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P116p Pacheco, José Augusto Políticas curriculares: referenciais para análise / José Augusto Pacheco. – Porto Alegre: Artmed, 2003. 144 p. ; 23 cm. ISBN 978-85-363-0116-7 1. Educação – Políticas curriculares. I. Título. CDU 37.044 Catalogação na publicação: Mônica Ballejo Canto – CRB 10/1023 O LADO POLÍTICO POLÍTICAS CURRICULARES ontrariamente ao que Ralph Tyler (1949) formulara, James Macdonald (1995, p. 149) proclama que o parâmetro principal do currículo não é o aluno, nem a sociedade, nem a herança cultural, mas o processo político de escolaridade. Assim, pretendo dizer que o processo político é a rede de estruturas, papéis, normas e rela- ções interpessoais que operam no processo de escolaridade. A consideração do currículo, e inerentemente a da educação, como uma construção política, parte do pressuposto de que a escola, nas palavras de Dwayne Huebner (1975, p. 273), é o veículo dessa atividade política, ou seja, um modo particular de organizar o poder e as influências que se encon- tram nas suas práticas cotidianas. Porém, reduzir o currículo a uma ativida- de política é considerá-lo um texto institucionalizado (Pinar e Reynalds, 1995, p. 149-152), legitimado por uma função burocrática direcionada para a efi- ciência e melhoria constante. Insere-se nessa argumentação a definição de currículo proposta por Ulf Lundgren (1997, p. 22): Defino currículo como a solução necessária ao problema da representação e o problema da representação como o objeto do discurso pedagógico. O objeto do discurso coloca-se como um domínio do pensamento e da construção de reali- dades sociais quando a produção social e a reprodução se separam entre si. Nesse caso, o currículo é um texto de solução do problema da repre- sentação, que interliga os processos de produção e de reprodução, abar- C 1 14 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO cando a seleção de conteúdos, a organização de conhecimentos e destrezas e a orientação de métodos de transmissão (Lundgren, 1997, p. 20).1 Para Dennis Carlson (1998, p. 279) “se, tal como sugere Michel Fou- cault, poder e conhecimento são inseparáveis, então, o currículo deve ser estudado pelas relações de poder não só que o constituem, mas também pelas quais é constituído”. Sendo uma lógica do poder educativo, o currí- culo não pode ser separado nem do contexto amplo que o define no tempo e no espaço nem da organização escolar que o concretiza. Por ser a política uma necessidade para a vida humana, tanto individual como social (Arendt, 1997, p. 67), a política curricular representa a racio- nalização do processo de desenvolvimento do currículo nomeadamente com a regulação do conhecimento, que é a face visível da realidade escolar, e com o papel desempenhado por cada ator educativo dentro de uma dada estrutu- ra de decisões relativas à construção do projeto formativo. Em termos formais, a política curricular corresponde ao conjunto de leis e regulamentações que dizem respeito ao que deve ser ensinado nas escolas (Elmore e Sykes, 1992, p. 186). Do mesmo modo, José Gimeno (1988, p. 129-130) define a política curricular como: toda a decisão ou o condicionamento dos conteúdos e da prática de desenvol- vimento do currículo, desde os contextos de decisão política e administrativa, que estabelece as regras de jogo do sistema curricular. Planeja parâmetros de atuação com um grau de flexibilidade para os diferentes agentes que moldam o currículo. Na medida em que o regula, a política é o primeiro condicionante direto do currículo e, indiretamente, é através da sua ação que outros agentes são moldados. Nessa perspectiva, a política curricular é uma ação simbólica, represen- tando uma ideologia para a organização da autoridade e que abrange tanto as decisões das instâncias da administração central como as decisões dos contextos escolares (Elmore e Sykes, 1992, p. 186), sendo implementada por intermédio de três tipos de instrumentos: normativos explícitos e objeti- vos (leis, decretos-leis, portarias, despachos normativos); normativos inter- pretativos e subjetivos (circulares e ofícios circulares); documentos de orien- tação e apoio (textos de apoio, documentos internos da escola). Se, no sentido primitivo do termo, a lei significa a fisionomia dos habi- tantes da cidade, mediante a qual se distinguem das outras cidades e dos outros habitantes,2 Hannah Arendt (1997, p. 121) sustenta que a lei pro- duz o espaço do político e que a política encerra uma finalidade e um sentido de ação. À lei associa-se, por isso, a regra que não é mais do que o POLÍTICAS CURRICULARES • 15 “código moral genérico” (Barry, 1995, p. 23) a que todas as sociedades aspiram apesar das diferenças que as caracterizam. Assim, a política é, ao mesmo tempo, processo e produto, envolvendo tanto a produção de intenções, ou de textos, como a realização de práticas, ou de ações concretas, ou ainda, de acordo com o pensamento de Stephen Ball (1997, p. 15), de texto e discurso: Eu partilho duas concepções de política. Por enquanto, apelidarei essas concep- ções de política como texto e política como discurso. De um modo muito sim- ples, poderíamos dizer que as diferenças entre essas duas concepções são bas- tante dramáticas e, em termos sociológicos, algo antiquadas e tradicionais. Mas tendo a aproximar-me da idéia de que a política não é nem um nem outro, mas ambos: estão implícitos um no outro. Como a política não se reduz a um simples texto e o Estado é apenas um dos teorizadores (Cood, 1988), os textos curriculares, oriundos da admi- nistração central, são documentos de trabalho que simbolizam o discurso oficial do Estado que agrega interesses diversos e alianças elaboradas a diversos níveis de ação. No entanto, são textos macropolíticos que se inse- rem em uma linha de racionalidade técnica quando os contextos de micro- decisão política são marginalizados. Reconhecer-se-á, assim, que as deci- sões políticas curriculares são fragmentadas e multicentradas. Há, não obstante, outros discursos que também legitimam a política cur- ricular e que são produzidos no contexto das diferentes práticas curriculares, pois “a ação pode ser determinada de modo diferente, mas não é determinada pela política” (Ball, 1997, p. 19). Nesse caso, os atores curriculares, sobretudo aqueles que se situam no contexto da escola, são produtores de discursos po- líticos que legitimam e dão significado ao cotidiano escolar. No modelo que propõem sobre o papel dos professores na formulação das políticas educati- vas, Paul Croll e colaboradores (1994) afirmam que os professores atuam, na escola e na sala de aula, como decisores políticos. Essas formas de poder explícitas ou implícitas dos atores que partici- pam na construção do currículo devem ser analisadas nos contextos das macro e micropolíticas,3 correspondentes, respectivamente, às intenções e à prática. No plano das macropolíticas,4 questionam-se os aspectos da fun- damentação e organização dos poderes não só expressos nos documentos oficiais, mas também nos momentos de produção desses textos.5 Nesse sentido, reconhece-se o peso dos grupos socioeconômicos nas práticas de influenciação6 e, mais ainda, o papel marcante da administração. O Estado 16 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO não é uma unidade unitária, mas uma estrutura complexa (Taylor, 1997, p. 29) que existe em função de processos que legitimam diferenças de opi- nião e converte a administração, depois de elaborado o corpus legislativo, no seu veículo de regulação da política curricular. Por outro lado, no plano das micropolíticas, aborda-se o lugar das es- colas, dos professores e dos alunos na configuração prática do currículo, lugares que nem sempre são controlados totalmente pela administração. Aliás, como reconhece Stephen Ball (1997, p. 10), uma teoria da política da educação não pode ser limitada à perspectiva do controle do Estado porque as políticas são imperfeitas e simples, enquanto que a prática é sofisticada, contingente, complexa e instável, o que equivale dizer que nes- se plano existem estruturas de poder, redesinformais de decisão e práticas discursivas que intervêm de modo ativo na decisão curricular. A reconceitualização das questões das micropolíticas, cujo quadro de análise se tem fundamentado na dicotomia entre estrutura e agência, des- taca as dinâmicas e estratégias de interação dos professores enquanto ato- res (Reay, 1998). Efetivamente, as políticas curriculares são decididas e construídas em espa- ços e vertentes que envolvem lutas e alianças7 e que de forma alguma se res- tringem ao conceito racional e operativo da linearidade política: o papel da administração na prescrição curricular, tanto por meio de uma estratégia top- down quanto de uma estratégia de negociação8 com vista à recentralização. A política curricular não se traduz, assim, em uma decisão central substanciada a partir de parâmetros e critérios de âmbito nacional e de formas concretas de regulação da construção cotidiana do currículo. Pelo contrário, a política cur- ricular decide-se e aplica-se em uma perspectiva interpretativa e menos deter- minista (Elmore e Skyes, 1992) ou em um conjunto complexo de relações entre a escola, a experiência individual e a vida pública (Page, 1990, apud Slattery, 1995, p. 5), ou, ainda, em um espaço de reconstrução de valores, experiências e interesses, dado que a política não pode esgotar-se no momen- to normativo como se o político fosse o ator por excelência na construção do currículo (Pacheco e Paraskeva, 1999). Ao contrário da perspectiva prescritiva, em que a política se processa em distintas fases lineares, desde a formulação até a avaliação, Sandra Taylor e colaboradores (1997, p. 25) conceitualizam a política como um processo complexo, interativo, multifacetado, desarticulado e menos racio- nal. Desse modo, as políticas curriculares, enquanto elos de ligação às po- líticas educacionais, pois são um seu subconjunto,9 não são decididas em um ciclo prescritivo, mas (Ball, 1997, p. 26)10 em um ciclo constituído por contextos