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Raiana Zacarias de Macêdo | 1 ITU – INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO CASO CLÍNICO Menino de 5 meses de vida é levado à consulta de puericultura. A mãe não tinha queixas e não havia alterações no exame físico, exceto um ganho ponderal inferior ao esperado e a existência de fimose fisiológica. O médico reforça as orientações e solicita retorno em 15 dias com exame de urina e urocultura. No retorno, a mãe referia que o filho apresentava boa aceitação do seio materno e continuava sem sintomas. Resultado do exame de urina colhida por saco coletor está abaixo e a urocultura revelou crescimento de Escherichia coli. Primeira coisa a ser perguntada é como foi colhida a urina? Nesse caso foi pelo saco coletor, o que tem grande risco de contaminação. OBS: Nitrito em crianças pequenas pode dar nitrito negativo, porque ele leva um determinado tempo para positivar (a bactéria transforma nitrato em nitrito). A ITU no lactente é uma das principais causas de febre não localizada, e sintomas mais evidentes, irritabilidade. Então, paciente sem clínica, não trata. EPIDEMIOLGIA Uma das infecções bacterianas mais frequentes na pediatria. Vacinação contra pneumococo e Haemophilus influenzae tipo B diminuiu muito os casos de ITU por esses agentes. E é considerada causa de doença bacteriana grave em lactentes febris. Vacinação = redução dramática dos casos de bacteremia e meningite por estes agentes. O atraso no diagnóstico e tratamento: · Risco alto de sepse em lactentes menores · Dano ao tecido renal (cicatrizes renais) · HAS · Doença renal crônica Quanto mais rápido o diagnóstico e o início do tratamento, e quanto mais novos episódios de pielonefrites forem prevenidos, melhor o prognóstico renal para a criança, evitando-se complicações em curto e longo prazo. INCIDÊNCIA É mais prevalente no sexo feminino, com pico maior entre os 0-3 meses e retorno dos 6 -12 meses. No sexo masculino em crianças não circuncidadas a incidência chega a 20%, enquanto os que são tem incidência de 2,4%. Picos -> treinamento de toalete (3 anos de idade) e início de atividade sexual. DEFINIÇÃO Multiplicação de micro-organismos em qualquer segmento do trato urinário. Trato urinário estéril: · Rins · Ureteres · Bexiga · Uretra posterior Colonização bacteriana: · Uretra anterior · Região periuretral Colonização bacteriana do trato urogenital: defesa natural contra microrganismos patogênicos Crianças que receberam antibióticos (amoxicilina e cefalexina) para o tratamento de outras infecções têm risco maior de ITU, pois estes agentes podem alterar a microbiota gastrintestinal, comprometendo a defesa natural do trato urinário e facilitando a colonização por bactérias uropatogênicas. Na flora normal da vagina encontram-se Difteróides, estreptococos, E. coli, Lactobacillus sp. Na uretra anterior vamos ter stafilococos epidermidis, enterococos faecalis, estreptococo alfa hemolítico, bactérias entéricas: E coli, proteus sp, difteroides. Fatores que possam alterar a flora normal: ATB, corticoide, desnutrição, crianças amamentadas inadequadamente. 1. Bacteriúria sintomática: cistite (baixa), pielonefrite aguda (alta) 2. Bacteriúria assintomática Via ascendente (maioria dos casos): Meninas – bactérias do intestino grosso / Meninos – agentes procedentes do meato uretral e prepúcio. Via Hematogênica : Principalmente em RN. E. coli = 80%, ou seja, principal causadora de ITU. Nos meninos que tem fimose, ocorre um acúmulo daquele esmegma onde o Proteus é colonizador. Outros agentes bacterianos : Klebsiella pneumoniae, Proteus mirabilis, Proteus vulgaris, Enterobacter sp., Enterococcus sp. e Pseudomonas sp. Além das bactérias, temos fungos (cândida) e vírus (adenovírus – hematúria macroscópica). O que vai definir os sintomas será a interação bactéria – hospedeiro. O fator de virulência dessa bactéria x predisposição do hospedeiro. FATORES DE PREDISPOSIÇÃO · Anormalidades do trato urinário · Fatores obstrutivos · Disfunções miccionais e constipação intestinal · Reação inflamatória e imunológica do indivíduo · Aleitamento artificial · Alteração da flora bacteriana normal TIPOS DE E. COLI Nós vamos ter as mais virulentas e as menos virulentas. A mais virulenta será a uropatogênica, as quais possuem ilhas de patogenicidade. Ela tem cromossomos que vão ser transcritos e vão ajudar essa bactéria a produzir adesinas (fimbrias que facilitam a adesão da bactéria na mucosa urogenital) e que vão liberar toxinas para poder penetrar com mais facilidade, protectinas (proteção contra as nossas defesas) e sideróforos (conseguem se manter sozinha). DIAGNÓSTICO · Anamnese · Fatores de risco · Histórico familiar de ITU de repetição, doença renal, refluxo vesico-uretral · Diagnósticos prévios de ITU · Constipação · Padrão miccional (frequência, tipo de jato, perdas urinárias) · Postura viciosa (segurar a diurese) · Exame físico · Peso e estatura · Aferir pressão arterial (mesmo < 3 anos) · Palpação abdominal procurando por fezes, massas · Sinal de Giordano · Exame genital externo (balanopostite, vulvovaginite) · Região glútea e lombossacra (região de onde vem inervação da bexiga) · Descartar outros focos infecciosos DIAGNÓSTICO CLÍNICO-LABORATORIAL O exame de urina é feito em duas etapas = fisicoquímica e sedimentoscopia. - Análise da urina: Estearase leucocitária é mais sensível que específica, então nem sempre