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Apostila - alfabetização para crianças autistas

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Alfabetização
para Autistas
Curso ministrado pela
Professora Dayse Serra
Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Módulo 1
Aula 1 – Etapa 1
Levar uma criança que tem o transtorno do espectro autista até o momento da
alfabe tização é a preocupação de muitos pais e professores e é sempre um
caminho que precisa ser percorrido com paciência, sem pressa e envolve muitas
etapas. Por isso, esse curso busca trazer algumas informações, sugestões e
estratégias de avaliação de alternativas de atividades para alfabetizar as nossas
crianças.
Quando se trata de autismo há uma diversidade muito grande de características
envolvendo tanto os casos mais leves como os mais graves e para que as ações peda
gógicas voltadas à alfabetização possam ser planejadas, é importante conhecer cada
um deles.
Então, a primeira etapa diz respeito a conhecer quem é seu personagem, quem é
esse aluno e quais são as suas características, a fim de entender se já é possível
iniciar o processo ou não. Em alguns casos, já se pode poder entrar com o trabalho
vendo os fonemas de imediato, mas em outros tem que se percorrer um longo
caminho, cons
truindo uma história até chegar na fase onde vai ser possível decodificar a leitura.
Nessa primeira aula, vamos tratar da identificação das alterações das habilidades
que envolvem o processo de aprendizagem e uma avaliação comportamental dos
nossos alunos, o que significa que existem habilidades prévias. No caso do TEA,
com certeza é porque é um processo que exige um amadurecimento da
neurobiologia do cérebro. Dessa forma, não podemos esperar que uma criança de
1 ano aprenda a ler, assim como ela ainda não pode se alimentar com
determinados alimentos. Logo, nós preci
samos de habilidades prévias e se nós não as tivermos, o que vai acontecer é um
insu cesso, fazendo com que e nós acreditemos que a criança com TEA não é capaz
de aprender a ler e, na verdade, não é isso. O que ocorre é que nós deixamos de
cumprir alguns elementos básicos, algumas histórias prévias que antecediam esse
processo de alfabetização.
Um aspecto extremamente importante e que é uma das dificuldades que configura
o autismo é exatamente o ponto central - a comunicação e a linguagem. Assim,
esses são justamente os aspectos avaliados no autismo, na deficiência intelectual e
nas dificulda des adaptativas. Destacando que quando se tem dois problemas
concomitantemente, essa avaliação se torna ainda mais importante.
Dentro do processo de comunicação e linguagem, é necessário avaliar a criança
desde o nascimento, levando em consideração os precursores de linguagem no
processo de alfabetização, quais são esses precursores e a sua relação com a
alfabetização.
2
Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Às vezes nós nos surpreendemos quando a criança pronuncia a primeira palavra,
pois para nós a sensação é de que aquilo está começando naquele momento, mas
na verdade o ser humano começa a trabalhar as habilidades para falar e andar
desde o seu nascimento.
A causa do autismo ainda é desconhecida, o que nós temos são muitas hipóteses,
sendo que uma das possíveis causas diz respeito ao prejuízo qualitativo na área da
linguagem.
Por isso, dentro de uma visão desenvolvimentista, que considera a linguagem como
ponto central no estudo do autismo, é necessário voltar aos precursores de
linguagem - que nada mais é do que tudo aquilo que acontece desde o nascimento
de um bebê até o momento em que ele vai falar, expressar oralmente aquilo que
ele deseja, ou seja, onde surge a linguagem expressiva e compreensiva. Vejamos a
seguir sobre esses precursores.
Todo esse caminho que a criança percorre envolve o uso do olhar, sendo que a troca
do olhar com o cuidador é responsável pelo afeto e, consequentemente, pelo
desenvolvi mento da inteligência. Isso, inclusive, é explicado pelas teorias
desenvolvimentistas e cognitivistas: a afetividade está presente na troca do olhar.
Dessa forma, o olhar está diretamente ligado a alfabetização, pois é através dele
que a criança pode acompanhar todas as atividades que lhe estão sendo fornecidas
e é fundamental que esse olhar seja um olhar de qualidade.
Nesse contexto, muitas pessoas ficam com dúvidas, uma vez que é muito falado que
o autista não olha nos olhos. No entanto, às vezes conhecemos portadores da
síndrome de asperger que olham nos olhos, sim. Nesses casos, o que é avaliado é a
qualidade do olhar, como que esse olhar se comunica, se tem uma duração
socialmente aceita, se é muito fixo, vazio, entre outros aspectos.
Em seguida, vem o sorriso responsivo no desenvolvimento da criança - não aquele
sorriso espontâneo, já que normalmente o bebê sorri porque você sorriu para ele,
ou seja, é uma resposta, um diálogo sem palavras. Porém, caso a criança ainda não
tenha desenvolvido sorriso responsivo, isso não é um obstáculo para alfabetização
como é a falta do uso do olhar.
Também há a questão da vocalização, que é os gritos que o bebê costuma dar no
berço ou no colo, que são sinais de saúde, de que a linguagem está tomando o
percurso adequado. está interpretando. Quando a criança vocaliza, isso facilita o
processo de alfabetização, pois é mais fácil fazer com que a ela repita os fonemas.
Do contrário, isso não representa um impedimento,, pois existe uma diversidade
muito grande dentro do autismo, tendo crianças não-verbais e com plenas
capacidades de aprender a ler e escrever.
3
Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Mas, e como saber? Simples, porque elas interpretam, escrevem o que estão
pensan do, você faz perguntas sobre o texto e ela mostra na gravura o que ela vê.
Portanto, a autista não-verbal também pode aprender a ler e escrever.
Um outro movimento precursor que a criança faz, lá pelos seus cinco ou seis meses
de vida, é o movimento antecipatório. Um exemplo disso é quando o bebê começa
a jogar os braços para manifestar a vontade de ir para o colo de alguém em que ele
tem confi ança, antecipando um desejo dele. Essa questão interfere no processo de
alfabetiza ção porque para a criança aprender qualquer coisa, ela precisa saber
demonstrar o seu desejo, saber se antecipar.
Em outro momento, é necessário perceber se a criança tem atenção conjunta e aten
ção compartilhada. Esses são movimentos imprescindíveis e que vão preparar o ser
humano para o diálogo, porque é através da atenção conjunta que podemos
perceber a atenção humana, que tem, por exemplo, a capacidade de acompanhar o
olhar.
Já na atenção compartilhada, a criança divide a sua atenção entre o seu interlocutor
e objeto, sendo uma preparação para uma mudança de turno, visto que no futuro
ela vai ter que prestar atenção no que está sendo falado em sala de aula, entre duas
pessoas ou entre duas pessoas e um objeto. Isso numa sala de aula é bastante
interessante, pois há muitos estímulos, sendo necessário fazer uma alternância no
foco da atenção.
Juntamente com a atenção compartilhada e conjunta, também temos o uso do apon
tar e do olhar, o qual começa a ser notado a partir dos 11 meses de vida e se
caracteriza pelo apontar de dedo. Este é um movimento fundamental da linguagem.
Existem dois tipos de apontar: o declarativo e o imperativo. No declarativo, a criança
aponta somen te para compartilhar uma ideia. Já no apontar imperativo, ela aponta
para pedir. Na alfabetização, nós precisamos desse apontar, principalmente se a
criança ainda ainda não domina o movimento da escrita.
Outro fator que merece atenção, é a imitação arbitrária, que é quando a criança
apren de a fazer uma imitação espontânea, sendo ela muito necessária para cópia,
escrita, para pronunciar os fonemas e repetir.
Também temos a fala referencial, que em geral antecede a fala fluente. Ou seja, é o
momento em que a criança começa a falar pedaços de palavras e apelidos. Assim, a
criança está iniciando uma verbalização e isso normalmente ocorre aos um ano e
oito meses de idade.
Portanto, quando todos esses precursores anteriormente citados acontecem de
uma maneira típica e com qualidade, significa quea criança não tem nenhum
problema no desenvolvimento. Por outro lado, quando algum desses precursores
não existe ou apresenta alguma falha, a resposta é um pouco preocupante,
demonstrando que tem algum atraso no desenvolvimento e o risco de autismo.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
No caso da alfabetização, é comum encontrar crianças com 6, 7, 8, 12 anos que não
tem esses precursores e por consequência, sem a fala, sem o olhar, sem o sorriso
responsivo e assim por diante.
Isso significa que antes de mais nada, para alfabetizar, é preciso desenvolver esses
precursores de linguagem, fazendo com que aquilo que não aconteceu
naturalmente, aconteça de uma forma artificial por meio de um acompanhamento
terapêutico.
Desse modo, é fundamental fazer uma avaliação detalhada e fidedigna para que a
intervenção e as atividades sejam mais acertivas e apropriadas para as necessidades
da criança. Lembre-se que o trabalho no TEA envolve sempre o resgate do
desenvolvi mento, da afetividade e da interação social para que as demais áreas
possam ser desenvolvidas.
Módulo 1 - Aula 1 – Etapa 2
Nesta etapa falaremos sobre como avaliar os precursores de linguagem, visto que
muitas vezes o professor pode ter dificuldades de pensar em quais atividades
podem ser realizadas para desenvolver essa habilidade ou mesmo identifica-la na
criança.
Na aula anterior, tratamos sobre uma série de precursores e fizemos o caminho que
o bebê percorre até chegar à fala, ressaltando que nem todos eles que tocarão no
pro cesso de alfabetização. As características que interferem diretamente no
processo de leitura e escrita, bem como a compreensão e a interpretação, são:
O USO DO OLHAR - Para avaliar essa característica, é preciso observar o olhar da
criança nos diversos planos. Sabemos que a criança com autismo tem certa
dificuldade de sustentar o “olho no olho” e acaba direcionando o olhar para a nossa
boca. Essa diferença é muito sutil e por isso deve ser avaliada com atenção. Ao
sustentar o olhar nos olhos do interlocutor, a criança tem a possibilidade de
entender as sensações e emoções que estão sendo passadas, o que fará diferença
no futuro, em um estágio mais avançado, deverão ser feitas perguntas sobre a
emoção de um personagem, sobre o que o autor quis dizer, quais foram os
sentimentos expressos no determina dos parágrafos, entre outras questões de
interpretação.
