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1 Maria Luiza de Azevedo A aplasia medular é uma doença caracterizada pela alteração no funcionamento da medula óssea. Na maioria dos casos é uma situação adquirida, geralmente associada a uma causa imunológica desconhecida que diminui as células progenitoras Ela também pode ser consequência de determinadas infecções, contato prolongado com produtos químicos, medicamentos, tratamento de doenças malignas com quimioterapia ou radiação, sendo raramente hereditária por alterações de gene, como na Anemia de Fanconi ou na Anemia de Blackfan-Diammond. Em cerca de 60% a 70% não se reconhece o agente causal, sendo considerada idiopática. Os fatores responsáveis pelo desenvolvimento da aplasia medular adquirida não são bem conhecidos, mas se sabe de alguns envolvidos: Lesão intrínseca da célula progenitora hematopoiética; Participação imune no desencadeamento e manutenção de pancitopenias; Perturbação do microambiente da medula óssea; Mutações genéticas. Essa participação do sistema imune na fisiopatologia foi evidenciada quando se observou a melhora da função hematopoiética depois de tratamentos imunossupressores. Foi realizado um estudo que mostrou que as células mononucleares do sangue de um paciente com aplasia quando “misturadas” com células obtidas de uma medula normal, inibiam a formação de colônias hematopoiéticas, ao mesmo tempo que quando as células T do paciente com aplasia foram retiradas a formação das colônias aumentou. Dessa forma, foi possível concluir que a produção de interferon e fator de necrose tumoral das células T desses pacientes inibiam a hematopoiese por determinar a morte celular. Como a medula óssea é responsável pela produção das células do sangue, ao ter seu funcionamento comprometido teremos a redução das concentrações de hemácias, plaquetas e leucócitos que caracterizam o quadro de pancitopenia. Dessa forma, ela pode ser definida por uma pancitopenia associada à uma medula óssea hipocelular, sem infiltração neoplásica, mieloproliferativa ou fibrose, levando a um quadro que corresponde a anemia, leucopenia e plaquetopenia. Ela vai ser classificada de acordo com os achados no sangue periférico, sendo essa diferenciação muito importante determinar as estratégias de tratamento e pensar no prognostico, podendo ser moderada, severa e muito severa. Severa: neutrófilos abaixo de 500, contagem de plaquetas inferior a 20.000 e contagem de reticulócitos corrigida menor que 1% na presença de anemia, associado a celularidade da medula óssea inferior a 30%. Muito Severa: neutrófilos abaixo de 200 e as outras características da severa. Apesar das 3 linhagens estarem diminuídas, a intensidade da redução entre elas pode ser diferente e a sintomatologia pode acabar sendo mais expressiva em uma delas. Trombocitopenia: as manifestações hemorrágicas acabam originando a sintomas mais alarmantes e geralmente são os primeiros observados. o Petequias; o Sangramento de gengivas; o Epistaxe; o Metrorragia. o O sangramento volumoso pode ser uma causa de óbito, principalmente quando ocorre no SNC ou no pulmão. APLASIA MEDULAR 2 Maria Luiza de Azevedo Anemia: o paciente pode se apresentar assintomático ou referir sintomas comuns: o Fadiga; o Dispneia; o Palidez acentuada; o Zumbidos. Leucopenia: a infecção é menos comum no início da doença, mas surge com a evolução principalmente na forma severa e muito severa em que a neutropenia é muito acentuada ou mais duradoura. o Infecção bacteriana mais comum; o Infecção fungica em casos de neutropenia prolongada. Diante de uma suspeita o diagnóstico só pode ser feito depois de uma completa avaliação do sangue e da medula óssea. Pancitopenia: achado invariável. o Linfócitos podem ser normais; o Hemácias normocromicas e moderadamente macrocítica; o Reticulocitopenia o Neutropenia com importância prognóstica, quando menor que 200 tem alto risco de complicações infecciosas graves. o Plaquetas: invariavelmente diminuídas, mas qualitativamente preservada. Ferritina: aumentada, já que existe uma baixa utilização do ferro e por conta das transfusões. Eritropoietina: aumentada, por conta do estímulo induzido pela anemia persistente. Medula óssea: deve ser avaliada por aspirado e biópsia. o Aspirado: detalhes citológicos – material gorduroso e poucas células hematopoiéticas. o Biópsia: celularidade é melhor estimada e afasta outras doenças infiltrativas. Estudo citogenético: normal, analisada para diferenciar de outras causas como a anemia de Fanconi. Como a pancitopenia é um achado comum a várias doenças, algumas desordens devem ser sempre consideradas como diagnóstico diferencial. Infiltração medular; Hemoglobinúria paroxística noturna; Hiperesplenismo; Infecções; Anemia megaloblástica; Coagulopatias de consumo. O tratamento vai depender da gravidade da aplasia. Na forma leve/moderada são utilizados medicamentos que estimulem a medula óssea, como oximetalona, corticoterapia, ácido fólico, danazol e algumas vitaminas. Nas formas severas e muito severas o tratamento tem como objetivo regenerar a hematopoiese e reduzir os riscos da pancitopenia, a partir de medidas de suporte. 