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Apostila de Sociologia do Direito

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1 
 
Professor Christopher Augusto Carnieri 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
APOSTILA DE SOCIOLOGIA DO DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Curitiba – 2020 
2 
 
ÍNDICE 
 
Introdução à Sociologia – 04 
Karl Marx – 09 
Émile Durkheim – 18 
Max Weber – 22 
Fundamentos da Sociologia do Direito e Pós-Modernidade – 27 
Sociologia do Crime – 34 
Criminologia Cultural – 46 
A Dinâmica Emocional do Desvio – 61 
 
 
 
 
3 
 
NOTA 
 
Esta apostila não tem valor comercial. Seu conteúdo é uma montagem informal de resumos, 
trechos de livros e algumas opiniões pessoais sobre assuntos pertinentes à sociologia do 
direito. 
 
4 
 
INTRODUÇÃO À SOCIOLOGIA 
 
 
1. O Iluminismo 
 O Iluminismo foi um movimento filosófico no século XVIII que contribuiu para a 
gradativa afirmação do pensamento científico sobre social. Ficou conhecido pela grande 
participação de intelectuais franceses, tendo sido um movimento que abordou aspectos 
filosóficos, políticos, econômicos e científicos. 
 Esse movimento combateu o absolutismo monárquico e defendeu, dentro de uma 
leitura da burguesia, o liberalismo político e econômico, a democracia, a divisão dos poderes, 
uma maior liberdade do homem, a liberdade de pensamento e a utilização de métodos 
racionais de estudo da natureza e da sociedade. 
 Um importante nome do Iluminismo foi Montesquieu (1698-1755), que em 1748, em 
sua obra Do espírito das leis, tece críticas ao regime absolutista, ao poder da igreja e, ao 
analisar as formas de governo, propõe a tradicional divisão dos três poderes de um Estado em: 
Legislativo, Executivo e Judiciário, concepção que passou a ser adotada, e até hoje é como 
funciona na maioria dos países. 
 Outro nome significativo da filosofia Iluminista foi Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), 
que em 1763 publicou a obra Do contrato social, e em 1773, Discurso sobre a origem e os 
fundamentos da desigualdade entre os homens. Rousseau fez parte dos denominados filósofos 
contratualistas, na medida em que propõem a necessidade de se estabelecer um contrato 
entre os homens para que possa haver harmonia e uma melhor vida social. 
 Rousseau partia da ideia de que no denominado Estado de Natureza “os homens 
nascem bons e livres, mas a sociedade os torna perversos”. Opunha-se à colocação do filósofo 
inglês Thomas Hobbes (1558-1679), que defendia o Estado Absoluto, pois o homem está 
sujeito à sua própria destruição, visto que, ao contrário de Rousseau, no Estado de Natureza 
vive em constante luta, situação caracterizada pela conhecida frase “o homem é lobo do 
homem”. Para Hobbes, é dessa situação de permanente luta entre os homens que decorre a 
necessidade de eles transferirem para um soberano todos os seus direitos, para que este possa 
agir de forma absoluta e acima dos indivíduos, concedendo estabilidade e ordem social. 
5 
 
 Rousseau defendeu justamente a opinião oposta, ou seja, a necessidade de se 
estabelecer um contrato social, por meio do qual os homens renunciam às suas vontades 
particulares, em favor dos interesses da coletividade. Por meio de um contrato social, 
transferem seus direitos pessoais a um soberano, que deve expressar a chamada vontade 
geral. Rousseau argumenta ainda que a origem da desigualdade entre os homens é fonte de 
diversas injustiças sociais e está na desigual propriedade privada da terra, considerada como o 
bem básico para a sobrevivência da humanidade. 
 
