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AT 1 2 32 S U M Á R IO 3 UNIDADE 1 - Introdução 4 UNIDADE 2 - Fungos 5 2.1 Características gerais 6 2.2 Aspectos microbiológicos 7 2.3 Citologia dos fungos 8 2.4 Fisiologia e metabolismo 8 2.5 Patogenia por fungos 9 2.6 Classificação das micoses humanas 10 2.7 O gênero Candida 10 2.7.1 Aspectos imunológicos do gênero Candida 11 2.7.2 Diagnóstico laboratorial do gênero Candida 16 2.8 Procedimento para coleta de amostras 18 2.9 Processamento de amostras 19 2.10 Exame microscópico de amostra e interpretação dos aspectos morfológicos 22 UNIDADE 3 - Vírus 23 3.1 Características gerais 25 3.2 Replicação de vírus 27 3.3 Vírus bacterianos - bacteriófagos 28 3.4 Vírus de doenças humanas 28 3.4.1 Vírus DNA 28 3.4.2 Vírus RNA 32 UNIDADE 4 - Infecções e Hepatites Virais 37 UNIDADE 5 - Síndrome da Imonodeficiência Adquirida – AIDS, Viroides e Príons 37 5.1 AIDS 40 5.2 Viroides 42 5.3 Príons 42 5.4 Vírus oncogênicos 44 UNIDADE 6 - Diagnóstico Laboratorial para Vírus 44 6.1 Coleta de material 45 6.2 Isolamento de vírus 46 6.3 Identificação direta e indireta dos vírus 48 6.4 Ensaios Moleculares 50 GLOSSÁRIO 51 REFERÊNCIAS 2 33 UNIDADE 1 - Introdução É verdade que por um tempo os micror- ganismos foram considerados somente ob- jetos de especulação, mas a contribuição, a persistência, o comprometimento e os esforços de inúmeros pesquisadores soma- ram-se para percebermos a sua importância (positiva e negativa) na vida dos seres huma- nos, animais e plantas de maneira geral. Calcula-se que em cada indivíduo existem 100 trilhões de microrganismos, que os fun- gos estão dispersos no meio ambiente, em vegetais, ar atmosférico, solo e água, algo em torno de 200 mil espécies de fungos (me- nos de 150 descritas pelo homem); bactérias estimam-se 10 mil espécies e atualmente já foram identificados pelo menos 3600 tipos de vírus. É verdade também que as micoses duran- te anos não foram consideradas pela área médica com a atenção necessária, possivel- mente pela falta de diagnóstico adequado, no entanto, o aumento do número de pa- cientes suscetíveis aos mais variados tipos de infecções tem aumentado, igualmente as infecções fúngicas. Pois bem, veremos neste módulo as carac- terísticas gerais de fungos e vírus, aspectos microbiológicos, morfologia, citologia, classi- ficação, com foco nas técnicas de identifica- ção e diagnóstico laboratorial para algumas espécies ou gêneros de maior interesse. Ressaltamos em primeiro lugar que embo- ra a escrita acadêmica tenha como premissa ser científica, baseada em normas e padrões da academia, fugiremos um pouco às regras para nos aproximarmos de vocês e para que os temas abordados cheguem de maneira clara e objetiva, mas não menos científicos. Em segundo lugar, deixamos claro que este módulo é uma compilação das ideias de vá- rios autores, incluindo aqueles que conside- ramos clássicos, não se tratando, portanto, de uma redação original e tendo em vista o caráter didático da obra, não serão expres- sas opiniões pessoais. Ao final do módulo, além da lista de refe- rências básicas, encontram-se outras que foram ora utilizadas, ora somente consulta- das, mas que, de todo modo, podem servir para sanar lacunas que por ventura venham a surgir ao longo dos estudos. 4 54 UNIDADE 2 - Fungos Os fungos constituem um grupo de organismos com cerca de 200.000 es- pécies, das quais, aproximadamente 100 são patogênicas e estão agrupadas no Reino Fungi. O termo fungo provém do latim fungus e significa cogumelo. Segundo Koga-Ito e Jorge (2010), con- sistem numa forma antiga de vida com cerca de 400 milhões de anos. Juntamen- te com as bactérias, são considerados os principais responsáveis pela manutenção da estabilidade geoquímica da biosfera. Os fungos são distribuídos amplamente na natureza, seja em ambientes aquá- ticos como em terrestres. Crescem em ambientes com temperaturas elevadas, assim como em regiões com temperatu- ras muito baixas. A maioria das espécies cresce por extensão contínua e ramifica- ções de estruturas filiformes denomina- das hifas. Alguns fungos possuem grande valor comercial graças ao seu importante pa- pel na fermentação de bebidas, alimen- tos e produção industrial de antibióticos. Por outro lado, estão também relaciona- dos com muitas patologias em plantas, animais e em seres humanos. O Reino Fungi engloba organis- mos com morfologias distintas, uni ou multicelulares, e podem ser clas- sificados em: a) Leveduras: fungos unicelulares mi- croscópicos, que podem ser patogênicos. b) Bolores: também denominados fungos filamentosos, são multicelulares, constituídos de células microscópicas ci- líndricas ligadas nas extremidades, for- mando um filamento denominado hifa. Quando grande quantidade de hifas es- tão agrupadas, estas são visíveis a olho nu e são denominadas de micélio. Podem ser patogênicos. c) Cogumelos: organismos macroscó- picos, não patogênicos. Os fungos apresentam semelhanças com organismos do Reino Animal, tais como presença de quitina em sua parede celular e o armazenamento de glicogê- nio. Do mesmo modo, compartilham com as bactérias a função de manutenção da estabilidade geoquímica da biosfera e também a capacidade de causar doenças infecciosas, além de terem métodos se- melhantes de isolamento e culturas. Por outro lado, estes apresentam caracte- rísticas próprias e diferenças em relação aos outros Reinos, o que permitiu seu agrupamento em um Reino distinto – o Reino Fungi, conforme esquema abaixo: 4 55 A dicariose é uma característica pecu- liar dos fungos nos quais a fase dicarió- tica é prolongada, com presença de dois núcleos haplóides sexualmente opostos, em citoplasma comum. 2.1 Características gerais Além da importância ecológica dos fungos como limpadores do solo e manu- tenção da estabilidade química da bios- fera, estes também apresentam grande importância econômica. Os fungos causam imensas perdas econômicas, pois são responsáveis pela deterioração de alimentos e materiais, tais como matéria têxtil e madeira. Além disso, causam doenças em plan- tas que implicam em grandes perdas na agricultura. Muitas doenças no homem e em animais também são causadas por fungos. Outro efeito maléfico dos fungos é a produção de micotoxinas, dentre elas, a aflatoxina produzida pelo Aspergillus flavus pode estar presente no amen- doim e feijão e causa danos ao homem por toxicidade direta e efeitos carcino- gênicos. Muitos países, inclusive o Brasil, enfrentam dificuldades para exportação de produtos, como grãos e sementes, por Fonte: KOGA-ITO; JORGE (2010, p. 204). 6 7 estarem contaminados pela aflatoxina, causando grandes perdas econômicas. Por outro lado, os efeitos benéficos dos fungos também apresentam impor- tância econômica. Estes são utilizados como alimento e no processamento de alimentos, bebidas e drogas. Os fungos utilizados como alimentos são os co- gumelos que apresentam alto teor de proteínas e sais minerais, como ferro e fósforo, e vitaminas como a niacina, ribo- flavina e tiamina. Os fungos são mundial- mente utilizados na fabricação de pães, queijos, cervejas e vinhos. Estão também envolvidos na produção industrial de an- tibióticos, vitaminas e enzimas, principal- mente com o desenvolvimento cada vez maior da área de biotecnologia (KOGA-I- TO; JORGE; 2010; COSTA; PEREIRA; JOR- GE, 2012). 2.2 Aspectos microbiológi- cos Morfologicamente, os fungos podem ser classificados em unicelulares (leve- duras), multicelulares (bolores) e dimór- ficos. As leveduras são células isoladas, es- féricas ou ovais, medindo de 2 a 5 µm de diâmetro, por 5 a 30 µm de comprimento. Podem formar cadeias pela união de cé- lulas individuais. A este agrupamento de leveduras denomina-se pseudomicélio. Dividem-se por brotamento ou cissipari- dade e desenvolvem colônias circulares, cremosas, opacas ou brilhantes em ágar Sabouraud. Os bolores são fungos filamentosos ou miceliais que têm como principalforma vegetativa as hifas (grego: hyphe = teia). As hifas são tubos ramificados medindo de 2 a 10 mm de diâmetro, cujo cresci- mento se dá pela produção de ramifica- ções laterais ou por prolongamento. À medida que as hifas crescem, formam uma rede entrelaçada que recebe o nome de micélio ou talo, cujo crescimento per- mite a formação de colônias. As estrutu- ras do fungo, morfologia dos esporos e aparência da colônia em meio de cultura, além da atividade bioquímica, são dados importantes para a identificação dos fungos filamentosos. O micélio pode ser classificado em: a) micélio vegetativo: hifas que penetram no meio de cultura; b) micélio aéreo: hi- fas que se desenvolvem acima do meio de cultura; c) micélio reprodutivo: micélio aéreo que dá origem a células reproduti- vas; d) haustórios: ramos especiais de hi- fas que penetram no hospedeiro a fim de conseguir alimento. A hifa pode apresentar parede trans- versal, denominada septo, e é chamada de hifa septada. Hifas que não apresen- tam septos são chamadas de cenocíticas. 