interligados de uma forma não-hierárquica: POLÍTICAS CURRICULARES • 17 • Contexto de influência: momento da construção dos discursos políti- cos ao nível dos principais grupos de pressão, dos organismos e dos contextos locais. • Contexto de produção do texto político: engloba a produção de di- versos textos – normativos, documentos, pareceres, discursos oficiais, intervenção da mídia que, forçosamente, é contraditória e incoerente, na medida em que representa diversas opiniões e alianças. • Contexto da prática: inclui o terreno da intervenção dos práticos, razão pela qual muitos dos textos curriculares são rejeitados, ignorados e distorci- dos sempre que não correspondam às experiências, aos valores, aos propó- sitos e aos interesses dos professores, aos alunos e demais atores. • Contexto dos resultados: diz respeito aos efeitos das políticas tanto nas estruturas e práticas quanto no impacto dessas mudanças nos pa- drões de igualdade, liberdade e justiça social. • Contexto da estratégia política: engloba as atividades sociais e polí- ticas de modo a contribuir para a resolução/atenuação das desigual- dades, no fundo, a base da investigação social crítica. POLÍTICAS EDUCACIONAIS As políticas de educação refletem, necessariamente, uma variedade de conceitos e abordagens (Berkhout e Wielemans, 1999),11 sendo a sua ori- gem situada na universidade, na 1a metade do século XX,12 com a realiza- ção de estudos sobre o poder das comunidades. Porém, e dado que o seu âmbito abarca todos os níveis de governo e tomadas de decisão, a emer- gência das políticas de educação como campo de estudo “foi mais associa- do ao desenvolvimento de uma política educacional que a distintos aspec- tos de teoria e metodologia” (Campbell et al, 1965). Essa natureza mais política e menos teórica faz com que as políticas de educação sejam referenciadas pela descrição de conceitos e pelo reconheci- mento da subjetividade dos seus pressupostos. Daí que o conceito de tomada de decisão lhe esteja associado: o processo de tomada de decisão foi primei- ramente estudado em nível local para se concluir que a política e a educação são interligadas pelas elites informais, pelos grupos de interesses e pelas interações formais (Kimbrough, 1964). De um modo mais sistematizado, e partindo da noção de políticas “como um conjunto de interações que influenciam e determinam a alocação autori- 18 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO tária e os valores”, Scribner e Englert (1977, p. 22) definem quatro conceitos fundamentais: governo, poder, conflito e orientação política. A noção de governo, ou de Estado, inclui todos os aspectos legais da política educativa e que se estendem por territórios delimitados; à noção de poder agregam-se os de controle, autoridade e influência. A noção de orientação política conjuga-se com todos os poderes de diplomacia, fazendo prevalecer que tanto as intenções e os discursos quan- to as práticas não sejam realidades isomórficas. Efetivamente, a política educacional não pode ser conceitualizada a partir de duas categorias analíticas autônomas ou justapostas: uma, o nível da concep- ção, a outra, o momento da implementação. Se em uma política tradicional esses dois momentos são cruciais, a passagem para o momento da prática, no entanto, faz-se por meio de inúmeros filtros que não só determinam o percurso das intenções como também acrescentam diversas leituras, uma vez que a cons- trução de significados depende dos contextos em que se inserem. Assim, a polí- tica contém contradições, omissões e significados divergentemente estrutura- dos que produzem diferentes efeitos (Burkhout e Wielemans, 1999). Um dos mais eficazes filtros é o da gestão e administração das escolas que, com o seu “olho interno”, determina, muitas vezes, o que conta como evento em uma realidade socialmente construída. Dessa forma, a política educacional não pode ser entendida exclusivamente nos fatos isolados da administração, como a produção e regulação dos textos normativos, mas sim como um sistema e uma cultura. A aceitação do modelo que contempla as abordagens macro e micro con- tém a idéia implícita de que a regulação administrativa é uma forma de governo que contribui para reduzir os decisores (White, 1976), além de confirmar a política como processo simbólico de manutenção da ordem social. Desse modo, a noção de conflito, decorrente das pressões formais e informais sobre os deciso- res e das relações que se estabelecem a partir de um determinado sistema de alocação de valores, torna-se central no estudo das políticas educacionais. Nesse aspecto, a teoria de alocação é a que melhor explica os conflitos que se geram ao nível dos grupos e dos sujeitos intervenientes no processo de decisão,14 pois a educação, apesar de ser reconhecida como um direito constitucional, é forte- mente intersectada por opções políticas que obedecem a lógicas de poder muito díspares e que são a expressão de conflitos. As longas raízes da teoria do conflito encontram-se nos trabalhos de Karl Marx e Max Weber (Karabel e Halsey, 1977), cujas perspectivas políti- cas e sociais são diferentes de uma visão consensual da sociedade que não pode ser reduzida a perspectivas meramente técnicas. A esse respeito, A. Gouldner (1973) contrasta a teoria social técnica (dominada pelos câno- POLÍTICAS CURRICULARES • 19 nes da lógica e evidência para a análise dos dados) com a infra-estrutura da teoria social (composta por sentimentos e concepções da realidade me- diadas pela experiência pessoal). O pessoal, o subjetivo e a opinião são uma realidade intrínseca à decisão educativa, e não reconhecê-los equiva- leria a lutar por processos de racionalidade técnica que fazem do sujeito um elemento que deve agir em conformidade com aquilo que “cientifica- mente” os especialistas decidem. Randall Collins (1993, p. 195-208) segue a idéia de Max Weber para propor uma teoria do conflito em educação. Atacando a teoria funciona- lista da estratificação educativa,15 orientada para o consenso e não para o conflito, argumenta que a expansão do sistema educativonorte-america- no reflete mais as necessidades técnicas da economia do que os efeitos da competição dos status groups pela saúde, pelo poder e pelo prestígio. Po- rém, e dado que o poder é um elemento crucial no sistema educativo, reforça, ainda, que a noção de educação serve para reafirmar o status cultural, protegendo os que a dominam e impondo barreiras aos que se encontram no seu exterior, embora, no centro desse conflito baseado no status, esteja o mercado. A noção de conflito é reforçada tanto por Samuel Bowles e Herbert Gintis como por Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron quando reali- zam os primeiros trabalhos de aplicação do estruturalismo à educação. Quanto ao trabalho de Samuel Bowles e Herbert Gintis, o sistema educa- tivo é um elemento crucial na reprodução do mundo de trabalho e é também uma reflexão sobre a hegemonia da classe capitalista, consta- tando que há um princípio de correspondência entre escolaridade e rela- ções sociais de trabalho. Correspondência e contradição são duas pala- vras-chave e, na teoria de reprodução, identificam três instituições fun- damentais que se encontram interligadas: família, escola e mundo do trabalho. No que diz respeito a Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron, a reprodução social está relacionada com a reprodução cultural, que é a expressão de uma cultura dominante ou de um capital cultural que faz parte do domínio simbólico, ou seja, a cultura oficial é aquela que está identificada com os valores e comportamentos da classe dominante e que possibilita a reprodução cultural pela exclusão.16 Como as escolas criam desigualdades (Kerckhoff, 1991), onde os funcionalistas freqüentemente viam o sistema educativo oferecer opor- tunidades para a mobilidade dos indivíduos, os teóricos do conflito têm desta- cado, de modo geral, o papel da educação na manutenção de um sistema social de desigualdade. (Karabel e Halsey, 1977, p. 35) 20 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO O grande parâmetro, hoje em dia, das políticas de educação é a ques- tão da igualdade (Paquette, 1998), e, acerca dessa questão, o consenso torna-se impossível, sobretudo quando existe um questionamento constante das políticas sobre a igualdade que permi- tem que um considerável número de alunos deixe o ensino superior, com ou sem diploma, não tendo as destrezas básicas, os bons hábitos de trabalho ou a preparação para o emprego.17 O questionamento da desigualdade é muito relacionada com o lugar da educação vocacional na escolaridade do aluno, principalmente se a educa- ção vocacional for apresentada, como o faz Theodore Lewis (1998), como uma educação geral, pressupondo a negociação de um conjunto nuclear de aprendizagens que criativamente integrem o acadêmico e o vocacional. Dis- cordando dessa solução, Michael Apple (1998) pergunta o que significa a palavra negociação ou o que conta realmente como negociação. O consenso não é fácil, sobretudo quando a existência de um bem comum não pode ser presumido. O consenso é sempre deliberado por meio de um processo que se submete aos efeitos da dominação e subordinação. Por isso, sustenta (Apple, 1998, p. 335): Penso que temos de ser extremamente cautelosos ao transferirmos para o nosso debate o que poderão ser assunções injustificadas sobre a igualdade de pode- res, um consenso atingível que todos partilham, e um universo educacional em que os conflitos que são verdadeiramente constitutivos e estruturais podem ser “negociados” e postos de lado através daquilo que poderíamos chamar de “cura através da fala”. Não estou, de modo algum, confiante nessa idéia. A noção de consenso integra a sensibilidade requerida para a apreensão de fatos e julgamentos relativos à sua significação e ordem (sensus) e o caráter público que implica envolvimento (con), podendo-se afirmar que existem, quan- do estão salvaguardados, os princípios da responsabilidade distribuída, da responsabilidade delegada, da participação administrativa, da multiplicação