2. O surgimento da Sociologia: Augusto Comte e a lei dos três estados 
 À medida que se aproximou do século XIX o pensamento sobre o social foi recebendo 
uma gradativa contribuição de aspectos que caracterizam a prática científica, principalmente 
mediante a influência do racionalismo. 
 Convém lembrar que este século representou uma importante modificação na maneira 
de vermos o mundo. É o momento de consolidação daquilo que denominamos modernidade e 
a crença do surgimento de uma época de ouro que, por meio do progresso, levaria à solução 
de todos os problemas através da intervenção humana proporcionada pela ciência. A grande 
divisão entre os saberes científicos que conhecemos hoje teve origem nesse período. É nesse 
contexto que vão surgir a sociologia, a psicologia e a antropologia, entre outras áreas do 
conhecimento. 
 De maneira resumida podemos dizer que, para o filósofo francês Augusto Comte 
(1798-1857), assim como nas ciências naturais, o conhecimento deveria buscar leis que regem 
a dinâmica da sociedade, o que só seria possível por meio de uma postura científica e que 
viesse substituir as concepções teológicas e filosóficas da realidade. 
 Comte partia da premissa de que o homem é um ser naturalmente social e portador 
de razão, que construía sua inteligência e interferia sobre a formação de seu pensamento. 
Argumentava que a sociedade humana passava evolutivamente pelo o que foi por ele 
denominado de lei dos três estados (ou estágios) do conhecimento e do pensamento humano. 
 O primeiro estado do conhecimento humano foi denominado por Comte, como o 
estado teológico. Neste estágio, o homem colocava Deus (ou forças sobrenaturais) como o 
regente de tudo que ocorre no cosmo e na vida social, conferindo-lhe uma ordem e uma 
determinada forma lógica. 
6 
 
 Em um segundo momento, o homem evoluiu a atingiu o estado denominado de 
metafísico. Nessa fase, o homem já não vê mais a figura divina como a única agindo sobre os 
fenômenos de mundo e de sua existência. Ao lado da ação divina já são notadas determinadas 
formas de intervenção da parte do homem. Trata-se de uma forma de questionamentos e 
levantamentos de dúvidas, que buscam uma ação além do que poderia provir do divino, 
considerado pelos positivistas como um momento de progresso e evolução do pensamento 
humano, mas ainda incompleto e insuficiente para que houvesse uma mais racional 
intervenção humana sobre a realidade abrangente. 
 O terceiro estado é chamado de positivo. Neste estágio do conhecimento, o homem é 
concebido como o articulador dos acontecimentos da vida social. Há uma valorização da busca 
do saber, da reflexão, com base na razão, nos métodos científicos também denominados de 
positivos e no uso da racionalidade. Tal só seria alcançado naquela nova sociedade industrial, 
conduzida para o progresso. É nessa perspectiva que Comte, em 1839, propôs a criação de 
uma nova ciência: a sociologia, originalmente denominada física social. 
 Comte afirma que nesse estado as noções não são mais absolutas, mas relativas; que é 
fundamental a aplicação do raciocínio, não acatando mais o caráter absoluto do que ocorria na 
realidade, da observação, da busca das leis que regem a relação entre os fenômenos, 
entendidos como algo empírico, real, e a própria adoção de um método de observação e 
estudo, partindo da apreensão dos fenômenos particulares e suas relações com situações 
gerais, próximo de uma postura indutiva faze à realidade. 
 
3. Princípios da Sociologia 
 Em síntese, na fase construção do objeto sociológico, pode-se dizer que a sociologia se 
dividiu em dois grandes pares de abordagem. Primeiro, o estudo da sociedade poderia ser 
realizado através de abordagens de estrutura ou de abordagens de ação. Em segundo lugar, o 
estudo da sociedade poderia ser realizado focando-se a ordem social, nas chamadas 
abordagens de consenso ou focando-se na transformação social, nas chamadas abordagens de 
conflito. 
 Abordagens de estrutura: são aquelas que pretendem explicar o comportamento das 
pessoas em sociedade através da “estrutura social”. 
7 
 
