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Aula PEC III Friedman Lawson Arida

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Metodologia na Economia Contemporânea – Friedman (1953) e Lawson (1997) 
Prof. Emmanoel Boff
10.04.2012
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Milton Friedman (1912-2006); prêmio Nobel em 1976
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
As aulas anteriores focaram principalmente no desenvolvimento da metodologia nas ciências naturais.
No entanto, como vimos, os princípios (e problemas) metodológicos elaborados por filósofos da ciência acabam rebatendo na economia...
Lembre, p. ex., de como a sociedade de econometria foi fundada bem no auge no positivismo lógico, em 1931.
É claro aí que a econometria foi influenciada pela visão de mundo lógico positivista.
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
Como vimos, a própria metodologia da economia esteve sujeita a vários problemas, entre outros motivos porque adotou uma postura bem lógico positivista.
Ou seja, os debates Keynes-Tinbergen sobre a aplicabilidade da econometria, a crítica de Haavelmo sobre a influência dos fatores pontenciais e efetivos nos modelos e a discussão de Koopmans contra Burns e Mitchell com relação à medição de dados econômicos sem teoria atestam para estes problemas. 
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
Para tentar dar conta desta situação, o norte-americano e prêmio Nobel Milton Friedman elaborou um artigo no meio dos anos 1950 que, até hoje, funciona como padrão da metodologia econômica. 
O artigo chamava-se “A Metodologia da Economia Positiva” – por aí já se vê que Friedman possui influências dos positivistas lógicos.
Contudo, ele também deve fugir dos problemas associados com o positivismo lógico. Como ele pode fazer isso? 
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
Em primeiro lugar, Friedman separa o que é economia positiva (que trata daquilo que é de fato) de economia normativa (que trata daquilo que deve ser).
Para Friedman, somente a economia positiva pode ser considerada uma ciência objetiva, livre de quaisquer valores. 
Para Friedman, o papel da economia positiva é de capturar regularidades empíricas para fazer previsões adequadas. 
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
Na sua visão as teorias científicas são compostas de: 
1. Uma linguagem (formada de sentenças sintéticas a posteriori e analíticas a priori, parecido com os positivistas lógicos); e
2. Hipóteses substantivas, que nos dão a capacidade de previsão da teoria em questão. 
Além disso, as teorias científicas devem ser simples e fecundas. 
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
Por teorias simples, Friedman entende que elas precisam de poucas evidências facutais para serem elaboradas;
Por teorias fecundas, Friedman entende que as poucas evidências factuais usadas devem ser capazes de gerar o maior número possível de previsões. 
Daí, tiramos que as hipóteses que usamos devem ser irrealistas. 
Mas atenção: isto não quer dizer que a teoria não deva fazer previsões realistas sobre o mundo econômico!
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
Ou seja, pouco importa se os pressupostos que fazemos sobre os indivíduos na economia são irrealistas.
Se, com estes pressupostos simples, formos capazes de fazer boas previsões, então a teoria é considerada boa. 
Lembre-se que, quando a visão adquirida de ciência não conseguiu acomodar a tese da simetria, alguns pesquisadores partiram para o instrumentalismo (enquanto outros foram para o confirmacionismo). 
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Milton Friedman e a Metodologia da Economia Positiva (MEP) - 1953
Uma das principais interpretações da MEP de Friedman, hoje, é seu caráter instrumental.
Ou seja, pelo fato de ele usar hipóteses claramente irrealistas, a teoria não serviria para explicar a realidade econômica.
Antes disso, a teoria econômica positiva seria um instrumento para que os economistas conseguissem fazer previsões sobre os fenômenos econômicos. 
Contudo, não é o caso de Friedman desprezar explicações sobre os fenômenos econômicos.
Veja no quadro como, na abordagem de Friedman, os fenômenos econômicos podem também ser explicados (e não só previstos). 
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As Críticas a Friedman
Bem, a ênfase que Friedman colocou na capacidade de prever os fenômenos econômicos deixou alguns com a ideia de que a explicação dos mecanismos causais reais da economia continuavam sem explicação. 
Na verdade, a própria falha de muitos modelos econométricos em fazerem previsões (o que rende várias piadas sobre economistas...) pode dar a ideia de que devemos procurar não apenas regularidades empíricas, mas mecanismos causais reais atrás dos fenômenos econômicos. 