Para que essa avaliação seja mais precisa, é interessante que o interlocutor mova-se
verificando se a criança acompanha estes movimentos. Ainda, uma outra forma
importante de fazer essa observação é utilizar um objeto de interesse da criança
colocando-o no plano vertical e/ou no horizontal, verificando se existe a
coordenação visomotora, bastante necessária para a prática de escrever. É também
muito impor
tante avaliar se a criança possui a percepção dos detalhes, ao contar uma história ou
apresentar uma gravura, se acompanha e explora o objeto com o olhar.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
MOVIMENTOS ANTECIPATÓRIOS - Movimentos antecipatórios: São movimentos
que a criança faz, quando bebê, lançando o corpo ou esticando os braços ao pedir
alguma coisa. Durante a fase de alfabetização o que se espera é que a criança
estique o braço para buscar algo. É possível aproveitar esses momentos para
trabalharmos também as habilidades de nomeação. Ao percebermos que a criança
gosta muito de determinado objeto, podemos fazer um gesto pela metade, levando
o objeto até o meio do caminho estimulando o indivíduo a esticar o braço até
alcançá-lo. Junto com o objeto desejado, é interessante entregar à criança algo que
esteja relaconado ao processo de escrita que possibilite a familiarização com a
possibilidade de desenhar, escrever, ouvir sons, etc.
Incentivando esses movimentos antecipatórios, é um dos primeiros movimentos
que o ser humano faz em direção à interação social. O processo de alfabetização
está diretamente ligado à cultura que, por sua vez, está diretamente ligada ao
processo de interação entre as pessoas. Ao ensinarmos à criança o gesto de
lançar-se em direção a algo, estamos estimulando a interação social e, nesse
contexto, produzindo cultura, familiarizando-a com outras pessoas e abrindo as
portas para a aprendizagem.
A alfabetização não deve ser um processo autônomo; a criança precisa da instrução
de alguém nesse processo, do contrário, não será uma leitura saudável. À medida
que a criança aprende os movimentos antecipatórios, ela terá ampliada a
capacidade de conviver.
ATENÇÃO CONJUNTA E COMPARTILHADA - Para fazer a avaliação dessa característi
ca, costuma-se utilizar, por exemplo, lanternas que produzem imagens (animais,
objetos). Para isso, diminui-se a iluminação do ambiente movendo a luz da lanterna
na parede e observando se a criança acompanha esse movimento, exercitando o
uso do olhar num processo de atenção.
É importante lembrar que essa etapa é parte de uma sequência e somente poderá
ser desenvolvida depois for feita a avaliação do uso do olhar e os movimentos
antecipató rios.
Após a utilização da lanterna, utiliza-se um objeto mais próximo da realidade
escolar. Por exemplo, podemos utilizar um papel grande em uma parede, riscando
uma linha e pedindo que a criança passe o dedo em cima, até que chegamos ao
momento em que a criança seja convidada pelo seu olhar (ou pelo seu dedo) a
observar um objeto dispos
to em um local diferente.
Crianças sem autismo olham para o local mostrado, enquanto que as crianças
autistas tendem a olhar para a ponta do seu dedo. Então, caso você não seja um
avaliador preparado, talvez não perceba a sutileza dessas diferenças. Por isso, é
muito bom que você faça essa avaliação em conjunto com outra pessoa, que possa
fazer anotações enquanto você observa ou vice-versa.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Depois é necessário que a criança faça uma troca de olhares, compartilhando a aten
ção. Esse gesto se relaciona com a formação do diálogo: no processo de leitura,
quan do você apresenta uma letra ou um fonema e questiona qual a figura que se
relaciona com o som que você está produzindo, a criança deve fazer o uso do olhar
no papel e voltar o olhar para você. Uma forma de fazer isso é trabalhar com a
criança sobre uma mesa, trocando objetos de posição, observando se ela consegue
alternar o olhar, ou colocando algum objeto perto do seu rosto para que ela
direcione o olhar para você, ou chamando outra pessoa para o trabalho fazendo um
jogo com bola, obrigando a criança a olhar para você.
Outro excelente exercício para a atenção compartilhada é utilizar um barbante
colori do, que pode ser feito com um número maior de pessoas em que cada um
segura uma parte do barbante e o joga aleatoriamente até que seja formada uma
rede.
Todas as atividades sugeridas são utilizadas não somente para avaliar, como
também para intervir quando a criança não tem habilidade.
IMITAÇÃO ARBITRÁRIA - O que esperamos é que a criança faça uma imitação
espontâ nea já por volta dos treze meses, quando a ensinamos a bater palminhas,
por exemplo. Em geral, uma criança autista com 6-7 anos não imita ou então tem
uma imitação atrasada, ou seja, aquela em que a criança ouviu uma frase há um
tempo e acaba repetindo fora de contexto.
A criança precisa repetir o fonema que você está emitindo, imite a escrita, pois a
cópia é uma forma de imitação. Um ótimo exercício para isso é utilizar o espelho. Se
a criança é muito refratária à questão da imitação, pode-se induzí-la imitando seus
gestos: se a criança bate na mesa, você bate também, colocando-se à frente dela
como se fosse um espelho ou uma sombra.
As imitações motoras são também bastante atrativas: brincar de bola, pular em uma
cama elástica, jogar bolinhas para o alto... Ensinar a criança a imitar coisas simples e
através da brincadeira, auxiliarão muito na imitação da escrita, que nada mais é do
que uma cópia.
Após a etapa de verificação desses primeiros percussores, deve-se observar o que o
paciente tem e o que não tempreservado e montar um plano de ação com
atividades para possibilitar o desenvolvimento do uso do olhar, os movimentos
antecipatórias, a atenção compartilhada e a imitação, que são habilidades
indispensáveis a tudo que virá depois.
Embora a recomendação seja de que não se tenha pressa durante as avaliações,
sabemos que essa etapa não demanda de muito tempo. Já o tempo para intervir é
imprevisível, pois depende de vários fatores, como o tempo que você passa com a
criança, a quantidade de vezes que as atividades se repetem... A sugestão é que
sejam
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
feitas pelo menos três tentativas a cada dez minutos, alternando as atividades para
evitar o cansaço e a perda de interesse da criança frente aos estímulos.
É muito importante que encaremos esse processo de forma científica, fazendo
anota ções, produzindo relatórios sobre os resultados, observando quais são as
falhas, o que precisa ser melhorado.
Módulo 1 - Aula 2 – Etapa 1
Avaliação das competências e habilidades
que envolvem a leitura e a escrita
Nesta aula falaremos sobre um trabalho mais diretivo, voltado especificamente para
a alfabetização. Começaremos a aprender sobre a avaliação das competências e
habili dades envolvidas na leitura e na escrita. Todas essas características foram
investigadas com crianças de qualquer natureza, ou seja, crianças típicas seguem
este mesmo padrão.
Para conseguir se apropriar da leitura e da escrita, a criança precisa possuir as
seguin tes habilidades:
VISOESPACIAIS: É a forma como a criança se relaciona com o espaço e como a
coorde nação visomotora funciona em relação a este espaço. Esta é uma habilidade
extrema mente importante e na qual percebemos que crianças com autismo
possuem dificul dades. Um exemplo comum é quando a criança escreve as palavras
ou frases emenda das e sem espaço entre elas. Isso está diretamente relacionado
com a coordenação
visoespacial e demonstra que a criança não entendeu os segmentos da fala e da
leitura e por isso apresenta a escrita irregular.
COMPREENDER E EXPRESSAR A LINGUAGEM - É necessário que a criança
apresenta a capacidade de linguagem compreensiva e expressiva, pois serão feitas
solicitações à ela (por exemplo, qual a imagem que começa com o som “A”?). Nesse
caso, a criança precisa compreender, processar essa informação e expressar-se de
alguma maneira.
PERCEPÇÃO VISUAL E LOCALIZAÇÃO NO ESPAÇO - Outra característica
extremamen te importante é a percepção visual, que está relacionada à habilidade
visoespacial e possibilita a diferenciação entre as letras p e b, por exemplo, pois a
curva da letra P fica em cima e a curva da letra B fica embaixo e a criança precisa
entender o que é em cima e embaixo, ter uma noção de direção e de continuidade.
SIMBOLIZAR, MEMORIZAR E EVOCAR A INFORMAÇÃO APRENDIDA - Essa é uma
outra habilidade importantíssima no que diz respeito à capacidade de ler, escrever
e, principalmente, de interpretar – para isso, a criança precisa simbolizar. Quando
se tra
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
ta de uma criança com TEA, observamos o prejuízo na imaginação, o que é essencial
para poder interpretar e entender uma história, por exemplo. A habilidade de
simboli zar se refere à capacidade que a criança tem de representar um som de
forma escrita, transformando o que ela ouve em uma palavra.
A memória é outra habilidade fundamental, pois a construção de qualquer
aprendiza gem se dá em etapas, aumentando o repertório de aprendizagem:
primeiro apresenta se um fonema, depois outro, que juntos formarão uma sílaba
que se transformará em uma palavra. Ou seja, se não existir a habilidade de
memorização, certamente haverá prejuízos no processo de leitura.
A evocação da informação aprendida é a capacidade da criança resgatar
informações obtidas em oportunidades anteriores, o que possibilita a ampliação do
conhecimento.
