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Métodos de Pesquisa em História Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Dr. Vanderlei Elias Nery Revisão Textual: Profa. Esp. Vera Lídia de Sá Cicaroni O Documento como testemunho da História 5 · Introdução · O documento e a história · Linguagens e História · O diálogo com as evidências O objetivo da disciplina é analisar as várias concepções que os historiadores desenvolveram em relação ao documento, chegando à visão contemporânea, que abandona esquemas prévios e introduz o dominado como sujeito da história. Ao abandonar a concepção positivista de documento, a historiografia atual permite a utilização de várias linguagens para o estudo da História. Nesta unidade, buscaremos compreender a relação do documento com a pesquisa histórica. Faremos, também, algumas indicações de leitura interessantes para que você compreenda melhor o que procuramos apresentar no texto. Não deixe de fazer essas leituras, com certeza você irá achá- las bem interessantes! Nesta unidade: O documento como testemunho da História, você deve estar atento à concepção positivista de documento, à concepção da chamada Escola dos Analles, à crítica a visão positivista e à concepção contemporânea de documento, que introduz o cotidiano na História. É importante, também, que você participe do fórum proposto e se prepare para as avaliações planejadas. Nesta unidade, você encontrará, além do fórum de discussão, seis questões de múltipla escolha na atividade de sistematização. Ao realizá-las, você poderá avaliar seus conhecimentos e preparar-se para a avaliação presencial que ocorrerá no final do semestre. O Documento como testemunho da História 6 Unidade: O Documento como testemunho da História Contextualização Iniciamos os estudos relativos à disciplina Metodologia da Pesquisa em História, tratando do tema O documento como testemunho da História. Na introdução, fazemos um breve relato das relações de classe, cultura e poder, buscando superar a visão mecanicista da história. Através da análise do documento e da história, demonstraremos as várias concepções que os historiadores desenvolveram em relação ao documento até chegar à visão contemporânea, que abandona esquemas prévios e introduz o dominado como sujeito da história. A concepção de documento contemporânea permite ao pesquisador introduzir novas linguagens no estudo da história, como: cinema, literatura, artes plásticas, depoimentos orais etc. Essa concepção abre novas formas de diálogo com as evidências, possibilitando o trabalho com múltiplas fontes de pesquisa e colocando, assim, ao historiador a necessidade de trilhar seu próprio caminho. 7 Introdução É importante que o historiador não faça um estudo separado das várias dimensões sociais; devem ser evitados estudos paralelos do aspecto econômico, político e cultural. Para isso, é necessário que o pesquisador esteja atento aos vários aspectos da vida em sociedade. O documento e a história Quando pensamos em documento, o primeiro significado que nos vem à mente é o escrito. Essa visão foi uma das primeiras que apareceram na história e está ligada à noção positivista da história, que apareceu no século XIX, quando a história recebeu o estatuto de ciência. Fonte: Thinkstock / Getty Images A noção positivista de história levava os historiadores a privilegiarem o documento, porém não qualquer documento, mas o oficial. “Esse documento assumia o peso de prova histórica e a objetividade era garantida pela fidelidade ao mesmo” A experiência humana é marcada por relações contraditórias, sendo assim, uma “experiência de luta e de luta política”. Nesse sentido, somos levados a ter um novo olhar em relação a luta de classes, que a partir dessa visão “é, ao mesmo tempo e na mesma medida, luta de interesses de valores”. Nesta perspectiva não se pode considerar a cultura como simples “reflexo ou eco de uma base material” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 7). A partir dessa concepção, as autoras afirmam que: Pensando a história como essa experiência vivida integral e socialmente, o conceito de política se amplia sendo definido como todo um espaço da luta. Nesse sentido o campo da política ultrapassa o âmbito estritamente institucional, os limites da presença e da ação do Estado, para se colocar na multiplicidade de formas de poder contidas nas estratégias de controle e de subordinação no social. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 8). 8 Unidade: O Documento como testemunho da História Dominação e resistências estão sempre presentes nas lutas. Mesmo que as vontades dos dominantes sejam reafirmadas, elas ficam marcadas pelas resistências, que estão [...] presentes, não apenas de forma organizada, mas também sob formas ‘surdas’, implícitas’. Daí a importância que adquire a maneira como a população organiza seu divertimento, suas festividades, suas formas de representar a luta do cotidiano, que certamente se articulam com formas literárias, com a música, a poesia, as práticas religiosas etc. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 8). Ao relacionar cultura e poder, passamos a perceber que o poder não apenas permeia o aparelho de Estado mas também está presente em outras áreas do cotidiano, como o trabalho, a escola, a família, “até as formas aparentemente mais ingênuas de lazer” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 8). Segundo as autoras, Ao pensar história e cultura dessa forma, não dá para incorporar os chamados “novos objetos” da pesquisa histórica de uma forma antiga; isto implica redefinir todo o sistema de conceitos com que nós, profissionais de história, vimos trabalhando. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 8). Partindo dessa concepção, podemos afirmar que é preciso superar a visão mecanicista da história, abandonando esquemas prévios, passando a reconhecer que “as categorias que servem de apoio ao trabalho serão construídas no caminho da investigação” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 9), ou seja, não são definidas a priori. Nessa concepção, a história é fruto da ação humana no mundo material. Assim, a noção de objetividade histórica passa a ser “pensada como as condições particulares específicas em que os homens empreendem sua atividade sob qualquer configuração: política, literária, social, cultural, econômica, religiosa” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 10). Para as autoras, é importante não compartimentalizar ou subordinar o estudo da história, o que significa dizer que não se deve fazer “um estudo paralelo do social, do cultural, do econômico, do político, mas sim um estudo que leve em conta todas essas aparentes dimensões” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 10). Os positivistas adotaram o sentido do documento como prova jurídica dos romanos da Antiguidade, dando-lhe nova significação, não mais de prova jurídica, mas sim de prova científica. O próprio fato de atribuir a palavra documento aos testemunhos históricos denota uma concepção de história que confunde o real com o documento e o transforma em conhecimento histórico. Apreender o real seria conhecer os fatos relevantes que se impõem por si mesmos ao conhecimento do historiador. Em decorrência, só consideravam relevantes para a história aquilo que estava documentado e daí a importância dos fatos da política institucional: atos do governo, atuação de grandes personalidades, questões de política internacional etc. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 13-14). Ora, essa noção de objetividade do documento excluía qualquer outro tipo de material para o estudo da história, como: música, literatura, teatro, pintura, fotografia, testemunhos orais etc. 9 Na concepção positivista, o documento fala por si só. Ao historiador cabe a fidelidade ao documento, ou seja, não se aceita a análise do pesquisador. Nesse sentido, “O melhor historiador seria aquele capaz de manter-se o mais próximo possível dos textos, despojando-se de ‘ideias preconceituosas’” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 14). Essa concepção tem o documento como garantia de objetividade,excluindo, assim, “a noção de intencionalidade na ação estudada e na ação do pesquisador, sendo esse processo construído historicamente” (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 6). A visão positivista da história passou a ser questionada no início do século XX principalmente por historiadores ligados à chamada Escola dos Annales. A partir daí, a noção de história foi ampliada e vista como ações dos homens, permitindo a incorporação de tudo aquilo que é produção humana, [...] tais como objetos, signos, paisagens etc. A relação do historiador com o documento também se modifica. O documento já não fala por si mesmo, mas necessita de perguntas adequadas. A intencionalidade já passa a ser alvo de preocupação por parte do historiador, num duplo sentido: a intenção do agente histórico presente no documento e a intenção do pesquisador ao se acercar desse documento. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 15). Os historiadores ligados à chamada Escola do Annales alteraram completamente a noção de história e a prática do pesquisador, como demonstram as autoras: Dessa maneira, a partir de interesses precisos no presente, o historiador escolhe os materiais (documentos) com os quais irá trabalhar e formula as perguntas que lhe parecem pertinentes. Nessa prática, progressivamente, o ponto de partida da investigação passa do documento para o problema. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 15). Segundo Khoury, Peixoto e Vieira, com base nos Annales, os pesquisadores passaram a valorizar a história como ciência. A partir daí, começaram a se apoiar excessivamente em esquemas explicativos, o que os leva a afirmar que [...] a objetividade do conhecimento histórico é garantida pelo método. Nesse caso a intencionalidade do pesquisador entra na definição do tema, na seleção dos documentos, mas principalmente na escolha do método, responsável pela cientificidade do seu trabalho. Por outro lado, a intencionalidade dos sujeitos históricos fica relegada a segundo plano e, nesse caso, o documento é usado como ilustração da vontade e competência do pesquisador. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 16). Essa concepção de fazer ciência-história teve forte presença nas décadas de 1960-1980, a partir de quando se passou a pensar a pesquisa histórica fora de esquemas ortodoxos, adotando-se “uma concepção de história que leva em conta toda a experiência humana a que não é alheio o historiador em seu trabalho” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 17). A concepção atual leva em consideração que a história é construída pela humanidade numa relação de luta constante. Nesse processo, a vida se dá numa relação de “dominação e subordinação em todas as dimensões do social, daí resultando processos de dominação e resistência” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 17). 10 Unidade: O Documento como testemunho da História Fonte: painelseguro.com Essa forma de fazer pesquisa histórica abandona os chavões antigos, marcados pelo erudito e pela escolha do método, e busca a incorporação da “experiência vivida”. Nessa perspectiva, homens e mulheres deixam de ser vistos como “sujeitos passivos e individualizados” para se tornaram “pessoas que vivem situações e relações sociais determinadas, com necessidades e interesses e com antagonismos” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 18). Fonte: mpaalagoas.blogspot.com Nesse ponto de vista, busca-se o estudo da totalidade da vida humana – social, econômica, política e cultural – sem subordinações; o que interessa ao investigador são as lutas reais. “Isto significa incorporar grandes áreas da experiência humana sem as quais a compreensão do social se torna precária” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 18). Adotando essa perspectiva, podemos afirmar que a utilização de documentos para pesquisa histórica deve ser valorizada, pois “A riqueza de informações que deles podemos extrair e resgatar justifica seu uso [...] porque possibilita ampliar o entendimento de objetos cuja compreensão necessita de contextualização histórica e sociocultural” (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 2). Segundo Sá-Silva, Almeida e Guindani, a utilização de documentos em pesquisa [...] permite acrescentar a dimensão do tempo à compreensão do social. A análise documental favorece a observação do processo de maturação ou de evolução de indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos, comportamentos, mentalidades, práticas, entre outros. (SÁ-SILVA, ALMEIDA E GUINDANI, 2009, p. 2). Para os pesquisadores das ciências humanas em geral e, em particular, para os historiadores, é importante entender [...] o significado de fontes primárias e fontes secundárias. As fontes primárias são dados originais, a partir dos quais se tem uma relação direta com os fatos a serem analisados, ou seja, é o pesquisador (a) que analisa. Por fontes secundárias compreende-se a pesquisa de dados de segunda mão, ou seja, informações que foram trabalhadas por outros estudiosos e, por isso, já são de domínio científico, o chamado estado da arte do conhecimento. (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 6). 11 Entre as etapas de investigação, uma das mais importantes é a análise dos documentos. É papel do investigador “interpretá-los, sintetizar informações, determinar tendências e, na medida do possível, fazer a inferência”. É fundamental situar os documentos numa “estrutura teórica para que seu conteúdo seja entendido”, já que “os documentos não existem isoladamente” (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 10). Uma das técnicas é a análise de conteúdo, que pode ser realizada relacionando-se “a frequência da citação de alguns temas, palavras ou ideias em um texto para medir o peso relativo atribuído a um determinado assunto pelo seu autor” (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 11). Para a análise do conteúdo, é fundamental que o investigador leve em consideração o contexto em que o documento foi produzido. A partir daí, pode-se começar o processo de análise, caracterizando a unidade de análise, a qual, segundo os autores, pode ser de dois tipos: Unidade de Registro e Unidade de Contexto. Na Unidade de Análise o investigador pode selecionar segmentos específicos do conteúdo para fazer a análise, determinando, por exemplo, a frequência com que aparece no texto uma palavra, um tópico, um tema, uma expressão, uma personagem ou um determinado item (operação que usa a quantificação dos termos). No entanto, dependendo dos objetivos e das perguntas de investigação, pode se (sic) mais importante explorar o contexto em que uma determinada unidade ocorre, e não apenas sua frequência. Assim, o método de codificação escolhido vai depender da natureza do problema, do arcabouço teórico e das questões específicas de pesquisa. (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 11-12). A partir daí, é importante caracterizar a forma de registro. Esse é um trabalho pessoal. Cada pesquisador tem seu método, e o trabalho pode ser realizado anotando nas margens do documento, fazendo sínteses ou diagramas etc. “Após organizar os dados, num processo de numerosas leituras e releituras, o investigador pode voltar a examiná-los para tentar detectar temas e temáticas mais frequentes; a partir daí será