de alternativas e da diversidade sensível/estimada, entre outros (Schawb, 1957, p. 408-413). Por outro lado, a sua existência torna possível o surgimento de uma consciência comum que torne aconselhável e necessária a criação de “uma ponte conceitual entre os discursos individuais, entre os discursos das pessoas e das instituições, entre as forças sociais e organizacionais e entre a ação política e técnica” (Macdonald e Zaret, 1975, p. 2). POLÍTICAS CURRICULARES • 21 Em termos políticos, o consenso refere-se a um tipo de acordo acerca dos fins e valores que envolve aspectos econômicos, políticos e sociais (Barry, 1987, p. 408-413) e que é característico de um pensamento conservador apoiado nos princípios defendidos pelos liberais clássicos. Nesse caso, o liberalismo tem sido associado a questões do consenso quando pressupõe o livre mercado e o individualismo nas questões econômicas, encontrando- se bem presente no Estado-providência social.18 OS PARÂMETROS CONCEITUAIS DAS POLÍTICAS CURRICULARES ode-se fazer o estudo das políticas curriculares a partir de diferentes abordagens – embora Stephen Ball (1990) reconheça que o campo da sua análise, tal como acontece para as políticas educacionais, tem sido mais dominado pelo comentário e pela crítica do que pela investigação empírica – que se situam ora no lado da racionalização ou prescrição, ora no lado da interpretação ou da análise crítica. São esses dois modelos que propomos, mas que passaremos a denominar modelo das racionalidades1 técnicas e modelo das racionalidades contextuais, em uma conjugação com as diferentes linguagens curriculares2 que enquadram tanto a noção de currículo quanto o processo do seu desenvolvimento. Em uma convergência de disposições científicas e analíticas com o pro- gresso tecnológico, a racionalidade técnica3 é próxima da racionalidade funcional, tal como a descreveu Karl Mannheim, ou seja, organização lógi- ca das tarefas em pequenas unidades, em função do interesse da eficiência, da razão instrumental de Max Horkheimer (aplicação da razão humana ao serviço dos objetivos instrumentais) e da racionalidade sistêmica (que con- siste na habilidade para compreender a natureza do conjunto do sistema a partir de cada tarefa particular). Na conferência sobre teoria curricular, realizada em 1967, na Ohio State University, James Macdonald (1995)4 utilizou os termos teorias de engenharia,5 para se referir à influente racionalidade tecnológica tyleria- na – que reduz o currículo a um processo de objetivação, na busca da eficiência e eficácia, e as organizações educacionais a uma complexa bu- rocracia6 – e framework theories, para abarcar os que perfilham a concei- tualização não-técnica do currículo e se identificam, de igual modo, com P 2 26 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO o conceito de racionalidade estética (de Herbert Marcuse) que, aplicado ao campo curricular, significa a adoção de novas formas de interpretação do currículo. No seguimento do que tem sido estabelecido para analisar a realidade educacional em função dos parâmetros modelados tanto pelas ciências sociais quanto pelas ciências naturais, esse dualismo encontra-se profun- damente enraizado na teorização curricular, por exemplo, nos critérios de fundamentação das teorias (Kemmis, 1988; Tadeu da Silva, 2000d), na caracterização do currículo como fato ou como prática (Young, 1998), e nas abordagens estruturalistas e pós-estruturalistas do currículo (Cherryhol- mes, 1988). O modelo das racionalidades técnicas integra-se no rationale Tyler, talvez um dos mais fortes parâmetros para a referencialização das políti- cas curriculares na medida em que se constituiu em um marco indelével tanto para a definição dos contextos de decisão quanto para a organiza- ção das práticas curriculares.7 É nesse sentido que, dentro de uma visão estrutural do currículo, Leo Cherryholmes (1988) fala na existência de quatro metanarrativas curriculares: a abordagem de Tyler; a estrutura das disciplinas (Schawb, 1963)8; a aprendizagem de Bloom; o prático de Schawb. Trata-se, de fato, de uma visão tecnicistado currículo em que as deci- sões políticas são tomadas em um nível macro, com o reconhecimento do papel centralizador da administração central e da linguagem especializada dos consultores curriculares, deixando-se às escolas e aos professores o papel de implementá-las, pois não são considerados nem lugares nem ato- res de decisão política. Digamos que tal quadro de decisão curricular é ainda fundamentado na lógica positivista da investigação, isto é, a prática só adquire validade científica se for determinada pela teoria, terreno reser- vado somente aos especialistas. No que diz respeito à decisão política cur- ricular, esse é um pressuposto errado porque os professores são atores e as escolas são locais privilegiados de (re)construção do projeto de formação dos alunos. É ainda um pressuposto errado porque seria considerar o cur- rículo como fato, negando-se ao professor, como afirma Michael Young (1998, p. 39), o papel qualitativo na “modelação do currículo e na concep- ção do dispositivo curricular como algo a ser entregue e a ser testado”. O currículo seria, assim, perspectivado como um produto que é oferecido e não como um projeto que deve ser compreendido, interpretado e transfor- mado. Dessa concepção de currículo, decorre a racionalização técnica e burocrática por meio de dois eficazes instrumentos: separação entre o mo- POLÍTICAS CURRICULARES • 27 mento da concepção, da responsabilidade dos especialistas e da adminis- tração, e execução, por intermédio da ação controlada dos professores; des- profissionalização dos professores, porque se tornam os operários curricu- lares e os não-decisores. Por sua vez, o modelo das racionalidades contextuais adquire sentido com os trabalhos no âmbito da teoria social crítica e das diversas aborda- gens pós-modernistas e pós-estruturalistas, contribuindo para a emergên- cia de uma teorização curricular crítica, emancipatória, cujos traços de identificação têm sido marcados pela pluralidade de propostas teóricas (Pacheco, 2000) e pela ausência de contributos práticos. Um quadro de análise mais completo é apresentado por Michael Apple (1999) quando refere a necessidade de analisar o currículo na base da conjugação teórica do pós-estruturalismo9 com os critérios da subjetividade que dão sentido e significado à ação humana, abarcando o que José Gimeno (1998), a partir dos trabalhos de diversos autores, por exemplo, Giner, Elster, Pérez Gómez e Habermas, designa racionalidade das situações, ou seja, uma racionalida- de limitada para compreender a relação das finalidades concretas com as circunstâncias também concretas. A racionalidade limitada, dentro da teoria weberiana de ação e da análise estratégica (Friedberg, 1995), reconhece aos atores da vida social um mínimo de racionalidade, cujo postulado se alimenta de duas fontes indissociáveis: “o caráter incerto da ação pública, por um lado, e o cará- ter coletivo da ação pública, por outro” (Baudouin, 2000, p. 261). Tal modelo de racionalidades ligadas aos contextos particulares inte- gra as noções práticas de currículo, defendidas inicialmente por Joseph Schawb,10 Lawrence Stenhouse e James Macdonald e que Michael Young (1998, p. 27) sintetiza na expressão “currículo como prática, cuja conse- qüência é a de os professores aceitarem submeter as suas práticas a uma reflexão crítica e que, perante isso, possam compreender o modo de trans- formar o currículo”. Efetivamente, trata-se de perspectivar o currículo por meio de uma lógica de ação à qual se associa a afetividade, tão profusamente explorada nas temáticas da pós-modernidade e pós-estruturalismo. Em uma visão pós-estruturalista do currículo, Leo Cherryholmes (1988, p. 163) defende a desmistificação da engenharia curricular, da decisão administrativa e do currículo como projeto neutro. Com razão se propõe que as políticas curriculares resultam de comple- xas decisões que derivam tanto do poder político oficialmente instituído quanto dos atores com capacidade para intervir direta ou indiretamente 28 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO nos campos de poder em que estão inseridos. Seguindo essa linha, José Gimeno (1998, p. 82) afirma que as políticas e práticas da educação não podem ser pensadas nem governadas à margem dos agentes. A racionalidade técnica cede, assim, à proeminência a uma outra racionalidade imperfeita, modesta nas suas aspirações, mas compre- ensiva das realidades sociais e humanas. Trata-se, por isso, de definir os parâmetros da autonomia em função de critérios organizacionais, profissionais e pessoais de modo a que se torne um processo contínuo de (des) construção.11 Uma das questões fundamentais na definição das políticas curriculares é a de determinar a centralidade das decisões na administração, escola e sala de aula, em uma definição clara dos limites entre as dimensões de localização (nível central ou local) do poder e de assunção do poder (responsabilidade política ou responsabilidade profissional) dentro das quais identificamos (Pa- checo, 2001, p. 91-107) quatro estratégias ou modelos principais (fig.1): Central B Política A C Profissional D Local Fig. 1. Políticas curriculares. a) Modelo A-B (política centralista). Papel determinante da adminis- tração central na concepção e operacionalização da política curricular. Trata-se de uma responsabilidade essencialmente política dos órgãos ministeriais, já que a responsabilidade profissional do professor reside na implementação de orientações e programas definidos urbi et orbe na base de um complexo quadro normativo. b) Modelo D-C (política descentralista). Papel predominante dos terri- tórios locais na contextualização da política curricular mediante a con- cepção, implementação e avaliação de projetos curriculares, que são POLÍTICAS CURRICULARES • 29 recontextualizados em função de orientações políticas que asseguram a igualdade. c) Modelo A-D (política centralista e descentralista). Prevalece a perspecti- va normativa. Política curricular