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1 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 Roteiro 1. Epidemiologia; 2. Modelo ATLS; 3. Avaliação primária; 4. Avaliação secundária; 5. Tratamento definitivo. EPIDEMIOLOGIA “O traumatismo (do grego trauma: "ferida") é uma lesão produzida por ação violenta, de natureza física (arma de fogo) ou química (queimadura), externa ao organismo, sendo o Politraumatizado o paciente que tem múltiplos traumatismos (exemplo: em um acidente de carro, pode ter acometimento do sistema respiratório, circulatório e nervoso).” • EUA: ❖ 60 milhões por ano; ❖ 145.000 mortes; ❖ 3,6 milhões de internações; ❖ 100 bilhões de dólares/ano → 40% do orçamento. • Brasil: ❖ 130.000 mortes; ❖ 360.000 sequelados. O trauma onera o sistema, tanto porque precisa de uma assistência à saúde quanto pelas sequelas, ou seja, o trauma incapacita um paciente que era capacitado para o trabalho e, a partir de então, vai depender do Estado. • Fechados → 75%; quando não há uma lesão de continuidade cutânea. ❖ Eventos de trânsito → 70%; ❖ Quedas → 20%. • Penetrantes → 15%; quando há lesão de continuidade. ❖ FPAF (ferimentos por armas de fogo) → 60%; ❖ FAB (ferimento por arma branca) → 35%. DISTRIBUIÇÃO TRIMODAL Em relação as causas de mortes no trauma, foi estipulado que existe uma distribuição trimodal (3 picos de morte). ❖ 1º pico: mortes que ocorrem imediatamente após o trauma. Nessas situações a assistência em saúde não traduz a diminuição dessas mortes. Então, na verdade, você tem que evitar que o agente causador do trauma ocorra. Aqui entra principalmente os acidentes automobilísticos, que é onde o indivíduo vai ter lesões vasculares, como as lesões de aorta, e vai acabar indo ao óbito no local. Nesses casos, medidas de educação no trânsito tem efeito. ❖ 2º pico: São aquelas patologias que acontecem após o trauma. Nesse caso, a assistência ao atendimento inicial é decisiva! Se houver uma falha, por exemplo, um indivíduo que teve um politrauma e está com um pneumotórax não drenado pode evoluir para um pneumotórax hipertensivo e posteriormente evoluir para PCR. Nesse momento, a capacitação técnica e a qualificação para o atendimento inicial é um ponto importante. ❖ 3º pico: Ele acontece em dias, e está relacionado a assistência que o indivíduo recebe no internamento/tratamento da patologia de base e definitivo. Isso exige uma demanda de especialistas, estrutura física (unidade com exames complementares, medicamentos…). Quando há um pico de óbitos nesse momento demonstra que a qualidade da assistência hospitalar é ruim. Com essa distribuição é possível ter uma noção de como o trauma mata e como exige uma preparação. É necessário prevenir, ter uma qualidade de assistência inicial ao trauma e uma qualidade final, tanto para o ambiente hospitalar de insumos quanto de recursos humanos. Prevenção – Qualidade inicial – Qualidade final Atendimento ao Politraumatizado 2 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 MODELO ATLS Preparação, triagem, avaliação primária (ABCDE), avaliação secundária e tratamento definitivo. O ortopedista criador do ATLS percebeu que apesar da qualificação dos profissionais, também era necessária uma sistematização na assistência, uma vez que em uma situação de trauma não há necessidade nenhuma de fazer um diagnóstico definitivo de uma patologia. Naquele momento é necessário trabalho em equipe em prol de salvar a vida do paciente. • Abordagem inovadora ao trauma: ❖ Tratar primeiro a maior ameaça a vida; ❖ A falta de um diagnóstico definitivo não deve impedir a aplicação do tratamento indicado; ❖ A história detalhada não é essencial para avaliação do politraumatizado. ❖ Trabalho em equipe → ABCDE (avaliação e tratamento). O ATLS preconiza o atendimento sequencial onde o objetivo maior é manter o indivíduo vivo para que no ambiente hospitalar ele tenha um tratamento definitivo. O modelo é estruturado para o atendimento em fases: PREPARAÇÃO • Estabelecer comunicação com unidade. Onde a equipe é informada do incidente para que ela se prepare em relação aos recursos humanos e insumos para prestar o atendimento. Logo, se você for prestar um atendimento de um indivíduo que sofreu um acidente de carro é diferente de um que