possível a “construção de categorias de análise” (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 12), que serão fundamentais para organização da pesquisa. Para os autores A pesquisa documental é um procedimento metodológico decisivo em ciências humanas e sociais porque a maior parte das fontes escritas – ou não – são quase sempre a base do trabalho de investigação. Dependendo do objeto de estudos e dos objetivos da pesquisa, pode se caracterizar como principal caminho de concretização da investigação ou se constituir como instrumento metodológico complementar. Apresenta-se como um método de escolha e de verificação de dados; visa ao acesso às fontes pertinentes, e, a esse título, faz parte integrante da heurística da investigação. (SÁ-SILVA, ALMEIDA e GUINDANI, 2009, p. 13). 12 Unidade: O Documentocomo testemunho da História Linguagens e História Sem abandonar os estudos macro, ou seja, das grandes questões econômicas, políticas e sociais, os historiadores passaram a incorporar a investigação do cotidiano, que leva o pesquisador a “diversificar a gama de materiais utilizados na investigação, incorporando novas linguagens; literatura, relatos, cinema, teatro, música, pinturas, fotos etc.” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 19). Para Khoury, Peixoto e Vieira (2002, p. 19), adotar diferentes linguagens para análise da história “se explica e se justifica pela ideia de que as relações de dominação e subordinação estão presentes em todas as áreas do social”. Sendo assim, a “Linguagem [...] é entendida como forma de luta e forma de dominação apresentando situações-limite, momentos de tensão e fortes possibilidades críticas”. A análise do cotidiano permite ao historiador colocar os dominados como sujeitos. Para tanto, para analisar discursos literários, imagens, sons, etc. é necessário “observar quem produz uma dada linguagem, para quem produz, como a produz e quem a domina”. É preciso ter em mente que essas linguagens não são neutras, nem muito menos despolitizadas. “Ao trabalhar com outras linguagens, é preciso colocá-las como elementos constitutivos da realidade social” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 20). As autoras lembram que, ao incorporar em seu trabalho “toda a diversidade de manifestações das relações humanas”, o historiador se coloca “duas ordens de dificuldades” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 21). Para elas, a primeira das dificuldades enfrentadas pelo historiador “é a própria tradição historiográfica, que dificulta a incorporação dessas outras linguagens ao trabalho do historiador, como expressão das relações sociais” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 21). Para incorporar diferentes linguagens à análise histórica é necessário superar, ou abandonar, os chavões, noções já cristalizadas na historiografia. A análise do particular e do todo deve ser realizada numa relação dialética. A segunda dificuldade, segundo as autoras, “está em o historiador sentir-se despreparado para lidar” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 22) com as diferentes linguagens. Fonte: arteescarlate.blogspot.com 13 Segundo Khoury, Peixoto e Vieira, O despreparo é o próprio desconhecimento do objeto, enquanto caminho a ser percorrido, e não a falta de conhecimento de técnicas universais capazes de dar conta da dimensão própria de cada linguagem, enquanto elementos e conceitos abstratos. Não dá para separar a produção de uma linguagem das condições históricas em que foi produzida. Nesse sentido, o pesquisador, em vez de estar preocupado em adotar esta ou aquela técnica “própria” para desvendar esta ou aquela linguagem, deve estar criando procedimentos que deem conta de desvendar o lugar social onde foi produzida, procurando responder à questão por que as coisas estão representadas de uma determinada maneira, antes de se preocupar em responder o que está representando. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 22). Adotando essa perspectiva de análise, o argumento de que o pesquisador deve ter conhecimentos de semiótica para analisar uma obra literária cai por terra. Não que devamos desprezar esses conhecimentos; eles podem ser úteis no processo de análise, [...] mas, se o historiador não extrapolar esse campo de reflexão, procurando desvendar de que se fala, como se fala, de onde se fala etc., e, para isso, estar criando procedimentos capazes de dar conta dessa realidade, estar fazendo relações, a investigação será superficial ou inadequada. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 22). Segundo as autoras, as linguagens têm dimensões próprias. Elas lembram o caso específico da literatura, para qual “é preciso estar atento às metáforas, imagens etc., pois os recursos da linguagem são recursos históricos” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 22). Fonte: Amistad, Steven Spielberg, DreamWorks SKG (1997) 14 Unidade: O Documento como testemunho da História Elas chamam atenção, também, para as imagens fotográficas e cinematográficas. A imagem por si não recupera a realidade. O que ela faz é trazer para a sua mente associações de imagens. Em realidade o enquadramento da foto e do filme corresponde ao recorte oferecido pelo documento. Daí ser importante analisar, examinar os planos das fotos (ou dos filmes). (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 23). É importante que o pesquisador esteja atento “ao modo como a linguagem foi produzida tentando responder por que as coisas estão representadas de uma determinada maneira, antes de se perguntar o que está representando” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 23). Fonte: pco.org.br O diálogo com as evidências Para trabalhar com múltiplas fontes de pesquisa, é necessário que o historiador busque trilhar seu próprio caminho. “Isto exige, além da ousadia, de um certo espírito de pioneirismo e de uma disposição de ‘quebrar a cara’, uma reavaliação da prática da interdisciplinaridade” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 26). Nessa perspectiva, os conceitos são elaborados no diálogo entre o pesquisador e os registros, abandonando-se, assim, “conceitos abstratos, acabados, elaborados fora desse diálogo” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 26). 15 Segundo as autoras, o historiador, ao abandonar os conceitos abstratos, acabados, elaborados fora do diálogo entre o pesquisador e os registros, estará trazendo à tona a própria luta de classes. Se faz isso inadvertidamente, sem pensar na complexidade da própria produção do conhecimento, pode estar sendo um veículo de perpetuação da dominação de classe. Entretanto, se realizar seu trabalho pensando a história como um campo de possibilidades, em que os diferentes sujeitos sociais têm diferentes formas de pensar o real e, portanto, formas diferentes de intervir no real, deverá se propor a recuperar as várias propostas em jogo e as razões da vitória de uma delas sobre as outras, o que significa trazer à tona também as causas perdidas. Para nós isto é recuperar a relação, o movimento, a contradição. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 26-27). A dominação de classe busca dizer não só o que deve ser lembrado como também o que deve ser esquecido. “Dependendo da força que um agente social teve no passado, sua fala será capaz ou não de ser perpetuada. Uma vez que até agora tem prevalecido o dominante, sua fala se perpetua com muito maior facilidade” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 27). Segundo as autoras, os dominantes perpetuam sua fala através do fascínio que exercem “sobre os dominados através de seu cotidiano”: roupas, veículos, joias, moradias, textos, regras de comportamento se impondo como ideal de vida” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 27). Para preservar as evidências deixadas pelos dominados, o historiador deve procurar “os vestígios que a evidenciam”. O pesquisador deverá fazer as “perguntas adequadas à experiência analisada e à experiência do analista” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 27). Quando o historiador parte da categoria classe social, por exemplo, é preciso ter em mente, “que a classe vive uma relação antagônica que se expressa em situações de exploração e de dominação em todas as dimensões do social” (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 28). Aqui é preciso lembrar o que foi dito anteriormente em relação ao diálogo com os registros, pois a explicação de como se dá a relação de classe [...] só poderá surgir do diálogo entre o pesquisador que pensa a classe de uma dada forma e as evidências da classe em estudo. Neste sentido é importante recuperar como essa classe pensou a si própria e o seu momento, como a contradição foi vivida. (KHOURY, PEIXOTO e VIEIRA, 2002, p. 28). As autoras lembram, ainda, a importância da preservação e divulgação dos registros da experiência humana. Esse é um dos papéis fundamentais do historiador, para que mais e mais pesquisadores tenham acesso a esses materiais. 16 Unidade: ODocumento como testemunho da História Material Complementar Vídeos: https://www.youtube.com/watch?v=TUoGz_f5HyI https://www.youtube.com/watch?v=sYJHhsva9Rc https://www.youtube.com/watch?v=kujxhlQqhuY https://www.youtube.com/watch?v=QGg9CCPWxHg Livros: http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2009/anais/pdf/3124_1712.pdf http://cpdoc.fgv.br/producao_intelectual/arq/517.pdf Sites: http://www.scielo.br/pdf/cp/n114/a08n114 https://www.youtube.com/watch?v=TUoGz_f5HyI https://www.youtube.com/watch?v=sYJHhsva9Rc https://www.youtube.com/watch?v=kujxhlQqhuY https://www.youtube.com/watch?v=QGg9CCPWxHg http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2009/anais/pdf/3124_1712.pdf http://cpdoc.fgv.br/producao_intelectual/arq/517.pdf http://www.scielo.br/pdf/cp/n114/a08n114 17 Referências KHOURY, Yara Maria Aun, PEIXOTO, Maria do Rosário da Cunha & VIEIRA, Maria do Pilar de Araújo. A Pesquisa em História. 4ª ed. São Paulo: Ática, 2002. SÁ-SILVA, Jackson Ronie, ALMEIDA, Cristóvão Domingos de & GUINDANI, Joel Felipe. Pesquisa documental: pistas teóricas e metodológicas. Revista Brasileira de História e Ciências Sociais, São Leopoldo, ano 1, nº 1, jul. 2009. 18 Unidade: O Documento como testemunho da História Anotações
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