descentralizada no nível dos discursos, mas recentralizada ao nível das práticas. A prática curricular é autônoma no discurso e nos textos curriculares, mas é definida e regulada pela adminis- tração central por meio do estabelecimento de referenciais concretos. Os territórios locais têm autonomia para (re)interpretar o currículo em função de projetos curriculares que são administrativamente controlados. d) Modelo C-B (política descentralista e centralista). Predominância das componentes profissional dos atores e institucional dos territórios lo- cais. A descentralização existe tanto nos discursos como nas práticas curriculares. A administração central define os referenciais da política curricular, mas entrega, aos territórios locais, a recontextualização reali- zada pela articulação do que pode ser face ao que deve ser. Além disso, o conteúdo da política curricular define-se em função de dimensões que concorrem para a concepção, realização e avaliação de um dado projeto de formação, nomeadamente na relação entre as dimensões do conhecimento e do contexto, por um lado, e entre as dimensões da organiza- ção e avaliação, por outro.12 Tanto a forma como o conteúdo das políticas curriculares não são, no entanto, decididos nem a partir de critérios meramente técnicos nem de sólidos argumentos teóricos e científicos, mas na base de opções políticas que, em termos ideológicos, representam noções distintas de Estado e lógi- cas proporcionais às influências dos grupos sociais com interesses e valores educativos (fig.2): Contexto Organização Avaliação Conteúdo Fig. 2. Conteúdo e forma das políticas curriculares. 30 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO Assim, na abordagem conceitual das políticas curriculares, incluímos, no modelo das racionalidades técnicas, dois parâmetros concretos: a en- genharia tyleriana e a engenharia mercantil que, por sua vez, estão na origem de outras duas lógicas de construção dessas políticas – a lógica de Estado13 e a lógica de mercado.14 E incluímos, no modelo das racionalida- des contextuais, outros dois parâmetros:a racionalidade crítica e a racio- nalidade cultural que fundamentam duas lógicas específicas – a lógica do ator e a lógica cultural (fig.3): Engenharia Lógica de Lógica Racionalidade tyleriana Estado do ator crítica Engenharia Lógica de Lógica Racionalidade mercantil de mercado cultural cultural Fig. 3. Lógicas na construção das políticas curriculares. Tais lógicas devem ser entendidas como campos de poder que legiti- mam, em diferentes momentos, as políticas curriculares. Metaforicamen- te, pode-se dizer que cada lógica curricular funciona, em um vasto e com- plexo mundo subterrâneo, nas mesmas condições das placas tectônicas, sujeitas a alterações e a ritmos de reajustamentos em função de critérios geográficos. Cada lógica curricular é, desse modo, um poder diferenciado que deve ser visto não só como um espaço próprio, com as suas dinâmicas e fronteiras específicas, mas também como um espaço interdependente e permeável, com as suas relações construídas na base do conflito, porque é manifesta a impossibilidade de um consenso absoluto. Enquanto espaço social diferenciado, onde os significados são legitima- dos pelos vetores da ideologia e hegemonia, a lógica curricular identifica-se pelos jogos de poder existentes. Assim, o currículo é construído pela luta de diferentes fronteiras que delimitam terrenos de participação e âmbitos de decisão. Não se poderá, contudo, aceitar que o currículo seja a expressão de uma única lógica, na medida em que as lógicas de Estado, de mercado, do ator e cultural são peças de um quebra-cabeça que adquire sentido pelas fronteiras que são conquistadas em momentos diferentes. R a c io n a lid a d e s té c n ic a s R a c io n a lid a d e s c o n te x tu a is POLÍTICAS CURRICULARES • 31 NOTAS 1. Para a definição do conceito de racionalidade, seguimos John Rawls (1993, p. 25) quando escreve que “o conceito de racionalidade é (...) aquele que é comum nas ciências sociais. Assim, conforme é usual, um sujeito racional é visto como tendo um conjunto coerente de preferências, estabelecidas de entre as opções que se lhe oferecem”. 2. Dwayne Huebner (1975) identifica seis linguagens curriculares: descritiva, causal, de controle, de legitimação, prescritiva e de afiliação. 3. A idade moderna é a idade da racionalidade técnica e é traduzida pela metáfora da teoria organizacional como organismo/sistema de vida que desenvolve as funções necessárias para sobreviver. O gestor é como parte interdependente que age em um sistema de adaptação. As três restantes metáforas são: no período clássico, a máquina/gestão dos resultados a partir de objetivos predefinidos/engenheiro que controla a máquina organizacional; período interpre- tativo-simbólico: cultura/padrão de significados criados e mantidos pela associação humana por meio da partilha de valores, tradições e costumes/gestor como artefato que funciona como símbolo do sistema; período pós-moderno: organização como colagem de diversos co- nhecimentos e compreensão que conjuntamente trazem novas perspectivas/gestor como teó- rico e artista (cf. Hatch, 1997). 4. Esta obra reúne os principais textos do autor. Uma análise mais concreta desse modelo é realizada na introdução feita por William Pinar (cf. Macdonald, 1995). 5. Abrange as seguintes designações no campo da teorização curricular: “paradigma tyleria- no”; “racionalidade tecnológica”; “paradigma tecnológico”; “modelo burocrático”. 6. O termo “fenômeno burocrático” é utilizado por Michel Crozier (1964) na base de três distintos usos. O primeiro e o mais tradicional corresponde a um conceito de ciência políti- ca: a burocracia é o governo através dos gabinetes. O poder burocrático implica, nesse caso, o reino da lei e da ordem. O segundo, decorrente do pensamento de Max Weber, dos soció- logos e dos historiadores: a burocratização é a racionalização das atividades coletivas. O último corresponde ao freqüente e vulgar senso da palavra burocracia: evoca a lentidão, o enfadonho, a rotina e a complicação dos procedimentos. 7. Para Herbert Kliebard (1975), uma das razões para o sucesso do Tyler rationale foi a sua extrema racionalidade. Trata-se de um quadro razoável para o desenvolvimento do currículo. 8. Texto apresentado na 1a Conferência “of San Jose State College (California) Division of Education” com o propósito de explorar os problemas curriculares mais comuns entre as escolas de ensino fundamental e médio e considerar, ainda, a estrutura do conhecimento em quatro disciplinas principais do currículo. Dá também seguimento às idéias propostas por Bruner no livro “The process of education”, publicado em 1960. O problema da estrutura das disciplinas para Schawb é o de determinar o seu número e a sua organização por meio das diferenças que existem realmente entre elas e em cada uma 32 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO delas. Identificar a disciplina que constitui o conhecimento contemporâneo e o domínio do mundo é identificar as matérias da educação, o material que constitui tanto os seus recursos como as suas obrigações. Relacionar essas disciplinas com outras é determinar o que deve ser ligado e o que deve ser rejeitado nos propósitos da instrução. Estrutura substantiva (ou conceitual) é o conjunto de problemas de uma dada disciplina dado que o corpo de conhe- cimento é significativo temporariamente. A estrutura sintática: está ligada ao processo de descoberta, à validação dos dados e ao método de construção do conhecimento. Seguindo Aristóteles, dividem-se as disciplinas em três grupos principais: teóricas (regularidade do conhecimento); práticas (envolvem escolha, decisão e ação baseada na ação deliberativa); produtivas (relacionadas com o fazer). Do mesmo modo, Philip Phenix (1964) (para quem o Livro de Jerome Bruner The process of education foi o mais influente no campo da educação) no esforço de elaborar uma teoria filosófica curricular para a educação geral, que define como um processo de produção de significados essenciais, avança com a seguinte tese: “o conhecimento das disciplinas tem padrões ou estruturas, e a compreensão dessas formas típicas é essencial para a orientação do ensino-aprendizagem” (p. X). Uma visão unitária do currículo é importante por muitas razões: uma visão compreensiva é necessária para fundamentar todas as decisões inteligen- tes acerca do que devemos incluir ou excluir em um curso de estudos; a pessoa é essencial- mente uma totalidade organizada e não uma coleção de partes separadas; a sociedade, tal como as pessoas consideradas individualmente, dependem de princípios da comunidade; um conceito compreensivo da estrutura da aprendizagem acrescenta um outro significado a cada componente do currículo (p. 4). 9. O pós-estruturalismo é um conjunto alargado de posições teóricas que seguem a lingüís- tica estruturalista de Saussure e outros escritos de Derrida, Lacan, Kristeva e Foucault que têm em comum a importância da linguagem e da representação (cf. Shilling, 1992). 10. Apesar de Leo Cherryholmes referenciar as propostas conceituais de currículo de Joseph Schawb como uma metanarrativa, tal como o faz para Ralph Tyler, pensamos que as suas idéias, juntamente com as de Dwayne Huebner e James Macdonald, revelaram-se funda- mentais para a compreensão do currículo como um processo que integra procedimentos práticos e para a crítica da excessiva teorização técnica. 11. A esse respeito, a obra de Morgado (2000) é elucidativa. 12. Tais dimensões consistem na delimitação do território da teorização curricular, pro- posto por Herbert Kliebard (1975): por que devemos ensinar isso e não outra coisa? Quem deve ter acesso a que conhecimentos? Que regras devem guiar o ensino? Como se devem inter-relacionar as distintas partes do currículo de modo a obter-se um conjunto coerente? Também William Schubert (1986, p. 42) centra o conteúdo das políticas curriculares no conhecimento, organização e avaliação: “Existe, por conseguinte, uma opinião muito real, na qual o currículo em si mesmo é encarado como uma forma de política educacional. Quandoé reduzido a texto, apercebemo-nos da política que subjaz às experiências de apren- POLÍTICAS CURRICULARES • 33 dizagem ou aos conteúdos (em conjunto com os objetivos, a organização e a avaliação). Mesmo quando não é reduzido a texto, sendo uma combinação de ações práticas documen- tadas, o currículo revela a política de um sistema escolar acerca dos conhecimentos e expe- riências que os alunos devem ter”. 