 A noção de estrutura remete à concepção da sociedade como um complexo de 
unidades individuais, cujas partes (como as células de um organismo) mantêm “relações” mais 
ou menos rígidas entre si, relações que superam a própria autonomia das partes na 
configuração de suas possibilidades. 
 Segundo esta concepção, os indivíduos são como células de um organismo, que 
possuem funções estruturalmente determinadas,independentemente de suas vontades 
individuais 
 Marx e Durkheim são representantes da tradição estruturalista. 
 Marx sustenta que a existência material dos indivíduos, isto é, sua posição na estrutura 
de distribuição material, determina a própria consciência individual: as ideias sociais estão 
associadas à posição de “classe”. 
 Por sua vez, Durkheim sustenta que a “consciência coletiva” é mais que a mera soma 
das consciências individuais: a sociedade precede lógica e cronologicamente aos indivíduos e 
os indivíduos agem em sociedade de um modo que não agiriam se estivessem dispersos. 
 Abordagens de ação: opõem-se logicamente às abordagens de “estrutura”, pois 
advogam que o comportamento do indivíduo em sociedade é mais bem explicado pelas razões 
subjetivas do indivíduo que desempenha um dado comportamento do que pela posição deste 
na estrutura social. 
 O maior representante deste tipo de perspectiva é Max Weber, para quem a unidade 
de análise da Sociologia deve ser o indivíduo e não o grupo. O sentido que o indivíduo atribui à 
sua ação deve ser “compreendido” para apreender-se o “sentido” da respectiva ação. 
 Além da divisão clássica entre abordagens de ação e de estrutura, há outra divisão 
pertinente para o fim de estabelecer a comparação entre os “pais fundadores”, que é a divisão 
entre as abordagens de consenso e de conflito. 
 Ao estudar a “moral social” ou a “consciência coletiva”, Durkheim foca os aspectos que 
contribuem para a conservação e a manutenção da ordem social. Trata-se de uma abordagem 
de consenso. 
 Marx e Weber, ainda que por vias opostas, ambos construíram abordagens de conflito. 
Para Marx, na dialética da história, as forças produtivas entram em contradição com as 
relações de produção existentes, desencadeando os períodos de revolução social. 
8 
 
 Max Weber, por uma via individualista, também elabora uma abordagem de conflito, o 
que se expressa, por exemplo, na sua teoria do “poder” (toda a probabilidade de um indivíduo 
impor a própria vontade em relação social, apesar das resistências que lhe possam opor). 
 
9 
 
KARL MARX (1818-1883) 
 
 
1. O materialismo histórico e dialético 
 A primeira questão que deve ser levada em consideração sobre a obra de marxista é o 
seu método de análise. A sua reflexão é uma espécie de resposta às ideias que estavam em 
evidência em sua época, na qual se destacou o pensamento de Hegel (1770-1831), 
representante máximo do idealismo alemão, que foi a principal escola filosófica do século XIX. 
 Hegel recorreu a princípios da dialética1 em busca da explicação do movimento e da 
transformação das ideias. A dialética pressupõe considerar que as coisas possuem movimento 
e estão relacionadas umas com as outras. A realidade é um constante devir, marcada pela luta 
dos opostos (ex: vida x morte, saúde x doença). Este é o movimento da dialética desencadeado 
pelo princípio da contradição e do conflito. 
Princípios da Dialética 
1. Tudo se relaciona A natureza se apresenta como um todo coerente de objetos e 
fenômenos ligados entre si, que os condiciona reciprocamente. 
2. Tudo se transforma A natureza e a sociedade se encontram em contínua 
transformação. 
3. Mudança qualitativa A transformação das coisas não se realiza num processo circular 
de eterna repetição, mas pelo acúmulo de elementos 
quantitativos que, num determinado momento, produzem o 
qualitativamente novo. 
4. Unidade e luta dos 
contrários 
A transformação das coisas só é possível porque no seu próprio 
interior coexistem forças opostas tendendo simultaneamente à 
unidade e à oposição. É o que se chama contradição. 
 
 Hegel encontra no princípio da contradição o motor do pensamento humano; logo, de 
toda a história da humanidade, pois considera a história como o pensamento que se 
materializa. Dizendo de forma simples, para Hegel o homem cria o mundo e a realidade a 
partir de suas ideias. 
 
1 Método de raciocínio que procura analisar a realidade colocando em evidência suas contradições. 
10 
 
 Para Marx e Engels, a compreensão adequada da realidade devia partir do pressuposto 
de que o homem é um ser material porque vive em meio à necessidade de produzir bens para 
satisfazer suas necessidades dentro de condições históricas concretas, com afirmam: 
“Os pressupostos de que partimos não são arbitrários nem dogmas. São 
pressupostos reais de que não se pode fazer abstração a não ser na imaginação. 
São os indivíduos reais, sua ação e suas condições materiais de vida, tanto aquelas 
por eles já encontradas com as produzidas por sua própria ação”. (MARX; ENGELS, 
1987) 
 
