tanto a geração de novas ideias capazes de garantir as vantagens competitivas quanto o desenvolvimento individual, a prática deste desenvol- vimento deve ser uma constante, pois pode ser observado de forma tangível, pela mudança comportamental, expansão das habilidades e conhecimentos para a solução de novas e diferentes situações (SCHERER, 2009, p. 34–35). Nesse processo de aprendizagem, a interação social é um elemento im- portante no compartilhamento de conhecimento, e um dos meios utilizados são as comunidades de prática, grupos de pessoas que compartilham uma inquietação, um problema ou um fascínio sobre determinado tema; assim, investigam e pesquisam para aprofundar o conhecimento. Para Vilas Boas e Cassandre (2018), as comunidades de prática são caracterizadas como método de aprendizagem constante. Bitencourt (2010) apresenta quatro elementos essenciais às comunidades de práticas: domínio, significado, comunidade e prática. A partir do domínio, é gerada a base comum, representando a sua identificação, e são estabelecidos os Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional6 temas essenciais dos quais o grupo irá ocupar-se. O significado é favorecido pelo domínio, caracterizando a forma como essa comunidade se reconhece. A comunidade são os participantes, e sua estrutura pode ser formal ou in- formal. A prática tipifica as ações concretas, e as comunidades de prática podem ser uma ferramenta de gestão da construção do conhecimento e são baseadas nas relações informais que se formaram no ambiente de trabalho. O resultado beneficiará o fortalecimento das estratégias, como também das competências individuais e organizacionais por meio do desenvolvimento contínuo e da construção do conhecimento. Comin, Inocente e Miura (2011) referem que a aprendizagem favorece e oportuniza a flexibilização e a agilidade na organização para enfrentar as incertezas, permitindo a reação às crises com maior rapidez. Portanto, as organizações devem oportunizar recursos e ferramentas para possibilitar que o maior número de pessoas possível esteja em constante processo de aprendizagem, o que contribui para o estabelecimento de programas edu- cacionais na modalidade a distância, como a implantação das universidades corporativas. Ao mesmo tempo, as organizações necessitam apresentar características peculiares para a implementação de um sistema de aprendi- zagem organizacional, tendo como prática a sistematização na solução de problemas, a investigação de novos comportamentos e tratamentos, a busca por compreender o aprendizado com as experiências e práticas de sucesso em outras organizações (benchmark), tendo a preocupação com a transmissão do conhecimento para toda a organização de forma ágil e efetiva. Os meios e métodos a serem utilizados no gerenciamento da aprendizagem são estudados pela gestão do conhecimento. A aprendizagem geraum conhecimento de que a organização necessitará e que poderá realmente ser uma vantagem competitiva. Como estimular a aprendizagem organizacional e averiguar como o conhecimento organi- zacional pode ser regido para atender às estratégias, bem como deverá ser difundido e utilizado são desafios para administração do negócio. A siste- matização da aprendizagem organizacional é uma preocupação da gestão do conhecimento e gera o desenvolvimento dos centros de treinamento e das universidades corporativas. Por meio dessas universidades corporativas, é possível organizar treinamentos corporativos nivelados com os objeti- vos estratégicos que substituíram os programas instrucionais do passado e que rapidamente ficavam desatualizados. As universidades corporativas utilizam-se da tecnologia e da metodologia de educação a distância, e muitos programas são constituídos em parcerias com universidades nacionais e internacionais (COMIN; INOCENTE; MIURA, 2011). 7Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional A abordagem da aprendizagem organizacional engloba várias perspectivas, pois o campo da aprendizagem humana é vasto e se ampara em muitas teorias. Para ter êxito na construção da aprendizagem nas organizações, as empresas utilizam várias estratégias que, às vezes, ocorrem conjuntamente. Assim, ter uma cultura de aprendizagem é muito significativo para a implementação dessa estratégias. As comunidades de práticas, educação a distância, gestão do conhecimento e as universidades corporativas são metodologias e ferra- mentas que incrementam e desenvolvem a reflexão e o compartilhamento das informações e dos conhecimentos, tão importantes para a aprendizagem organizacional. Principais estudos sobre a aplicabilidade do processo de aprendizagem nas organizações Vários são os autores que se dedicaram ao estudo da aprendizagem nas organi- zações desde a década de 1990. A partir