13. Conjuntamente com Maria A. Flores e João Paraskeva, abordamos, incipientemente, as lógicas de Estado e de mercado (cf. Pacheco e Paraskeva, 1999.) 14. No enquadramento das políticas educacionais, Joseph Kahne (1996, p. 155-159) identi- fica quatro perspectivas principais: o utilitarismo; as visões da Direita (perspectivas da liber- dade natural, da meritocracia e da igualdade democrática rawliana); o pensamento comu- nitário democrático; e a psicologia humanista. DA ENGENHARIA CURRICULAR À LÓGICA DE ESTADO DISCURSOS VERTICAL E HORIZONTAL proliferação de teorias e a diversificação dos argumentos que legiti- mam as políticas curriculares, em termos de análise, têm sido uma cons- tante ao longo dos últimos anos. No entanto, é de salientar as abordagens que recolocam as políticas educacionais entre as dimensões macro e micro e as relações entre estrutura e agência. O macro e o micro são duas formas distintas de discursos, para Basil Bernstein (1999) – tal como o são para Pierre Bourdieu (simbólico/domínio) e Jurgen Habermas (mundo real/ racionalidade instrumental –, que se reconhecem no dominado/dominante (vozes), no íntimo/distante (social), no dentro/fora (contextual), nas opera- ções/princípios (cognitivo), no espontâneo/contraído (avaliação) e no sub- jetivo/objetivo (epistemológico). Tal perspectiva estruturalista, de interligação das noções de agência e estru- tura, não pode ser reduzida ao dualismo centrado nas macro e microanálises educacionais. Assim, a dicotomia dessas análises tem sido alterada para uma dualidade de campos de interpretação, cujos processos de construção teórica realçam uma visão integrada da realidade social (Sheeling, 1992).1 Porém, Basil Bernstein (1999, p. 159) retoma a idéia de recontextualização como forma de reduzir as dicotomias enunciadas por meio dos discursos vertical e horizontal, isto é, por um lado, um discurso que toma a forma de uma estrutura hierarqui- camente organizada, coerente e explícita e, por outro, um discurso que engloba “um conjunto de estratégias que são locais, organizado de um modo segmenta- do, relativo a um contexto específico e dependente, de modo a maximizar os encontros com as pessoas e os seus habitats”. A 3 36 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO A dualidade vertical/horizontal é a mesma forma de articular o que pode ser, face ao que deve ser, reconhecendo-se que o currículo jamais pode ser entendido como um plano dicotômico que é controlado adminis- trativamente desde a sua concepção até a execução. Por isso, a relação entre a decisão política e a implementação tem sido objeto de crítica de muitos autores que contestam os modelos de controle do estado from top to bottom que são idênticas às dicotomias top-down/bottom-up, estrutura/ agência, macro/micro; central/local (Raab, 1994). Em uma lógica de decisão administrativa, todos os aspectos do currí- culo são planificados de uma forma prescritiva, existindo uma compati- bilidade entre a planificação dos especialistas e a implementação dos professores (Klein, 1991). Registra-se, também, a crença de que a oferta do mesmo currículo a todos os alunos resolve o problema da desigualda- de da escola e assegura-lhes uma formação de qualidade, medida por testes estandardizados, que funcionam como parâmetros de orientação curricular. Nesse caso, a avaliação criterial é o motor permanente da ino- vação curricular, o que tornam os testes criteriais os mais adequados para avaliar as escolas e os sistemas, requerendo avaliação por amostras,2 ao contrário dos testes normativos que implicam a avaliação de toda a po- pulação (Tyler, 1974). DA NOÇÃO DE ESTADO Por não ser o Estado uma entidade monolítica e existir em função de prioridades e interesses, as políticas curriculares são construídas tanto na complexidade, heterogeneidade e contradição de posições, quanto na exis- tência de poderes disseminados. Aliás, no dizer de Charles Raab (1994, p. 11), a ênfase da decisão política centrada no Estado não significa subscre- ver o modelo de controle do Estado em que a implementação obedece ao sentido do top-down/bottom-up. Pela mesma razão, no modelo proposto por Stephen Ball, o ciclo político não é linear e hierarquizado. Por isso, no estudo das políticas relacionadas com o Estado, Charles Raab propõe o conceito de política de redes de trabalho, a qual situa no plano interorgani- zacional,3 podendo ser utilizado conjuntamente com os modelos de distri- buição de poder e as teorias de Estado (Raab, 1994, p. 17). Nos estudos tanto da filosofia política quanto da ciência política, o Estado é caracterizado, entre outros aspectos, pela centralização da au- toridade, pelo monopólio de coerção e pelo poder de criação da norma, POLÍTICAS CURRICULARES • 37 surgindo associado à lei, à autoridade e ao poder. A sua legitimação, desse modo, é questionada na existência do indivíduo e na sua relação com a sociedade. Como se trata de um conceito contestado, Norman Barry (1995, p. 63) afirma que sobre o Estado há teorias rivais e incom- patíveis, resumindo a sua visão a duas: a teoria econômica, que corres- ponde à máxima satisfação da escolha dos indivíduos desde que se tor- ne uma agência de maximização das suas satisfações; a teoria orgânica, para a qual o Estado é a pré-condição para a escolha individual, pois é uma ordem objetiva que existe independentemente dos interesses e das escolhas individuais. É reconhecido que a construção da entidade a que se chama Estado se fez historicamente a partir dos pressupostos da lei, que impõe um conjunto de regras de natureza pública, e da centralização da autorida- de. Tais elementos são fundamentais para a clarificação da sua gênese e da sua consolidação, ainda que existam diferentes perspectivas para a sua fundamentação. Embora a distinção seja feita a partir de quadros teóricos precisos, a noção de Estado reclama a noção de governo, ou seja, se podemos falar do Estado “quando pretendemos descrever um conjunto de regras que autorizam grupos particulares a agir” (Norman, 1995, p. 70), fala- remos do governo como uma opção dos cidadãos, no caso das democra- cias políticas, a quem legitimam para o exercício dessa autoridade re- gulada. Ainda de acordo com Norman Barry, a teoria orgânica do Esta- do estabelece a legitimidade mais pelo parâmetro da autoridade que pelo da escolha individual. Porque deve preceder a noção de individua- lidade, o argumento principal é o de que a noção de autoridade deve ser localizada na experiência histórica específica e nas estruturas tradi- cionais das regras (Norman, 1995, p. 79). Mesmo assim, “nada justifica o lugar central que tradicionalmente cabe ao Estado e ao seu aparelho nesse sistema, muito menos o postulado da sua unidade e da sua coe- rência” (Friedberg, 1995).4 Apesar de ter assumido um papel acrescido nas esferas social e cul- tural, o Estado tornou-se o braço secular do sistema político, refletindo sistemas particulares de poder e autoridade, constatando-se que possa existir “uma legitimidade da relação de dominação que não possui, no entanto, necessariamente a relação de poder” (Baudouin, 2000, p. 60).5 Sobretudo a partir das conotações sociológica e filosófica, não existe um consenso sobre o significado dos termos poder e autoridade, embora, geralmente, sejam associados o primeiro à legitimidade e à legalidade e o 38 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO segundo aos fatores causais que permitem a uma pessoa, ou um grupo de pessoas, determinar a ação dos outros (Barry, 1995, p. 86). O poder intersecta, subseqüentemente, interesses dos indivíduos que são conjugados diferentemente, de acordo com as regras instituídas, legiti-madas pela moralidade, competência e responsabilidade. No pensamento weberiano, a autoridade é classificada em três ti- pos: autoridade racional-legal (burocrática, baseada em regras impes- soais); autoridade tradicional (fundamentada na obediência); autori- dade carismática (caracterizada pela obediência que é determinada pela qualidade pessoal). Ainda que não sejam descrições da realidade, mas sim tipos ideais, as categorias de autoridade identificadas são apenas indicações possíveis do exercício do poder, sobretudo quando se reco- nhece a existência de uma autoridade de jure (autoridade legal, mas nem sempre efetiva) e de uma autoridade de fato (autoridade assumida na realidade). Trata-se de uma tipologia que, segundo Jean Baudouin (2000, p. 66), está muito amarelecida com o tempo; apercebemo-nos, em particular, de que se revela de uma grande pobreza quando se trata de interpretar os totalitaris- mos modernos ou de pensar a eminente simplicidade das democracias contem- porâneas. Porque a autoridade é uma construção histórica, legitimada por tra- dições ideológicas relativas a valores, interesses e relações de poder, o processo de desenvolvimento (formal e informal) do currículo tem sido visto como uma variável organizacional6 a partir de duas perspectivas principais: por um lado, uma perspectiva conservadora, em que a autori- dade representa hierarquia e é contrária à persuasão, que propõe a igual- dade por meio de um processo de argumentação (Arendt, 1954, p. 93), estando centrada nos valores e nas normas tradicionais, sendo a escola uma mescla de reprodução com o reconhecimento dos conceitos de famí- lia, nação, dever, confiança e normas (Barry, 1995, p. 122); por outro lado, uma perspectiva radical, emancipatória, que vê na autoridade a lógica de dominação das escolas como fábricas, ou prisões, a partir do pensamento foucaultiano, e propõe a cultura como um terreno de conhe- cimentos e práticas, encontrando-se, na sociedade e na comunidade, os