6 7 Estruturas microscópicas básicas de fungos: a, b, c - filamentosos, d - leveduras Os fungos dimórficos apresentam-se sob duas formas diferentes em condi- ções ambientais diversas. Geralmente, apresentam-se sob a forma de leveduras nos tecidos vivos e quando cultivados em profundidade em meios líquidos de cul- tura a 35-37°C. A temperatura ambien- te (25-30°C) e na superfície de meios de cultura sólidos aparecem geralmente na forma micelial, ou seja, apresentando mi- célio. Esta característica de alguns fungos parece exercer importante papel para a sua virulência. A fase hifal apresen- ta aderência maior às células e outras estruturas (plástico) em relação à fase leveduriforme (Olsen, 1990 apud KOGA- -ITO; JORGE; 2010). A aderência à superfí- cies é um importante fator de virulência, em particular para microrganismos que causam patologias na cavidade bucal, já que esta é frequentemente banhada por fluxo salivar. Estudos conduzidos por Pugh e Caw- son (1977 apud KOGA-ITO; JORGE; 2010) demonstraram que a produção de fos- folipase é particularmente concentrada nas pontas das hifas, o que pode indicar que a transformação da forma leveduri- forme para a forma hifal facilite a pene- tração do fungo através da mucosa. Tanto a forma leveduriforme quanto a forma hifal são capazes de produzir in- fecção (Ghannoum e Abu-Elteen, 1986 apud KOGA-ITO; JORGE; 2010), porém, as hifas parecem conseguir escapar mais facilmente da ação do sistema imunoló- gico do hospedeiro. Segundo a Agência Nacional de Vigi- lância Sanitária (2005), esses conceitos fundamentais representam a base para a identificação de um fungo, pois a classifi- cação de filamentosos é feita, em regra, pelas características morfológicas, tanto macroscópicas (cor, aspecto, textura da colônia, etc.), quanto microscópicas (for- ma e cor da hifa, presença ou não de sep- tos, tipo e arranjo de esporos, etc.), além da velocidade de crescimento (lenta, moderada ou rápida). A identificação de leveduras, ao contrário, é feita, principal- mente, por características fisiológicas, desde que, a morfologia destes fungos não é muito variada e não permite dis- tinção entre espécies e, em regra, entre gêneros. 2.3 Citologia dos fungos Os fungos assemelham-se às células de plantas superiores e de animais na sua complexidade anatômica, pois são euca- rióticas e possuem vários cromossomos diferentes. Os principais constituintes destas células, além dos constituintes essenciais de uma célula eucariótica, são: parede celular – constituída de duas ou várias camadas de material fibri- lar com organização característica – 90% é constituído de hexoses e hexosaminas, e 10% de proteínas, carboidratos e lipí- deos. Em muitos fungos, a molécula es- trutural é a quitina, constituída de resí- duos de N-acetil-glicosamina; lomassomos – são agregados de membrana citoplasmática localizados entre a parede celular e a membrana; núcleo – de forma irregular e tama- 8 9 nho reduzido. Durante a divisão, ocorre a presença do fuso mitótico ou meiótico no interior do núcleo, sem desorganização da carioteca; capa nuclear – estrutura conspícua envolvendo parcialmente o núcleo. Cons- titui um intenso aglomerado de ribosso- mos revestidos por um duplo sistema de membranas; organelas – apresentam mitocôn- drias, complexo de Golgi, retículos (gra- nular e liso), etc. Os fungos patogênicos geralmente não apresentam flagelos ou outros órgãos de locomoção. 2.4 Fisiologia e metabolis- mo Os fungos são imóveis em sua maioria. Não possuem clorofila ou qualquer outro pigmento fotossintético. Deste modo, dependem de produtos orgânicos de ou- tros organismos, sejam estes vivos ou mortos, como fonte de energia. São, por- tanto, heterotróficos. A maioria é aeróbio, alguns são anaeróbios facultativos, porém nenhum é anaeróbio. Os processos empregados na obtenção de energia são respiração e fermentação, sendo o último mais ca- racterístico das leveduras. Apresentam existência saprofítica ou parasitária. To- dos são Gram-positivos, corando-se in- tensamente também pelo Ácido Periódi- co de Schift (PAS). A maioria dos fungos têm como neces- sidades nutricionais, os elementos C, O, H, N, P, K, Mg, S, B, Mn, Cu, Mo, Fe e Zn. Muitas espécies não necessitam de luz para seu desenvolvimento, já outras ne- cessitam para formar suas estruturas de reprodução, podendo ser consideradas fototróficas (que buscam a luz) (MORA- ES; PAES; HOLANDA, 2009). Os fungos crescem bem em tempera- tura ambiente (25-30ºC). Os patogênicos ao homem se desenvolvem à temperatu- ra de 37°C. Existem fungos que crescem à temperatura de 50ºC e outros ao redor de 42°C (KOGA-ITO; JORGE; 2010). 2.5 Patogenia por fungos Os fungos apresentam vários meca- nismos de patogenia, podendo causar diferentes efeitos sobre os seres huma- nos, dentre eles as micotoxicoses e hi- persensibilidade. As micotoxicoses são causadas pelos metabólitos tóxicos produzidos pelos fungos. Decorrem da ingestão, por vezes acidental, de fungos produtores de toxi- nas. Uma das micotoxicoses mais conhe- cidas e economicamente importantes é aquela relacionada à contaminação de grãos e sementes por Aspergillus flavus e a produção de aflatoxina por estes mi- crorganismos. Essa toxina foi relaciona- da em animais à degeneração das células hepáticas, além disso, discute-se tam- bém seu poder carcinogênico, embora ainda não tenha sido comprovado cienti- ficamente o seu papel específico na car- cinogênese humana. Os fungos, naturalmente presentes no ar, também podem constituir um estí- mulo antigênico e levar a estados de hi- persensibilidade em seres humanos. As doenças fúngicas mais comumente en- contradas no homem são as micoses, que são classificadas de acordo com os teci- dos do hospedeiro que estão comprome- tidos pela infecção. 8 9 Geralmente as micoses que acometem o indivíduo saudável são leves e autoli- mitadas, porém a incidência de infecções fúngicas graves e oportunistas tem au- mentado dramaticamente nas últimas décadas devido ao aumento no número de pacientes imunodeprimidos, em par- ticular, aqueles infectados pelo vírus da imunodeficiência humana, pacientes com câncer sob tratamento quimioterá- pico e transplantados (COLEMAN et aI., 1998 apud KOGA-ITO; JORGE; 2010). Além disso, estudos multicêntricos, em vários países do mundo, têm de- monstrado a crescente preocupação com o aumento significativo na prevalência de infecções hospitalares causadas por fungos (Raymond e Aujard, 2000 apud KOGA-ITO; JORGE; 2010). Um estudo rea- lizado em 8 países europeus, analisando as infecções hospitalares em 20 institui- ções pediátricas, encontraram 9% des- tas causadas por leveduras do gênero Candida. Na Argentina, as espécies mais frequentemente relacionadas com infec- ções hospitalares fúngicas ocorridas em 12 instituições hospitalares foram Can- dida albicans, C. tropicalis, C. parapsilo- sis, C. kruseie C. glabrata (RODERO et aI., 1999 apud KOGA-ITO; JORGE; 2010). Outro estudo sobre a epidemiologia das micoses nos Estados Unidos conclu- íram que as espécies do gênero Candida são importantes patógenos relacionados com infecções hospitalares na unidade de terapia intensiva neonatal (Saiman et aI., 2000 apud KOGA-ITO; JORGE; 2010). No Brasil, estudos realizados em hospi- tais de São Paulo e Rio de Janeiro mostra- ram que as infecções hospitalares fúngi- cas eram causadas predominantemente por outras espécies de Candida que não C. albicans (Colombo et aI., 1999 apud KOGA-ITO; JORGE; 2010). Os principais fungos atualmente relacionados com in- fecções hospitalares são: Candida ssp., Aspergillus ssp., Pneumocystis carinii, Cryptococcus neoformans, Paracoccidioi- des brasiliensis, Histoplasma capsulatum, Fusarium ssp. E Penicillium ssp. 2.6 Classificação das mico- ses humanas As micoses são classificadas de acordo com os tecidos do hospedeiro que estão sendo acometidos pela infecção. Didati- camente temos: micoses superficiais – limitadas às camadas mais externas da pele e pelos (Pitiríase versicolor; Piedra branca; Pie- dra negra); micoses cutâneas – estendem-se pela epiderme, incluem doenças invasi- vas dos pelos e unhas (Dermatofitoses; Candidíase); micoses subcutâneas – afetam a derme, tecido subcutâneo, músculo e fáscias (Cromomicose; Esporotricose; Mi- cetoma – eumicetoma e actinomicetoma –; Zigomicose; Rinosporidiose; Doença de Jorge Lobo; Feo-hifomicose; Hialo-hi- fomicose); micoses sistêmicas – podem disse- minar-se por muitos sistemas do organis- mo (Paracoccidioidomicose; Histoplas- mose); micoses oportunistas – infecções fúngicas causadas por fungo de virulên- cia intrínseca baixa ou originalmente co- mensais e que pode produzir infecções 10 11 subcutâneas e disseminadas em indiví- duos debilitados (Criptococose; Asper- gilose) (ALMEIDA, 2000; MORAES; PAES; HOLANDA, 2009; KOGA-ITO; JORGE; 2010). 2.7 O gênero Candida O gênero Candida compreende apro- ximadamente duzentas espécies de le- veduras não produtoras de endosporos. Devido à inabilidade do gênero em apre- sentar formas sexuadas, são classifica- dos como fungos imperfeitos da classe Deuteromycetes. A espécie de maior im- portância médica é C. albicans seguida por C. tropicalis e C. glabrata, que perfa- zem cerca de 80% do isolamento em can- didoses. C. parapsilosis, C. stellatoidea, C. guilliermondii, C. krusei e C. kefyr são também isoladas de diferentes patolo- gias médicas. C. stellatoidea é diferencia- da da C. albicans por não assimilar saca- rose. Devido à identidade entre as bases de DNA dessas duas espécies, C. stella- toidea tem sido considerada atualmente como uma variante sacarose negativa de C. albicans. C. dubliniensis apresenta muitas semelhanças fenotípicas com C. albicans. Técnicas de biologia molecular permitiram a diferenciação genética e a descrição dessa nova espécie. As espécies de Candida são distingui- das entre os demais Deuteromycetes pela habilidade em formar pseudo-hifas, sendo C. glabrata a única exceção. As demais espécies do gênero podem ser identificadas através de morfologia colonial e pela capacidade de assimilação e fermentação de carboidratos. As leveduras do gênero Candida en- contram-se amplamente espalhadas na Natureza, sendo que algumas espécies vivem como saprófitas ou parasitas no homem e em outras espécies animais. C. albicans, associada obrigatoriamente a seres humanos ou outros animais homo- termos, vive normalmente na orofaringe, na boca, nas dobras da pele, na secreção brônquica, na vagina, urina e fezes de humanos. Sua ocorrência na água e no solo é relativamente rara e está ligada à contaminação desses elementos da Na- tureza pelos seres humanos e animais. 