da divulgação dos trabalhos de Peter Senge (1990) sobre as organizações que aprendem, a questão da aprendizagem nas organizações ganhou destaque pela repercussão e pelo impacto, que teve eco nas empresas naquele momento em se iniciava a era da globalização. A partir de então, vários outros estudos foram sendo agregados ao tema. Para Senge (1990), as empresas devem estar em processo contínuo de aprendizagem por meio do desenvolvimento das cinco disciplinas: domínio pessoal (autoconhecimento), modelos mentais (imagens que as pessoas têm internalizadas que interferem na sua forma de ver o mundo), visão compar- tilhada (ter objetivos compartilhados), aprendizado em grupo (desenvolvi- mento de habilidades coletivas) e pensamento sistêmico (modelo conceitual). Segundo este autor, [...] à medida que o mundo se torna mais interligado e os negócios se tornam mais complexos e dinâmicos, o trabalho está cada vez mais ligado ao aprendi- zado, e já não basta ter uma única pessoa aprendendo pela organização toda. Simplesmente não é mais possível que a cúpula “resolva” e todos tenham de seguir as ordens do “grande estrategista”. As melhores organizações serão aquelas que descobrirão como despertar o empenho e a capacidade de aprender das pessoas em todos os níveis da organização (SENGE, 1990, p. 12). A disciplina do domínio pessoal se refere ao autoconhecimento: “Pelo domínio pessoal aprendemos a esclarecer e aprofundar continuamente nosso objetivo pessoal, a concentrar nossas energias, a desenvolver a paciência, e Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional8 a ver a realidade de maneira objetiva” (SENGE, 1990, p. 16). Tendo domínio pessoal, o profissional tem a capacidade de tornar a visão de seu futuro mais perceptível, pois a tensão criativa gerada o movimentará em direção aos seus objetivos. Segundo Bitencourt (2010), é essa disciplina que promove o aprendizado constante, ou seja, o autodesenvolvimento. A pressão ou as forças que atuam entre a realidade percebida e a visão do que é almejado é a origem de energia empreendedora que possibilita a ação em vez de reação, em que a pessoa apropria-se do seu desenvolvimento, adquire um forte compromisso em ampliar a sua consciência por meio da reflexão, podendo modificar e experimentar novos modelos mentais. Os modelos mentais estão estabelecidos no decorrer do desenvolvimento da personalidade: “São ideias profundamente arraigadas, generalizações, ou mesmo imagens que influenciam nosso modo de encarar o mundo e nossas atitudes” (SENGE, 1990, p. 17). Para Scherer (2009), os modelos mentais são os responsáveis pelas dissonâncias da percepção, e uma forma de trabalhar com eles é trazê-los para o exterior e realizar uma minuciosa análise. A visão compartilhada é a imagem do futuro que a liderança inspira em seus liderados sobre o que deseja criar: “Quando existe um objetivo concreto e legítimo, as pessoas dão tudo de si e aprendem, não por obrigação, mas por livre e espontânea vontade” (SENGE, 1990, p. 18). A disciplina de aprendizado em grupo engloba a capacidade de diálogo entre os membros para a solução de algum problema; assim, ao fazerem um brainstorming (levantamento de várias ideias com a consequente análise escolha pela melhor solução), por exemplo, surgirá algo novo, além da soma das diversas ideias. A quinta disciplina é o pensamento sistêmico, que é imprescindível para que as demais disciplinas funcionem e é a disciplina que corrobora que o todo pode ser maior que a soma das partes. Para que seja eficaz, necessita das outras quatro disciplinas: visão compartilhada, para ter o comprometimento das pessoas a longo prazo; análise dos modelos mentais, para identificar as imprecisões na forma de ver a realidade; aprendizado em grupo, para alcançar novas soluções, além das capacidades individuais e do domínio pessoal para o autodesenvolvimento contínuo (SENGE, 1990). A contribuição de Chris Argyris e Donald Schön (1974) para a apren- dizagem organizacional é anterior aos estudos de Senge, mas foi mais pro- fundamente estudada na década de 1990. Os autores explicitam como as pressuposições que norteiam o comportamento dos indivíduos e grupos nas empresas podem ser alteradas e as denominaram circuitos de aprendizagem, que é o processo que prepara o encaminhamento de suas políticas ou a 9Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional busca por seus objetivos. No conceito de aprendizagem em circuito curto, são aquelas em que os indivíduos aprendem ao receber uma informação ou quando detectam um erro/problema e são corrigidos sem alterar as estratégias ou procedimentos ou normas vigentes. No circuito duplo, há um questiona- mento na base para a ação, ou seja, liga o erro do problema constatado às estratégias e às normas que