HABILIDADES VISOESPACIAIS
- O aluno olha para o local adequado enquanto realiza a tarefa? -> Muito
importan te, independente da idade do aluno.
- O olhar é sustentado? -> É normal que, durante uma aula, o aluno olhe para
outros lados, mas deve voltar o olhar para a atividade.
- Localiza o objeto solicitado quando é convidado a olhar pelo professor ou
instru tor?
- Consegue mudar o olhar de plano sem perder a atenção? -> Observar se a
criança leva o olhar e retorna à atividade ou ela perde o foco e busca outras coisas.
Novamente, todas as atividades servem para avaliação e também para as
intervenções necessárias para corrigir o que ainda não está bom. Ao perceber que o
aluno ou paci ente não executa adequadamente essas habilidades através das
simples tarefas, devemos proporcionar que ele aprenda a olhar para a tarefa e
sustente o olhar, utili zando objetos de interesses da criança, intercalando com
atividades de escrita.
HABILIDADE DE COMPREENDER E EXPRESSAR A LINGUAGEM
Esta segunda etapa de avaliação envolve a compreensão da linguagem e essa é uma
área de extrema importância, que é também observada ao suspeitar-se de que a
criança com TEA tenha uma deficiência intelectual associada.
Com relação à alfabetização, foram selecionadas questões que ao serem
observadas, auxiliam muito na prática da avaliação. São elas:
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
- Demonstra compreender o significado de pelo menos 10 palavras? ->
Indispensável na condução de um exercício, que aponte o que é necessário e
execute a tarefa solicitada.
- Nomeia objetos? -> Se for verbal. Se não for, que a criança pelo menos saiba
demonstrar apontando aquilo que ela precisa ou quer.
- Ouve histórias ou relatos por pelo menos 5 minutos? -> Sabemos que existem
muitos problemas de comportamento envolvidos no TEA e vários deles estão em
torno da dificuldade de atenção e da ansiedade. Crianças muito ansiosas, por
exemplo, demonstram esteriotipias, não têm foco. Então é necessário que a criança
que está se propondo a aprender a ler e escrever seja capaz de ouvir por pelo
menos 5 minutos. Em primeiro lugar, pelo fato da qualidade da atenção, pois caso a
criança não tenha essa capacidade, não haverá percepção que se sustente ou
memória que se concreti
ze. Em segundo lugar, se a criança não suporta ouvir um relato de cinco minutos,
pode significar que ela não suporta interação com o outro.
Uma sugestão de atividade que tem dado muito certo na prática é procurar
aumentar o tempo de concentração da criança utilizando música. Por exemplo,
proponha fazer uma atividade enquanto a música está tocando. No decorrer do
tempo, a duração da atividade pode aumentar, com a execução da mesma tarefa
enquanto a música toca duas vezes.
- Compreende ordens? -> Toda vez que se deseja fazer com que a criança se torne
mais compreensiva do que está no seu entorno e esteja mais inserida no contexto, a
aprendizagem da linguagem oral se dá sempre pelos verbos, pois substantivos são
altamente arbitrários, enquanto os verbos são ações que podem ser demonstradas.
Então, a criança com autismo consegue aprender melhor a função e aplicação da
linguagem quando começamos pelos verbos (risque, coma, pule, pinte).
- Expressa pensamentos e desejos? -> É necessário que o avaliador tenha muita
sensibilidade nesse caso, pois na maioria dos casos a forma de se expressar não é
usual, ou seja, não se dá de forma verbal, mas sim com gestos ou atitudes. Mais
ainda há casos de maior amadurecimento intelectual em que o aluno se expressa
falando sobre o gosta, o que deseja fazer, como resolveu ou resolverá alguma
situação.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Módulo 1 - Aula 2 – Etapa 2
Avaliação das competências e habilidades
que envolvem a leitura e a escrita
PERCEPÇÃO VISUAL E LOCALIZAÇÃO NO ESPAÇO
Sabemos que a criança precisa ter perpecção visual e auditiva bem desenvolvidas
para aprender a ler e escrever. Quando se trata em crianças com TEA, essa questão
é mais complicada, pois existe a possibilidade de hiper ou hipossensibilidade visual
e/ou auditiva, ou seja, a incapacidade deperceber diferenças ou mesmo ter aversão
à certos estímulos.
Nessa etapa do curso, estamos considerando que você conhece o seu aluno
suficiente mente para saber se ele possui essas características, se ele se incomoda
com foco de luz ou cores muito fortes, ou se ele é do tipo que não se dá conta de
detalhes. Além disso, a questão da localização no espaço, pois sempre
trabalharemos a leitura associ ada à escrita.
Existem crianças ou jovens com autismo que rejeitam a escrita, especialmente
aqueles que aprenderam a ler sozinhos. Nesse caso, podemos substituir a escrita
pela colagem de uma letra, a representação de um fonema, ou mesmo pela
tecnologia de um com putador, tablet ou qualquer outro equipamento que cause
um pouco mais de interes se nessa pessoa. O que não pode ser permitido é que a
leitura se dê sem a escrita.
Aí está a importância da localização do espaço: como escrever da esquerda para a
direita, o tamanho das letras, o número de linhas utilizadas - para tudo isso existem
técnicas. Porém, a princípio desejamos que a criança se localize dentro de uma folha
ou de uma página de livro, através da percepção visual.
- Percebe detalhes sem se fixar neles? -> Tanto podemos ter um aluno que passa
as páginas de uma revista sem nenhuma fixação, como podemos ter uma criança
que se interessa por determinado personagem que para em uma página mas foca a
atenção em um detalhe mínimo e desimportante. Ambas situações não são
saudáveis. O ideal é que a criança explore o espaço inteiro e tenha uma dimensão
do visual como um todo.
- Consegue montar quebra-cabeças mesmo que de poucas peças? -> O que
impor ta não é a habilidade de montar o quebra-cabeça mas sim se ela percebe a
questão do todo e das partes. Com essa atividade, podemos analisar se a criança
tem a capacidade de síntese, de juntar partes, habilidade esta que será cobrada no
futuro, quando solicitarmos que ela junte o fonema “b” com a letra “a”.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
- Completa imagens e/ou letras? -> Isso tem uma relação com a
percepção visual - habilidade que envolve a leitura - como também possui
uma relação importante com a teoria da coerência central. Se a criança vê
o pedaço de uma letra, pode não reconhe cer a letra completa, então
precisamos mostrar isso comparando as duas formas (a letra de forma
completa e incompleta).
- Faz exercícios de encaixe? -> Exercício importante para verificar a
habilidade de percepção visual. A criança precisa olhar para o tabuleiro ou
a superfície onde precisa encaixar as peças e escolher o local correto pela
semelhança.
- Percebe semelhanças e diferenças?
Após a conclusão dessa avaliação, na medida em que for constatado que
existe algu ma falha nessas questões apresentadas, devemos sempre
buscar fazer um trabalho de suplência, de maneira a compensar aquilo
que não é bem desenvolvido, até que a criança tenha eficiência nesses
tópicos.
HABILIDADE DE SIMBOLIZAR, MEMORIZAR E EVOCAR A INFORMAÇÃO
APRENDIDA
Essa é uma questão muito importante na aprendizagem de qualquer ser
humano, mas especialmente no TEA devemos observar e avaliar a
capacidade de simbolizar, memo rizar e evocar a informação aprendida.
Sabemos que uma das grandes dificuldades de uma criança autista é a
habilidade de simbolizar, pois a utilização de símbolos é alta mente
subjetiva. Como existe uma dificuldade muito grande na interação social,
consequentemente, a criança com TEA não se apropria dessa cultura.
Sabendo que existe uma falha no processo de imaginação na criança que
tem TEA, precisaremos avaliar o nível dessa fragilidade, bem como
procurar desenvolvê-la.
- O aluno consegue imaginar e apresenta condutas simbólicas nas
brincadeiras? -> Sabemos que a brincadeira é indispensável na vida de
uma criança e que é através do brincar que ela representa e constrói o
mundo e a realidade, então é essencial que trabalhemos bastante com a
teoria da mente, com a leitura das emoções e com a leitura facial.
Quando uma criança se interessa mais por uma caixa de papelão do que
por um brin quedo, é sinal de que existe uma falha na sua capacidade
lúdica e aí precisamos produ zir isso. Isso é muito importante, pois no
momento da alfabetização, precisamos deixar a imagem da “bola” e passar
para o fonema que inicia a palavra “bola”, o que depende de uma
capacidade de simbolização bastante intensa.
É necessário ainda observar se a criança apresenta conduta simbólica
durante a brin 12
Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
cadeira. Brincar que conversa com alguém com um telefone de brinquedo é
imaginar; pegar um objeto qualquer, como uma garrafa vazia, fazendo de conta que
esse objeto é um telefone, é algo muito mais complexo do que brincar com um
telefone. Isso significa que a criança está simbolizando, imaginando e colocando
algo dela ali, ou seja, é uma conduta simbólica.
Quando a criança começa a brincar com o “faz de conta”, temos boa parte do jogo
ganho!
- Apresenta memória de trabalho? -> Uma características de várias crianças com
TEA é uma capacidade incrível de memorização. Mas a memória de trabalho é
aquela em que ela registra e memoriza enquanto realiza um exercício.
- Consegue lembrar da atividade realizada no dia anterior? -> O mais importante
para garantir que a aprendizagem está realmente acontecendo é a evocação,
quando a criança consegue trazer lá de trás a informação aprendida para o
momento presente. Uma sugestão interessante seria iniciar uma sessão da mesma
forma que a anterior terminou, justamente para criar um elo e criar uma espécie de
memória.