será ITU. Já o nitrito é menos sensível, mas tem grande especificidade, então ele pode dar negativo em algumas situações, mas caso dê positivo tem 98% de chances de ser ITU. Fatores que podem positivar esses valores são a forma de coleta e o tempo de armazenamento. Quanto mais tempo ela for armazenada mais chances de proliferação bacteriana. O tempo da coleta e entrega ao laboratório não deve passar de 1 hora, pois a partir daí a urina não será mais fresca. Nitrito falso positivo -> bactérias contaminantes e corantes avermelhados. Nitrito falso negativo -> incubação vesical curta (<4h), densidade urinária elevada, altos níveis de vitamina C, ITU por pseudômonas e cocos G + (quem reduz nitrato em nitrito são as Gram -). Estearase leucocitária falso positivo -> febre, exercício vigoroso, vulvovaginite, balanopostite, dermatite das fraldas, corpo estranho, nefrolitíase, infecção extra-urinária (apendicite, Kawasaki, infecção estreptocócica), nefrite túbulo-intersticial. Estearase leucocitária falso negativo -> altos níveis de vitamina C e proteinúria. COLETA DE URINA - Amostra limpa de urina (jato médio – higiene, primeiro jato despreza). - Se não for possível de obter: saco coletor (não invasivo), punção suprapúbica ou sonda vesical (invasivos). DIRETRIZES DE COMO COLETAR URINA DA CRIANÇA 1. Se o clínico julgar que o lactente febril, sem causa aparente, precisa receber imediatamente tratamento com antibiótico, deve colher urina para realização de citologia urinária e urocultura, antes da administração do medicamento. Então, antes do ATB, cateterização uretral ou punção suprapúbica (padrão-ouro). 2. Se o clínico julgar que o lactente febril, sem causa aparente, não parece tão doente para indicar o uso imediato de antibiótico, ele deve avaliar a probabilidade de ITU, de acordo com os fatores individuais de risco. 2 a - Baixa probabilidade de ITU – observação clínica 2 b - Se não for do grupo de baixa probabilidade: 2 escolhas Coleta de urina por PSP ou CV para análise da urina e URC Coleta de urina por saco coletor. Se sugestiva de ITU realizar nova coleta por PSP ou CV. Diagnóstico definitivo = criança sintomática + urocultura positiva. Geralmente há o crescimento de apenas uma espécie de bactéria. O encontro de 2 ou mais germes na cultura é sugestivo de contaminação. UROCULTURA POR SACO COLETOR TEM 80% DE RESULTADOS FALSOS POSITIVOS, DEVENDO SER VALORIZADA SOMENTE SE RESULTADO NEGATIVO! TRATAMENTO · Prevenir a disseminação da infecção (sepse) · Aliviar os sintomas agudos · Evitar lesões renais em longo prazo (cicatrizes renais) · Prevenir recorrências Para decidir o tratamento primeiro precisamos saber se é alta ou baixa. A pielonefrite tem uma criança com febre e estadogeral mais comprometido. Devemos também avaliar se precisa ser iniciado de imediato ou se pode aguardar a urocultura e se o tratamento deve ser oral ou parenteral (não é mais eficaz que o oral) e o que determina isso é a viabilidade ou não da via oral. E por fim avaliar se a criança pode ter acompanhamento ambulatorial ou tem que ficar hospitalizada. INDICAÇÕES DE INTERNAÇÃO HOSPITALAR · Menores que 3 meses de idade · Imunossuprimidos · Desidratado, vômito ou inabilidade para ingestão oral · Falha na terapêutica oral · Sepse ou estado de toxemia · Doenças obstrutivas do trato urinário ou malformações complexas · Doença renal crônica · Indicação social Os sublinhados são indicações de tratamento parenteral. O tratamento pode ser substituído por oral após sessar a febre. TRATAMENTO CISTITE Dura de 3 – 7 dias. TRATAMENTO PIELONEFRITE AGUDA Nunca menos de 7 dias. Normalmente 10 dias, em alguns casos 14 dias. Se um paciente recebe profilaxia por alguma mal formação com antibiótico, o remédio passado não deve ser o mesmo da profilaxia. - Via oral - Via parenteral OBS: evitar uso indiscriminado das quinolonas. TRATAMENTO DAS DISFUNÇÕES DA BEXIGA E DO INTESTINO · Estimular ingesta hídrica · Hábito urinário correto (forma correta de sentar, vaso adequado) · Treinamento de toalete (acostumar o horário aproveitando o reflexo gastrocólico após o almoço) · Treinamento da constipação intestinal INVESTIGAÇÃO POR IMAGEM Antigamente: US + UCM + DMSA Atualmente: redução da exposição a radiação e exames invasivos Objetivo: detectar malformações congênitas que possam predispor a criança a novos episódios. Criança com < 6 meses e ITU = USG obrigatória. Provável malformação. DMSA (cintilografia). ANTIBIÓTICO PROFILÁTICO Não se recomenda o uso rotineiro de profilaxia. - Indicações: · Após a primeira ITU -> apenas se houver suspeita de malformação do trato urinário · ITU de repetição -> até correção de fatores de risco · Uropatias obstrutivas, consideradas fatores de risco para ITU de repetição · Refluxo vesicouretral graus IV e V BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA Presença de bacteriúria e cultura positiva, porém não há sinais ou sintomas indicativos de ITU. Mais comum na idade escolar e meninas adolescentes. Não associada com malformação das vias urinárias. As únicas situações em que se vai tratar bacteriúria assintomática são: · Mulheres grávidas · Procedimento urológico invasivo Do contrário, o tratamento é contra-indicado. Porque vai causar uma alteração da flora bacteriana de baixa virulência para uma flora de alta virulência e aumentar a predisposição à colonização por uropatógenos.
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