2.7.1 Aspectos imunológi- cos do gênero Candida A imunidade das infecções por Candi- da spp. em humano é bastante complexa devido aos diferentes tipos de candidose e à inter-relação entre os sistemas imu- nes sistêmico e secretório. Considerando-se que leveduras do gê- nero Candida estão presentes como co- mensais na cavidade bucal em aproxima- damente 40% dos indivíduos saudáveis, pode-se inferir que em pacientes sadios imunocompetentes, os mecanismos lo- cais de defesa do hospedeiro são sufi- cientes para prevenir infecções por Can- dida. Por outro lado, quando as defesas locais ou sistêmicas estão diminuídas, Candida tem a capacidade de invadir os tecidos e causar doença, sendo, portan- to, sua virulência determinada mais pelo hospedeiro do que pelo fungo. Infecção por C. albicans caracteriza- -se no principal achado em pacientes com imunodeficiência celular severa, não sendo, entretanto, de importância em pacientes que apresentam deficiências apenas de linfócitos B. Pacientes com 10 11 AIDS apresentam acentuada ocorrência de candidose (KOGA-ITO; MARTINS; JOR- GE, 2010). 2.7.2 Diagnóstico labora- torial do gênero Candida Segundo Koga-Ito; Martins e Jorge (2010), as amostras podem ser colhidas da saliva, de lavabos bucais e da mucosa: saliva – coletar aproximadamente 2 mL de saliva, sem estimulação, em cole- tor universal descartável. Fazer diluições em solução fisiológica (NaCl 0,85%) es- terilizada (1:10 e 1:100); lavados bucais – colocar 10 mL de solução fisiológica tamponada (PBS, 0,1 M, pH 7,4) esterilizada na cavidade bu- cal, bochechar por sessenta segundos e verter o conteúdo em coletor universal descartável. Diluir 1:10 e 1:100 em solu- ção fisiológica (NaCl 0,85%) esterilizada e semear em placas contendo meio de cultura apropriado; mucosa – coletar com swab este- rilizado, esfregando o mesmo sobre a mucosa, ou no caso de lesões, sobre as mesmas. Colocar o swab em tubo de en- saio contendo salina (10 ml), agitar, fazer diluições (1:10) e semear em placas con- tendo meio de cultura apropriado. O meio mais utilizado para a cultura é o ágar Sabouraud Dextrose. Para coleta de amostras de cavidade bucal, adiciona-se cloranfenicol para proporcionar seletivi- dade ao meio. Incubação por 24/48 horas até uma semana a 37°C ou a temperatura ambiente. Semear 0,1 mL das diluições e do ma- terial puro na superfície do ágar, espa- lhar com alça de Drigalski. Após período de incubação, observar crescimento de colônias características: esféricas, bran- co-foscas, com aparência de porcelana, de 4 a 8 mm de diâmetro, bordos lisos e odor característico. Uma alternativa para o isolamento de leveduras do gênero Candida é o uso de CHROMagar Candida, que é um meio se- letivo utilizado também para identificar culturas mistas. Preparar o meio de cul- tura de acordo com as instruções do fa- bricante. Após incubação a 30°C por 48 horas, as colônias de C. albicans apresen- tam coloração verde-clara; C. dublinien- sis, verde-escura; C. tropicalis, azul-acin- zentada; C. krusei, C. glabrata, C. kefyr, C. guilliermondii, rosa e C. parapsilosis e C. lipolytica, creme. A partir das colônias características, fazer esfregaço e coloração de Gram para confirmação microscópica. As colônias que em microscopia apresentarem cé- lulas ovalares, grandes, Gram-positivas, com ou sem brotamentos, semear em tu- bos contendo ágar Sabouraud, para pos- terior identificação. Os mesmos autores sugerem o seguinte roteiro para identificação das amostras e suas provas: a) Formação de tubo germinativo Em tubo de ensaio (13 x 17 mm) con- tendo 0,5 mL de soro estéril de coelho, adicionar uma alçada da cultura de 24 ho- ras da levedura, colocar em banho-maria a 37°C, por até três horas. A formação de tubo germinativo é observada em mi- croscopia de luz, colocando-se uma gota 12 13 da suspensão entre lâmina e lamínula, no período de duas até três horas da incuba- ção. b) Produção de pseudo-hifas e cla- midoconídeos (microcultivo) Para se verificar a produção de clami- doconídeos, utiliza-se o meio ágar fubá tween 80 ou ágar-corn meal acrescido de 1% de Tween 80. Cada amostra de leve- dura a ser testada é semeada em estriaúnica na superfície do meio e coloca-se uma lamínula no centro da lâmina. Incu- bar por 48 a 72 horas em temperatura ambiente. Fazer a leitura em microsco- pia de luz, observando-se a presença de pseudo-hifas e clamidoconídeos (clami- dósporos). c) Fermentação de açúcares (Zimo- grama) Utiliza-se caldo vermelho de fenol dis- tribuído em tubos de ensaio, com tubos de Duhran em seu interior e autoclava- dos a 120°C por quinze minutos. Cada açúcar (glicose, maltose, sacaro- se, galactose e lactose), esterilizado por filtração, é adicionado de forma a obter concentração de 1%. Os tubos são se- meados a partir de uma cultura pura de 24 horas da levedura em ágar Sabouraud dextrose. A leitura é feita após 48 horas e uma semana de incubação a 37°C, con- siderando-se a produção de ácido evi- denciada pela viragem da coloração do meio de cultura de vermelho para ama- relo e a produção de gás no interior dos tubos de Durhan. d) Assimilação de açúcares (Auxo- nograma) Para verificação da assimilação de car- boidratos pelas amostras de Candida, uti- liza-se meio mínimo, quimicamente defi- nido, sem fontes de carbono. Para cada amostra a ser testada, obtém-se uma suspensão da levedura com turvação equivalente ao tubo número 10 da esca- la de MacFarlane, a qual é semeada em pour plate. A seguir, colocam-se discos de papel de filtro embebidos numa solu- ção a 1% dos seguintes açúcares: glico- se, galactose, lactose, maltose e sacaro- se na superfície do meio. O crescimento da amostra nas proximidades do açúcar significa que o microrganismo assimila aquele açúcar como fonte de carbono. e) Interpretação das provas bioquí- micas As amostras são caracterizadas em espécies de acordo com as característi- cas de produção de tubo germinativo em soro estéril de coelho, produção de pseu- do-hifas e clarnidoconídeos em ágar-fubá tween 80, fermentação e assimilação de carboidratos, baseando-se em Sandvén (1990 apud KOGA-ITO; MARTINS; JORGE, 2010). O quadro abaixo apresenta caracte- rísticas culturais, assimilação e fermen- tação de carboidratos pelas amostras de Candida. 12 13 f) Crescimento a temperatura de 42°C Para identificação presuntiva das amostras de C. dubliniensis, as amostras devem ser semeadas em ágar Sabouraud dextrose (Difco) e incubadas a 42°C por 48 horas. Ao contrário de C. albicans, C. dubliniensis não se desenvolve ou cresce escassamente a essa temperatura. g) Prova da atividade de beta-glu- cosidase intracelular Para identificação da atividade de be- ta-glucosidase intracelular, a amostra a ser testada deve ser ressuspendida em acetato de sódio contendo 1mg de me- tilumbeliferil-b-glucosidase. Após rea- ção, observar em transiluminador sob luz ultravioleta. Amostras de C. dubliniensis são positivas para esse teste e apresen- tam fluorescência. (+) Prova positiva. (-) Prova negativa. (A) Produção de ácido. (G) Produção de gás. Baseado em Sandvén e Silverman Jr. et al. (1990). 14 15 Fluxograma para identificação das espécies de leveduras do gênero Candida Fonte: KOGA-ITO; MARTINS; JORGE (2010, p. 234). 14 15 Esquema simplificado para identificação de alguns gêneros de leveduras Quanto às toxinas Killer, a sua bioti- pagem de sensibilidade é realizada de acordo com Polonelli et al. (1983 apud KOGA-ITO; MARTINS; JORGE, 2010). Cada amostra é semeada em pour plate e, a seguir, as leveduras produtoras de toxi- nas killer são inoculadas na superfície do meio de cultura. As placas são incubadas por 72 horas em temperatura ambiente. Para leitura do teste são consideradas sensíveis as amostras que produzem halo de inibição de crescimento ao redor das cepas padrão e resistentes àquelas que apresentam crescimento em torno das mesmas. Após a leitura do teste para verificação do fator killer, os resultados são apresentados de acordo com esque- ma proposto por Polonelli et al. (1993), composto por três dígitos. Os dois quadros abaixo representam as cepas padrão utilizadas para a verifi- cação do fator killer e os modelos de bió- tipo killer. Fonte: ANVISA (2005, p. 16). 16 17 Cepas padrão e sua procedência, utilizadas para verificação do fator killer Modelo de biótipo killer segundo Polonelli et al. (1983). Cada código é constituí- do por três dígitos Fonte: KOGA-ITO; MARTINS; JORGE (2010, p. 235). 2.8 Procedimento para cole- ta de amostras No Manual de ‘Detecção e Identifica- ção dos Fungos de Importância Médica’, elaborado pela ANVISA (2005), estes são os procedimentos para coleta de amos- tras de fungos: Escarro – recolher, de preferência, a primeira expectoração da manhã, após gargarejo com água limpa ou fervida, em frasco de boca larga, esterilizado. Não deve conter saliva; aspirado gástrico – aspirar cerca de 5 a 10 ml de suco gástrico, através de sonda nasogástrica, pela manhã, em je- jum; aspirado traqueal e secreção ob- tida por broncoscopia – procedimento realizado por médico treinado. O material colhido deve ser colocado em recipiente estéril; sangue e aspirado de medula ós- sea – fazer assepsia rigorosa no local da punção e coletar cerca de 5 a 6 ml de san- 16 17 gue venoso, que deverá ser injetado di- retamente, em frasco contendo meio de cultura. A última gota de material deve ser distendida em uma lâmina de micros- copia, para coloração de Giemsa; líquor – fazer assepsia rigorosa no local da punção. Coletar 2 ml ou mais, para exame microscópico e cultura para fungos. Os tubos na rotina hospitalar, devem ser usados na seguinte sequên- cia: 1º exame bioquímico; 2º exame de celularidade; 3º microbiológico, reduzin- do assim a possibilidade de isolamento de contaminantes da pele. Entretanto, a coleta da amostra em tubos específicos para cada um desses exames, aumenta a sensibilidade do exame micológico e, por isso, deve ser recomendada; tecido obtido por biópsia, ne- cropsia e peças operatórias – colher assepticamente, utilizando instrumen- tos estéreis e