3 Maria Luiza de Azevedo O suporte se trata da reposição de plaquetas, hemácias e da prevenção e controle das infecções. Vale ressaltar que nos pacientes que já tem indicação de transplante a transfusão deve ter critérios mais rigorosos: Reposição de hemácias com hemoglobina menor que 6, plaquetas em situação de sangramento ativo ou contagem < 10000. Devem ser irradiados, para reduzir índice de rejeição no transplante. Além disso, é necessário pensar no controle de infecções e iniciar terapia precoce, corrigindo também alterações hemodinâmicas e hidroeletrolíticas Para a restauração da hematopoiese pode ser utilizado técnica imunossupressora ou transplante de medula óssea, seguindo os critérios das diretrizes brasileiras. Os imunossupressores utilizados são: Globulina Antilinfocítica (GAL): inibe linfócitos ou células do timo; Ciclosporina A (CSA): inibe a calcineurina, que bloqueia a transcrição de linfócitos; Corticosteroides: prevenir complicações da GAL. Alguns pacientes que utilizam o tratamento imunossupressor podem apresentar recaídas, se aconselhando um segundo ciclo. Em alguns casos é necessário manter o CSA por um longo período e com baixas doses para evitar a recaída. Como o esquema demonstra, o transplante é empregado nos pacientes com anemia aplástica severa, com menos de 40 anos e que possuem doadores aparentados com HLA idênticos. Mas, o número de transfusões prévias ao transplante e o intervalo entre o diagnóstico e o procedimento são fatores que vão interferir no resultado. Ex.: paciente submetido a 15 transfusões e com doença inferior a dois meses têm o melhor resultado, podendo alcançar a cura definitiva em 90% dos casos. As chances de cura vão se tornando menor a medida que o número de transfusões prévias aumenta e a duração da doença fica mais longa. o No Brasil, para auxiliar nesses casos é utilizado uma combinação de bussulfano e ciclofosfamida antes do transplante para condicionar o organismo. O processo de transplante se inicia com testes específicos de compatibilidade. A partir da identificação de um doador compatível ele é submetido a um procedimento feito em centro cirúrgico, sob anestesia, com duração de aproximadamente duas horas. Nesse procedimento são realizadas múltiplas punções, com agulhas, nos ossos posteriores da bacia, onde é aspirada a medula, sem causar comprometimento à saúde do doador. Já para receber o transplante, o paciente é submetido a um tratamento que ataca as células doentes e destrói a própria medula, para receber uma medula sadia como se fosse uma transfusão de sangue. Quando está na corrente sanguínea, as novas células circulam e se alojam na medula óssea onde se desenvolvem. Os principaisriscos estão relacionados com infecções, com as drogas quimioterápicas utilizadas no tratamento e com a nova “memória” das novas células que por serem também células de defesa podem reconhecer alguns órgãos do receptor como estranho. Essa complicação é chamada de doença do enxerto contra hospedeiro, comum e de intensidade variável. Quando não há doador compatível, recorre-se ao banco de medula óssea, com chances mais reduzidas de encontrar doador. 4 Maria Luiza de Azevedo Mesmo com todas as medidas a rejeição ainda pode ser de 10%, ocorrendo de forma precoce onde temos falha primária de pega, ou tardia depois da recuperação hematopoiética. A forma precoce é difícil de reverter, diferente da tarde onde existe a possibilidade de imunossupressão ou retransplante. Além dos tratamentos mencionados o paciente vai precisar fazer várias mudanças no estilo de vida: Infecção: mais susceptíveis, então é necessário evitar aglomerações, boa higiene, evitar cortes; Sangramentos: evitar atividades que podem causar hematomas, usar escovas de dente macias, evitar medicamentos que afetem a coagulação, Anemia: dieta balanceada (evitar terapia a base de ferro), conservar energia. Outros: uso de preservativo indispensável, sempre informar a respeito da patologia em qualquer procedimento. O prognóstico desse paciente vai depender do grau da anemia e do tratamento que foi escolhido. Se for a forma leve ou moderada alguns paciente conseguem viver muitos anos com a doença controlada por medicamentos. Já na forma severa ou muito severa, o prognostico varia de acordo com algumas condições. Ex.: Pacientes que recebem concentrado de hemácias e plaquetas com frequência por exemplo, podem desenvolver anticorpos que destroem essas células tornando a transfusão inútil e quase impossível encontrar sangue para esse paciente. Por isso, os cuidados como o uso de componentes filtrados e fenotipados nas reposições interferem diretamente no prognóstico. Além disso, podemos citar: Intensidade da Neutropenia; Quantidade e qualidade de transfusões; Terapêutica; Tratamento de suporte. A indicação terapêutica não é fácil e precisa ser feito com muito cuidado para garantir o melhor prognostico possível ao paciente.
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