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
Visando dar conta tanto das falhas dos modelos econométricos quanto do que entendia por falta de explicações causais dos fenômenos econômicos, o inglês Tony Lawson vai apontar que os modelos que se utilizam do método N-D normalmente esquecem que possuem uma ontologia atrás deles. 
Mas o que é mesmo ontologia? 
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
Dá pra dizer que “ontologia é o estudo do ser”. Tá certo...mas o que isto significa concretamente? 
Nas aulas anteriores demos o exemplo concreto com uma cadeira.
Se nós formos 100% empiristas, vamos definir a cadeira (ou seja, dizer o que ela é) pelas propriedades empíricas que ela possui: altura, comprimento, espessura, densidade média, massa etc. 
O problema é que podemos montar um objeto diferente de uma cadeira com a mesma altura, comprimento, espessura, densidade média, massa etc...
Logo, a essência da cadeira (i.e., sua “cadeiridade”) não se reduz ao empírico. 
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
Também podemos tentar definir a cadeira (ou dizer o que ela é) pela sua função: servir de assento. 
Mas, como vimos, o chão, uma mesa ou um meio-fio podem também servir de assento.
Ora, o chão, uma mesa e um meio-fio não podem ser definidos como cadeiras... 
Assim, a essência da cadeira (de novo, sua “cadeiridade”) também não se reduz à sua função. 
Agora estamos chegando numa explicação concreta do que é ontologia.
Ontologia é o estudo do que faz as coisas serem exatamente o que elas são: a cadeira ser cadeira, p. ex. (e não apenas um amontoado de ferro, madeira, parafusos etc).
Podemos também dizer que a ontologia estuda a essência das coisas (ou entes, na linguagem da filosofia) que aparecem para nossos sentidos. 
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
Ou seja, a ontologia busca captar a essência das coisas, aquilo que está atrás do modo como as coisas aparecem para nossos sentidos. 
Isto pode ser importante porque, afinal, há coisas que parecem ser uma coisa mas não são.
P. ex., parece que o Sol gira em torno da Terra...mas, na essência, isto é só um modo de falar, e não corresponde à verdade. 
Do mesmo modo, parece que a Lua é mais ou menos do mesmo tamanho do Sol...o que também não corresponde à verdade. 
Parece que um mágico pode fazer sumir um objeto, mas isto na verdade também é só um truque...
Algum outro exemplo? 
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
Esta pode ser a bronca de Lawson contra os modelos de tipo positivista inspirados em Friedman: eles captam apenas o modo como as coisas aparecem para nós (seu lado empírico), mas não a sua essência!
Ou seja, empiricamente podemos, p. ex., verificar um trade-off entre inflação e desemprego...mas qual é a essência deste fenômeno? Modelos exclusivamente empíricos não nos dizem isto. 
Isto não quer dizer que o empírico seja falso: quer dizer apenas que ele é um domínio ontológico específico da realidade, que não contém necessariamente a essência dela. 
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
É por isso que Lawson, inspirado no filósofo realista Roy Bhaskar (1944
– hoje), vai entender que a realidade possui não só o domínio ontológico empírico (que é, segundo Lawson, o que os positivistas olham exclusivamente), mas outros dois domínios: o efetivo e o real. 
O domínio real é composto pelas leis e mecanismos causais gerais;
Estas leis e mecanismos causais gerais produzem diversos efeitos. 
P. ex., as leis da física produzem explosões nas galáxias.
Estes efeitos constituem o domínio ontológico efetivo da realidade.
Por fim, entre todos os efeitos produzidos pelo domínio ontológico real, alguns podem ser captados pelos nossos sentidos e nossos aparelhos científicos: este constitui o domínio ontológico empírico da realidade. 
P. ex., nossos telescópios podem captar as explosões acima. 
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Tony Lawson e o Realismo Crítico na Economia (1997)
Repetindo mais uma vez: para Lawson, o problema com uma metodologia como a de Friedman é que ela esquece que há mecanismos e leis causais que regem os fenômenos empíricos. 
OK, para efeitos de previsão do número de horas de um dia pode ser útil supor, p. ex., que o Sol gire em torno da Terra. Podemos, inclusive, montar uma teoria com esta hipótese, segundo Friedman.