colocar o material em reci- piente estéril, com salina. Não adicionar nenhum líquido fixador; urina – a amostra biológica mais apropriada para o diagnóstico de micose do trato urinário é obtida por sondagem ou citoscopia. Quando não for possível, e para evitar contaminação com microrga- nismos presentes nas áreas vizinhas, fa- zer limpeza prévia da região perineal com água e sabão, desprezar o primeiro jato de urina da manhã, e colher 3 a 5 ml de urina em tubo de ensaio estéril. Coleções de 24 horas, não têm valor para diagnós- tico micológico; fezes – fazer lavagem prévia da região anal com água e sabão, coletar porções de fezes em recipiente estéril com tampa ou “swab” anal, mergulhar o “swab” em salina estéril e enviar o tubo ao laboratório; secreção ou pele de conduto au- ditivo externo – colher material por curetagem da lesão ou com swab estéril. Mergulhar o swab umedecido em salina estéril e enviar o tubo ao laboratório; material de micose ocular – o me- lhor método para recuperação de fungos, requer raspado de córnea, aspiração de líquido intraocular ou biópsia. A coleta com auxílio de swab não é indicada em local de drenagem; lesão de nariz e seios paranasais – coletar secreção, material necrótico ou tecido obtido por biópsia em recipiente estéril; mucosa oral e orofaringe – cole- tar com swab estéril o material de lesão de mucosa jugal, papilas linguais ou re- gião tonsilar. Mergulhar o swab umede- cido em salina estéril e enviar o tubo ao laboratório; secreção vaginal – com auxílio de espéculo, coletar material da lesão ou do fundo de saco vaginal com swab estéril. Mergulhar o swab umedecido em salina estéril e enviar o tubo ao laboratório; líquidos corporais (pleural, ascí- tico, pericárdico, sinovial) – fazer as- sepsia rigorosa no local da punção. Cole- tar cerca de 5 a 10ml de líquido em tubo de ensaio estéril; pus e material de abscesso – de- vem ser colhidos de preferência, por aspi- ração de abscessos fechados, com serin- ga e agulha estéril. Se a lesãofor aberta, limpar o local com gaze esterilizada em- bebida em salina estéril, para eliminar os 18 19 exsudatos superficiais que são altamen- te contaminados com bactérias. A seguir, colher o material com swab. Mergulhar o swab umedecido em salina estéril e en- viar o tubo ao laboratório; pele e pelos – se possível, descon- taminar a pele com álcool 70% antes da coleta. Raspar com lâmina de bisturi as escamas cutâneas da borda das lesões. Pode-se utilizar também, uma lâmina de microscopia. Colocar o material entre duas lâminas limpas, de preferência es- terilizadas, vedando-se as bordas das lâ- minas com fita adesiva para evitar perda do material. Os pelos tonsurados devem ser retirados com pinça estéril e acondi- cionados entre lâminas ou em potes, de preferência esterilizados; unhas – fazer limpeza prévia das unhas, escovando com água e sabão. Cortar com tesoura e desprezar a parte descolada da unha e, com lâmina de bis- turi, raspar as áreas mais profundas e pulverulentas. Colocar este material en- tre lâminas e vedá-las com fita adesiva. 2.9 Processamento de amostras O sucesso na visualização e isolamen- to do agente etiológico depende, além da coleta e transporte adequados e volume suficiente da amostra, de seu processa- mento correto antes do exame micológi- co. As seguintes recomendações de- vem ser cuidadosamente, seguidas para boa resolução diagnóstica: pelos, cabelos, escamas de unha e pele – devem ser aliquotadas para exa- me microscópico e cultura, pois, para exa- me, são clarificadas com solução aquosa de KOH a 20% e, para cultura, não podem sofrer nenhum tratamento prévio, sendo por isso, inoculadas diretamente na su- perfície do meio de cultura; líquor, secreções e fluídos cor- porais – (líquido pleural, ascítico, sino- vial, pericárdico, aspirado transtraqueal, lavado gástrico e broncoalveolar [BAL]) devem ser concentrados por centrifuga- ção (1500 a 2000 rpm por 10 minutos). Os materiais coletados com swabs devem ser eluídos em solução salina e também devem ser centrifugados. O sedimento obtido é o material adequado para o exa- me microscópico e semeadura em meios de cultura; para urina – é recomendável que uma alíquota (alça calibrada) seja se- meada, por esgotamento, sobre o meio de cultura distribuído em placa de Petri, para exame quantitativo, pela conta- gem de unidades formadoras de colônias (UFC). A outra alíquota deve ser centrifu- gada (1500 a 2000 rpm por 10 minutos) e o sedimento será utilizado para exame microscópico e nova semeadura em tubo (cultura qualitativa); escarro – pode ser digerido com enzima (v/v) N-acetil-L-cisteina (250 mg de enzima dissolvidas em 1 L de solução- -tampão citrato ou solução fisiológica), que fluidifica e facilita a manipulação da amostra e formação de sedimento após centrifugação. Porém, não foi compro- vado que esse tratamento melhore a recuperação de fungos da amostra sen- do, portanto, opcional. Pode-se utili- zar, como alternativa, para digestão da amostra, solução de KOH 20%. A porção 18 19 purulenta da amostra é preferível e por- ções liquefeitas não são adequadas para isolamento do agente. A porção da amos- tra tratada com KOH, porém, só pode ser usada para exame microscópico, pois a potassa destrói, após algumas horas, as estruturas do fungo, inviabilizando seu isolamento em meio de cultura. Neste caso, outra porção da amostra deve ser centrifugada e o sedimento usado para cultura; tecidos obtidos por biópsia – re- querem fragmentação, com o auxílio de um bisturi estéril ou maceração (gânglio) com pistilo em almofariz; pode ser fei- to dentro de uma placa de Petri estéril. Esse procedimento visa aumentar a área de superfície e expor o microrganismo li- gado ao tecido, ao maior contato com o meio de cultura; sangue e aspirado de medula ós- sea – não necessitam preparação, sen- do que o exame microscópico tem baixa sensibilidade e, portanto a cultura é im- portante para identificação do agente. Para cultura, as amostras são semeadas imediatamente, após a coleta, em fras- cos contendo meio de cultura. O meio pode ser bifásico (15 ml de ágar inclinado sob 50 ml de caldo) composto de infusão de cérebro-coração (meio BHI) ou Sabou- raud. Meios contendo saponina para lise e posterior centrifugação da amostra são indicados. Na prática, frascos para hemocultura bacteriológica (simples ou automatizada), proporcionam isolamen- to adequado de fungos, desde que res- peitado os períodos necessários ao seu desenvolvimento. Para fungos dimórfi- cos, de crescimento lento (>15 d), muitos autores consideram o método de lise- -centrifugação o mais sensível. O sangue e medula óssea não devem ser coletados em seringas contendo EDTA, pois esta substância se combina com elementos da parede dos fungos, diminuindo a sensibi- lidade do exame. Um dos procedimentos recomendados para é a inoculação de 5 a 6 ml da amostra no frasco com meio bifá- sico sendo, uma parte para 10 partes do meio líquido, que deve ser então, incuba- do à temperatura de 30°C. 2.10 Exame microscópico de amostra e interpretação dos aspectos morfológicos A observação de um fungo na amostra biológica tem grande valor diagnóstico, pois demonstra a invasão do fungo no tecido e permite uma informação ime- diata ao médico, a qual pode ser crucial para determinar a terapia apropriada ao paciente. No entanto, se a quantidade da amostra biológica for insuficiente para o exame microscópico e cultura do mate- rial, a cultura, na maioria das amostras, tem prioridade sobre o exame microscó- pico, desde que é método mais específico e em muitos casos, mais sensível. O exa- me microscópico da amostra é realizado por várias técnicas, dependendo do tipo da amostra e suspeita clínica (ANVISA, 2005). a) Exame microscópico direto com hidróxido de potássio (KOH) a 20% É usado para exame de pelos, pele, unha, tecido obtido por biópsia, exsuda- tos espessos e outros materiais densos. Colocar uma gota de KOH (aquoso a 20%) em uma lâmina de microscopia e sobre esta, uma porção da amostra a ser exa- 20 21 minada. Cobrir a preparação com uma la- mínula e, para intensificar a clarificação, aquecer ligeiramente, sobre a chama de um bico de Bunsen, sem deixar ferver a mistura. Examinar a preparação após 20 minutos, em microscópio óptico comum, inicialmente, com objetiva de 10x, segui- da de 40x. b) Exame microscópico direto com tinta nanquim (tinta da china) Utilizada em amostras de líquor, urina, secreções ou exsudatos, para visualiza- ção de leveduras capsuladas do gênero Cryptococcus, que se tornam mais evi- dentes contra o fundo negro proporcio- nado pela tinta. Colocar uma gota de tinta nanquim e uma gota do sedimento da amostra cen- trifugada, sobre uma lâmina. Cobrir a pre- paração com lamínula e observar ao mi- croscópio óptico (objetivas de 10x e 40 x). Nesta técnica, um erro bastante fre- quente é confundir linfócitos com célu- las de leveduras. A diferenciação é feita pela refringência da parede celular e das inclusões no citoplasma das leveduras, além da presença de brotamentos. c) Exame microscópico com colora- ção pelo método de gram Todos os fungos são Gram-positivos, assim a utilização da coloração não visa a diferenciação dos microrganismos, mas possibilita discriminar elementos fún- gicos de artefatos existentes em urina, secreções e fezes. A amostra é espalha- da de modo homogêneo, em movimentos circulares, em uma lâmina de microsco- pia, fixada com calor e submetida à colo- ração. d) Exame microscópico com colo- ração panótica (giemsa, leishman ou wright) Essas colorações são usadas para pesquisa de Histoplasma capsulatum em diversas amostras biológicas: medu- la óssea, sangue, aspirados e secreção cutânea. Nesses casos, faz-se um esfre- gaço semelhante ao usado para colora- ção de Gram. Fixa-se com metanol e cora- -se segundo o método escolhido. Podem ser usadas ainda para corar imprints de tecidos obtidos por biópsia. A seguir estãoesquematizados os principais aspectos morfológicos obser- vados ao exame microscópico e os possí- veis agentes etiológicos de acordo com a amostra biológica. 