sofreu uma queimadura. Na prática, no caso do SAMU, tem relação com a ocorrência que você abre, o acionamento que você recebe em um hospital, a passagem do plantão, o pedido de uma vaga... TRIAGEM • Definição das prioridades de atendimento e escolha da unidade hospitalar para remoção. A triagem determina a prioridade nos atendimentos. A gente sempre deve priorizar o paciente menos grave. Por exemplo, se tiver dois pacientes (um grave e outro menos grave) e eu prestar o atendimento ao mais grave, o que era menos grave pode se agravar e se tornar mais grave quanto o outro. O atendido deve ser SEMPRE o menos grave! Se após a avaliação, o paciente for classificado como menos grave, ele deve ser priorizado independente da idade. EX: frente a um paciente idoso que está LOTE e uma criança de 2 anos que está inconsciente, o atendimento deve ser ao idoso que se encontra lúcido e orientado. Por isso é necessário todo o procedimento de avaliação. Então, o paciente menos grave no atendimento inicial, o médico vai pranchar, colocar o colar e ele estará OK. Já o outro paciente vai precisar instalar medidas e agir. Vale lembrar que o ideal seria 2 equipes atendendo 2 pacientes (1 pra cada), mas se você estiver sozinho para atender os dois pacientes, deve priorizar o menos grave. Quando há múltiplas vítimas (5 ou mais) a gente tem uma organização que divide os pacientes por zona. 2 vítimas + 1 equipe → prioriza quem tem mais chance de sobrevida. AVALIAÇÃO PRIMÁRIA (ABCDE) • Medidas auxiliares a avaliação primária e reanimação. A avaliação primária vai avaliar o paciente, mas também contempla medidas auxiliares, como passagem de sondas e drenos e monitorização, pois ao mesmo tempo que está avaliando o paciente, a enfermeira está vendo o monitor, oximetria de pulso, pressão... E também tem as medidas de reanimação, que são terapias que se não fizer naquele momento o indivíduo vai morrer. Por exemplo: paciente com hematoma extradural não consegue ser drenado no trauma e vai conseguir sobreviver, mas se o indivíduo tiver um pneumotórax hipertensivo e não for drenado, ele vai evoluir para PCR e vai morrer. Por isso que nesse momento é necessário avaliar o paciente e agir nas medidas salvadoras, pois dessa forma será entregue um paciente estável para avaliação secundária, onde ele vai ter um diagnóstico definitivo e vai ser tratado. 3 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 IMPORTANTE O número de vítimas e a gravidade das lesões excedem a capacidade de atendimento do pessoal e/ou hospital → Serão atendidos primeiramente os pacientes com maior chance de sobrevida; O número de vítimas e a gravidade das lesões não excedem a capacidade de atendimento do pessoal e/ou hospital → Serão atendidos primeiramente os pacientes com risco iminente de vida. AVALIAÇÃO PRIMÁRIA - ABCDE A sistematização do ABCDE é um fluxograma que tentou no profissional deixar um pouco automático a adoção de medidas, que são avaliação da perviedade da via aérea, a avaliação do aparelho respiratório, o combate ao choque e tratamento da hemorragia, a avaliação neurológica e a exposição completa. Devem ser feitas nessa ordem, mas concomitantemente. Isso de ABCDE sinaliza só que não posso me preocupar em calcular a escala de Glasgow antes de tratar um pneumotórax na letra B. Isso é feito de forma simultânea e várias vezes durante o atendimento, pois a situação clínica do paciente vai mudando. Não pode priorizara letra E, em detrimento da A, B, C e D. Nessa ordem de atendimento a chance de você tomar medidas que mantenham a vida do paciente íntegra é maior. A primeira coisa a ser feita na avaliação primária é perguntar o nome do paciente. Quando chega na cena é instantâneo. Não é o momento de perguntar o que aconteceu, mas sim o nome do paciente, pois na hora que o paciente responde o nome dele, isso traduz para que a via aérea dele está pérvia, que o padrão ventilatório está normal, que a oxigenação está boa, status neurológico. Então, não há sinais ou sintomas de choque. Choque não significa perda de volume, e sim o estigma da hipoxemia tecidual. Toda avaliação começa com essa pergunta: “Senhor, qual o seu nome?” XABCDE Atualmente, na abordagem do PHTLS, que é o atendimento pré-hospitalar adicionou-se a letra