Mas Lawson insistirá que isto não explica os movimentos reais que ocorrem no espaço sideral.
E Friedman bem poderia rebater dizendo que saber estes movimentos reais não importa, porque o que ele quer fazer em primeiro lugar é prever bem...
E então, de que lado ficamos? Temos aí uma polêmica que Persio Arida tentará resolver com a retórica...
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As ciências sociais na visão de Lawson
E no campo social, e especificamente econômico, o que propõe Lawson? 
Bem, ele sugere que a sociedade emerge como uma propriedade emergente de estratos mais básicos da realidade. 
Mas o que é uma propriedade emergente? 
Propriedades emergentes são aquelas que surgem da interação entre um e mais entes da realidade, e que não são redutíveis às propriedades de nenhum destes entes em particular. 
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As ciências sociais na visão de Lawson
Ex: O hidrogênio (H2 ) e o oxigênio (O2 ) possuem certas propriedades químicas e físicas (ponto de fusão, ebulição, massa específica etc). 
Contudo, quando eles se juntam, podem se transformar em H20, que tem propriedades químicas e físicas totalmente diferentes do hidrogênio e oxigênio quando separados. 
Daí dizemos que as propriedades que surgem desta ligação são emergentes. 
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As ciências sociais na visão de Lawson
Assim, a partir da matéria inorgânica podem se formar compostos orgânicos.
A partir dos compostos orgânicos podem se formar sistemas vivos. 
A partir dos sistemas vivos podem se formar animais sociais. 
A partir dos animais sociais formam-se sociedades. 
As sociedades aparecem como resultado da ligação entre diversos indivíduos, sendo que a sociedade, como um todo, não pode ser reduzida ao comportamento em particular dos indivíduos. Logo é uma propriedade emergente da união dos vários indivíduos que a compõem. 
Ademais, a sociedade (e a economia) são sistemas abertos – por elas passam fluxos de matéria, energia e informação. 
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As ciências sociais na visão de Lawson
Esta visão vai de encontro à visão da economia tradicional, que investiga os grandes agregados econômicos (consumo, investimento, PIB) com base na soma dos comportamentos maximizadores de indivíduos isolados em um sistema fechado. 
Em particular, a economia deveria estudar a essência dos fenômenos que surgem quando diversos indivíduos humanos se ligam em sociedade com o fim de produzir, trocar e consumir bens e serviços necessários para a manutenção e reprodução desta sociedade. 
Lawson cria um modelo que tenta dar conta das propriedades emergentes que surgem quando temos uma sociedade humana: o modelo transformacional da ação social (MTAS), baseado no método retrodutivo. No quadro, para maiores detalhes. 
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As ciências sociais na visão de Lawson
Como vimos, o método retrodutivo pretende ir além da indução (que parte de casos particulares para uma lei geral) e além da dedução (que parte de uma lei geral para casos particulares).
Como já vimos com os positivistas lógicos, nenhum desses dois métodos garante que chegaremos a um conhecimento 100% sério e rigoroso. 
Ou seja, Lawson não tenta chegar à conclusão de que todos os cisnes são brancos (lei geral) a partir da observação de vários cisnes brancos (casos particulares), que é o caso da indução.
Também não postula que se um animal com tais e quais características tiver a cor branca (lei geral), então será um cisne branco (caso particular). 
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As ciências sociais na visão de Lawson
Lawson propõe que observemos vários cisnes e, a partir da constatação de que todos eles são brancos, façamos a pergunta: qual é a causa ou mecanismo real que leva à brancura de todos estes cisnes? 
Esta seria a base do método retrodutivo. 
Do mesmo modo para a economia, deveríamos nos perguntar: dada que observamos que uma dada economia tem tais e quais características, quais é a causa ou mecanismo real que leva a estas características? 
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As ciências sociais na visão de Lawson
Lawson propõe o uso da retrodução em ciências sociais exatamente porque a sociedade (e a economia) são sistemas abertos – ou seja, por elas passam fluxos de matéria, energia e informação. 
Assim, não seria fácil utilizar o método dedutivo para chegar a conhecimento sério e rigoroso na economia. 
Corremos sempre o risco de esquecermos fatores importantes, e isso enviesa nossos modelos e fragiliza as previsões. 