 Karl Marx parte da análise concreta da realidade, ou seja, como o homem necessita 
modificar o mundo para sobreviver – ele tem de trabalhar, de produzir os seus meios de 
subsistência. O trabalho e as condições materiais é que fazem o homem agir e pensar o mundo 
e a sua realidade. 
 O que caracteriza o homem é o trabalho, ou seja, a produção material da 
sobrevivência. Para Marx, a nossa espécie está mais para Homo faber do que para Homo 
sapiens, ou seja, o ser humano transforma a natureza e se transforma quando produz. Desse 
modo, o homem é visto como um ser determinado pelo espaço e pelo tempo – seu modo de 
subsistência e produção depende das condições técnicas em que vive. 
 Ao transpor os princípios da dialética na análise do processo histórico, Karl Marx 
conclui que as sociedades, assim como tudo que vive, traz em si o gérmen da sua própria 
destruição. A história dos sistemas e modos de produção é uma constante superação do velho 
pelo novo. Segundo ele, o declínio dos sistemas sociais se dá no seu próprio interior, quando 
os indivíduos, ao repetirem suas formas, vão recriando e transformando seu funcionamento. 
 Assim, a realidade expressa constantemente movimentos contraditórios que formam 
sínteses. No entanto, a síntese não significa que haja uma solução definitiva, pois novas 
contradições são geradas. Portanto, as transformações da sociedade se dão por meio de 
contradições e conflito. 
 
2. A noção de estrutura social 
 Para Marx, as bases da sociedade (instituições, regras, ideias e valores) são dadas pelas 
condições materiais pelas quais os homens obtêm os meios para sobreviver. A base é definida 
11 
 
como infraestrutura e está ligada aos meios de produção, condições materiais de produção da 
subsistência. 
 A superestrutura está vinculada às ideias, valores e visão de mundo. Karl Marx afirma 
que a infraestrutura e a superestrutura estão indissoluvelmente ligadas entre si, formando 
uma interação dialética. Desse modo, a superestrutura é um reflexo da base material da 
sociedade. 
 Sendo assim, as relações políticas, jurídicas e ideológicas de uma sociedade refletem as 
relações econômicas. Em outras palavras, as condições materiais determinam os grandes 
sistemas imateriais de uma sociedade, com as ideologias, religiões, sistemas morais, leis, 
enfim, os modos de pensar que configuram a superestrutura. 
 
3. Concepção de Estado 
 Duas questões inter-relacionadas nos ajudam a pensar a posição de um dos maiores 
pensadores do século XIX, Karl Marx. São elas: 1. Qual a origem do Estado? 2. Qual sua função? 
 
 Com relação ao papel do Estado e sua origem existem diversas interpretações. Ao 
longo dos últimos séculos as explicações desenvolvidas pelos “Contratualistas” ganharam 
maior destaque e aceitação entre os estudiosos do tema. Marx, no final do século XIX, 
apresentou uma outra explicação que desde então vem igualmente influenciando muitos 
outros intelectuais. 
 
 Grosso modo, os Contratualistas explicaram que o Estado é originário de um contrato 
social entre os integrantes da sociedade. Para eles, na medida que os grupos humanos foram 
se ampliando os conflitos e a desordem social maximizaram a necessidade da existência de 
normas mais complexas que possibilitassem uma convivência social mais harmônicas. A 
ampliação dos grupos humanosgerou muitos momentos de desentendimentos entre os 
indivíduos, e isso demandava um julgamento da causa de forma impessoal. As constantes 
ameaças de conflitos com outros grupos também maximizavam a necessidade de criar meios 
que promovesse a segurança dos grupos. Outra necessidade estava na providência de bem 
coletivos, os quais os indivíduos precisavam se organizar para provê-los de forma que um ou 
outro indivíduo não assumisse os custos sozinho. Frente a essa situação, os grupos humanos 
teriam separado alguns indivíduos para serem responsáveis dessas questões que 
12 
 
demandariam um custo (de toda ordem) muito grande para os indivíduos. A estes indivíduos 
separados ficariam o encargo de atuar de forma impessoal, provendo segurança, bens 
coletivos, justiça e legislação. Em troca, receberiam salários ou outros benefícios como 
pagamento, bem como recursos, em forma de impostos, para prover essas questões. Surgia 
assim o “Contrato Social”, onde a sociedade contratava com o “grupo separado” que daria 
origem ao Estado, recebendo deste segurança, bens coletivos, justiça e legislação e detrimento 
de pagar-lhes impostos e se subjugar a sua atuação. 
 