20 21 Interpretação de aspectos morfológicos encontrados em exames microscópicos de amostras biológicas (1) Exame microscópico com KOH. / (2) Exame microscópico com tinta nanquim. / (3) Exame microscópico com colo- ração de Gram. / (4) Exame microscópico com coloração de Giemsa ou panótica. / (5) São fungos saprófitas que podem se tornar oportunistas, por ex. Aspergillus, Fusarium, Acremonium, cuja identificação só é possível pela cultura. / (6) No sangue, leveduras do gênero Candida não formam pseudohifas e a identificação de gênero e espécie é possível, somen- te, após isolamento em meio de cultura. Fonte: ANVISA (2005, p. 11). 22 2322 UNIDADE 3 - Vírus Vírus são parasitas intracelulares obri- gatórios cujo genoma é constituído por um só tipo de ácido nucléico DNA ou RNA e que utiliza os sistemas enzimáticos ce- lulares para síntese de elementos que fa- zem parte de sua estrutura. Vírus, do latim virus, significa veneno ou fluido venenoso. A palavra vírus foi usada desde a antiguidade até o final do século passado para designar vários tipos de agentes nocivos ou venenosos. A partir de 1850, cientistas observaram que algumas doenças apresentavam vá- rias características de doenças infeccio- sas, porém sem o isolamento de micror- ganismos, o que os levou a pesquisar a existência de agentes nocivos diferentes dos já conhecidos. A partir de 1881, Pasteur colocou a raiva entre os parâmetros da teoria mi- crobiana das doenças, tornando possível seu estudo experimental e controle atra- vés de inoculação em cérebro de cães e coelhos (JORGE, 2010). A primeira descrição parcial de ví- rus foi feita pelo cientista russo Dmitrii Ivanowski, em 1892, que relatou que o agente da doença vegetal mosaico do tabaco poderia passar livremente por fil- tros bacteriológicos. Loefler e Frosch, em 1898, comprovaram a filtrabilidade dos vírus com experimentos com o agente etiológico da febre aftosa. Esses filtra- dos, apesar de reproduzirem a doença, não cresciam em meios artificiais como bactérias e fungos. Após esses achados, iniciou-se nova fase na microbiologia: o estudo de agen- tes infecciosos invisíveis, mesmo com os mais potentes microscópios da épo- ca. Inicialmente, os pesquisadores de- monstraram existência de vírus animais e vegetais, e, posteriormente, vírus com capacidade de infectar as bactérias; os bacteriófagos. Roehe (2008) sintetiza que vírus são microrganismos que se replicam sem- pre dentro de células vivas; utilizam (em maior ou menor grau) o sistema de sín- tese das células e induzem a síntese de proteínas capazes de transferir o geno- ma viral para outras células. Os vírus, apesar de possuírem a ca- pacidade de, a partir de uma unidade, originarem outras (mesmo que dentro de células), diferem dos demais seres vivos nas seguintes características: a) não apresentam a célula como unidade estrutural básica/como os demais seres vivos; b) apresentam apenas um tipo de ácido nucléico: DNA ou RNA; c) apresen- tam como constituintes orgânicos bá- sicos o ácido nucléico e as proteínas; d) podem conter uma ou mais enzimas, en- tretanto seu conteúdo enzimático não é suficiente para reproduzir outro vírus; e) são inertes no ambiente extracelular; f) replicam-se somente em células vivas, sendo parasitas genéticos (JORGE, 2010). As viroses representam a principal causa de doenças em seres humanos, sendo responsáveis desde resfriados co- muns até hepatites, encefalites fatais e pela síndrome da imunodeficiência ad- quirida (AIDS). 22 2323 3.1 Características gerais Antes que fosse possível estudar a morfologia dos vírus no microscópio ele- trônico, os pesquisadores tinham obser- vado estruturas intracelulares associadas com infecções por vírus, as quais foram chamadas de corpúsculos de inclusão. São partículas arredondadas no citoplasma ou núcleo das células infectadas por alguns vírus. Atualmente, foi demonstrado que representam agregados ou colônias de ví- rus, contendo subunidades virais incom- pletas e vírus inteiros. Como exemplos de corpúsculos de inclusão citoplasmática pode-se citar os da varíola (corpúsculo de Guarniere) e da raiva (corpúsculo de Ne- gri). Na varicela e herpes, os corpúsculos de inclusão são nucleares. Os menores vírus têm somente 17 nm de diâmetro e os maiores chegam a 1000 nm (1 micrômetro). Mesmo os maiores têm uma pobre visibilidade ao microscó- pio óptico. A maioria dos vírus só pode ser detectada usando microscopia eletrônica de alta resolução (BOSSOLAN, 2002). Jorge (2010) fala em dimensões que va- riam de 20 a 300 nm, os maiores conhe- cidos seriam da varíola e da vacínia (200- 300nm) e entre os menores, o da febre aftosa (10 nm) e poliomielite (28 nm). Microfotografias das imagens virais em microscopia eletrônica revelaram a for- ma, dimensões e estruturas internas dos vírus, demonstrando que cada vírus apre- senta características próprias. A estrutu- ra viral completa é denominada vírion. Cada partícula viral (ou vírion) pode ter as seguintes estruturas: capsídio e envelope – o capsídio é uma capa protéica que circunda o ácido nucléico, e é composto de subunidades de proteína, os capsômeros, que são res- ponsáveis pela especificidade viral. Todos os vírions possuem uma simetria de es- trutura, podendo ou não apresentar um envoltório (envelope) contendo lipídeos ou lipoproteínas. Assim, os vírions com envelope são sensíveis aos solventes de lipídeos, tais como o éter, o clorofórmio e agentes emulsificantes (sais biliares e de- tergentes); ácidos nucléicos – os vírus podem ter DNA ou RNA, mas nunca são encon- trados os dois juntos no mesmo vírion. A estrutura dos ácidos nucléicos nos vírions pode ser linear ou circular; alguns vírus apresentam enzi- mas em sua constituição. Polimerases e transcriptases presentes em alguns vírus atuam em seu mecanismo de infeccionali- dade (JORGE, 2010). Morfologicamente (com ilustração a seguir), os vírus podem ter: simetria cúbica – são icosaédricos, apresentando vinte faces triangulares constituídas por proteínas (protômeros). Exemplos: vírus da poliomielite, adenoví- rus, herpesvírus; simetria helicoidal – apresentam simetria tubular ou helicoidal. Exemplo: mosaico do tabaco, vírus vegetais (bata- ta), influenza e caxumba; complexos – possuem envelope e são geralmente pleomórficos, pois o en- velope não é rígido. Exemplos: esféricos (arbovírus e arboencefalites), paralelepí- pedos (poxvírus e varíola) e bacteriófa- gos. 24 25 Simetria icosaédrica: [A] pólio, verruga, adeno, rota; [B] herpes. Simetria helicoidal: [C] mosaico do tabaco; [D] influenza; [E] sarampo, caxumba, parainfluenza; [F] raiva. Simetria incerta ou complexa: [G] poxvírus; [H] fagos T-pares. Fonte: PELCZAR; CHAN; KRIEG (1996). Sobre a taxonomia viral, Stephens et al. (2009) colocam ilustradamente a pro- posta do International Committee on Ta- xonomy of Viruses (ICTV) que vem apri- morando as normas de classificação viral passo a passo, estabelecendo, assim, uma taxonomia exclusiva para a orga- nização dos vírus. O mais importante de todo esse princípio é que os vírus podem ser agrupados de acordo com as suas pro- priedades físicas, químicas e biológicas, assim como as das células que infectam. Dessa forma, os vírus podem ser classifi- cados de acordo com o tipo de ácido nu- cléico, simetria do capsídeo, presença ou ausência do envelope, tamanho e sensi- bilidade às substâncias químicas. 24 25 Fonte: Adaptado de Oliveira apud Stephens et al. (2009, p. 128). 3.2 Replicação de vírus Bossolan (2008) explica que antes que qualquer vírus possa infectar uma célula animal, ele primeiro deve ligar-se a um receptor específico na membrana ce- lular, provavelmente uma glicoproteína. Como já foi dito, muitos vírus podem ter um envelope rico em lipídeoenvolvendo o capsídio. Do envelope de muitos vírus projetam-se “pontas” que podem conter glicoproteínas e lipídeos. As proprieda- des das moléculas que constituem o en- velope estão relacionadas com a adesão do vírus a vários substratos. Se o envelo- pe não está presente, as propriedades do capsídio determinam as características adesivas do vírus. A multiplicação dos vírus se faz por replicação, na qual as porções protéica e nucléica aumentam no interior das célu- las hospedeiras sensíveis. Este proces- so pode ser dividido em etapas, que são comuns a todas as infecções vi- rais: a) Adsorção A adsorção envolve a participação de receptores específicos na superfície da célula hospedeira (receptores glicopro- téicos) e das macromoléculas dos vírus. O processo parece ocorrer na superfície da célula hospedeira em duas fases: a pri- meira compreende adsorção preliminar por ligações iônicas e é facilmente rever- sível por alterações do pH ou da concen- 26 27 tração salina do meio; a segunda fase pa- rece ser mais firme e irreversível (JORGE, 2010). b) Penetração A penetração do vírus nas células pode ser por invaginação da membrana celular (endocitose mediada pelo receptor), por fusão do invólucro viral com a membra- na celular e através da penetração viral através da membrana. Os vírus nus (sem envelope) parecem penetrar pelo meca- nismo de fagocitose (BOSSOLAN, 2008). c) Desnudamento É a remoção do envoltório protéico do vírus, pela ação de enzimas da célula parasitada. Após penetração, ocorre pe- ríodo durante o qual não há evidência de replicação (período de eclipse). Durante esse período, possivelmente ocorre de- sintegração do vírus, cujo ácido nucléico se torna, então disponível e apto a trans- mitir informação genética. d) Transcrição, Tradução e Replica- ção Ocorre de acordo com o vírus. Nas vi- roses animais, os vírus são classificados em seis classes, de acordo com o ácido nucléico que o constitui e a forma de