É por isso que, para Lawson, é um erro a ciência econômica focar na tarefa de prever fatos. 
Como é um sistema aberto, sempre há múltiplas causas atuando nos fenômenos, e isso dificulta a previsão. 
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As ciências sociais na visão de Lawson
Assim, a economia deveria ser uma ciência parecida com a geologia, p. ex.: não faz sentido prever quando ocorrerá um deslocamento de placas tectônicas que levará a um terremoto ou maremoto. 
Mas sempre é possível identificar causas e lugares onde há grande probabilidade de terremotos e maremotos. 
Identificando estas causas e lugares, podemos criar instituições que nos protejam destes eventos em situações específicas, e não prever quando tal evento vai ocorrer, o que é muito difícil, devido à natureza multicausal destes fenômenos. 
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Críticas a Lawson 
Mesmo assim, Lawson não é poupado de certas críticas. P. ex.:
1. Ele não responde como certas sociedades com certos procedimentos poderiam captar os efeitos das leis e mecanismos causais reais dos fenômenos – ou seja, não mostra como passamos do domínio ontológico real para o empírico.
2. Alguns o acusam de arrogância: ele afirma que pode chegar às leis e mecanismos reais causais dos fenômenos econômicos quando o ambiente intelectual, depois da queda dos positivistas lógicos, é bem mais modesto. 
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Críticas a Lawson
3. Outros afirmam que muitos econometristas que usam o método N-D tentaram, sim, buscar as leis e mecanismos causais reais dos fenômenos econômicos. Ou seja, não ficaram presos simplesmente a regularidades empíricas. 
4. Não dá para identificar na HPE qual seriam as “últimas estruturas causais” dos fenômenos econômicos: para Ricardo, p. ex., estas estruturas eram a lei da população e dos retornos marginais decrescentes da terra; para Marx, a lei do valor e tendência decrescente da taxa de lucros; depois da 2a Guerra, passam a ser as preferências bem-comportadas, monotônicas, contínuas, não-saciáveis e quase-côncavas dos agentes...
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O que fazer em tal situação? 
Desta forma, o “espólio” do positivismo lógico nos legou pesquisadores, em economia, que ora querem identificar a explicação dos fenômenos (um lado da tese da simetria), enquanto outros querem prever os fenômenos (o outro lado desta mesma tese). 
Como vimos, tanto Friedman quanto Lawson tem problemas. 
Será que poderíamos sair desse impasse? 
Persio Arida, com a retórica, aposta que sim. 
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Exercício
Veja a tabela abaixo, que descreve como se dá a transformação de valor da mais-valia em valor monetário para Marx numa economia com
três setores (VER QUADRO):
1.Supondo que a taxa de mais-valia é de 50% e que não existe poder de monopólio entre os capitalistas dos 3 setores, complete a tabela, justificando. 
2. Suponha agora que você possa agregar todos os setores da economia numa função de produção Cobb-Douglas. Defina esta função de produção. 
3. Marx estava atento ao fato de que produzia uma teoria específica para um sistema de produção de uma certa época e lugar -- os países europeus avançados na segunda metade do século XIX. Com base nesta informação, explique o que é o problema da especificade histórica das ciências sociais (EHCS). 
4. Dos dois modelos acima, qual seria, provavelmente, o preferido de Friedman? E o de Lawson? Forneça uma razão para Friedman criticar o modelo escolhido por Lawson e outra para Lawson criticar o modelo escolhido por Friedman. 
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Tabela
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Resposta do exercício
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Resposta do exercício
2. A função será Y = A.K180/450L180/450.
3. O problema da EHCS dá conta da dificuldade da ciência em produzir teorias gerais acerca dos fenômenos sociais. Ou seja, por mais geral que uma teoria social deseje ser, em alguma medida ela deve levar em conta a especificidade dos problemas da sociedade e da época em que está sendo produzida (ver apontamentos de aula). 
4. Friedman provavelmente preferiria o modelo de Cobb-Douglas (neoclássico) e Lawson o modelo marxista. Lawson poderia criticar o modelo neoclássico por não identificar mecanismos causais do processo capitalista de produção (Cavalcante, p. 13), como a exploração do trabalho pelo capital. Por sua vez, Friedman poderia criticar a falta de simplicidade e fecundidade (Cavalcante, p. 11) do modelo de Marx, que divide a economia em três setores e é historicamente específico para a sociedade capitalista. 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
O interesse inicial de Persio Arida é sobre como as controvérsias são resolvidas em economia.
