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1 UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA MIOPIA EM MARKETING: UMA ANÁLISE LARISSA CELANO GAGLIANO BIANCO Rio de Janeiro 2021 2 MIOPIA EM MARKETING: UMA ANÁLISE Larissa Celano Gagliano Bianco1 RESUMO Publicado no segundo semestre de 1960, Miopia em Marketing é um artigo de autoria do professor alemão Theodore Levitt na revista bimestral Harvard Business Review, na qual trabalhava como editor. Fazendo jus ao nome, Miopia em Marketing tem como objetivo apontar e criticar como as empresas tem seu foco no desempenho do produto, deixando de levar em consideração a demanda e o interesse de seus clientes. ABSTRACT Published on the second semester of 1960, Marketing Myopia is an article written by German professor Theodore Levitt in the bimonthly magazine Harvard Business Review, on which he worked as an editor. Living up to the name, Marketing Myopia aims to point out and criticise how busimess companies end up focusing solely on their products, failing to take in consideration the demands and interests of their clients. Palavras-chave: Marketing, produto, cliente. O texto inicia-se com o autor apresentando brevemente a ideia de setores de rápida expansão, os quais denomina estagnados, não por conta de um mercado saturado, mas por conta de má administração. Para ilustrar a ideia, se utiliza de exemplos: estradas de ferro que perderam espaço para os automóveis por considerarem-se apenas empresas ferroviárias, e não empresas de transporte, como deveriam. Outro exemplo citado é Hollywood e o setor de cinema, que se consideravam exclusivos e limitados, e 1 Graduanda em Comunicação Social com ênfase em Jornalismo pela Universidade Veiga de Almeida (UVA) 3 rapidamente perderam espaço para a televisão por considerarem-se como tal, e não como simplesmente entretenimento. Os exemplos acima são o que Levitt define como erros de análise. As empresas se superestimam ao subestimar o potencial dos possíveis concorrentes, enxergando-se como únicas, exclusivas ou versáteis, como afirma o autor, de forma que deixam de se preocupar com a inovação do mercado e acabam por se tornarem, eventualmente, ultrapassadas. Lhes falta enxergar à frente de seu tempo e considerar que nada é absoluto e o mercado vive em constante mudança. Como diz Levitt, o erro consiste em contar com a “superioridade inigualável de seu produto”. O autor aponta que as empresas se esquecem, no entanto, que tudo o que há hoje veio para substituir algo do passado, reforçando a ideia de que nada é único e insubstituível, mas deve inovar-se a fim de atender a demanda do público. São citados como exemplos a diminuição no uso da lavagem à seco, a troca das mercearias de esquina pelos grandes supermercados e a substituição das lâmpadas à querosene pela energia elétrica, esta última que por muito tempo vem sendo tida como “absoluta”, mas deve manter em mente, como todos os outros setores, que é preciso enxergar um passo à frente, utilizando-se da iminência de uma concorrência à altura para se reinventar e manter-se relevante. Um exemplo mais moderno que podemos citar é a praticamente extinção das locadoras de filmes com o avanço da tecnologia para os serviços de streaming. O que antes teve de se adequar aos DVDs com o fim das fitas VHS, atualmente foi incapaz de oferecer um concorrente à altura das plataformas de streaming que se tornaram queridinhas dos consumidores por sua praticidade e eficiência. Entre deslocar-se até uma videolocadora e assinar um streaming do conforto da sua residência, principalmente com a correria dos tempos modernos, é claro que o consumidor irá optar pela opção que demande menos do seu tempo. Segue com o que Levitt chama de “ciclo auto ilusório”: empresas e empresários que confiam cegamente na relevância de seu produto, não enxergando a possibilidade de se tornar estagnada até que isso ocorre. Para o autor, esse ciclo se dá por quatro condições, sendo estas: a crença de uma população em crescimento assegura o desenvolvimento; a crença de que o produto não possui concorrentes à altura; fé exagerada na produção em 4 massa e as vantagens da queda rápida de custos unitários proporcional ao aumento da produção; e por último, a preocupação com um produto testado e experimentado de forma caprichosa, seu aperfeiçoamento e custo de produção reduzido. Segundo o economista, há uma crença impregnada nos setores de