X, que significa exsanguíneo. É a adoção de medidas que combatem a hemorragia. No PHTLS, o combate a hemorragia precisa ser adotado antes do fluxograma normal do ABCDE. • A → Abertura de vias aéreas: avaliar se a via aérea está pérvia. Significa tudo que faz com que a via aérea seja obstruída. A via aérea é formada pelas fossas nasais, faringe (músculo estriado), laringe, traqueia, brônquios e bronquíolos e alvéolos. Ps. Todo músculo esquelético é estriado, mas nem todo músculo estriado é esquelético. Todo músculo estriado tem um controle voluntário. O córtex cerebral, que é o telencéfalo, onde ficam os corpos celulares dos neurônios, vão mandar os axônios que vão formar os nervos periféricos para inervar esses músculos. Então, quando tem alguma coisa do córtex, por exemplo, um sangramento, vai ter um comprometimento desse envio de mensagem. Então esse músculo da faringe vai ficar flácido e a língua (implantada no palato mole; estrutura muscular) vai perder a sua tonicidade (vai cair), obstruindo a passagem de ar. Da mesma forma, na letra A pode combater a obstrução por corpo estanho (exemplo - dentadura). • B → Ventilação e respiração: é o exame físico do aparelho respiratório. Inspeção, palpação, percussão e ausculta, pois, vai diagnosticar as patologias torácicas que são agregadoras de morte no trauma, como um pneumotórax hipertensivo, hemotórax maciço, pneumotórax aberto e tórax instável. • C → Circulação com controle de hemorragia: combater hemorragia, procurando o local e identificar o choque. O choque mais prevalente no trauma é o hipovolêmico do tipo hemorrágico (necessita de volume e combate a hemorragia). Os outros tipos de choques, como o neurogênico, não agregam morte no momento inicial. • D → Exames neurológicos (disfunção): Status neurológico. Vamos definir medidas como a proteção da via aérea, uma vez que a letra D traduzir que o comprometimento neurológico está elevado. Se o córtex estiver muito comprometido, essa mensagem não chega aos músculos e há a probabilidade de não ventilar (a respiração é a nível celular; a ventilação é o procedimento de inspiração e expiração), pois isso depende dos músculos intercostais, 4 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 diafragma (músculos estriados). Se não tiver resposta cortical eles não vão funcionar. • E → Exposição e controle de hipotermia: identificar outros agravos Essa é a ordem de priorização, mas tudo isso é feito ao mesmo tempo. Não pode priorizar a letra E antes de tratar a D e por aí em diante. A – VIA AÉREA E COLUNA CERVICAL • Manter perviedade; • Aspirar via aérea com aspirador rígido. • Fornecer oxigênio com máscara não reinalante.: mesmo que o indivíduo esteja respirando bem, pois isso garante a ventilação máxima possível. Na letra A, pode também realizar manobras que vão garantir a prevenção da queda da língua. Se houver uma flacidez de base de língua, a rinofaringe (área que se comunica com a nasofaringe) vai ser obstruída, o ar não vai passar, e o indivíduo não vai conseguir ventilar. Por isso que faz manobras que elevam a região cervical, como Jaw-Thrust (elevação através do ângulo mandibular) e Chin-Lift (elevação através do mento). Isso garante o posicionamento da base da língua no local correto e impedir o comprometimento ventilatório. Associado a isso também tem a cânula de guedel que mantem a língua na posição anatômica. Elas são numeradas (1-7) e essa numeração tem uma cor diferente. Para saber qual tamanho deve ser usado, é preciso fazer uma medida entre a narina e o ângulo da mandíbula. A forma de colocar a cânula de guedel é com a sua extremidade apontando para o nariz e dentro da boca é que gira, pois se imediatamente colocar a cânula na posição final que ela deve ficar, acontece que ao introduzir ela acaba empurrando ainda mais a língua para trás, e em vez de ajudar, piora a situação. Então, adentra com a cânula totalmente e só lá dentro que gira 180º graus, garantindo que a língua fique na posição certa e o ar passe entre as paredes da cânula. Além de poder ofertar oxigênio pelo conduto, serve também para evitar as mordidas e até o rompimento de um tubo. Nesse momento, no final da letra A, em que já fez medidas de elevação, forneceu obrigatoriamente O2, aspirou, já