Estimular a memória é muito importante, não somente com o copiar ou o decorar,
mas sim pela busca de criar um repertório dentro do sujeito, para que ele possa
construir novas aprendizagens.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Módulo 2 – Aula 1
Estudo de caso – Habilidades necessárias
ao processo de alfabetização
Neste módulo faremos um estudo de caso sobre os precursores de linguagem,
assun to tratado no módulo anterior, para verificar se estamos avaliando
corretamente e como estamos lidando com estas avaliações. Para isso, nesse
estudo, chamaremos a criança de Théo.
THÉO
Ao avaliar uma criança de 8 anos com TEA que frequenta o primeiro ano de uma
escola regular, encontramos o seguinte quadro:
1 – Théo olha nos olhos do seu interlocutor por 3 segundos, mas isso nunca ocorre
de forma espontânea – ele precisa ser convidado.
2 – Quando deseja algum objeto que está na mão de um adulto, ele tira o objeto
rapi damente e evita a interação.
Em primeiro lugar, precisamos pensar como foi a colocação do Théo na turma do
primeiro ano, visto que, de acordo com a legislação, de acordo com a sua idade,
deveria estar em uma turma de segundo ano. Sabemos que, nesse caso, houve
uma mudança de escola e a escola considerou o fato de que Théo faz aniversário
no meio do ano, por isso foi decidido mantê-lo nessa turma.
Théo só olha na direção solicitada se for convidado com o indicador do adulto que
conversa com ele. Não aponta e utiliza a mão do adulto como ferramenta, ou seja,
coloca a sua mão sobre a mão do adulto para pegar um objeto que está ao seu alcance.
Nesse caso, o ideal é inverter a posição das mãos, colocando a sua mão sobre a da
criança e pega o objeto para que ela perceba que tem condições de fazer isso. Esse
gesto demonstra a falta de maturidade do Théo em relação à independência e
autono mia.
Ao ter a sua atenção desafiada para o compartilhamento, olha em duas direções, mas
em seguida escolhe um único foco e fixa o olhar no objeto eleito.
Por exemplo, se você oferece ao Théo uma caneta e uma tesoura, ele olha
rapidamente para os dois e escolhe um. Se estivéssemos falando de dois
brinquedos ou dois objetos que lhe sejam interessantes, esperaríamos que Théo
alternasse o olhar e não esco lhesse um objeto fixando o olhar em um único ponto.
Nesse tipo de situação, a propos ta é que você inverta a posição dos objetos para
que a criança possa olhar para os dois
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Alfabetizaçãopara Autistas Professora Dayse Serra
pontos e aprender esse compartilhamento.
Ao entrar na sala, Théo segue uma espécie de ritual, passando pelos mesmos brinquedos
e atividades antes de aceitar um novo convite.
Se existe uma novidade em dia determinado, como um ensaio ou uma festinha, é
possível que ele rejeite essa rotina, pois segue sempre os mesmos passos e entra
em um nível de estresse muito grande quando é quebrado. Sendo assim, não
devemos estressar uma criança com uma quebra de rotina muito frequente, pois
eles necessi
tam de estabilidade.
Sabemos que quanto maior a inflexibilidade, mais grave é o caso e, em termos de
leitura escrita, maior será sua dificuldade de aprender e entender, por exemplo,
quem é o autor do texto, a subjetividade dos personagens, as metáforas, etc.
Frente a essa situação, uma boa sugestão é começar a quebrar a rotina alterando
gradativamente a sequência de atividades, substituindo a última, inicialmente,
depois a penúltima, e assim sucessivamente. Além disso, caso a criança já domine
uma ativi dade de vida autônoma como escovar os dentes – se ela sabe a função da
escova de dentes e sabe escová-los com independência -, pode-se utilizar uma outra
escova de dentes para fazer uma pintura. Por outro lado, se não existe essa
autonomia com relação ao objeto, não se deve utilizá-lo para outras atividades.
É interessante também fazer um trabalho de arte utilizando sucatas, por exemplo,
transformando um objeto em outro, pois dessa forma faz-se um convite à
imaginação e à flexibilidade, que são fundamentais no processo de
desenvolvimento.
Para Steinberg, a pessoa inteligente é aquela que resolve problemas, consegue se
relacionar socialmente e possui flexibilidade para se adaptar as mudanças. Então a
flexibilidade tem uma relação muito importante com a inteligência e com a
capacidade de absorver conteúdos e conhecimentos e cabe a nós desenvolver isso
na criança.
É possível iniciar um processo que envolva a leitura e escrita?
Com base na observação que fizemos, mesmo que esteja em uma turma em alfabeti
zação, Théo não conseguirá acompanhar esse processo nesse momento. O que espe
ramos agora é que ele seja feito um trabalho com todas as pendências e lacunas
exis tentes para que Théo possa chegar na fase de alfabetização. É necessário que
sejam
feitas adaptações curriculares que, como se pode perceber, exigem atividades de
educação infantil, onde se deve trabalhar a noção de tempo, as percepções, entre
outras.
Quais as demandas que precisam ser trabalhadas nesta etapa?
Temos como uma das primeiras demandas o uso do olhar e o tempo de duração.
Todo profissional que trabalha com crianças com TEA deve estar atento a este
tempo de du
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
ração, observando e cronometrando o tempo das atividades. 3 segundos
de olhar é muito pouco e esse olhar é sem qualidade, então a ideia é
tentar aumentar esse tem po. Todas as vezes que a criança mantiver um
tempo maior de interação visual, faça com que ela sinta que pode ser
recompensada por isso de alguma maneira, como fazer uma atividade que
ela gosta, ou pelo simples fato de perceber que nada de tão aversi vo
aconteceu.
Ainda há uma outra demanda importante que é a do movimento
antecipatório, o que Théo não possui, visto que pega o objeto
rapidamente da mão da pessoa e sai evitando a interação. Na sala de aula,
o tempo todo se entrega um livro, uma folha de exercícios, um pincel, e
quando a criança deseja, ela antecipa e demonstra com o gesto de exten
der a mão. Então o objetivo é encurtar o seu braço para que a criança
estique o dela.
Existe ainda o desafio da atenção conjunta, pois a criança precisa aprender
a olhar sem que você convide somente com o indicador e entender que
deve olhar para onde se está convidando somente com a utilização da fala
ou mesmo com o olhar do interlocu tor. Por isso, é necessário aumentar
este treino, utilizando lanternas e o seu próprio olhar, fazendo
movimentos com a cabeça e desenvolver o apontar da criança. Leve o
dedo da criança até o objeto desejado para que ela aprenda a finalidade.
Além disso, há a necessidade de desenvolvimento da atenção
compartilhada, que é a alternância de fazer escolhas, pois é isso que
sustentará no futuro a atenção e a capaci dade de dialogar.
Com base nesse contexto, não poderíamos começar hoje o trabalho de
alfabetização com o Théo sem antes reparar todas essas falhas e
prepará-lo para o movimento de perceber letras, fonemas e tudo mais que
esse processo exige.
Módulo 2 - Aula 2
Habilidades necessárias ao processo de
alfabetização
Existem muitos recursos disponíveis, porém nem sempre os utilizamos da
maneira mais favorável. O desenvolvimento de habilidades de uma criança
com TEA não está na sofisticação do material que utilizamos, mas sim no
que podemos e conseguimos fazer com eles – e é isso que fará toda a
diferença!
Nesta aula comentaremos sobre algumas atividades que foram vivenciadas
na prática. 16
Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES PARA A LEITURA: ATIVIDADES
PRÁTICAS DE INTERVENÇÃO
Na imagem abaixo podemos visualizar um brinquedo comum, construido artesanal
mente e que pode ser facilmente encontrado. Este brinquedo nos convida a pensar
em duas habilidades muito importantes para a leitura e a escrita: análise e síntese –
juntar e separar.
Sabemos que o fonema é a menor unidade da língua. Por isso existe a enorme
necessi dade de que a criança seja consciente da ideia do todo e suas partes.
Através de uma brincadeira como essa, trabalharemos a percepção, habilidade de
comunicação, a habilidade visoespacial, ou seja, todas as habilidades necessárias
para a criança apren der a ler.
Imaginando a situação de uma criança que ainda não consegue fazer essa
montagem, juntando essas cinco peças e fazer um todo, em primeiro lugar
entregamos à ela o quebra-cabeças montado e desmontamos retirando pedaço por
pedaço, conforme a imagem a seguir, chamando a atenção para cada peça com o
dedo indicador.
Existem casos de criança que, aos dois anos, montam quebra-cabeças com 48 peças
com perfeição. Isso pode ser resultado de uma memória muito poderosa, mas que
não é eficiente para os casos de aprendizagem, pois quando é feita a evocação da
atividade aprendida, ela falha. Nesses casos, pode-se voltar a uma atividade como
essa.
Após desmontar o brinquedo, peça para que a criança faça a montagem sozinha.
Desse modo, proporcionamos à criança o pensamento de “vai e volta”, para que no
futuro, por exemplo, o som do R com o A, vai fazer o RA, e o A com o R, vai fazer o
AR. Assim estamos preparando o terreno para depois trabalharmos com o todo e as
par
tes, com unidades menores, com situações em que uma letra ou um fonema troca
de posição, etc.
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Sabemos que uma das alterações de uma criança autista é exatamente na
percepção (hipo ou hipersenssibilidade), por isso é importante que se evite imagens
com muitas cores ou poluição visual.
Na imagem abaixo vemos um tipo de quebra-cabeça que não é adequado para uma
criança autista, pois o personagem aparece muito decorado, uma imagem infantiliza
da. Não significa que não se possa utilizar imagens infantis, afinal, estamos
trabalhan do com crianças. Mas seria muito interessante apresentarmos uma zebra
de verdade, para evitar certa confusão visual.
Em geral observamos, na prática, que as crianças montam o quebra-cabeças
anterior com muita facilidade, mas a da zebra não – apesar de ter quatro peças. Por
isso sabe mos que a dificuldade da criança com TEA em montar quebra-cabeças não
está no número de peças e sim na questão visual.