produção de que a população em crescimento assegura os lucros. De acordo com ele, um crescimento da quantidade de consumidores proporcional ao número de vendas assegura uma certa paz ao produtor que pensa no futuro - é muito mais fácil pensar sob ótimas condições do que diante de cenários difíceis. No entanto, essa mesma paz e sossego impedem uma expansão mais rápida e eficiente, uma vez que não há problemas com os quais se preocupar e, por fim, não há raciocínio lógico acerca do que pode estar por vir. Utilizando o velho setor de petróleo como exemplo, Levitt acreditava que, em 25 anos, a indústria do petróleo se encontraria na mesma situação da decadência das estradas de ferro: substituídas por algo melhor. Isso não aconteceu, mas a gasolina encontrou alguns concorrentes como o combustível à base de álcool. Mais recentemente, os transportes elétricos vêm se popularizando novamente entre a elite, mas ainda é uma alternativa cara demais para a maioria da população para competir com o combustível à base de petróleo. Para o professor, o setor petroleiro havia tido como foco principal a melhora no modo de adquirir e fabricar seus produtos, ao invés de melhorar o produto em si e se preocupar com a sua comercialização. As grandes companhias, ao se garantirem apenas na exclusividade de seu produto focando apenas no meio de produção, não são as grandes responsáveis pelo sucesso do combustível à base de petróleo, mas sim outras empresas menores que seguem inventando novos produtos à base de óleo combustível. Utilizando o exemplo dado por Levitt, o querosene só conseguiu se manter após a substituição do lampião à base de querosene pela lâmpada elétrica porque os aquecedores de ambiente necessitavam do combustível para se manter funcionando. Outro exemplo utilizado pelo autor é da montadora automobilística Detroit que, assim como a indústria petroleira, confiava demais no nome que criara para si, ignorando completamente as exigências e preferências do público. Enquanto sempre fez pesquisas de mercado com seus consumidores, a questão nunca fora o que queriam num novo carro, mas o que preferiam dentro daquilo que a montadora já oferecia. A partir do momento 5 em que pequenos concorrentes passaram a oferecer algo que eles não tinham, grande parte de seu público migrou para estes pequenos fabricantes. Novamente, assim como as empresas petroleiras, seu foco estava virado para o produto que oferecia, e não para o interesse do público alvo. Como aponta o autor, muito se acreditava naquela época que o marketing era consequência do sucesso do produto, que era sempre posto em primeiro lugar na lista de prioridades. Atualmente, pode-se observar que a prática vem se invertendo: é cada vez mais clara a necessidade e vantagem de se investir nas campanhas de marketing de um produto, seja este superior aos concorrentes ou não. Campanhas bem elaboradas, elementos da cultura moderna e jogos de palavras, por exemplo, muitas vezes contribuem mais para a venda de um produto mediano do que a eficiência do produto em si. Levitt cita Henry Ford e sua mundialmente conhecida estratégia de vender carros pelo preço de 500 dólares. Apesar de pecar tirando o poder de escolha do consumidor ao vender apenas carros na cor preta, vender seus veículos por um preço tão baixo garantia alcançar até mesmo as classes sociais maisbaixas, atendendo a uma parcela da população que seus concorrentes não alcançavam por questões financeiras. O alemão afirma que “ao invés de um gênio em matéria de produção, na realidade era um gênio em marketing”. Por que não os dois? Adotar a produção em massa foi o que possibilitou o baixo custo de seus automóveis que, por sua vez, possibilitou a compra em massa por parte das diversas classes sociais. Para o autor, no entanto, a atitude de baixar o custo de produção de Henry Ford é, na verdade, mais um exemplo de auto ilusão. É necessário enxergar que o sucesso de Ford se deu numa época muito diferente economicamente falando, e tentar aplicar a estratégia sem analisar o mercado atual é arriscado e pode levar a uma piora nos negócios. Como vimos anteriormente, é preciso ter uma visão crítica acerca do produto em questão e seu público-alvo, e não o ter como um “faturamento garantido” de forma a ignorar qualquer coisa além do produto em si. Levitt comenta que, ainda na década de 60, um dirigente de automobilística de Detroit previa a possibilidade de que