re- plicação do mesmo. Explique-se que esta classificação vi- ral foi definida por David Baltimore, em 1971, a fim de correlacionar as caracte- rísticas do ácido nucléico com as estraté- gias de replicação. Essa classificação não tem finalidade taxonômica, uma vez que o autor utiliza a já existente (STEPHENS et al., 2009). Classe I – vírus DNA de fita dupla – o DNA do vírus transcreve RNAm, que ini- cialmente produz enzimas para síntese do DNA que ocorre no citoplasma. Poste- riormente, ocorre síntese das proteínas virais. São vírus de classe I os Herpesví- rus, Poxvírus, Adenovírus e Papovírus. Classe II – vírus DNA de fita simples – o DNA do vírus é duplicado no núcleo da célula, juntamente com o genoma da mesma, através dos mecanismos celula- res. A partir da sequência do DNA do ví- rus é sintetizado RNAm, que é traduzido em proteínas virais. São vírus classe II os Parvovírus. Classe III – vírus RNA de fita dupla – o RNA viral de fita dupla é constituído por segmentos distintos, os quais são copia- dos em RNAm e traduzidos em proteínas virais. O RNA viral é sintetizado no cito- plasma, sendo copiada apenas uma fita do RNA, a qual, a seguir, é complementa- da, formando RNA de fita dupla. Os Reo- vírus são de classe III. Classe IV – vírus RNA de fita sim- ples positiva – o próprio RNA viral é o RNA mensageiro. Quando o RNA de fita única do vírus atua diretamente como RNAm, são chamados de vírus de cadeia positiva (Fita +). O RNAm do vírus contém infor- mação genética para produção da RNA polimerase própria. A replicação ocorre no citoplasma através de um processo complexo. São vírus classe IV os Picorna- vírus e Togavírus. Classe V – vírus RNA de fita simples negativa e enzima polimerase – RNA-de- pendente – o RNA viral é copiado em fi- tas simples de RNA através da enzima polimerase-RNA-dependente de origem viral. A replicação se faz através dessas 26 27 fitas simples de RNA, que servem de mol- de para o genoma viral e para a síntese de RNAm. Os vírus, que devem replicar seu RNA primeiro para depois formar o RNAm, são chamados de vírus de cadeia negativa (fita -). São classe V os Parami- xovírus e Rabdovírus. Classe VI – vírus RNA de fita sim- ples com presença de DNA complemen- tar –são chamados retrovírus e possuem como parte de sua estrutura a enzima transcriptase reversa, a qual possui ação na síntese de DNA complementar inter- mediário ao RNA viral; ação de nuclease, digerindo o RNA das moléculas híbridas (RNA-DNA) e síntese de fitas duplas de DNA, o qual transcreve para o RNA viral e para o RNAm. A síntese dos ácidos nucléi- cos virais ocorre tanto no núcleo como no citoplasma. Em geral, a replicação do DNA ocorre no núcleo (exceto para poxvírus) e a replicação do RNA no citoplasma. e) Maturação e Liberação Viral A maturação representa o acoplamen- to das subunidades formando o vírus completo. O processo de liberação é dife- rente conforme o agente viral. Em alguns casos, a lise celular resulta na liberação concomitante das partículas virais. Em outros, a maturação e a liberação são re- lativamente lentas e os vírus são libera- dos sem a destruição da célula hospedei- ra (exocitose). Bossolan (2008) explica que os vírus são capazes de dirigir a síntese dos com- ponentes essenciais para sua progênie e de acoplar estes materiais sob a forma de vírions maduros, no núcleo e/ou no cito- plasma da célula infectada. 3.3 Vírus bacterianos - bac- teriófagos Bacteriófago significa comedor de bactérias. Vírus que infectam bactérias foram observados, independentemen- te, por Twort (1915) na Inglaterra e por d'Herelle no Instituto Pasteur de Paris, em 1917. Cada um desses pesquisadores verificou que culturas jovens de bacté- rias entéricas podiam ser dissolvidas pela adição de filtrados assépticos de certas amostras de esgoto. O caldo claro, outra vez filtrado e acrescentado a culturas de bacterianas suscetíveis, repetia o efeito. Esse fato tornou-se conhecido como fe- nômeno de Twortd'Herelle, sendo o fator lítico chamado de bacteriófago por d'He- relle. Os vírus das bactérias são amplamen- te distribuídos na Natureza, existindo fagos para a maioria, senão a totalidade das bactérias. Estruturalmente, asseme- lham-se aos demais vírus, sendo consti- tuídos por ácido nucléico circundado por uma camada protéica (JORGE, 2010). Os bacteriófagos têm o cerne de ácido nucléico envolvido por um capsídeo de natureza protéica, como os outros vírus. Existem 3 formas básicas de bacteriófa- gos: cabeça icosaédrica sem cauda, cabe- ça icosaédrica com cauda e filamentosa. Com relação ao ciclo de vida, os bacterió- fagos podem ser líticos (ou virulentos) e temperados (ou avirulentos). No ciclo lítico, os fagos líticos destro- em as células hospedeiras bacterianas. No processo infeccioso lítico, após a re- plicação do vírion, a célula hospedeira rompe-se, liberando nova progênie de fagos para infectar outras células hospe- 28 29 deiras. Os fagos temperados não destroem suas células hospedeiras. Em vez disso, o ácido nucléico viral é integrado ao ge- noma da célula hospedeira e replica-se na célula bacteriana hospedeira de uma geração a outra, sem que haja lise celular. Este processo é denominado lisogenia e é realizado somente pelos fagos que possuem DNA de fita dupla (BOSSOLAN, 2008). 3.4 Vírus de doenças huma- nas Os vírus infectam diferentes hospe- deiros, desde microrganismos intrace- lulares, como micoplasmas, bactérias e algas até todas as plantas e animais su- periores. São conhecidos mais de trezen- tos vírus que infectam seres humanos, os quais produzem diversas doenças (em torno de cinquenta síndromes distintas já foram caracterizadas) com diversas manifestações clínicas. Em relação às doenças produzi- das por vírus, é importante salien- tar: a) muitas são subclínicas. b) a mesma doença pode ser produzi- da por vários tipos de vírus, assim como o mesmo vírus pode produzir diferentes doenças. c) a doença produzida não tem relação com a morfologiado vírus. d) a evolução da doença é determina- da pela constituição genética do vírus e do hospedeiro (JORGE, 2010). 3.4.1 Vírus DNA Os vírus animais são divididos em vírus DNA e vírus RNA. Vírus DNA que produ- zem doenças em seres humanos incluem: parvovírus, papovavírus, adenovírus, herpesvírus e poxvírus. 3.4.2 Vírus RNA Vírus RNA que causam doenças em se- res humanos incluem: picornavírus, toga- vírus, paramixovírus, ortomixovírus, rab- dovírus, reovírus e retrovírus. Os quadros abaixo mostram as prin- cipais doenças produzidas por vírus no ser humano, com base na sintomatologia que apresentam e as principais classes de vírus DNA e RNA que produzem doen- ças em seres humanos e as doenças que causam. 28 29 Principais doenças humanas produzidas por vírus, de acordo com a sintomato- logia e com o(s) tecido(s) que afeta(m) Fonte: Jorge (2010, p. 180). 30 31 Principais classes de vírus DNA que produzem doenças em seres humanos e as doenças que causam Fonte: Jorge (2010, p. 181). 30 31 Principais classes de vírus RNA que produzem doenças em seres humanos e as doenças que causam Fonte: Jorge (2010, p. 181) 32 3332 UNIDADE 4 - Infecções e Hepatites Virais A doença viral ocorre em consequên- cia da infecção viral em um hospedeiro, o qual pode apresentar ou não sinais e sintomas clínicos. Em muitos casos, a in- fecção viral não é capaz de causar altera- ções clínicas visíveis no indivíduo, infec- ção inaparente ou subclínica. Entretanto, quando observamos alterações clínicas no hospedeiro, chamamos de infecção sintomática ou aparente. Algumas infecções virais podem cau- sar o que chamamos de síndrome, que consiste em um grupo de sinais (é o que o médico ou pessoas próximas ao paciente observam, como lesões na pele, vômito e diarreia) e sintomas (é o que o paciente relata como dor no corpo, tontura) espe- cíficos, caracterizando uma determinada infecção. Sendo assim, podemos consi- derar que um mesmo vírus pode causar sintomas clínicos diferentes (STEPHENS et al., 2009). O quadro abaixo mostra uma correla- ção entre alguns sintomas clínicos da via respiratória e o agente viral: Síndrome Principais sintomas Causas virais mais comuns Lactantes Crianças Adultos Laringite e gripe Rouquidão, “tos- se de cachorro” Parainfluenza, Influenza Parainfluenza, Influenza Parainfluen- za, Influenza Taqueobron- quite Tosse Parainfluenza, Influenza Parainfluenza, Influenza Influenza, Adenovírus Bronquiolite Tosse e dispneia Vírus sincicial respiratório, Parainfluenza Raro Raro Faringite Faringite Adenovírus, Herpes sim- ples Adenovírus, Vírus Coxsa- ckie Adenovírus, Vírus Coxsa- ckie Pneumonia Tosse e dor toráxica Vírus sincicial respiratório, Influenza Influenza, Parainfluenza Influenza, Adenovírus Resfriado comum Obstrução nasal e secreção nasal Rinovírus, Adenovírus Rinovírus, Coronavírus Rinovírus, Coronavírus 32 3333 Os diferentes sinais e sintomas da do- ença viral observados em um hospedeiro são determinados por características es- pecíficas do agente, e também do hospe- deiro, as quais são influenciadas por fa- tores genéticos de ambos. A patogênese viral refere-se à inte- ração de fatores virais e do hospedeiro, que levam à produção de doença. Um ví- rus patogênico tem que ser capaz de in- fectar e causar sinais da doença em um hospedeiro suscetível. No processo da patogênese viral, po- demos observar doenças mais severas ou mais brandas. Isso ocorre devido à existência de cepas virais mais ou menos virulentas, ou às diferentes respostas imunológicas do hospedeiro. As respostas das células dos hospe- deiros suscetíveis às infecções virais po- dem ocorrer através de três caminhos diferentes: ausência de alterações apa- rentes, efeito citopático (CPE) seguido de morte e transformação celular (cresci- mento alterado) (STEPHENS et al., 2009). Na infecção localizada, a replicação viral permanece próxima ao sítio de en- trada do vírus. Exemplo: pele, tratos res- piratório e gastroentérico. Na infecção sistêmica ou disseminada, o espalha- mento do agente pelo organismo ocorre em várias etapas, como entrada, dissemi- nação para os linfonodos regionais, vire- mia primária e disseminação para órgãos suscetíveis. Após a viremia secundária, os vírus são disseminados para outros órgãos, como cérebro, pulmão, pele, etc. Existe uma predileção dos vírus para determinados órgãos. Os vírus das he- patites, por exemplo, atingem principal- mente o fígado. É o que chamamos de tropismo viral. Falando em hepatite viral... O termo hepatite viral é usado para de- signar alterações hepáticas, associadas a agentes infecciosos virais. Vários são os vírus que podem afetar o fígado, como o vírus da hepatite A, B, C, D, E, Herpes sim- ples, Epstein-Barr, Citomegalovírus e fe- bre amarela. O vírus da hepatite B (HBV) destaca-se dos demais não só por alta prevalência entre profissionais de saúde, como também por provocar lesões como cirrose e câncer hepático. Além disso, o HBV é presentemente a única forma que pode ser prevenida por vacinação efetiva e sem efeitos colaterais (JORGE, 2010). Nos quadros a seguir teremos a des- crição sucinta dos principais tipos de he- patites virais, bem como as principais ca- racterísticas, nomenclatura, antígenos e anticorpos dos vírus da hepatite. 