Ainda utilizando o quebra-cabeça da zebra como exemplo, vemos na imagem a
seguir que a situação ainda se agrava, pois existe no brinquedo um plano de fundo,
o que pode acabar provocando uma confusão ainda maior, visto que a imagem
original e a do fundo possuem cores e detalhes bem diferentes.
Esse tipo de brinquedo fariaum grande sucesso com crianças típicas, mas não com
crianças que possuem alterações nas percepções.
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Na imagem a seguir podemos ver um outro brinquedo simples e que pode ser
encon trado facilmente e são utilizadas como se fossem cubinhos de gelo. É muito
importante também utilizarmos objetos dessa natureza, como gelo ou mesmo
bolsas térmicas.
É muito interessante se pudermos, por exemplo, congelar alguns desses objetos e
colocar outros em uma panela com água quente e fazer uma sensação tátil com a
criança, colocando os dois ao mesmo tempo sobre a sua pele, fazendo com sinta a
diferença de temperatura.
O canal sensorial é uma porta aberta para a aprendizagem. Toda vez que
adquirimos aprendizado, isso se dá por meio das percepções, pelo visual, pelo
auditivo, pelo corpo, etc. Em geral, temos essa queixa da criança com autismo, que
muitas vezes possui aversão ao toque. Então, ao fazermos essa estimulação
sensorial, estamos também trabalhando para equilibrar essa questão da
sensibilidade, treinando ainda a criança para que seja mais tolerante a ambientes
com diferentes temperaturas.
DESENVOLVIMENTO DA ESCRITA ORTOGRÁFICA: ATIVIDADES PRÁTICAS
E INTERVENÇÕES
Não podemos pensar na leitura sem a escrita! Essas duas habilidades precisam cami
nhar juntas, pois precisamos da representação grafofonêmica para desenvolvermos
a consciência fonológica. Não adianta nada a criança saber ler muito bem mas não
ser capaz de transcrever aquilo que lê.
Na imagem a seguir, vemos um tabuleiro com letras de encaixe. Apesar de ser lindo,
colorido e um presente muito bacana para crianças que não tem alterações na
percep ção, não é adequado para trabalharmos com crianças com TEA.
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Utilizando este tabuleiro, com tantas texturas e cores diferentes, a criança teria
muita dificuldade na percepção do contorno. Por isso, não é o indicado para
trabalharmos com crianças autistas.
Uma questão que sempre surge é a questão de letra cursiva x letra de caixa alta. Às
vezes a criança aprende a escrever, mas utiliza somente letras maiúsculas e não
utiliza a letra cursiva, o que traz uma preocupação muito grande. Na verdade, todos
os esfor ços devem ser focados no ato de escrever, de conseguir representar o
pensamento de uma forma escrita, e não no tipo de letra que a criança utiliza.
Na imagem a seguir temos um exemplo de exercício para fazer a criança gostar de
escrever. Essa é uma fala recorrente dos pais, pois algumas crianças autistas tem
resistência à escrita. Por isso precisamos fazer com que o ato da escrita seja uma
atividade prazerosa e interessante para a criança.
A ideia da atividade é preencher os espaços em branco. Observe que estamos
utilizan do uma caneta bem grossa – tenha sempre preferência por objetos assim,
que propor cionem o movimento gradativo da “garra” para a “pinça”, pois este
movimento de pinça é muito sofisticado, principalmente para a criança autista que
tem dificuldades motoras.
Essa atividade ainda pode ser feita com a utilização de balões de aniversário, que
sejam resistentes e não estourem com facilidade. Depois, aos poucos vá
introduzindo a cartolina, ou uma folha A4, pois a criança já estará familizaridada
com esse tipo de caneta, já experimentou o prazer de escrever e quebrou a
resistência.
É interessante não ficar preso às letras nesse momento, mas sim aproveitar para
falar sobre as cores, qual o objeto que está sendo pintado, para que serve, etc.
Dessa forma se desenvolve, ao mesmo tempo, a linguagem, a relação visoespacial,
a capacidade de se comunicar e também a memória das brincadeiras.
Aqui está outra sugestão para trabalharmos, não somente com crianças, mas
também com adultos autistas que precisam superar a resistência à escrita:
utilizando o mesmo tipo de caneta para escrever em um espelho, conforme a
imagem a seguir.
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Nessa imagem, estamos trabalhando o plano horizontal, mas esse espelho também
pode estar preso em uma parede e, nesse caso, estaríamos trabalhando o plano
verti cal. Quando a criança tem dificuldade em iniciar em um plano vertical, coloque
o espelho na parede, depois utiliza um plano mais inclinado, com o espelho na
diagonal e depois colocá-lo deitado sobre uma superfície. O ato da escrita depende
também do uso do olhar, pois a criança terá que transcrever do plano vertical para
o horizontal. Se a criança tem essa dificuldade, é interessante fazer isso por etapas.
Essa atividade propicia ainda o desenvolvimento do uso do olhar, pois enquanto a
criança desenha, ela vê seu reflexo no espelho e também enxerga a pessoa que está
trabalhando ao lado dela.
Em um estágio mais avançado, em que estivermos trabalhando as letras com a
criança, podemos observar o exemplo demonstrado na imagem a seguir:
Sabemos que o uso de pontilhado não é adequado para o desenvolvimento da
criança com autismo. A Teoria da Coerência Central afirma que a criança com TEA
tem dificul dades de perceber o “todo” quando é partido.
Quando se dá uma linha pontilhada para a criança cobrir, com a intenção de que ela
aprenda a escrever a letra B, podemos obter como resultado justamente o que está
demonstrado nesta imagem.
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Por isso, o ideal seria já entregar a criança a letra completa e aí sim pedir que ela
cubra a letra com outra cor, seja com uma caneta, com tinta ou com os dedos,
conforme a imagem abaixo:
Dessa forma a criança entenderá com mais facilidade como é que se desenha essa
letra.
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Módulo 3 – Aula 1
A leitura precoce e uma análise crítica
dos métodos de alfabetização
Para chegarmos ao processo considerado adequado para a alfabetização de
crianças com TEA, precisamos conhecer um pouco do que se fala a respeito de cada
um destes métodos.
O PAPEL DA MÚSICA
Outra importante atividade prática que pode ser feita na escola e na área
terapêutica, é o trabalho com a música. Alguns médicos, inclusive, recomendam a
musicoterapia. A música, em geral, trabalha com rimas, então pode ajudar a criança
a entender rimas, a finalização e inicialização de palavras e também auxilia na
construção de uma prosódia bastante interessante. Então, ao trabalharmos com
música, estamos preparando a criança para entender a pontuação. Além disso, é
possível mostrar à criança como respirar na hora certa, o que fará com que, no
futuro, ela saiba utilizar a vírgula no lugar adequado.
RIMAS
As rimas têm uma importância muito grande para trabalhar a percepção auditiva e a
consciência fonológica. Ao trabalharmos dessa forma, podemos perceber que, algu
mas crianças com autismo não verbais e que vão se tornando verbais com o passar
do tempo, começam a falar pelo final das palavras. Então a rima ainda colabora
para a oralização da criança.
Também trabalha-se com a regularidade dos sons e da língua, ou seja, observando o
que se repete sempre da mesma forma, fazendo com que a criança desenvolva uma
audição para a escrita ortográfica.
Quando trabalhamos com rimas, em uma fase inicial da alfabetização, não se utiliza
a escrita, então utilizamos imagens e sons. A escrita aparece somente depois da
percep ção auditiva, ou seja, depois que tudo esteja bem organizado na cabeça da
criança.
ALITERAÇÃO
A aliteração é fundamental, pois quando começarmos a trabalhar com fonemas,
vamos perguntar à criança, por exemplo, “qual o desenho que começa com o som
A?”.
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Para responder essas questões, a criança precisa entender como começam e como
terminam as palavras.
PARA DESENVOLVER A TEORIA DA MENTE
O primeiro trabalho a ser feito é o desenvolvimento da teoria da mente. Na história
do autismo vemos vários tipos de abordagens, desde a psicanalítica até a
desenvolvimen tista, cada uma explicando o autismo de uma forma diferente, mas
nenhuma anula ou elimina a outra. A teoria da mentevem de uma abordagem
cognitivista e faz parte desse processo histórico da tentativa de explicar o que é o
autismo.
No nosso contexto, a teoria da mente é extremamente útil na alfabetização.
Sabemos que a criança com TEA tem incapacidades de perceber emoções e/ou
intenções. Muitas vezes vemos profissionais trabalhando com “bonequinhos” com
expressões, tentando fazer com que a criança reconheça essas emoções. Porém
essa é uma tarefa extremamente difícil, pois para chegar ao ponto de fazer esse
reconhecimento, a criança precisa ter uma capacidade de imaginação e simbolismo
muito grande, o que, na maioria das vezes, uma pessoa com autismo não tem.
O interessante nesses casos é que seja feito um trabalho, em um primeiro
momento, com filmagens dos pais e familiares, utilizando um tablet, por exemplo,
com recados direcionados à criança. Essa atividade vai servir tanto para regular o
comportamento, como também para preparar a criança para conseguir responder
questões de inter
pretação de texto (“o que o autor quis dizer em determinado parágrafo?”).
Depois de utilizar os vídeos, passamos a utilizar fotografias, depois vídeos de
crianças desconhecidas com diferentes expressões... No final, quando a criança
dominar essas habilidades, aí poderemos utilizar imagens simbólicas, pois dessa
forma terá maior facilidade em fazer esse reconhecimento.