carros movidos a energia solar seriam comuns até 1980. A previsão se concretizou parcialmente: aproximadamente 20 anos depois, o dinamarquês Hans Tholstupen e o australiano Larry Perkins fizeram a primeira viagem a 6 bordo de um carro movido a energia solar, o qual chamaram de The Quiet Achiever. Já em 1985, na Suíça, foi realizado um torneio onde parte dos 72 participantes se locomoveu em veículos movidos apenas a energia solar. Mais recentemente, em 2020, a empresa holandesa Lightyear já encomendava 500 de seu exemplar elétrico, o Lightyear One. No entanto, infelizmente, devido ao alto custo de pesquisas e mão de obra, o automóvel elétrico ainda está muito longe de se tornar algo comum. O professor entende que, a qualquer momento, a indústria do petróleo sofrerá uma “destruição criativa”. Diante dos avanços tecnológicos e a demanda do mercado por um novo tipo de combustível menos prejudicial ao meio ambiente, é inevitável que tenham que, em algum momento, se reinventar e abrir mão da gasolina que conhecemos hoje como principal combustível dos meios de transporte. A indústria petroleira deve abandonar tudo com o qual está acostumada a fim de ultrapassar seus concorrentes e não cair no esquecimento. Utilizando como exemplo a indústria eletrônica, Levitt considera seu grande avanço inicial um “marketing fraudado”. Uma vez voltados para as vontades do setor militar, sua inovação é apenas de interesse pessoal, uma vez que já sabe exatamente o que entregar a seu consumidor – os militares – e sem ter de se preocupar ativamente com sucesso ou fracasso de vendas. Não há marketing, apenas um produtor entregando a seu consumidor um produto previamente definido; não há preocupação com o sucesso do produto, uma vez que seu foco é apenas o produto que deve ser entregue exatamente como requisitado. Novamente, Levitt analisa que a atitude contínua de se focar sempre no produto em questão acima das vontades do consumidor é consequência de dois fatores: primeiro, a complexidade do setor eletrônico abre margem para um foco maior no desenvolvimento do produto, de forma que o marketing deixa de ser importante; segundo, os administradores de empresas eletrônicas têm preferência pelo que já conhecem e conseguem ter um maior controle, em detrimento da imprevisibilidade do marketing. Por fim, Levitt chama atenção ao fato de que as empresas devem entender que seu maior foco deve ser no interesse do cliente – o que pensa e o que deseja – ao invés de se importar única e exclusivamente com seu produto. É do interesse de todas as empresas preocupar-se com os interesses de seu público, estudá-lo e agradá-lo - não o contrário. O 7 autor frisa o fato de que “vendas não é marketing”, mas sim uma consequência deste. O ato de vender baseia-se simplesmente nas artimanhas para convencer o consumidor a comprar; já o marketing, vai muito além. O marketing estuda o comportamento do consumidor além da venda, sempre buscando inovar suas estratégias e manter-se relevante no mercado. Diferentemente do que acreditavam os antigos empresários das companhias de petróleo e eletrônica, é muito mais interessante focar no interesse do cliente do que rebaixá-lo a um mero consumidor de seu grandioso produto. CONCLUSÃO Apesar de escrito há mais de 60 anos, o artigo de Theodore Levitt descreve bem exatamente o que não se deve fazer quando à frente de um negócio: menosprezar o poder do marketing. Levitt se utiliza de três grandes setores para ilustrar seus exemplos, tornando a leitura não apenas um ensinamento sobre marketing, mas também de história. Suas ideias podem facilmente ser aplicadas aos dias modernos, sobretudo com o grande avanço que vem sofrendo o setor de tecnologia nos últimos anos. Agora mais do que nunca, o marketing se tornou algo essencial na construção de uma empresa, e aquelas que não investem no ramo dificilmente chegam tão longe quanto gostariam. Não só se tornou necessário por conta da praticidade e eficiência da internet, mas também porque diante do avanço da mesma, houve também um aumento significativo da concorrência, exigindo estudos cada vez mais profundos acerca do público consumidor. Diante desta situação, é indispensável um marketing de qualidade, sem qualquer possibilidade de focar apenas no próprio produto como fizeram os setores de outrora. MIOPIA EM MARKETING: UMA ANÁLISE MIOPIA EM MARKETING: UMA ANÁLISE
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