34 35 Vírus Hepatite A Hepatite B Hepatite C Hepatite D Hepati- te E Família Picornaviri-dae Hepadnavi- ridae Flaviviridae Não classificada Calciviri- dae Gênero Heparvírus Orthohe-padnavírus Hep-c-vírus Deltavírus Hepevírus Vírion 27 nm icosaédrico 42 nm esférico 30-60 nm esférico 35 nm esférico 27-34 nm icosaédri- co Envoltório Nenhum Sim (HBsAg) Sim Sim (HBsAg) Nenhum Genoma SsRNA DsDNA SsRNA SsRNA SsRNA Tamanho do genoma 7,8 kb 32 kb 9,4 kb 1,7 kb 7,5 kb Estabilidade Termo- estável e estável em ácido Sensível a ácido Sensível a éter Sensível a ácido termoes- tável Transmissão Orofecal Parenteral Parenteral Parenteral Orofecal Prevalência Alta Alta Moderada Baixa, regional Regional Doença fulminante Rara Rara Rara Frequente Durante a gravidez Doença crônica Nunca Frequente- mente Frequente- mente Frequente- mente Nunca Oncogênese Não Sim Sim ? Não Características do vírus da Hepatite Fonte: Jorge (2010, p. 190). 34 35 Nomenclatura, definições, antígeno e anticorpos dos vírus da Hepatite 36 3736 Em se tratando da Hepatite B, o teste deve ser realizado quando houver evi- dências sorológicas de infecção por HBV. A interpretação dos testes sorológicos para Hepatites se encontra no quadro a seguir: Fonte: Jorge (2010, p. 194). Vírus HBsAg Anti-HBc total Anti-HCV IgM Anti-HAV Anti-HDV Diagnóstico clínico provável Vírus único - - - + + Hepatite A + + - - - Hepatite A - - + - + Hepatite A Vírus combinado + + - + + Hepatite A e B + + - - + Coinfecção - + - - + Hepatite B e D + - + - - Coinfecção com hepatite B e C 36 3737 UNIDADE 5 - Síndrome da Imonodeficiên- cia Adquirida – AIDS, Viroides e Príons 5.1 AIDS A síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS: acquired imune deficiency syndro- me) pode ser definida como um conjunto de alterações provocadas pela perda da imuni- dade celular, pela ação de um Retrovírus não oncogênico contendo RNA de polaridade positiva. O vírus é linfotrópico para células T humanas – o HIV. A doença manifesta-se pelo aparecimen- to de uma série de infecções oportunistas, como mostra o quadro abaixo e/ou sarcoma de Kaposi. É certamente a doença de imuno- deficiência secundária mais comum no ser humano atualmente. Patógeno Doença BACTÉRIAS Mycobacterium tuberculosis Tuberculose. Mycobacterium avium-intracellulare Tuberculose disseminada. Legionella pneumophila Pneumonia. Espécies de Salmonella Doença gastrointestinal. VÍRUS Herpes simples Citomegalovírus Lesões da pele e mucosa. Pneumonia. Encefalite, pneumonia, gastroenterite e febre. Epstein-Barr Leucoplasia oral pilosa, possivelmente linfoma.Varicela zóster Catapora e herpes zóster. FUNGOS Pneumocystis carinii Pneumonia. Candida albicans Infecção das mucosas e do esôfago. Cryptococcus neoformans Meningite e doença renal. Histoplasma capsulatum Outros fungos oportunistas Pneumonia e infecções disseminadas de acordo com o fungo oportunista. PROTOZOÁRIOS Toxoplasma gondii Encefalite. Espécies de Cryptosporidium Diarreia grave. Infecções frequentemente encontradas em pacientes com AIDS Fonte: Jorge (2010, p. 198). 38 39 A AIDS pode ser causada por pelo menos dois tipos de vírus da imunodeficiência hu- mana (HIV, human immunodeficiency ví- rus), denominados HIV-1 e HIV-2. A maioria dos casos de AIDS no mundo é causada pelo HIV-1. O HIV-2 é mais comum em algumas regi- ões da África Ocidental e pode ser menos vi- rulento. Estudos baseados em sequência de DNA demonstraram que o HIV-2 apresenta relação muito próxima com o vírus da imu- nodeficiência em símios (SIV) encontrado em macacos africanos, podendo ser consi- derado o mesmo vírus. Por outro lado, esses estudos demonstraram que o HIV-2 difere bastante significantemente do HIV-1. As vias comprovadas de transmissão são: a) contato sexual com pessoa infectada: todas as formas de relação sexual (heteros- sexual ou homossexual), ativa e passiva, va- ginal, anal e oral apresentam risco de infec- ção por HIV. b) através de sangue e derivados: recebi- mento de transfusão de sangue ou de pro- dutos do sangue contaminados com o HIV. c) compartilhamento de agulhas não es- terilizadas por usuários de drogas endove- nosas. d) transmissão da mãe para o feto ou ne- onato. e) transmissão pela amamentação. O ví- rus é também encontrado na saliva, lágrimas e demais secreções. O período de incubação, apesar de ainda não estar perfeitamente definido, pode va- riar de seis meses a dez anos. A característica principal da infecção pelo HIV é a depleção dos linfócitos T auxiliadores/ indutores. O vírus tem tropismo pelas células que apresentam marcador CD4 em sua su- perfície, o qual é um receptor para o vírus. A principal célula que apresenta marcadores CD4 são os linfócitos T auxiliadores (célula T4), porém, subgrupos de monócitos e macrófa- gos também apresentam esses marcadores, podendo também ser infectados pelo HIV. O linfócito T4 é responsável direta ou in- diretamente por vários efeitos, entre eles: a) ativação de células: macrófagos, células T citotóxicas, células NK, células supressoras e células B; b) secreção de fatores trópicos ou indutores sobre outras células. Assim, com a depleção das células T4, todas essas funções ficam deprimidas. Os pacientes com AIDS também apresentam atividade anormal das células B, com ativação policlonal, hipergama- globulinemia, complexos imunes circulantes e autoanticorpos. O HIV já foi isolado de monócitos do san- gue e de vários órgãos nos indivíduos infec- tados. No cérebro, a principal célula infecta- da é o monócito/ macrófago, e isso pode ter repercussões importantes nas manifesta- ções neurológicas associadas às infecções pelo HIV. Os macrófagos alveolares pulmo- nares infectados também podem participar na pneumonia intersticial em alguns pacien- tes. O primeiro relatório clínico documentado sobre AIDS foi datado de 1981, entretanto, estudos sorológicos retrospectivos demons- traram que amostras de soro colhido desde 1959, na África, já apresentavam anticorpos anti-HIV. Calcula-se que entre 20 a 30% dos adultos jovens da região da África Central es- tejam infectados com o HIV. O diagnóstico geralmente é feito pelas infecções oportunistas e Sarcoma de Kapo- 38 39 si. Hemograma demonstrando neutropenia, testes cutâneos (tuberculina, estreptoqui- nase e candidina), dosagem de linfócitos T, isolamento do vírus do sangue e dosagem de anticorpos anti-HIV no soro também são utilizados. O prognóstico é sombrio, com le- talidade de 70% após 2 anos de evolução e de 100% após cinco anos. O HIV caracteriza-se por um vírus envelo- pado de tamanho entre 80 a 100 nm. Possui duas fitas idênticas de RNA de fita dupla de polaridade positiva. O capsídeo é de forma ogival, sendo formada por proteínas do cap- sídeo p24/25. No interior do capsídeo encon- tram-se as moléculas de RNA e as enzimas transcriptase reversa, protease e integrase. O envelope apresenta espículas constituídas de várias glicoproteínas. As mais importantes são a gp120, que serve como adesina primária para receptores da célula hospedeira (CD4) e a gp41, que permite a fusão do envelope viral com a membrana da célula. As espículas (gp120) permitem a fixação do vírus ao receptor CD4 de linfócitos Th, ma- crófagos, células dendríticas e demais células que apresentam esse receptor. Após fixação, ocorre entrada do vírus na célula hospedeira, onde o RNA viral é liberado e transcrito em DNA com auxílio da transcriptase reversa. A seguir, o DNA viral integra-se ao DNA cro- mossômico da célula hospedeira (provírus). Após integração, o provírus pode controlar a produção de infecção ativa, originando novos vírus que são exocitados ou permanecem no interior da célula, ou pode permanecer inativo como provírus. As diversas proteínas estruturais e re- guladoras e os respectivos genes do HIV estão expressos nos quadros abaixo: Genes e produtos do vírus HIV na célula hospedeira *O número representa o peso molecular aproximado da proteína em Kd, Baseado em Walker, 2002 Fonte: Jorge (2010, p. 199). 