vai conseguir ter uma noção de como o paciente está respondendo, pois o paciente estará monitorizado (visualização da FR, FC, saturação). Se o paciente tiver com a saturação baixa, com nível de consciência comprometido, então, nesse momento tem que definir se vai deixar o paciente só com suporte de oxigênio ou se vai garantir a via área. Garantir a via aérea é passar um tubo e depois insuflar o cuff. A passagem do tubo pode ser feita através de IOT, cricotireoidostomia e traqueostomia. Nesse momento, se o paciente precisar de uma via área definitiva e você não fizer, é uma falha no atendimento inicial, colocando o paciente em risco eminente de vida. 5 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 • Nível de consciência alterado; • Dor e/ou sensibilidade na linha média cervical ou dorso; • Sinais neurológicos focais; • Deformidade anatômica da coluna. Todo paciente politraumatizado tem um risco eminente de trauma raquimedular e como o principal sitio de TRM é a coluna cervical, preconiza a utilização de um colar cervical para imobilizar/estabilizar a coluna cervical do paciente! Além disso, é ponto de conflito no ATLS, sobre a estabilização do resto do neuroeixo, que são a coluna toracolombar e o finalzinho da coluna sacral, e essa estabilização se daria pelo pranchamento do paciente. Esse pranchamento tem que ser com uma prancha rígida, seja ela a tradicional de madeira ou as alternativas (em colher ou insuflável), que são formas de garantir o transporte. Porém, a manutenção do paciente em prancha rígida ou não ainda não é ponto de consenso. Algumas escolas advogam que o paciente deve ser mantido na prancha só para transporte (prática), e caso não tenha nenhum sinal neurológico focal, deformidade ou alteração sensitiva, pode ser tirado da prancha. Isso porque a manutenção do paciente na prancha aumenta a REMIT (resposta endócrina, metabólica e imunológica do trauma), pois o paciente fica submetido a uma situação de estresse muito maior. Outra escolas dizem que o paciente só pode ser tirado da prancha quando for excluída qualquer lesão após a rotina radiológoca do trauma. A imagem acima ilustra as formas de pranchamento. Tem o pranchamento com o paciente em decúbito dorsal, lateral e ventral. É importante saber que o pranchamento é sempre monobloco, prioritariamente com 3 profissionais, um na cabeça e dois no corpo, e esse monobloco garante que o paciente seja movido lateralmente e posicionado na prancha de uma vez só. Quando o paciente está deitado em decúbito ventral a prancha é posicionada na parte posterior e o paciente em monobloco tambémé virado. B – VENTILAÇÃO – EXAME FÍSICO DO TÓRAX É o exame físico do aparelho respiratório. Inspeção, palpação, percussão e ausculta. • Diagnosticar: ❖ Pneumotórax; ❖ Hemotórax; ❖ Tamponamento cardíaco; ❖ Contusão pulmonar; ❖ Contusão cardíaca; ❖ Ruptura de vasos; ❖ Lesão de diafragma; ❖ Lesão de esôfago. O objetivo é diagnosticar as principais patologias torácicas que podem levar o paciente a morte. Se você não identifica tais patologias, é uma falha no atendimento inicial e pode haver comprometimento do paciente. Tem que DRENAR O TORÁX NESSE MOMENTO e não esperar chegar no hospital. • 4 condições que não podem sair da sala de emergência sem diagnóstico e conduta: 1. Pneumotórax hipertensivo; 2. Hemotórax maciço; 3. Pneumotórax aberto; 4. Tórax instável/contusão pulmonar. À medida que você negligencia isso aqui, o paciente pode evoluir de pneumotórax simples para um quadro de insuficiência respiratória (intubação), pneumotórax hipertensivo, choque obstrutivo e morte. Neste momento, além da avaliação, entram as medidas de ressuscitação, sendo uma delas, a passagem do dreno do tórax. É diferente de um paciente que tem um TCE – hematoma subdural, porque isso não vai ter muita mudança no caso do paciente. Lá no hospital, sim! 6 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 C – CIRCULAÇÃO/CONTROLE DE HEMORRAGIAS • Identificação precoce do choque: ❖ Expressão clínica da falência circulatória aguda que resulta na oferta insuficiente de oxigênio para os tecidos. Choque não significa perda de sangue! Choque é uma síndrome, ou seja, um conjunto de sinais e sintomas que refletem a hipoxemia tecidual. No sangue, a hemoglobina