referenciais crítico e ético para a definição de autoridade escolar “como um conjunto particular de idéias e práticas, dentro de um contexto histo- ricamente definido” (Barry, 1995, p. 130).7 POLÍTICAS CURRICULARES • 39 Na perspectiva radical, sobretudo dentro dos parâmetros dos estudos culturais, o conceito de autoridade aproxima-se do de “legitimidade” que, “entretanto, evoca critérios éticos de justiça que não estão presentes, ne- cessariamente, no conceito de ‘autoridade’” (Tadeu da Silva, 2000c, p. 19). A questão fundamental reside, assim, em saber se, em uma pers- pectiva crítica, a autoridade é um instrumento de racionalização, desde que o professor seja um intelectual transformador de modo a interrogar a autoridade que legitima as suas práticas, ou um instrumento de questio- namento de todas as relações de poder, sendo este concebido, na esteira do pensamento de Michel Foucault, de forma fragmentada, difusa e des- centralizada. Independentemente das perspectivas citadas, a emergência do currí- culo na sociedade moderna e industrial está fortemente associada à no- ção de Estado, sobretudo naquilo que representa não só em termos de racionalização e burocratização de finalidades educacionais, bem como em função de diversas formas de controle social que legitimam práticas concretas de autoridade. Segundo Pierre Bourdieu (1997, p. 73-79) – partindo do pensamen- to de Max Weber –, o Estado, relacionado com o capital econômico, cultural e social, constitui-se na reivindicação do monopólio do uso le- gítimo da violência física e simbólica em um determinado território, ou seja, sobre estruturas físicas e mentais, ou esquemas de percepção e de pensamento, que correspondem, no campo curricular, ao processo de inculcar uma cultura dominante, assim constituída em uma cultura na- cional legítima. A onipresença do Estado, ou a essência da sua razão de ser, é global- mente legitimada pelo aparelho jurídico, em uma sucessão de legados his- tóricos a partir do direito romano, pela administração e pelo currículo, estabelecendo o sistema de finalidades que orientam o processo educativo. É nesse sentido que Pierre Bourdieu (1997, p. 69, citação de Bernhard, 1988, p. 34) transcreve as seguintes palavras: A escola é escola do Estado, onde se faz dos jovens criaturas do Estado, quer dizer, nada mais que cúmplices do Estado. Quando entrei para a escola, en- trei para o Estado, e como o Estado destrói os seres, entrei para o estabeleci- mento de destruição dos seres [...] O Estado fez-me entrar à força no Estado, como de resto fez aos outros todos e tornou-me dócil perante ele e fez de mim um homem estatizado, um homem regulamentado e registrado e domado e diplomado, e pervertido e deprimido como os outros todos. Quando vemos homens, vemos apenas homens, vemos apenas homens estatizados, servido- 40 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO res do Estado, que, durante toda a sua vida, servem ao Estado e, a partir daí, durante toda a sua vida servem a contra-natureza. Ainda que as perspectivas essencialistas sejam amplamente criticadas, poder-se-á questionar: o que é o Estado? Pode-se afirmar (Apple, 1999a) que deve ser visto como uma coisa que está em formação e que se define acerca da criação, estabilização e norma- lização de relações de poder e autoridade. Não sendo uma estrutura mono- lítica, o Estado define-se na diversidade de instituições que se refletem, sucessivamente, na sociedade política, nas políticas educacionais, nas polí- ticas curriculares e na escola (Paraskeva, 2000). O Estado define-se basicamente pela institucionalização da sociedade e pela historicidade do Estado-Nação. A instituição é um sistema público de regras que determina funções e posições (...) uma insti- tuição pode conceber-se de duas formas: em primeiro lugar, como um objeto abstrato, isto é, como uma possível forma de conduta expressa por um sistema de regras; em segundo lugar, como a realização, através da conduta e pensa- mento de certas pessoas em certos momentos e lugares, das ações prescritas por essas regras. (Rawls, 1993, p. 63-64) O Estado-Nação é uma construção múltipla ligada a uma conjuntura histó- rica singular.8 FUNDAMENTAÇÃO DAS POLÍTICAS CURRICULARES É certo que a visão de um sistema escolar comum suportado pelo Estado não foi um plano para a transformação radical da sociedade através das linhas da igualdade; pelo con- trário, foi um projeto para estabilizar a continuidade da sociedade republicana sem o questionamento de muitos problemas sociais. (Molnar, 1985, p. 4) Daí que as políticas educacionais e curriculares sejam discutidas a par- tir da teoria liberal clássica – com ênfase no individualismo – da teoria liberal moderna – com a discussão do Estado-providência (Welfare-state) – e da gestão científica. POLÍTICAS CURRICULARES • 41 Teoria liberal clássica A lógica do Estado, na construção das políticas curriculares, funda- menta-se no liberalismo clássico, que pressupõe o individualismo e o utili- tarismo, na medida em que começa com uma visão realista do homem e da sua condição, ou seja, por um lado, a racionalidade do auto-interesse dita que os indivíduos podem seguir o curso da sua ação e, por outro, os merca- dos podem existir desde que não neguem os aspectos econômicos da liber- dade que é ditada pelos valores individuais. Por isso, o liberalismo clássico, enquanto doutrina normativa, é uma amálgama que inclui: economia cien- tífica, utilitarismo, direitos naturais, deontologia kantiana, contratualismo e evolucionismo. Enquanto a ideologia contém um componente científico pesado, o objetivo da sua doutrina é limitado e não pode ser restrito à classe, ao partido ou a qualquer grupo coletivo que possa desejar utilizar o Estado como um mecanismo de implementação dos seus programas já que sublinha os fins coletivos (Barry, 1996, p. 6). No liberalismo clássico, os julgamentos morais são derivados das pai- xões, da ação individual, da ordem espontânea, da satisfação dos interes- ses imediatos e não propriamente da razão pela qual visa à máxima satis- fação doindivíduo na relação com o Estado.9 Estado-providência O Estado-providência, ou o Estado do bem-estar, é um termo politica- mente muito controverso,10 com sentidos diferentes para a teoria liberal clássica e para a teoria liberal moderna. Os conceitos que o caracterizam – justiça, igualdade, liberdade, direito, entre outros –, tanto podem servir para defender como para rejeitar a idéia de ajuda que o Estado presta ao indivíduo. Como realça Norman Barrry (1999, p.1), “o paternalismo, a coerção e a ineficiência são, eles próprios, destrutivos do conceito humano de providência”. No contexto da industrialização, e com o aparecimento de uma pobre- za criada pelos novos processos de produção, a gênese do Estado-provi- dência representa um outro olhar sobre a realidade social, sobretudo quando os interesses individuais constituem um dos princípios essenciais do lais- ser-faire. Desse modo, a ação social do Estado foi determinada não só pelo reconhecimento da existência de graves desigualdades sociais, que ironica- mente não podem ser explicadas só porque os pobres são pobres, e a po- 42 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO breza é uma condição social, mas também pelos princípios do utilitarismo que reforçam o componente individual do bem-estar e da satisfação. Simi- larmente, o Estado assume a educação pública como sendo uma das suas responsabilidades, ao mesmo tempo que faz parte de propósitos econômi- cos, sociais e culturais. O Estado-providência torna-se, assim, uma categoria de análise políti- ca e econômica, cuja discussão se mantém atual em um momento em que se procuram novas formas de legitimação do Estado perante o poder exa- cerbado do mercado cada vez mais globalizado. O Estado-providência é explicado, em primeiro lugar, pelo conceito de justiça redistributiva, na medida em que define eqüidade não em termos de alocação de recursos, mas como um conjunto de instituições para dar resposta às necessidades individuais. O consenso tem sido construído em nome de uma responsabilidade governamental que legitima a sua ação por meio dos impostos, que deve operar a distância tanto do mercado quanto da caridade privada e em torno de serviços como a educação e a saúde. Depois, a argumentação a favor ou contra o Estado-providência é funda- mentada pela convicção de que existe um acordo último sobre os fins soci- ais (Barry, 1999, p. 7). Mesmo assim, existem duas tradições opostas acerca do Estado-provi- dência. A tradição individualista encontra-se nos pressupostos da teoria libe- ral clássica: o indivíduo é um agente abstrato, sem obrigações para com a sociedade, e o Estado-providência equipara-se a um ato de voluntariado. Contudo, o liberalismo clássico também desenvolveu, sobretudo com os tra- balhos de Edmund Burke, as “responsabilidades diminutas do governo tanto em relação à igualdade de oportunidades como no que diz respeito à preser- vação da lei, ordem, continuidade e coesão social” (apud Barry, 1999, p. 7). As suas raízes são as do utilitarismo (laisser-faire econômico), embora exista um alinhamento moral com as idéias de Adam Smith quando diz que os serviços devem refletir as escolhas subjetivas das pessoas. O utilitarismo é perigoso a partir do momento em que se defende que o bem-estar é um fenômeno subjetivo e que por tal razão jamais pode haver consenso social. A tradição individualista corresponde ao sistema denominado poor law system, ou seja, a redistribuição mínima. De fato, trata-se de uma perspec- tiva liberal clássica que reforça a crença na importância acrescida do mer- cado e na idéia de que a liberdade individual é o regulador eficiente da alocação de recursos. O Estado mínimo social é só para os que não conse- guem ganhar o suficiente. Em termos de educação, é o sistema de voucher (cheque) que deve funcionar (Sleeman, 1973). Na teoria liberal clássica, POLÍTICAS CURRICULARES • 43 acredita-se que existe uma harmonia automática entre o auto-interesse do indivíduo e o Estado-providência no seu conjunto, pelo que o credo