40 41 5.2 Viroides O conceito de viroide foi proposto por Diener, em 1971, quando estudava a do- ença do tubérculo da batata, onde de- tectou RNA nos núcleos das células ve- getais doentes. O viroide é uma partícula infecciosa de RNA menor que os vírus, apresentando, ainda, outras diferentes características: consiste em apenas uma molécula de RNA circular com baixo peso, não apresenta capsídeo e envelope, não produz proteínas, pode ser copiado ape- nas no núcleo da célula hospedeira e, para a sua detecção, é necessária a iden- tificação de sequências de nucleotídeos do RNA, diferindo dos vírus, por não ser possível a sua visualização em tecidos infectados sem a utilização dessas técni- cas. Em revisão sobre os avanços em rela- ção às pesquisas de viroides, Eiras et al. (2006) citam que no Brasil, Fonseca & Boiteux (1997) publicaram uma minucio- sa revisão sobre viroides em que relacio- naram aspectos da biologia, história, mé- todos de detecção e purificação, origem, sintomas, vias de transmissão e estraté- gias de controle. Posteriormente, porém, pouco se avançou nas pesquisas com viroides no Brasil, mas após isso, pouca atenção tem sido dada a eles na América Latina. Os viroides são classificados na taxo- nomia moderna em famílias, gêneros e espécies, segundo suas características biológicas e moleculares. E constituem os menores e menos complexos fitopa- tógenos conhecidos. Ainda não está cla- ro como os viroides causam doença, mas devem utilizar proteínas celulares para efetivar seu ciclo infeccioso. A morte celular pode ocorrer devido à alteração do metabolismo, pois este interfere na capacidade de as células processarem o RNA mensageiro, impedindo, assim, a produção de proteínas celulares (STE- PHENS et al., 2009). A tabela a seguir apresenta a classifi- cação dos viroides em famílias, gêneros e espécies e os respectivos acrônimos, de acordo com o Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus (ICTV) (FLORES et al., 2005 apud EIRAS et al., 2006). 40 41 Observe que as espécies-tipo de cada gênero estão sublinhadas. Fonte: Eiras et al.(2006, p. 231). 42 43 Segundo Eiras et al. (2006), com origens distintas e incertas e com relações evoluti- vas pouco conhecidas, os agentes subvirais apresentam um contínuo de relações com- plexas com outros agentes patogênicos e com suas plantas hospedeiras, que tornam o seu estudo intrigante e ao mesmo tempo fascinante. Nos últimos 30 anos, desde a descoberta dos RNAs autocatalíticos, houve uma pro- funda reviravolta no pensamento evoluti- vo, pois acreditava-seque essa propriedade fosse exclusiva das proteínas. Assim, junta- mente com outras evidências, postulou-se a existência de um mundo baseado exclusiva- mente em moléculas de RNA. Apesar de talvez serem relíquias de um passado longínquo, os viroides parecem ter emergido como patógenos somente no sé- culo XX, e provavelmente causaram doen- ças pela sua introdução acidental em plantas cultivadas a partir de plantas selvagens (Die- ner, 1996 apud EIRAS et al., 2006). Para aqueles que se interessem pelo tema, vale a pena ler a íntegra do artigo ela- borado pelos autores acima e dali partirem para novas descobertas que certamente se- rão instigantes. 5.3 Príons Os príons, já estudados em outro mo- mento, são partículas protéicas infecciosas, extremamente pequenas, resultantes de proteínas normais modificadas por mutação, nomeada por Stanley Prusiner, em 1982. Di- ferente de outras proteínas que aparecem em membranas plasmáticas de muitas cé- lulas, os príons se ligam a estas membranas internamente formando fibrilas que, como não podem ser organizadas corretamente, formam agregados que, por sua vez, ao lon- go do tempo, acabam por matar as células (STEPHENS et al., 2009). Desde 1920, várias doenças têm sido atri- buídas a esse agente infeccioso, algumas de- las acometem o ser humano e causam dege- neração mental, outras estão relacionadas a infecções de caprinos e bovinos, como a encefalopatia e a doença da vaca louca, res- pectivamente. Vários aspectos da infecção por príons ainda não estão elucidados, entre eles a forma como uma doença causada por príon se propaga. O Prêmio Nobel de Medicina, de 1987, foi dado a Prusiner por seu estu- do, onde ele identifica as cinco caracte- rísticas desse agente infeccioso: não são inativados pelo calor a 90ºC; o tratamento com radiação não tem efeito nas infecções por príons, nem formol; resistem às enzimas que digerem DNA ou RNA; são destruídos por agentes químicos, como o fenol, a ureia e hidróxido de sódio 1M, responsáveis pela desnaturação de proteí- nas; possuem pareamento direto de amino- ácidos. Atualmente, sabe-se que a inativação dos príons só é possível em autoclave, à tempe- ratura de 130º C. 5.4 Vírus oncogênicos São vírus com capacidade de modificar o acido nucléico, formando associação estável com o genoma da célula hospedeira, mudan- do a sua estrutura e a função no organismo. Os oncogenes são fragmentos de DNA de vírus tumorais que causam a divisão descon- 42 43 trolada da célula hospedeira, já o protoonco- gene é similar ao oncogene, mas é formado a partir da captura de genes ‘extras’ da célula hospedeira por alguns vírus RNA tumorais. A maioria dos vírus oncogênicos codifica a informação para divisões ilimitadas, pois são mutantes que contêm deleções ou substi- tuições. Essas mutações alteram o material codificado por estes genes. A maioria dos vírus tumorais conhecidos até o momento são vírus DNA, tais como o vírus de Epstein-Barr (EBV), o Papiloma Vírus Humano (HPV) e o Vírus da hepatite B (HBV); entretanto, alguns vírus RNA estão associa- dos a cânceres, como, por exemplo, o HTLV-1 e o HIV. Revisão de Martins e Cotroxo (2009) ex- plica que no homem, o HBV pode causar hepatocarcinoma e seu DNA está integrado no DNA da célula hospedeira com inserções também clonais. Entretanto, o genoma do HBV não codifica qualquer oncoproteína e também não tem um padrão consistente de integração na vizinhança de qualquer proto- -oncogene. Assim, acredita-se que o efeito do HBV seja indireto e possivelmente mul- tifatorial: a lesão crônica dos hepatócitos e a hiperplasia regenerativa pelo HBV podem levar ao aparecimento de mutações espon- tâneas ou podem ser provocadas por agen- tes ambientais, como aflatoxina na dieta. 44 4544 UNIDADE 6 - Diagnóstico Laboratorial para Vírus Segundo o Departamento de Microbio- logia da Universidade Federal de Minas Gerais (2012), a análise do histórico e dos sintomas apresentados pelos pacien- tes fornece as primeiras indicações para o diagnóstico de uma infecção viral. Os exames laboratoriais são realizados para confirmar o diagnóstico pela identifica- ção do agente viral da infecção, determi- nar a terapia antiviral mais adequada, de- finir a evolução da doença e monitorá-la epidemiologicamente. Existem diferentes métodos que per- mitem o estudo dos vírus, dentre eles os mais comuns são os que utilizam cul- turas celulares para observar os efeitos citopáticos (ECPs), a purificação de partí- culas virais, a observação da morfologia virai e de seus componentes (proteínas e ácidos nucléicos) e os testes sorológicos. Podem também ser utilizadas técnicas moleculares para a detecção do agente viral. A escolha do método depende do tipo do espécime, do custo para sua reali- zação, da rapidez necessária do diagnós- tico e do tempo de evolução da doença. Stephens et al. (2009) ressaltam, po- rém, que muitas vezes é necessário uti- lizar mais de um método, a fim de se ter uma melhor definição diagnóstica, já que existem diferentes vírus que apresen- tam morfologia semelhante. Desta for- ma, o diagnóstico não pode ser baseado apenas neste aspecto morfológico ou- tros aspectos deverão ser considerados para um diagnóstico preciso. Com a utilização de animais de labora- tório e das culturas de células, é possível isolar e identificar estes agentes. Devido à dificuldade do isolamento de um vírus a partir de espécimes clínicos (secreções diversas, urina, fezes, líquido cefalor- raquidiano, pele, líquido pleural, saliva, soro, etc.), os ensaios sorológicos são uma alternativa e permitem a avaliação indireta do vírus, pela detecção de anti- corpos específicos, tanto na fase aguda da doença, quanto na de convalescença (STEPHENS et al., 2009). Ressalte-se mais uma vez que a rea- lização dos ensaios laboratoriais para o diagnóstico viral deve obedecer a todas as normas de Biossegurança e boas prá- ticas de laboratório como vimos em ou- tros momentos do curso. 6.1 Coleta de material No caso das infecções virais agudas, quando se deseja detectar elementos da partícula viral, as amostras destinadas ao exame devem ser colhidas precocemen- te, antes que o vírus deixe de ser libera- do. Além disso, os anticorpos produzidos em resposta a infecção podem bloquear a detecção do vírus. De modo geral, os espécimes clínicos de quadros respira- tórios devem ser colhidos nos primeiros dias após o início dos sintomas. Nas in- fecções intestinais, onde a excreção de vírus pelas fezes é em geral mais prolon- gada, a coleta pode ser feita nas três se- manas que se seguem ao aparecimento da diarreia. As amostras dos vírus da herpes sim- ples (HHV1) e da varicela-zoster (HHV3) devem ser isoladas, a partir das lesões, 44 4545 antes de se completarem cinco dias do início dos sintomas. Quanto menor o tempo entre a coleta da amostra e seu envio ao laboratório, maiores as chances de isolamento dos vírus. Os vírus podem ser cultivados em cultura celulares, ovos embrionados e animais experimentais. Na tabela abaixo estão listados alguns exemplos de materiais comumente ana- lisados em laboratórios. Materiais analisados em laboratório Fonte: UFMG (2012, p. 2). 6.2 Isolamento de vírus Os vírus, ao contrário de outros mi- crorganismos, só se replicam em células vivas. Desse modo, seu isolamento ape- nas é possível quando se utiliza um hos- pedeiro vivo, como a cultura de células, os animais de laboratório e os ovos em- brionados. As células de mamíferos foram culti- vadas pela primeira vez em laboratório há pouco mais de 70 anos. Em meados do século XX, um grupo de pesquisadores isolou o Poliovírus em cultura de células. A partir daí, uma infinidade de famílias virais foi isolada e identificada, sendo al- gumas destas não associadas às doenças da época (STEPHENS et al., 2009). Por meio da microscopia ótica, a pre- sença do vírus é identificada de forma indireta, através de alterações morfoló- gicas na célula, denominadas