sustentam a ação. Para esses autores, o foco é que as organizações possam, por meio do processo de aprendizagem, de- senvolver competências imprescindíveis à estratégia do negócio (FLEURY; OLIVEIRA JUNIOR, 2002). Segundo Antonello (2010), Kolb (1984), utilizando as teorias de apren- dizagem de Dewey, Lewin e Piaget, estruturou um sistema experimental de aprendizagem, a partir do entendimento de que os “[...] adultos aprendem passando por um ciclo de experiência concreta (fazer), refletir (observar e refletir), conectar (formação de conceitos abstratos e generalizações), testar as implicações dos conceitos em novas situações, e fazer novamente” (KOLB, 1984 apud ANTONELLO, 2010, p. 35). Estando a reflexão integrada no sistema, a ação será detalhada, havendo um engajamento no ciclo de apren- dizagem (Figura 1). Figura 1. Ciclo de aprendizagem vivencial. Fonte: Kolb (1984 apud ANTONELLO, 2010, p. 36). Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional10 Bitencourt (2010) destacou os principais conceitos e as ênfases da apren- dizagem organizacional, apresentados resumidamente no Quadro 2, a seguir. Autores Conceito Ênfase Peter Senge (1990, p. 11) “Lugar onde as pessoas expandem continuamente sua capacidade de criar os resultados que realmente desejam, onde surgem novos e elevadospadrões de raciocínio, onde a aspiração coletiva é liberada e onde as pessoas aprendem continuamente a aprender em grupo”. Metanoia (mu- dança de men- talidade), cinco disciplinas Chris Argyris (1992, p. 132) “Aprendizagem organizacional é um processo de detectar e corri- gir erros. O erro é visto como um desvio cometido entre nossas in- tenções e o que de fato ocorreu”. Rotinas defen- sivas e ciclos de aprendizagem Morgan, Bergamini e Coda (1996, p. 84) “Organizações são sistemas de processamento de informações ca- pazes de aprender a aprender”. Organizações como cérebro e organização holográfica David Garvin (1993, p. 80) “Organizações capacitadas em criar, adquirir e transferir conhecimentos e em modificar seus comporta- mentos para refletir estes novos conhecimentos e insights”. Técnicas de qualidade total Marquardt (1996, p. 230 e p. 2) “Organizações de aprendizagem são empresas que estão continua- mente se autotransformando uti- lizando tecnologia, empowerment e expandindo o aprendizado para melhor se adaptarem e terem su- cesso em um ambiente mutável”. Estratégias de mudança e de comprometimento Quadro 2. Conceitos e ênfases da aprendizagem organizacional (Continua) 11Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional No ambiente dinâmico e de alta competitividade como o que estamos vivenciando desde a década de 1990, e no qual a cada dia enfrentamos novos desafios, a rapidez no aprendizado organizacional é uma vantagem competi- tiva. Eleger e mapear os conhecimentos e as competências necessárias para o sucesso do negócio são elementos essenciais para o processo de aprendizagem organizacional, que só terá benefícios reais se estiver associado à geração do conhecimento e ao desenvolvimento dessas competências com a adoção de práticas geradoras de aprendizagem, seja por meio de autodesenvolvimento, pelas comunidades de prática ou na universidade corporativa, seja no dia a dia de trabalho. Fonte: Adaptado de Bitencourt (2010). Autores Conceito Ênfase Takeuchi e Nonaka (1997, p. 77) “A internalização é o processo de incor- poração do conhecimento explícito no conhecimento tácito. É intimamente re- lacionada ao aprender fazendo. Quando são internalizadas nas bases do conhe- cimento tácito dos indivíduos sob a forma de modelos mentais ou knowhow técnico compartilhado, as experiências através da socialização, externalização e combinação tornam-se ativos valiosos”. Apropriação e disseminação do conhecimento; conhecimento explícito e tácito. Kolb (apud STARKEY, 1997, p. 312) “Trata-se de uma organização edifi- cada em torno de processos coope- rativos, na qual as pessoas aprendem mediante a cooperação e cooperam para aprender coletivamente”. Aprendizagem vivencial Swieringa, Wierdsma e Sieringa (1992, p. 28 e p. 162) “Trata-se de uma organização edifi- cada em torno de processos coope- rativos, na qual as pessoas aprendem mediante a cooperação e cooperam para aprender coletivamente”. Mudança orga- nizacional, níveis de aprendizagem e competências Quadro 2. Conceitos e ênfases da aprendizagem organizacional (Continuação) Autodesenvolvimento e aprendizagem organizacional12 ANTONELLO, C. S. O autodesenvolvimento e a perspectiva da aprendizagem organiza- cional. In: BITENCOURT, C. Gestão contemporânea de pessoas: novas práticas, conceitos tradicionais. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010. ARGYRIS, C. Overcoming organizational defenses. 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