O DESENVOLVIMENTO DA ESCRITA ORTOGRÁFICA – ATIVIDADES PRÁTICAS
E INTERVENÇÕES
- Trocar símbolos por letras: proponha uma atividade em que toda vez que existir
um “quadradinho verde” a criança tenha que substituí-lo por uma letra;
- Colar letras:fazer exercícios de colagem. No lugar de dar um desenho para colorir,
dê letras vazadas para a criança colorir, pois isso faz com que ela se familiarize com
aquela forma;
- Escrever em quadros brancos;
- Escrever no chão;
- Escrever em quadros mágicos.
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Módulo 3 – Aula 2
Habilidades necessárias para o processo
de alfabetização
O trabalho do desenvolvimento da escrita deve ser realizado com atividades
práticas. Muitos pais têm dúvidas se o filho que é não verbal pode aprender a ler e
a escrever, e ele pode aprender, sim. Pois, a escrita também pode ser vista como
uma forma de comunicação alternativa ampliada, sendo assim é bem possível que
a criança que tem dificuldade na fala e na verbalização, consiga escrever
adequadamente.
Destaca-se que é fundamental dar um pouco de valor ao desenho, uma vez que ele
é peça-chave no desenvolvimento da escrita. Infelizmente, às vezes o desenho da
crian ça com autismo é relativamente menosprezado, como se isso não fosse
importante. É muito comum que questões como a importância do comportamento,
das habilidades sociais, das atividades da vida autônoma e até da escolarização
sejam enfatizados e que o desenhom que é algo de extrema importância para que
depois a criança possa desenvolver a capacidade de escrever as letras seja em caixa
alta ou da forma que for.
Por isso, a seguir analisaremos alguns exemplos de trabalhos em desenho que
foram realizados com crianças.
Desenho 1: No desenho acima, é possível perceber que se trata de um desenho
muito Inicial. Ele foi feito por uma criança que apresenta autismo grave, nível 3 de
acordo com DSM-5 e que faz apenas uns rabiscos. É um sem tem muito significado.
Em casos desse tipo, a orientação é desenvolver essas habilidades de desenho e
poder fazer desse desenho algo frutífero para que no futuro a alfabetização possa
transcor rer bem. É importante ressaltar que quando se está no meio de uma
avaliação para verificar se a criança desenha bem ou não, não se deve intervir,
deixando a criança livre; agora, ao começar o processo de intervenção para
construir uma habilidade necessária que depois vai discorrer na escrita, aí é
imprescindível ter o cuidado de fazer um direcionamento a fim de dar forma a esse
desenho, bem como um significa do.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Desenho 2: se percebe que não existem formas geométricas perfeitas, mas a
criança foi ajudada a fazer o limite e, quando for preciso auxiliá-la, pode segurar na
mão ou fazer um exemplo para que ela possa copiar, caso tenha condição. Nesse
desenho acima, foi combinado com a criança para que ela colorisse somente dentro
do limite e a partir daí ela foi guiado passo a passo, com cada traço sendo
monitorado e recebendo dias. Assim, foi realizada uma intervenção de fato para
que ela construa a ideia de uma imagem, de um desenho e que a percepção dela se
estabilize dentro dessa possibilida
de.
Desenho 3: a ideia foi trabalhar a comparação de cores para que a criança aprenda
a fazer essa diferenciação, a trabalhar percepção através do desenho. No azul, a
criança ficou bastante livre e no vermelho ela foi direcionada.
Para chegar a esse resultado, a criança trabalhava trabalhava de um lado na folha e
eu trabalhava do outro lado, fazendo as mesmas coisas. Fiz um boneco de palitinho
mesmo azul e um vermelho. O azul saiu espontaneamente e o vermelho a criança
foi um pouco direcionada para fazer as pernas, os braços e o corpo, sendo que
depois ela tentou vazar um pouquinho para fazer os olhos e a boca. Ressalta-se que
fazer um rosto humano já foi um salto evolutivo muito importante.
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Desenho 4: já é uma outra criança com um autismo menos grave e que apresenta
uma característica do autismo no desenho. Todo mundo costuma pensar que
estereotipias podem ser notadas apenas no movimento de mãos ou então sonoros.
Nesse exemplo, temos um desenho considerado estereotipado, porque existe uma
forma que parece um carrinho e que se repete em várias situações, além de um
bonequinho que imita personagens de desenho animado.
Dessa forma, esse desenho que tem uma presença muito repetida é considerado
um desenho estereotipado, em que a criança desenha, mas não expressa, não
demonstra a imaginação, é algo que vai se repetindo como se fosse um
engessamento. Isso sigini fica que é uma criança que talvez tenha mais dificuldade
para aprender a ler do que aquela do desenho anterior, que consegue imitar e
consegue fazer diante de um modelo que você coloca e essa que foi um pouco mais
resistente quando recebeu a prospota para que fizesse outros desenhos precisa
desenvolver a flexibilidade para que aprenda a desenhar outras coisas.
Desenho 5: a mesma criança do desenho anterior começa a descobrir as diferenças
entre desenho e letra, manuseando letras, começando a escrever de uma maneira
aleatória, ou seja, não tem nada escrito, mas ela usa letras como se estivesse escre
vendo [uma carta. Obs: essa atividade foi feita após uma leitura de uma história
para ela e nós contávamos a legenda.
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Desenho 6: é a mesma criança do desenho estereotipado e podemos observar que
ela já melhorou na sua flexibilidade, no seu repertório através da busca pela
fisionomia de bichos, de um formato de sol. Então, já é um salto bastante
importante na flexibilidade, algo que é muito útil para nós porque se eu deixo que
um desenho, porque se deixar
mos que se repita o mesmo modelo, depois teremos dificuldade de apresentar para
a criança que as letras têm diferentes formas, correndo o risco de que ela se fixe
em um determinado modelo de letra.
Desenho 7: já se nota um ganho maravilhoso, é a mesma criança. Ela estava
fazendo uma história e como gostava muito de um jogar Mario Bros no videogame
e também estávamos na época da Copa, essas palavras ficaram mais claras e ela
memorizou e escreveu na folha, mesmo sem conhecer essas palavras de fato.
Assim, ela aumentou o repertório e a capacidade de imaginação e isso é
fundamental no processo de leitura e escrita .
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Desenho 8: dá para perceber o ápice do nosso trabalho com a mesma criança dos
desenhos estereotipados, a qual conseguiu fazer alguma coisa de maneira
autônoma. Assim, somem os monstrinhos e a fixação sobre personagense nós
contamos uma história e ele faz uma representação com muitos detalhes. Esse
desenho é uma rique
za e celebra né todo o desenvolvimento de um processo, mas é claro que para
chegar a esse resultado, nós desenhamos muitas vezes quase toda vez que nos
encontráva mos.
Desse modo, é inquestionável a importância de separar um momento para isso e às
vezes na escola nós vulgarizamos essa atividade ou, então, deixamos a criança fazer
quando ela não tem nada de tão importante para realizar, usando o desenho
apenas como recreação. No exemplo acima, ficou claro o coroamento do desenho
infantil dentro do TEA.
Módulo 3 – Aula 3
Pseudoleitura e hiperlexaia - Atitudes
pedagógicas diante desses comportamentos
O QUE É A HIPERLEXIA?
A hiperlexia se dá quando a criança tem um interesse precoce pelo alfabeto e pela
leitura e ocorre de uma forma independente, aos 5 anos de idade, sem a orientação
de um adulto. Em geral, essa criança domina um vocabulário sofisticado mas não
conse gue entender o significado das pelavras que lê ou pronuncia, ou seja, não tem
interpre tação.
Como “leitura” entendemos a compreensão, que se dá na precisão (quando a
criança entende fonemas e letras que compõe as sílabas e palavras) e na fluência,
ou seja, o ritmo da leitura permite que a criança estenda o que lê. Já a
“pseudoleitura” não ultra passa a decodificação.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Dentro de um processo de alfabetização legítimo, entendemos que a criança passa
por três etapas muito importantes: decodificação, compreensão do texto e
interpretação. Na fase da compreensão, dentro do nosso contexto, nos referimos à
situações em que a criança pode destacar situações diretamente no texto. Por
exemplo, na frase “Ber
nardo brincou com João na pracinha”, a criança deve ser capaz de responder “Com
quem Bernardo brincou?” e “Onde Bernardo Brincou?”. Já o estágio de interpretação
é um processo mais sofisticado, pois a criança deve destacar situações que não é
apresentado de forma objetiva, sendo capaz de identificar emoções, sensações,
colocando-se no lugar do autor ou das personagens.
Portanto, a pseudoleitura é o processo em que a criança decodifica mas não possui
a capacidade de interpretar o que está lendo.
Entendemos que uma criança é hiperléxica de fato, quando aprende a ler em uma
faixa etária diferente daquela que se espera (no Brasil, por volta de 6 ou 7 anos), e
sem a orientação de um instrutor.
POR QUE A HIPERLEXIA OCORRE NO TEA?
Porque na criança com TEA a memória, às vezes, tem um potencial muito grande,
mas não é uma memória de qualidade, ou seja, é um grande banco de dados, onde
se registra informações que não podem ser processadas. A criança memoriza um
grande número de palavras mas não faz a relação, por exemplo, da sílaba MA de
MACACO com a sílaba MA de MALA.
A hiperlexia ocorre também pelo fato de que a criança com TEA possui dificuldade
na interação social, o que faz com que ela aprenda de forma muito autônoma.
Outra fato que faz com que a hiperlexia se dê é a alteração nas percepções, como
discutimos em aulas anteriores.
A HIPERLEXIA COMO UM PROBLEMA
Ao falarmos de autismo, precisamos entender que este é um caso diferente
daqueles em que há altas habilidades ou superdotação, em que a criança também
aprende de forma autônoma, mas possui a habilidade de interpretação. Por isso a
hiperlexia é um problema tendo em vista que, no início da infância quando ocorre a
leitura precoce, há confusões com relação ao diagnóstico.