que está no interior das hemácias (1 anel de protoporfirina 4 com 1 anel ferroso), se liga covalentemente a molécula de O2 e conduz o oxigênio até os tecidos. Quando há um comprometimento dessa oxigenação tissular, os tecidos de uma forma geral, exceto o nervoso, vão conseguir fazer respiração anaeróbia através da produção do lactato e consegue sobreviver por um tempo limitado. Então, a falta de oxigênio vai levar a um comprometimento da funcionalidade dos órgãos e esse conjunto de sinais e sintomas se expressa na forma de choque. Existem 4 tipos de choques: o hipovolêmico, o cardiogênico, o distributivo (choque medular) e o obstrutivo. O mais frequente no trauma é o hipovolêmico do tipo hemorrágico, por isso que a letra C é sobre o controle do choque e da hemorragia. Pode existir também o hipovolêmico por desidratação que é o caso do paciente queimado. Recapitulando a diferença da hemorragia da letra X para a hemorragia da letra C do ABCDE: o significado da letra X (feito no atendimento pré- hospitalar) é unicamente para o controle da hemorragia externa (contenção do sangramento visível), enquanto que na letra C trata-se do controle da sequela do sangramento (se manifesta na forma de choque hipovolêmico). Atualmente, se preconiza que faça o controle do sangramento com uso de torniquetes ou outros métodos. O conceito de choque não está restrito apenas e perda de sangue, e na verdade, significa hipoxemia tecidual. Diversos mecanismos levam ao choque, como é o caso do pneumotórax (não tem hematose e falta oxigênio nos tecidos). No caso da letra C, deve ser tratado todos os tipos de choque, mas priorizando o controle do sangramento. Dúvida: Como é feito o manejo de um pneumotórax? Em um pneumotórax hipertensivo realiza-se uma toracocentese de alívio e assim que possível, realiza- se a drenagem de tórax selo d’água para evitar que o paciente fique no processo de coleta e recoleta. No caso de um pneumotórax simples, é importante saber diagnosticar, sendo este diagnóstico feito por meio de percussão e assimetria torácica utilizando a semiologia abordada pela letra B do ABCDE. Neste caso, realiza a drenagem torácica em selo d’água também. Se não for colocado o dreno selo d’água, esse pneumotórax simples se torna hipertensivo, isso porque a lesão que acontece lá no segmento bronquiopleural que faz com que o ar passe pelo espaço intrapleural e se acumule lá vai ser mantido. Então, à medida que o indivíduo for ventilando, vai acumulando mais ar, e será necessário entubar e realizar uma punção de alívio nesse paciente. Ar, pus e sangue (pneumotórax, empiema e hemotórax) precisam sair do espaço pleural, portanto deve ser feito drenagem em selo d’água. No caso de pneumotórax aberto, faz curativo em três pontas e drenagem em selo d’água assim que possível. PASSO A PASSO Continuando a respeito do tratamento do choque e partindo do princípio que a principal causa é um choque hipovolêmico do tipo hemorrágico, é importante identificar o local do sangramento. Para isso, devemos identificar os sinais precoces de choque, como a taquicardia. Lembrar que a hipotensão é um sinal tardio! O corpo vai responder aumentando o débito cardíaco pelo aumento da frequência cardíaca, portanto, hipotensão demonstra que existe uma falha dos mecanismos compensatórios e não um estigma de choque. 7 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 Onde sangra? Mnemônico do sangue no chão (teoricamente já combatido na letra X, com torniquete e imobilização na fratura exposta) e nos 4 locais (locais mais comuns do trauma: tórax, abdome, retroperitônio e pelve). A pelve óssea também é incluída, pois a medula óssea dos ossos plano-chato laminares (calota craniana, costelas, crista ilíaca) são a principal fonte de hematopoiese do adulto. Na criança são os ossos longos (tíbia, úmero e fêmur). Após a avaliação de sangramento externo, contenção do mesmo e apesar dos sinais de choque, já pode-se descartar a possibilidade de trauma de tórax, visto que não foi identificado sinais de derrame pleural no tórax pós trauma, o que nos levaria a pensar que seria um hemotórax (derrame pleural), com abolimento de murmúrios vesiculares e som de macicez a percussão. Dessa forma, se fosse o caso de um hemotórax, deveria