Se a “visão adquirida” de ciência tiver razão, as controvérsias são resolvidas quando nossas leis gerais são repetidamente confirmadas por testes empíricos...
...se Popper tem razão, as controvérsias seriam resolvidas quando uma teoria é repetidamente falsificada, mesmo quando colocamos hipóteses auxiliares testáveis junto a ela.
Mas é isso que ocorre na prática? 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
Ora, os TCCs (principalmente Kuhn e Feyerabend) mostraram que não é isso que se sucede. 
Como Arida observa, muitas controvérsias acabam por cansaço e desinteresse, e certas “vitórias” teóricas não mostram que houve aceitação consensual da comunidade acadêmica sobre seus termos. 
Veja casos como a “controvérsia do capital” entre a Cambridge norte-americana e a britânica; a controvérsia sobre a definição de renda nacional ou o conceito de “firma representativa”. 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
Daí Arida observa que há dois modos de aprender teoria econômica: um que ele chama “hard science”, prevalecente nos EUA; e outro chamado “soft science”, mais comum na Europa.
Em que consiste cada um desses modos de aprender teoria econômica? 
O modelo “hard science” imagina que a economia deveria ser estudada como ciência “dura”, tipo física. Neste sentido, sua evolução se dá pela expansão da fronteira do conhecimento, que ocorre quando as teorias conseguem resistir a testes empíricos, explicar os fenômenos e gerar previsões que se confirmam. 
A HPE, neste caso, não precisaria fazer parte do currículo das faculdades, pois o eventual conhecimento antigo já foi absorvido nos novos modelos. 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
O modelo “soft science”, por sua vez, supõe que a HPE é parte integrante do estudo da teoria econômica, e que é necessário estudar os “grandes mestres”, como Smith, Ricardo, Marx, Keynes para poder compreender adequadamente a teoria. 
Neste caso, a HPE seria imprescindível para uma compreensão adequada da teoria econômica: no fundo, a teoria atual deveria sempre beber na fonte dos mestres do passado. 
Deste modo, o modelo “hard” imagina que a economia seria parecida mais com uma ciência natural, ao passo que o modelo “soft” a compararia mais com uma ciência histórica. 
Mas seriam estes modelos adequados pra explicar o que acontece na prática com as controvérsias entre economistas? 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
Arida aponta que nenhum dos dois modelos é adequado: no caso “hard”, muitas vezes as controvérsias terminam, como já dissemos, por cansaço, desinteresse...não tem a ver com capacidade de resistir a testes empíricos ou fazer novas previsões.
No caso “soft”, o erro é imaginar que o conhecimento gerado no passado pode ser facilmente usado para resolver um problema presente. 
Esta mistura de teoria com história é, na visão de Arida, funesta. 
Não dá pra aplicar teorias passadas diretamente ao presente porque as teorias são contextuais e sujeitas a fatores extra-científicos. 
Lembram do problema da EHCS? Arida não menciona, mas cabe aqui...
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
Então Arida se pergunta:na prática, como, p.ex., a escola neoclássica se tornou dominante frente às suas grandes rivais (a EHA e os velhos institucionalistas americanos – VIA)? Afinal, até o início da 2a Guerra, não dava pra dizer que os neoclássicos venceriam esta batalha...
Será que foi porque os modelos neoclássicos resistiram melhor às falsificações? Será que fizeram melhores previsões? Será que explicaram melhor certos fenômenos econômicos? 
Não foi nada disso, segundo Arida...
Os neoclássicos venceram porque eram “bons de conversa”, ou seja, tinham melhor capacidade de convencer e persuadir. 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
É isso o que faz a retórica – convencer e persuadir. 
A retórica é útil, segundo Arida, já que a tese de Duhem-Quine nos mostra que não temos testes cruciais (ou seja, sempre podemos salvar nossas teorias de eventuais falsificações)...
...além disso, sabemos desde as críticas ao positivismo lógico que os fatos estão carregados de teoria.
Isto implica que o sistema teórico gera sua própria evidência.