Ao percebemos uma criança considerada um “pequeno gênio” que lê sozinha, que
possui pouco interesse por atividades infantis, pode ser equivocadamente
classificada como alguém que possui altas habilidades e ter ignoradas as falhas
recorrentes do TEA. Outra dificuldade comum é que a criança, provavelmente, não
terá imaginação e
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
capacidade de interpretar; pode ter um vocabulário extremamente sofisticado,
inclusive na fala, mas utilizar palavras que ela mesma não domina e desconhece o
significado.
ESTRATÉGIAS PARA REVERTER A HIPERLEXIA
A primeira coisa que costumamos fazer é não incentivar o prosseguimento dessa
leitura. Caso isso se transforme em uma espécie de compulsão e a criança queira ler
absolutamente tudo que está ao seu alcance, o que devemos fazer é contextualizar,
utilizando o objeto de leitura de forma generalizada.
Outra estratégia é fazer com que a criança desenhe aquilo que está supostamente
lendo, para dar início a uma representação gráfica, visto que a leitura sem a escrita é
um outro problema causado pela hiperlexia.
É importante ainda é incentivar mais a imaginação e a brincadeira, transformando
sucata em brinquedos, brincar com letras, inibindo um pouco a quantidade de livros
e revistas que está à mostra e dando preferência à livros que possuam imagens
mais compatíveis à faixa etária da criança.
Se a criança rejeitar todas essas estratégias, será necessário seguir o passo a passo
do método fônico, que estudaremos no próximo módulo, refazendo caminhos para
garantir a representação da escrita, a representação grafofonêmica e também a
capa cidade de interpretação.
De certa forma, em casos de hiperlexia, uma das principais estratégias é justamente
inibir a leitura, o que acaba fazendo com que muitos pais se preocupem que a
criança perca o interesse pela leitura ou pela escola. Porém, se soubermos ditar o
caminho adequado, isso não ocorrerá de forma alguma.
Módulo 3 – Aula 4
Causas do Sucesso e insucesso dos
processos de alfabetização
A situação no Brasil é extremamente séria no que diz respeito ao fracasso escolar no
processo de alfabetização. Nós temos índices assustadores de fracasso de crianças
típicas que não conseguem aprender a ler e que muitas vezes não conseguem
dominar o processo de leitura e de escrita e vinte trinta anos atrás isso não ocorria,
então isso acaba nos levando a um questionamento de porque existe essa
dificuldade na alfabeti
zação das crianças nos dias de hoje?
31
Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
Um outro problema também é que toda criança que não consegue
aprender a ler e escrever, em geral ela é encaminhada para o consultório
com suspeita de dislexia e assim acabamos tendo muitos diagnósticos
com falso positivo, ou seja, crianças que muitas vezes são consideradas
disléxicas e passam por terapias de fonoaudiologia e psicopedagogia por
conta de uma suposta dislexia. E quando vamos avaliar esse histórico de
como a criança recebeu o diagnóstico da hiperlexia, de como ela aprendeu
e ler e de quais são as características que ela apresenta hoje, nós
chegamos a conclu
são de que houve um diagnóstico falso positivo e que toda a origem do
problema estava no método foi escolhido para a criança ser alfabetizada.
Esse é um problema sério, porque normalmente o problema é buscado na
criança e não no método escola utiliza.
OS TIPOS DE MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO
Nós temos dois tipos de métodos de alfabetização que depois vão se
classificar em processos, esses métodos são classificados de acordo com o
processamento psicológi co da criança. Assim, nós aprendemos através de
duas formas de processamento psicológico: por análise ou por síntese.
MÉTODOS ANALÍTICOS
São considerados métodos analíticos aqueles que partem de um todo para
uma unidade menor. E são eles: psicolinguístico, natural, sentenciação,
palavração.
Exemplo do método psicolinguístico/natural: Tal método é considerado
psicolin guístico, porque supostamente em uma situação de sala de aula, a
professora orienta ria a turma e a turma escolheria essa frase de uma
situação real. Então, suponhamos que o aluno, chamado Beto, chegou
atrasado na sala de aula e com um picolé na mão, a professora aproveita
essa oportunidade de forma muita perspicaz e vai para o qua dro e escreve
essa frase, já que os alunos estarão com a atenção voltada para este fato.
Nesse tipo de situação, o papel do professor é o de trabalhar bastante o
reconheci mento dessas palavras através de exercíciose, após ter certeza,
que as crianças já reconhecem as palavras, é necessário partir para uma
outra etapa, conforme exemplo abaixo.
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Nessa etapa, a professora deve escolher uma palavra para poder apresentar as
famíli as silábicas de cada palavra e, posteriormente, pegar essas sílabas e formar
novas palavras, a fim de ampliar o vocabulário da criança.
Destaca-se que esse método não é indicado para ser utilizado com crianças que têm
autismo, porque a criança trabalharia pela via da memória e não pelo significado, ou
seja, ela memorizaria essa silabação e não conseguiria reconhecer essa mesma
sílaba na maioria dos casos.
No exemplo acima, deve ser realizado o mesmo trabalho silábico, exercícios para
reconhecimento e, para finalizar, a formação de novas palavras. Ressalta-se que
quando as crianças se encontram em um estágio já avançado, formando palavras, o
que se espera desse processo todo é a ampliação de vocabulário, sempre
procurando avaliar a aprendizagem através do ditado e se tudo estiver caminhando
conforme o esperado, significa que está correto, mas dentro de um processo de
memorização, o que não nos atende no caso do autismo, pois o que se espera no
TEA é justamente fugir disso.
Exemplo do método de sentenciação:
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Esse método também trabalha com análise, visto que sai do todo para a parte. Ao
ver a imagem acima você deve estar se perguntando qual é a diferença entre o
método de sentenciação e o método psicolinguístico. No psicolinguístico,
obrigatoriamente a frase é proveniente de uma situação real, de algo que
aconteceu na sala de aula; na sentenciação, a frase a escolhida de acordo com os
interesses do professor. Neste caso, a intenção foi trazer para a criança uma palavra
que tivesse duas sílabas através de uma música que chamasse a atenção dela; uma
palavra que também tivesse encon
tro vocálico e que ao mesmo tempo tivesse uma palavra com "ão", um monossílabo
com acento, para que se possa trabalhar um conceito gramatical. Sendo assim, essa
escolha foi intencional, para exercitar todos esses dados que envolvem a língua
portu guesa.
Para trabalhar esse tema com uma criança típica, a oração deve ser dividida para
que se possa tecer algumas explicações sobre cada uma dessas palavras e também
para realizar exercícios para garantir a memorização. Agora, no caso de uma
criança com autismo, esse trabalho seria de alta complexidade, pois são vários
conceitos ao mesmo tempo e também levaria a memorização.
Na sequência, vem a mesma etapa do método psicolinguístico, que consiste na
separa ção das famílias silábicas e na formação de novas palavras.
Exemplo do método de palavração:
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Nesse exemplo, foi escolhida a palavra sapato. O método de palavração envolve as
mesmas etapas do método psicolinguístico e de sentenciação, com a diferença de
que o processo é começado por meio de uma palavra e não de uma sentença,
sendo que é importante lançar duas ou três palavras por vez para a criança poder
fazer compara
ção, ressaltando que deve ser palavras isoladas. Todos os métodos de análise
devem usar o ditado como forma de avaliação, pois é um instrumento
imprescindível no processo de alfabetização, destacando a relevância de fazer uso
também do ditado construtivo (brincar com as palavras) a fim de construir uma
escrita de qualidade, para que a criança possa aprender através do treino as
diferenças entra cada palavra.
MÉTODOS SINTÉTICOS
Os métodos sintéticos são utilizados para alfabetização de crianças com TEA, sendo
eles: alfabético; silabação; fônico. Esses métodos são denominados sintéticos por
que parte é uma parte menor, como a letra, a sílaba e o fonema para formar o todo
(palavra e sílaba).
Exemplo do método alfabético: É o método tradicional, em que é apresentado o
alfabeto e o nome das letras.
Exemplo do método de silabação: As famílias silábicas são apresentadas
diretamen te, para depois formar palavras e aumentar o repertório, também pelo
viés da memó ria.
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Exemplo do método fônico: O alfabeto é apresentado de uma maneira bastante
singular, sem falar os nomes das letras, mas sim os seus sons.
Módulo 3 – Aula 5
A importância da consciência fonológica
no processo de alfabetização
Durante o processo de leitura, existem áreas do cérebro que são ativadas e que são
responsáveis pelo processo de leitura e escrita. O método fônico se afina muito bem
com essa neurobiologia da aprendizagem e essa é uma das principais razões de se
adotar este método.
Além disso, na língua portuguesa há sonoridades que permitem a utilização do som
para alfabetizar. Nós escrevemos e lemos da forma que falamos, mas o som
respeita a origem e a forma como a língua portuguesa é estruturada. Por exemplo,
quando dizemos para uma criança típica que M + A = MA, ela entende, mas uma
criança autista vai entender que M + A = “emeá”. E aí está a importância de
tratarmos o som das letras.
Entendemos que a criança lê através de um processo chamado consciência
fonológica, através do qual a criança entende que existe um som que pode ser
representado por um grafema, que é a letra. Quando a criança adquire a
capacidade de transformar um som em uma letra, depois em sílabas, depois em
palavras, significa que ela adquiriu a consciência fonológica.
A AQUISIÇÃO DA LEITURA E DA ESCRITA
O processo de leitura e escrita tem um caminho e ao falarmos nisso, podemos perce
ber ainda mais claramente a coerência em todo percurso que fizemos até agora e o
porquê de nos preocuparmos com cada uma das etapas que antecedem a leitura e
a escrita de uma criança que possui autismo.
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- Leitura Logográfica: Em um primeiro momento, quando a criança está um pouco
distante da leitura propriamente dita, ela fará uma leitura logográfica, o que significa
que ela “lê” imagens.