ser realizado a drenagem, e vindo sangue, então o foco de sangramento foi identificado. Ao descartar hemotórax, volta-se a atenção para o abdome, e por conta disso, no caso do paciente se encontrar em um hospital, durante o atendimento inicial iria ser feito o USG FAST, em situações específicas, onde é identificado o sangramento. O próximo passo após identificação do sangramento é parar o sangramento, estancar (quando é possível no sangramento externo) e repor volume com soro. Essa conduta mencionada anteriormente foi alterada, e a partir de agora, fazemos a classificação do choque hemorrágico de 1 a 4 e cada um dos níveis de choque, demandam um tratamento específico. Resumindo o passo a passo para o manejo do choque, temos a seguir: CHOQUE HEMORRÁGICO 1. Fazer o diagnóstico. 2. Classificar o choque. 3. Repor volemia. 4. Avaliar a resposta a reposição inicial. Mediante um paciente em choque que está sendo abordado na letra C, o manejo é feito com 2 acessos calibrosos, com jelco de tamanho 14 ou 16 e priorizando o acesso periférico, tendo como segunda opção o acesso intraósseo e na terceira opção o acesso venoso central. Além disso, faz o uso de 1 litro de infusão rápida soro ringer lactato, cuja osmolaridade é mais semelhante a osmolaridade plasmática ou soro fisiológico aquecido. Após 1 litro de infusão de soro rápido o paciente pode responder bem e ter um controle dos sinais de choque. Se necessário, faz mais 1L. Não é o ideal fazer 2L de soro imediatamente, pelo fato de o choque ser um déficit de oxigenação, e devido ao fato de a hemoglobina conduzir oxigênio, ao fazermos a reposição com mais 2L de soro, a hemoglobina se torna diluída e dificulta a perfusão do paciente. Se o paciente não responder com 2L, não precisa colocar mais porque o queele precisa é de hemoglobina. Neste caso, entram os hemoderivados. 1 litro → reavaliação → 1 litro → hemoderivados. AVALIAÇÃO NEUROLÓGICA • Avaliação pupilar: É um indicativo bom para avaliação de topografia da lesão, ou seja, o local em que ela se encontra. De forma resumida, nós temos a pupila, que é a abertura que comunica o espaço anterior do globo ocular com a câmara posterior onde se localiza a retina. Na retina, a luz que passa pela pupila se concentra nos cones e forma um estímulo nervoso que será conduzido pelo segundo par craniano, o nervo óptico. Esse nervo, partindo de ambos os globos oculares, vão se cruzar no quiasma óptico e lá no quiasma, ao nível do tronco encefálico, eles estimulam o terceiro par craniano, nervo oculomotor, promovendo a contração do músculo esfincteriano pupilar. O nervo oculomotor é totalmente motor e faz parte do sistema nervoso parassimpático, juntamente com o 7º, 9º e 10º pares cranianos. O sistema nervoso simpático está ao nível a coluna toracolombar, T1a L1, e a pupila recebe 5% de inervação do SNS. Portanto, quando se coloca um foco de luz na pupila e a mesma contrai, traduz um estímulo ao nervo óptico, chegou o estímulo ao oculomotor e este contraiu a pupila (miose). Ambas as pupilas se contraem, pois no quiasma óptico, as fibras se entrelaçam e estimulam os dois nervos. Além disso, dizemos que a pupila é não fotorreagente quando ela não responde ao estímulo fotomotor e é denominada 8 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 de anisocórica quando uma das pupilas está tendo uma resposta diferente da outra. Em uma analogia, quando temos um paciente com sangramento dentro do crânio, aquele processo expansivo faz a compressão do nervo oculomotor provocando inicialmente uma hiperreação e levando a uma pupila miótica. Por conta disso, a pupila miótica traduz trauma/lesão intracraniana. Do lado acometido. Se o processo expansivo se mantém, ocorrerá hipoxemia, as células neuronais vão morrer e o nervo oculomotor deixa de funcionar, para tanto, só restará os 5% do sistema nervoso simpático, passando lateralmente ao mesencéfalo e chegando na região lateral do músculo esfíncter pupilar. Dessa forma, a pupila fica midriática e evolui para morte encefálica, se tornando uma pupila com midríase fixa bilateral. • Escala de coma de Glasgow; A escala de coma de Glasgow avalia o status neurológico, ou seja, ela avalia a cognição (capacidade do indivíduo de se manter no estado de