Como já cansamos de repetir, algo como “desemprego involuntário” só existe para um economista keynesiano – só com o “óculos” da teoria de Keynes é possível “ver” essa e-vidência. 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
Assim, quando Arida olha o passado, o que ele vê são diferentes escolas de pensamento econômico tentando convencer e persuadir comunidades de pensadores econômicos de que estão certos. 
P. ex., quando pesquisadores de linhagem marxista dizem que o sucesso neoclássico se deve ao fato de as teorias neoclássicas serem adequadas ao capitalismo, eles estão tentando subsumir o sistema teórico neoclássico em termos marxistas.
Ou seja, estão fazendo retórica, segundo Arida. 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
O mesmo acontece com os neoclássicos, que tentam explicar a gênese das formas institucionais que condicionam os mercados (preocupação típica da EHA e dos VIA) através de dois critérios: 
1. Uso de formalidade lógica; e 
2. Ideia de que decisões individuais são o ponto a partir do qual começamos a fazer modelos. 
É assim que os neoclássicos tentam subsumir as teses básicas da EHA e dos VIA...e isso também é retórico!
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
Daí, para Arida, a ideia de e-vidência é mais que empírica: é a conformidade do discurso às regras da boa retórica.
Neste caso, a verdade funciona como disposição em aceitar evidência empírica inequívoca. 
Arida pode dizer isso porque sabemos que fatos não são puros, não estão dados num mundo que é 100% externo às nossas teorias. Mais uma
vez: fatos são carregados de teoria!
Compare isto com as noções de verdade de Popper e da “visão adquirida” de ciência...
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
Arida mencionou também certas “regras” da boa retórica. Quais seriam estas “regras”? Ele elenca oito delas: 
1. Simplicidade (como Friedman);
2. Coerência (ou seja, nada de recorrer a hipóteses ad-hoc só para fechar o modelo);
3. Abrangência (é a “fecundidade” de Friedman);
4. Generalidade: aí a ideia é incluir o rival como caso particular. 
P. ex., Keynes tentou incluir os “clássicos” que o precederam como casos particulares de sua teoria que, não à toa, é chamada de geral;
Marx também: seu “capital industrial” pode ser visto sob a forma de “capital mercadoria” (fisiocratas), “capital produtivo” (Smith, Ricardo) e “capital dinheiro” (mercantilistas). 
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Pérsio Arida (1952- hoje) e a HPE como teoria e retórica (1983, 2006)
5. Deve-se diminuir o número de metáforas (embora a economia esteja cheia de metáforas relativas à física, como veremos na segunda parte do curso);
6. Formalização matemática;
7. Reinventar a tradição: ou seja, recortar o passado de modo a excluir o adversário e se incluir numa certa tradição de pensamento – veja Keynes, Marx e Lucas, que fizeram isso...
8. Ignorar interesses práticos, para que não se diga que está se “puxando a sardinha” para determinado grupo (econômico ou político) ao qual os resultados da teoria possam interessar. 
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Conclusão do Arida
A “visão adquirida” de ciência e o falsificacionismo falharam na economia. 
Na prática, quem comanda maior poder de convencimento é quem determina o que vai ser considerado como evidência e verdade na economia. 
Mas isto não pode ser perigoso? Onde fica a verdade como correspondência que a tradição positivista adotava? 
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Exercícios para a prova – questão tipo 1
A primeira parte do nosso curso descreveu historicamente a tentativa de diversos pensadores de achar uma metodologia de pesquisa que garantisse a produção de conhecimento sério e rigoroso. As afirmações abaixo, compostas por duas orações ligadas pela conjunção PORQUE, tratam de algumas ideias desses pensadores. Julgue-as como V ou F, comentando sua resposta e afirmando se há relação de causalidade entre elas.
1. A teologia não pode ser considerada ciência para os positivistas lógicos PORQUE a teologia contém proposições metafísicas, como a idéia de um ente supremo (Deus) não apreensível diretamente pelos sentidos humanos. 
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Resposta-padrão
V; V. Há relação de causalidade: se a teologia contém proposições metafísicas (como a existência de um Deus que está além dos sentidos humanos), então ela não pode ser considerada ciência. Para os positivistas lógicos, apenas as proposições sintéticas a posteriori (vindas da obervação de fatos atômicos do mundo pelos sentidos) e as proposições analíticas a priori (como as da lógica e da matemática) contam como ciência. 