- Escrita Logográfica: Esse é o momento em que a criança faz diversos desenhos e
diz que escreveu uma carta. A criança ainda não sabe a diferença entre imagens,
letras e números e entende como se tudo fosse a mesma coisa.
- Escrita Alfabética: Quando a criança descobre que as letras existe e que é
diferente dos desenhos e dos números, passando a perceber que existe uma
unidade, que é a letra, e começa a escrever de maneira indiscriminada.
- Leitura Alfabética sem compreensão: Quando a criança reconhece as letras e
brinca, faz de conta que está lendo.
- Leitura Alfabética com compreensão: É quando a criança já consegue entender o
que está lendo.
- Leitura Ortográfica: Nesse momento, a criança lê e interpreta.
- Escrita Ortográfica: A criança consegue representar graficamente aquilo que
acabou de ler, já possui um domínio melhor da ortografia.
Esse caminho acontece tanto com as crianças neurotípicas, quanto com as crianças
autistas.
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Módulo 4 - Aula 1
Programa de Alfabetização para Alunos com
TEA: As etapas do processo de alfabetização
Apresentação geral do programa
Nesta aula veremos as etapas do processo de alfabetização e uma apresentação
geral do programa:
- Exercícios com música e rimas: A música e a rima ajudam na prosódia e na
pontua ção. Os elementos da música, como ritmo e tempo, vão ajudar a criança a
identificar o tipo de pontuação (quando é interrogativa, exclamativa) e a ideia da
rima de que pala vras diferentes podem terminar do mesmo jeito, ajuda a criança a
generalizar.
- Reconhecimento de sons com imagens;
- Reconhecimento do som associado à grafia da letra;
- Reconhecimento do som inicial por diferenciação.
Na imagem acima temos um exemplo de exercício inicial, que é feito depois do
traba lho feito com música e rima. As imagens podem ser apresentadas de
diferentes manei ras, como em cartazes, em folhas ou em uma apresentação de
slides, preferencialmen te em cores, para ajudar a criança a diferenciar os objetos.A
criança pode escolher os
objetos pintando, circulando ou simplesmente apontando a resposta certa.
Observe que não há nesse momento os nomes dos objetos escritos. Isso porque o
que nos interessa agora é a consciência e a percepção auditiva da criança, a
capacidade de associar o som ao desenho.
Em uma próxima etapa, fazemos os seguintes trabalhos:
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- Apresentação das vogais: Em geral, acontece em todos os métodos. A forma de
apresentar é que deve ser diferente.
É muito importante ressaltar que somente podemos passar para a etapa seguinte
quando tivermos certeza de que a etapa anterior foi vencida com sucesso. Do contrá
rio, a criança pode apenas memorizar e não interiorizar em termos de
aprendizagem.
Também é importante não nos apegarmos a sequências de repetição, como “AEIOU”
que levem a criança a apenas decorar.
Observe na imagem acima que são apresentadas duas vogais. O motivo de apresen
tarmos dessa forma é porque a criança aprende melhor por discriminação e por
com paração.
Às vezes o terapeuta ou o professor pensa que começando pelas letras do nome da
criança pode facilitar o processo, mas não é assim que ocorre. O ideal é que comece
mos de fato pelas vogais, pois são os primeiros sons que a criança emite - quando
nos referimos à neurobiologia da aprendizagem, da leitura e da escrita, esse é um
dos aspectos.
- Apresentação dos encontros vocálicos: Não é necessário apresentar todos os
encontros vocálicos. O ideal é apresenta-los de forma isolada e não dentro de uma
palavra, mas de preferência que já signifique uma monossílaba.
Com o tempo, a criança terá a aprendizagem por dedução e generalização. Em tudo
que fazemos com crianças com TEA, precisamos ter uma preocupação com a
generali zação, ou seja, a capacidade de compreender que um encontro vocálico
pode estar presente em diferentes palavras e situações. E o mesmo ocorre para as
consoantes.
- Apresentação das consoantes agrupadas: Devem ser apresentadas de uma
forma específica que estudaremos nos módulos seguintes.
- Apresentação dos dígrafos;
- Apresentação das dificuldades ortográficas.
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Módulo 4 – Aula 2
Apresentação das vogais – Procedimentos do alfabe
tizados e atividades
Na aula anterior vimos exemplos de atividades relacionadas a rimas, às terminações
das palavras. Agora, vamos começar a focar estes exercícios nos fonemas apresenta
dos. Nessa primeira atividade, temos o som relacionado à imagem:
# Evite sempre dar a crianças com TEA comandos como marque, circule, sublinhe,
pinte... Apenas pergunte “Quais?”.
# Pronuncie as palavras de forma vagarosa e enfática, para que a criança identifique
o som.
# Fale direcionando a boca para os olhos da criança, depois abaixe a cabeça para
que ela repita olhando nos seus olhos.
# Apresente à criança mais de um exercício, para que a criança possa entender qual
é o som.
# Repita o exercício até que você tenha certeza de que a criança esteja identificando
corretamente o som inicial das palavras.
Depois que a criança dominar o som associado à gravura, apresente a ela a grafia
da letra sem o apoio da imagem, conforme a imagem a seguir:
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Em uma próxima etapa, apresente à criança a gravura acompanhada da grafia,
porém faltando a letra inicial. Pergunte à ela “Qual é o som que falta para
completar?”. Observe a imagem a seguir.
Quando for o caso de uma criança mais comprometida, com um pouco mais de
dificul dades, tenha em mãos dois cartões, por exemplo, um com a letra A e outra
com a letra O e peça para que ela escolha um dos cartões para colar ou então que
ela escreva.
Após todas estas etapas vencidas, apresente à criança a segunda vogal escolhida
anteriormente e repita os mesmos passos feitos com o som do A, conforme as ima
gens a seguir.
Depois destas atividades, para ter certeza de que a criança aprendeu, realize
primeiro um ditado com apoio de uma imagem: mostre um desenho e peça para
que a criança escreva a letra correspondente ao som. Após, faça outro ditado,
porém sem a utiliza ção de imagens de apoio.
Se a criança acerta, podemos passar para a próxima etapa e apresentar as outras
vogais: E, I e U.
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Módulo 4 – Aula 3
Apresentação dos encontros vocálicos
Ao apresentarmos os encontros vocálicos, partimos do princípio de que a criança já
domina completamente todas as vogais.
Não existe uma ordem de apresentação dos encontros vocálicos – é interessante
que você observe e utilize-os de acordo com a situação. Para exemplificar,
escolhemos AI e EU, com o cuidado de escolher encontros vocálicos que tivessem
letras diferentes para que possamos utilizar 4 vogais e também porque estes
encontros facilitam na repre
sentação gráfica.
Como a criança já domina o som e a letra, nesta etapa já podemos apresentar a
figura com a grafia. Na imagem abaixo, podemos ver a representação de uma
criança com dor.
A partir do momento em que você conseguir mostrar essa imagem e a criança ter a
capacidade de escrever ou apontar que tem a habilidade de reconhecer essa
sensação, já pode mostrar outras ideias.
Na imagem acima, vemos a representação de “EU”. Sabemos que um dos problemas
que permeiam o TEA é a ausência da identidade: muitas crianças autistas não se
refe rem a si mesmos na primeira pessoa, mas sim na terceira. Aproveitando a
oportunida de de trabalhar essa noção de identidade, temos utilizado o “EU” nesse
momento.
Nesse caso, podemos utilizar um retrato da criança, ou mesmo uma foto sua, e
fazer com que ela diga quem é esse EU.
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Somente teremos certeza de que podemos seguir a aprendizagem da criança,
quando mostramos a imagem e ela aponta ou escreve o encontro vocálico correto.
Evite situa ções de “completamento”, onde ela precise completar com o U para fazer
o EU, pois nessa etapa ela não vai compreender.
Precisamos mostrar, graficamente, a junção das letras. Faça isso com um vídeo, uma
animação, ou então com cartões colados em palitinhos e depois apresente as duas
vogais juntas. Dessa forma, a criança é capaz de perceber que as duas vogais
trabalha das anteriormente agora estão juntas e formam um novo som. Se não
trabalharmos bem essa junção, pode ficar a ideia de que o AI é uma terceira coisa e
não duas letras que se unem para um novo contexto.
Em uma próxima etapa, caso se verifique eu a criança aprendeu, peça à criança que
cubra as letras estudadas. Até aqui ainda é admissível que a criança ainda não esteja
escrevendo, mas não podemos passar para as consoantes sem o domínio da escrita
adequadamente.
Aí podemos solicitar que a criança faça um exercício de reconhecimento e diferencia
ção. O caminho que fizemos foi: imagem com som e presença das letras, encontros
vocálicos sem a imagem e agora vamos utilizar a imagem sem a representação das
letras. Nesse momento, o interesse é que a criança escreva o que aprendeu, colando
as letras, apontando em cartões ou mesmo escrevendo.
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Alfabetização para Autistas Professora Dayse Serra
A última etapa deste processo onde apresentamos três encontros vocálicos é
verificar se é possível prosseguir. Faça um ditado, sem o apoio visual das figuras,
somente com uma folha em branco, peça para a criança transcrever os sons dos
encontros vocálicos que você disser.
Lembre-se que cada uma dessas etapas tendem a demandar um tempo
considerável, por isso é preciso ter paciência, respeitando o tempo de
aprendizagem da criança. Somente passe para a próxima etapa se a anterior estiver
vencida.
Módulo 4 – Aula 4
Apresentação dos encontros vocálicos - Parte 2
Nesta aula vamos observar o que costumamos propor como uma segunda etapa de
apresentação de encontros vocálicos.
Observe que, nesse momento, temos o cuidado de escolher encontros vocálicos que
tem uma vogal que se repete. Como podemos ver na imagem abaixo, a letra I se
repete nos três encontros:

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