vigília). Vale lembrar que o SNC é dividido em periférico e central, sendo este último formado pelo encéfalo e medula. No encéfalo, tem o telencéfalo, que é a parte cortical contendo corpos celulares dos neurônios que enviam informações neurais para contração da musculatura e também é de onde saem fibras nervosas para o sistema nervoso autônomo. Então, quando o córtex está comprometido, várias funções estarão comprometidas, como a resposta verbal, resposta motora e a abertura ocular. Sendo assim, definiu-se o número 8 da escala de Glasgow como o ponto de corte para introdução de uma via aérea definitiva, pois foi visto que quanto menor o número/classificação na escala de Glasgow, maior o comprometimento do córtex. Então aquela musculatura que está no espaço intercostal, como o diafragma, estará com sua inervação comprometida, consequentemente, seu funcionamento não será adequado, ou seja, não haverá uma ventilação eficaz, e portanto, o paciente precisará ser intubado. Na escala de Glasgow, o paciente perde ponto quando tem ausência de reflexo pupilar. • Lateralidade. E – EXPOSIÇÃO E CONTROLE AMBIENTAL • Expor todo doente → buscar outras lesões. • Prevenir hipotermia. Na letra E, realiza-se o máximo de exposição possível do doente para melhor inspeção visual e exame físico e para facilitar a busca por lesões. Segundo o ATLS, indica-se a realização do toque retal e vaginal que é bastante questionado nas literaturas. Lembrando de durante a exposição, não se esquecer de utilizar o isolante térmico (papel laminado com a parte refletora voltada para o paciente) para prevenção de hipotermia. Além disso, durante o manuseio de um paciente com suspeita de trauma com lesão de coluna, indica-se que ele seja girado em monobloco. 9 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 1 MEDIDAS AUXILIARES • Sondas; • Monitorização multiétnica: pressão arterial, frequência cardíaca, frequência respiratória e saturação periférica de O2. • Reavaliação contínua. MECANISMO MIST ❖ Mecanismo: o que aconteceu? Acidente de moto, carro. O que o paciente teve? Trauma torácico, TCE. Como estão as pupilas? ❖ Injúrias encontradas e suspeitas → Considerar a transferência. Na hora que a estabilidade do paciente for garantida, ele vai ser transferido. Atendimento pré-hospitalar, UPA → hospital de maior porte (exemplo. HGE). ❖ Sinais e sintomas: o que foi visto? Taquicardia, hipotensão ... ❖ Tratamentos: o que foi feito? volume, drenagem de tórax. AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA Após a estabilização do quadro e o paciente já estar fora de risco iminente, realiza-se a avaliação secundária, que compreende: • História clínica: ❖ A → Alergias; ❖ M → Medicamentos: uso habitual. ❖ P → Passado médico: ex. paciente grávida. ❖ L → Líquidos e alimentos: noção em relação ao jejum em casos de necessidade de cirurgia. ❖ A → Ambiente e eventos: mecânica do trauma, magnitude e lesão esperada de acordo com o tipo de trauma ocorrido. • Exame físico: dos pés a cabeça. ❖ Cabeça e pescoço; ❖ Maxilofacial; ❖ Coluna vertebral; ❖ Tórax; ❖ Abdômen; ❖ Períneo. A meta da avaliação secundária é chegar ao diagnóstico, e para isso, será utilizado medidas auxiliares, como: • Medidas auxiliares: ❖ TC; ❖ RM; ❖ EDA; ❖ Broncoscopia; ❖ USG FAST. TRATAMENTO FINAL A sistematização para o tratamento final perpassa as seguintes etapas: Ocorreu o trauma e a equipe se prepara para o atendimento, simultaneamente está sendo feito a triagem das vítimas e então, durante a avaliação inicial, de acordo com o ABCDE, são feitas as medidas de reanimação e as medidas auxiliares, intubação, drenagem torácica, monitorização multimétrica. Quando o paciente está estável e considera-se a transferência, ao chegar no hospital, é feito avaliação secundária com coleta de história clínica ampla e exame físico completo, associado a medidas auxiliares, como TC, RNM, EDA e USG fast com o objetivo final de chegar ao diagnóstico e realiza-se o tratamento definitivo. BIBLIOGRAFIA • ATLS: Advanced Trauma Life Support for Doctors. American College of Surgeons. 10 a edição. 2018. • Ferreira, L.M., Odo, L.M. Guia de Cirurgia: Urgências e Emergências, 1 ª edição. São Paulo: Editora Manole, 2001.
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