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Outro exercício do tipo 1
2. É possível considerar a teologia conhecimento válido para Feyerabend PORQUE, para Feyerabend, há incomensurabilidade radical entre o que é considerado conhecimento válido em épocas e culturas distintas. 
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Resposta-padrão: 
V; V. Há relação de causalidade: Feyerabend considerava-se um “anarquista metodológico”, onde “vale tudo” na elaboração do conhecimento. Se há incomensurabilidade radical entre os conhecimentos válidos de diversas épocas, então é possível considerar a teologia conhecimento válido, dependendo do que se considera conhecimento válido para a época em que determinado tipo de saber vigora.
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Mais um exercício do tipo 1: 
3. Popper, Kuhn e Lakatos não admitem proposições metafísicas na ciência PORQUE os três crêem que a metodologia falsificacionista guia a busca por conhecimento.
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Resposta-padrão: 
F; F. Não há relação de causalidade, pois não decorre como conseqüência dos três crerem que a metodologia falsificacionista guia a busca por conhecimento que eles não admitam proposições metafísicas. A primeira asserção é falsa, pois todos eles admitem que proposições metafísicas são inevitáveis na ciência – é impossível se livrar de visões de mundo, valores ou crenças na busca do conhecimento. A segunda também é falsa, pois, ao contrário de Lakatos e Popper, Kuhn crê que fatores históricos e psicossociais guiam mais a busca de conhecimento que o falsificacionismo (ver Blaug, pp. 67-8).
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Exemplo de questão do tipo 2: 
Imagine que você é um economista que trabalha para uma grande empresa monopolista no setor de Petróleo e Gás (P&G). Devido à descoberta de reservas de P&G em águas profundas, o custo marginal de extração de barris de petróleo aumentou de R$ 40 para R$ 60. Estima-se a curva de demanda inversa por petróleo da empresa como p = 100 – q. Depois do aumento no custo marginal, o preço do barril estacionou em R$ 78. 
1.Este resultado é idêntico ao esperado pela teoria do monopólio? Justifique.
2. Se você é um economista que utiliza metodologia falsificacionista de pesquisa, você deve abandonar a teoria do monopólio, caso o resultado esperado pelo modelo não seja idêntico ao resultado obtido empiricamente? Justifique, usando a tese de Duhem-Quine.
3. Se você é um economista que utiliza metologia de pesquisa de Friedman, você deve abandonar a teoria do monopólio, caso o resultado esperado pelo modelo não seja idêntico ao resultado obtido empiricamente? Justifique, explicando qual é o principal objetivo da MEP (Metodologia da Economia Positiva) de Friedman. 
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Resposta-padrão: 
Não: igualando RMg = CMg (condição de 1ª ordem para maximização de lucro) e substituindo na curva de demanda, de acordo com o que a teoria do monopólio prevê, chegamos a p = R$ 80.
Não. Primeiramente você deve verificar se as hipóteses iniciais relevantes da teoria são testáveis e resistiram ao teste empírico. A tese de Duhem-Quine diz que uma teoria nunca pode ser 100% falsificada, devido à existência de um conjunto vasto de condições iniciais (muitas das quais não podem ser testadas). Em outros termos, não há experimento crucial. Desta forma, um falsificacionista vai querer especificar quais condições iniciais são relevantes no estudo do comportamento de firmas monopolistas e aplicar testes empíricos que comprovem a resistência aos testes da teoria do monopólio com essas condições iniciais. Somente então a teoria poderá ser efetivamente abandonada.
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Resposta-padrão:
Não. O principal objetivo da MEP de Friedman é elaborar teorias simples e fecundas, capazes de capturar regularidades empíricas e fazer boas previsões. O fato de o resultado previsto pela teoria do monopólio não ser idêntico ao obtido empiricamente não significa que a teoria do monopólio deva ser abandonada: a teoria previu corretamente que o preço do barril subiria, embora sem acertar o valor exato. Como as regularidades empíricas da economia estão sujeitas a erros aleatórios, não se pode afirmar que a diferença entre o valor previsto e o achado é suficiente para abandonar a teoria do monopólio.

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