econô- mico é a harmonia natural dos interesses, a divisão do trabalho conduz à riqueza das nações, o papel do mercado é regulado pelo mecanismo do preço, o papel da competição consiste em introduzir a qualidade dinâmica no sistema de produção e, por último, a anatomia do poder define-o como a habilidade para produzir o efeito pretendido (Girvetz, 1950 e 1963). Logo, o Estado-providência é discutido como a expansão da produção na dinâmica econômica e não como uma questão totalmente humanitária. A tradição institucional11 é um dos princípios políticos da teoria liberal moderna quando a política pública é orientada para o bem-estar e satisfa- ção das pessoas (individual e coletivamente). Nesse caso, o Estado-provi- dência é marcado pela ética do altruísmo, pela concepção cooperativa e pelos valores comunitários: o Estado assume responsabilidades no campo da saúde, da segurança, do emprego, das pensões e da educação. Em termos educacionais, essa tradição tem servido de argumento para a escola compreensiva, que surge no quadro das políticas de educação com- preensiva na Inglaterra (Simon, 1994)12 em oposição às escolas elitistas e aristocráticas (grammar schools). Stephan Ball situa o começo dessas esco- las em 1965, em um momento de oposição ao lobby meritocrático escolar, solicitando-se às autoridades locais que submetessem planos de reorgani- zação compreensiva à administração, de modo a garantir uma igualdade de oportunidades, mas com a definição de um mínimo de oportunidades, a partir de três idéias associadas: educação compreensiva; igualdade; ensino progressista (Ball, 1984).13 Tanto a individual como a institucional são tradições redistributivas, embora por caminhos sutilmente diferentes. Porém, em um nível conceitual, o debate acerca do Estado-providência continua, e os argumentos são uti- lizados desde o individualismo até ao coletivismo (Barry, 1999, p. 138). Na prática, o grau em que temos o controle coletivo sobre o comportamento do indivíduo, o grau em que os interesses individuais são subordinados aos propósitos coletivos, acentua a diferença do liberalismo de hoje relativa- mente ao liberalismo clássico (Girvetz, 1950). Gestão científica do currículo A discussão do papel do Estado na construção das políticas curricula- res em nome de uma escola pública e eficiente é fortemente legitimada 44 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO pelo desejo de aplicar os conhecimentos adquiridos no campo da adminis- tração à educação. Aceita-se a perspectiva dominante de que o currículo é um processo administrativo que responde a problemas concretos mediante a aplicação do método científico, oriundo das ciências exatas, e de novos conhecimentos. Situando-se o currículo nas lógicas da construção da realidade históri- ca, sobretudo com a emergência das revoluções sociais e industriais que viriam a implementar no cotidiano as marcas da modernidade, Landon Beyer e Daniel Liston (1996, p. 7) situam a maturidade do currículo, en- quanto projeto de formação e veículo de opções políticas, naquilo que cha- mam a idade da eficiência, ou naquilo que chamaremos a gestão científica do currículo. A base de tal modelo assenta-se nos autores que, no início do século XX, defendem a gestão científica como um modelo universal, suscetível de ser aplicado a todos os campos do conhecimento e que Herbert Kliebard (1995) integra no grupo dos eficientistas sociais. A gestão científica está relacionada com os livros de Frederick Taylor – Principles of scientific management, publicado em 1911 – e de Bertrand Thompson – The theory and practice of scientific management, surgido em 1917 – tornando-se onipresente em todos os aspectos da vida americana, desde o exército até à educação. Sendo traduzido e aplicado em quase todos os países, Frederick Taylor centra-se na idéia da eficiência e na crença de que o modelo universal pode ser aplicado a todas as situações e a todas as atividades sociais: gestão do lar; gestão das propriedades; gestão dos negócios; gestão das igrejas e das instituições filantrópicas(como as universidades e os departamentos go- vernamentais, mediante a consideração de mecanismos fundamentais: tem- po, estudo da engrenagem e desenvolvimento da unidade de tempo para os vários componentes de qualquer trabalho). A idéia de tornar o currículo e as escolas mais práticas deve-se, em grande parte, à pressão do utilitarismo educacional e do modelo tayloria- no de gestão científica, descrito, por vezes, como o poder mágico, porque é a panacéia para todas as doenças econômicas. Embora se admita que a educação não seja um negócio e que a escola não funcione como uma fábrica, na verdade, a influência dos valores comerciais, fazendo dos admi- nistradores das escolas gestores de negócios e não escolares e filósofos educacionais, torna-se relevante não só pela produção bibliográfica (livros, jornais e revistas), mas também pela pressão daqueles que são responsá- veis pela administração e gestão da escola (Callahan, 1962). POLÍTICAS CURRICULARES • 45 Um dos mais influentes é William Bagley (1907), cujas idéias se resu- mem aos seguintes aspectos: • Tipologia normal da sala de aula: 30 alunos, aproximadamente iguais em idade, habilidade, grau de atenção, podendo ser simultaneamente treinados e instruídos por um só professor (é a noção de classe, ou sala de aula). • Gestão da sala de aula a partir da unidade de grupo dos alunos: primeiramente é um problema econômico, pois a gestão da sala de aula pode ser considerada um problema de negócio. • As reformas intervaladas na educação têm escasso impacto nos pro- fessores. • É essencial para cada professor a psicologia educacional e a teoria geral da educação. • O conceito de escola como negócio deve ser revisto na perspectiva dos significados e fins. A escola é diferente da fábrica porque é ativa e humana e não lida com materiais mortos e inertes, dado que a perso- nalidade do professor é um fator influente. • A tarefa da escola é preparar a criança para a vida na sociedade civilizada. • A educação escolar é apenas uma espécie típica de educação. A edu- cação representada pela casa, Igreja, ou qualquer outra instituição so- cial, é igualmente válida. • O fim da escola deve ser formulado por meio da eficiência social e esta deve ser o standard a utilizar no julgamento da escola. Outro autor marcante é Joseph Rice que, em 1913, publica um con- junto de ensaios com o título Scientific management in education acerca da investigação realizada sobre as salas de aula das escolas norte-ameri- canas. A inculcação do modelo baseado na noção científica de educação é continuada por David Snedden. As suas idéias remetem tanto para o conceito de currículo (Snedden, 1927) definido como o conjunto de pla- nos, com propósitos, orientações, regras, textos e princípios formulados, quanto para os standards de proficiência escolar e para as políticas edu- cacionais, que devem tornar mais explícitos e expressivos os planos e não tanto as aspirações,14 ou, ainda, para a noção de aprendizagem (Snedden, 46 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO 1937), dividida em elementos constitutivos e classificada por meio de procedimentos científicos e de acordo com as funções e não com as maté- rias. A procura da eficiência curricular, fazendo do Estado o guardião dos direitos em matéria de educação, entroniza-se no movimento de criação dos standards científicos de medida, amplamente defendido por Ellwood Cubberley (1929). Desse modo, a política educacional do Estado é uma política construtiva de desenvolvimento da educação pública. O Estado deve tornar-se mais ativo, um agente energético, trabalhando para o cres- cimento moral, intelectual e social das pessoas. Como especifica Ellwood Cubberley (1929, p. 28-29), a formulação de standards mínimos para as diversas formas da educação pública, a melhoria constante dos standards e o envolvimento das comunidades na atividade educativa são deveres fun- damentais do Estado. Identificados os alicerces conceituais do modelo de gestão científica, o Estado torna-se um instrumento de promoção da apren- dizagem pública, em parceria com outras instituições, assim desenvolvido por Donald Schon (1971, p. 116): o problema do Estado como um sistema de aprendizagem poderá ser declarado de forma simples nestes termos: como podemos, tanto na sociedade como na nação, aprender a identificar, a analisar e a resolver os nossos problemas? As respostas a essa questão encontram-se nos trabalhos dos autores que consagram o modelo científico de gestão curricular, com destaque para Frank- lin Bobbitt e Ralph Tyler. Um dos maiores esforços no sentido de aplicar a gestão científica ao currícu- lo foi o de Franklin Bobbitt15 – um professor de administração educacional da Universidade de Chicago, cujo primeiro trabalho é publicado em 1913. Certo de que os princípios da gestão científica tinham uma aplicabilidade universal, defende, então, que os diretores e supervisores devem fornecer instru- ções detalhadas aos trabalhadores e que os standards, métodos e recursos de- vem ser definidos. É a partir dessas idéias que defende dois princípios: “a definição dos standards quantitativo e qualitativo deve ser determinada em fun- ção do produto (...) e de acordo com cada uma das etapas de trabalho”, acredi- tando que a educação é “um processo de modelação como uma manufatura de linhas de caminho de ferro de aço” (Bobbitt, 1913, p. 11). A defesa de standards curriculares por Franklin Bobbitt é lida por Ray- mond Callahan (1962, p. 78) do seguinte modo: POLÍTICAS CURRICULARES • 47 Os professores deveriam instantaneamente saber quando os alunos falharam, os diretores deveriam saber quando os professores foram ineficientes e poderiam facilmente determinar, não de uma forma vaga e geral, mas de modo preciso e absoluto, o modo como as suas escolas são comparadas com as outras. Como o sistema escolar precisa de standards de performance, por meio de um plano detalhado, a educação é comparada a uma indústria produti- va. Tal como Frederick Taylor, Franklin Bobbitt acredita que a eficiência “depende da centralização da autoridade e define a direção dos superviso- res em todo o processo realizado”, apesar de ser deixada aos professores alguma iniciativa (Bobbitt, 1913, p. 89). Por isso, defende a teoria educaci- onal como mera opinião, dado que o seu desejo é o de estabelecer uma base científica para a elaboração do currículo. Tal idéia é expressa na obra que mais o consagra na fundação do campo curricular – The curriculum – e na qual escreve que precisamos de uma técnica científica que tem sido de- senvolvida em outros campos de formação (Bobbitt, 1918, p. 42): “A teoria central é simples. A vida humana, qualquer que ela seja, consiste na perfor- mance de atividades específicas”. Dado que a educação prepara para a vida adulta em termos de habilida- des, atitudes, hábitos, avaliações e formas de conhecimento que são os obje- tivos do currículo e que são numerosos, definidos e particularizados, o currí- culo16 converte-se no conjunto de experiências que as crianças e os jovens devem ter para atingir os objetivos, experiências essas desenvolvidas em dois níveis: experiência de vida da comunidade, levando-o à participação na vida da comunidade (formação indireta); educação sistematizada no nível da formação direta. Assim, o currículo pode ser definido de dois modos: é todo um conjunto de experiências, quer diretas quer indiretas, direcionadas para a revelação das capacidades do indivíduo; ou, então, é o conjunto de expe- riências conscientemente voltadas para a formação e que as escolas usam com objetivos de desenvolvimento e de aperfeiçoamento, num sentido mais amplo; quando o currículo é definido neste sentido de inclusão das experiências dire- tas e indiretas, então, os seus objetivos são o conjunto de capacidades, práticas, sistemas de conhecimento, etc., que cada ser humano deve possuir. (Bobbitt, 1913, p. 43) Partindo de uma investigação analítica, Franklin Bobbitt (1913, p. 283) identifica o método de construção do currículo baseado nos objetivos: 48 • JOSÉ AUGUSTOPACHECO Precisamos de princípios de construção do currículo. Não soubemos que deve- ríamos determinar em primeiro lugar os objetivos a partir do estudo das neces- sidades sociais. Supusemos que a educação consistia somente no ensino de matérias familiares. Na monografia escrita em 1922, Bobbitt reforça o valor do método cien- tífico na construção do currículo e responde a dois propósitos fundamentais: discutir o método de forma a melhorá-lo; contribuir para a formulação de uma técnica prática de reexame do currículo e reformulação que possa su- plantar o método primitivo freqüentemente utilizado. E o método consiste na clarificação do conceito de educação e na defesa dos objetivos. A educa- ção tem por finalidade produzir resultados: esses resultados são habilidades humanas, hábitos, atitudes, apreciações, destrezas, poder de julgar, caracte- rísticas pessoais de diversa natureza. A primeira tarefa prática do construtor do currículo é elaborar uma lista de propósitos de trabalho relativa a habili- dades específicas e a outras características humanas. Cada item curricular é um significado e um fim. É preciso conhecer em primeiro lugar quais são os fins. Daí que a educação esteja sempre relacionada com objetivos. O engenheiro que planeja a construção de uma estrada de Omaha a Los Angeles – devemos saber – começa o seu trabalho tendo uma perspec- tiva global da região que liga os dois pontos. A partir dos dados do relevo, obtidos por meio de uma observação preliminar, traça a linha da estrada. “O primeiro passo do engenheiro educacional é ter uma perspectiva global do campo da vida do ser humano através da observação dos fatores que estão em perspectiva e que se relacionam” (Bobbitt, 1924, p. 7). O segundo passo, dado pelo grupo que constrói o currículo, não pode ser dado em segunda mão. Deveria-se fazê-lo por sua própria observação, pensamento, julgamento e decisão. Apesar da existência de estradas ge- rais, há rotas a seguir pelas crianças, e são essas rotas que exigem a enge- nharia educacional: “a maior tarefa da construção do currículo no presente é a descoberta de metas para um caminho global e a planificação de um esboço global de estradas/rotas” (Bobbitt, 1924, p. 5). O método é sim- ples, a partir do relevo que é dado aos objetivos: “os objetivos da educação são todas as atividades que permitem atingir a totalidade da vida humana desde o nascimento até à morte” (Bobbitt, 1926, p. 4). Porque “a educação é primeiramente para a vida adulta e não para a vida da criança” (Bobbitt, 1924, p. 8), a primeira tarefa consiste em descobrir as atividades17 que dão sentido aos seres humanos e transformá-las em objetivos. O plano a ser utilizado é o da análise de atividades e, depois da identificação do campo de atividades, é necessário dividi-lo em unidades. POLÍTICAS CURRICULARES • 49 A noção eficientista de currículo é defendida na década de 30 por Ho- wars Dawson (1934, p. 16) nos seguintes termos: “o currículo da escola consiste em todas as atividades, cursos de estudos, matérias e materiais que são utilizados como significados para a prossecução de objetivos e resposta aos propósitos escolares”. Trata-se de uma noção que acentua as perspectivas administrativas sobre o currículo e que denota que a mudan- ça operada no sistema educativo é o resultado da pressão de grupos com especiais interesses. Assim, com o crescimento do movimento científico em educação, durante a primeira metade do século XX, os estudos sobre o currículo multiplicaram-se. Um novo campo profissional de especialização emergiu no currículo (Grieder et al., 1961, p. 192). A utilização da autoridade do especialista torna-se onipresente, e as re- formas curriculares começam a ter os seus apóstolos, partilhando a idéia de que os estados devem regular as prescrições sobre as matérias que devem ser ensinadas, relegando para plano secundário as outras atividades. Com efei- to, as atividades extracurriculares são vistas fora do trabalho regular das escolas. A história das atividades escolares conduz-nos à conclusão do que tem sido o método da porta traseira de melhoria do currículo, pelo menos como fator de mudança curricular (Grieder, 1961, p. 202). O reconhecimento do especialista curricular como artífice da mudança curricular contribui, de modo marcante, para a estandardização dos pro- cessos de construção do currículo baseada na racionalidade científica: cen- tralização do processo de tomada de decisão, divisão do trabalho, identifi- cação de destrezas, leis e regras de controle do trabalho. É com base nesses pressupostos, edificados em uma miríade de dinâ- micas sociais, econômicas e políticas, que ocorre a gênese do campo curri- cular, primeiro, no início do século XX, com Franklin Bobbitt18 e Wenett Charters (1923), e depois com Ralph Tyler, em meados do mesmo século, iniciando o chamado rationale Tyler que consolida o modelo de gestão científica, rapidamente convertido em um poderoso instrumento de orienta- ção e definição das práticas curriculares, na medida em que oferece um modelo simples de formular os objetivos (que Bloom, em 1956, viria a transformar em uma pedagogia de controle de comportamentos essencial- mente cognitivos19), selecionar os conteúdos (dando origem na década de 60 à estrutura das disciplinas20), organizar as atividades e proceder à ava- liação. Apesar de discordar da idéia de que a escola seja uma instituição econômica, Ralph Tyler, ao fundamentar o seu pensamento na gestão científica orientada para a eficiência, elabora um modelo teórico que se 50 • JOSÉ AUGUSTO PACHECO tornaria preponderante no desenvolvimento curricular, tal como escreve Herbert Kliebard (1975, p. 39): O campo do currículo deve ser desenvolvido – não o modelo universal de de- senvolvimento do currículo. Goodlad afirmou, a dada altura, que Tyler marcou uma época de investigação curricular. A nova época está muito atrasada. Desse modo, Ralph Tyler, em colaboração com Vergil Herrick, identifi- cou os elementos indispensáveis para a existência de um currículo em ação, independentemente de qualquer teorização curricular. Mesmo os que mais se lhes opõem teoricamente não deixam de reconhecer que os elementos tylerianos de uma prática curricular, perspectivados a partir de abordagens processuais e interpretativas, são os objetivos, os conteúdos, as atividades e a avaliação. Ralph Tyler sempre viu a avaliação como uma parte integrante do pro- cesso de desenvolvimento do currículo. Enquanto trabalhava o rationale para a avaliação, articulado com o seu trabalho no Eight-year study (Aikin, 1942)21, de 1933 a 1941, desenvolveu paralelamente o rationale para o desenvolvimento do currículo e que viria a consagrar, em 1949, no título Basic principles of curriculum and instruction, elaborado a partir da crença de que os educadores devem clarificar e validar os seus objetivos. Também devem desenvolver experiências de aprendizagem e ajudar os alunos a obter os objetivos e avaliar continuamente o progresso dos alunos de acor- do com estes (Madaus e Stufflebeam, 1989). O rationale Tyler representa, de igual modo, a conceitualização de uma teoria curricular interligada a uma teoria linear, normativa e prescritiva de instrução e que apresenta quatro características principais para Jerome Bruner (1966): deve especificar as experiências; deve especificar o modo pelo qual o conhecimento é reestruturado; deve especificar as seqüências efetivas de apresentação dos materiais a serem aprendidos; deve especifi- car a natureza dos passos de recompensa e punição do processo de ensino e aprendizagem. Aliás, Jerome Bruner22 confere à gestão científica curricular uma argu- mentação sólida, com questões ligadas à filosofia, à psicologia da aprendiza- gem e ao conhecimento, identificando a escola como uma agência social especi- al que nutriria a excelência intelectual e a meritocracia, algo distanciada da idéia de Dewey para quem a escola deveria estar ligada à vida da comunidade. Com a publicação, em 1961, do livro The process of education,23 a teoria e a
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