 Em suma, para os Contratualistas o Estado surge de um acordo coletivo, de um 
contrato social. Sua função é atender as necessidades coletivas. Marx discordaria dessa leitura 
e julga ser uma visão ideologizada que atente aos interesses da classe dominante. 
 
 Para compreendermos as ideias de Karl Marx podemos partir de sua preposição de 
que “a história de toda sociedade até hoje é a história de lutas de classes” (MARX, 1996, p.66). 
Embora essa preposição envolva uma perspectiva histórica, Marx esteve preocupado com a 
sociedade de sua época, a sociedade capitalista e desenvolverá suas ideias com base no seu 
contexto histórico (na modernidade). Nesse sentido, afirmou que “a nossa época, a época da 
burguesia, caracteriza-se, entretanto, por ter simplificado os antagonismos de classe. A 
sociedade vai se dividindo cada vez mais em dois grandes campos inimigos […]: burguesia e 
proletariado” (MARX, 1996, p.67). 
 
 Nesse contexto, a leitura de Marx do Estado é que esse é essencialmente classista, ou 
seja, representante de uma classe e não da sociedade em sua totalidade como afirmavam os 
Contratualistas. Para Marx, “[…] o poder político do Estado representativo moderno nada mais 
é do que um comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa”. O 
Estado seria originário da necessidade de um grupo, ou classe social, manter seu domínio 
econômico a partir de um domínio político sobre outros grupos o classes. Segundo Marx 
(1993, p.96), “toda classe que aspira à dominação […], deve conquistar primeiro o poder 
político, para apresentar seu interesse como interesse geral, ao que está obrigada no primeiro 
momento”. É por isso que as ideias dominantes de uma época, segundo Marx, são as ideias 
dos grupos dominantes. É nesse contexto teórico que Marx desenvolverá a ideia de ideologia, 
a qual, seria uma “peça chave” para transmitir as “ideias invertidas de ponta-cabeça” que lhes 
possibilitam a manutenção do status quo. 
 
 
13 
 
Segundo Marx, 
 
“[…] as relações jurídicas, bem como as formas de Estado, não podem ser 
explicadas por si mesmas, nem pela chamada evolução geral do espírito humano; 
estas relações têm, ao contrário, suas raízes nas condições materiais de existência”. 
(Prefácio de Contribuição à crítica da economia política, 1992, p. 83). 
 
Diferentemente do que defendiam os Contratualistas, não era o Estado quem determinava a 
organização da sociedade, mas a composição da sociedade, em suas relações de classe, que 
determina a estrutura do Estado. Se de um lado o Estado com sua atuação jurídica seria 
responsável por determinar a estrutura da sociedade, por outro, Marx destacaria que a 
estrutura de classe da sociedade determinaria e estrutura do Estado. 
 
Para Marx, 
 
“Através da emancipação da propriedade privada em relação à comunidade, o 
Estado adquiriu uma existência particular, ao lado e fora da sociedade civil; mas 
este Estado não é mais do que a forma de organização que os burgueses 
necessariamente adotam, tanto no interior como no exterior, para garantir 
recíproca de sua propriedade e de seus interesses”. (MARX, 1993, p.98). 
 
 A função do Estado na teoria marxista estaria em defender os interesses das classes 
dominantes por meio de seus instrumentos de regulação: sistema jurídico e o aparado militar 
e policial. 
 
 No intuito de manter a ordem estabelecida, no caso da sociedade moderna, a 
dominação burguesa, o Estado desempenharia uma função de caráter repressivo capaz de 
manter o status quo. Na obra “A guerra civil na França” Marx escreveu, 
 
 À medida que os progressos da moderna indústria desenvolviam, ampliavam e 
aprofundavam o antagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder do Estado foi 
adquirindo cada vez mais o caráter de poder nacional do capital sobre o trabalho, de força 
pública organizada para a escravização social, de máquina do despotismo de classe. Depois de 
cada revolução, que assinala um passo adiante na luta de classes, revela-se com traços cada 
vez mais nítidos o caráter puramente repressivo do poder do Estado (s/d. p.79). 
 
14 
 
 Um ponto relevante da teoria marxista é que ainda que nem sempre o Estado esteja 
sendo administrado diretamente por um burguês, como analisou em na Obra “O 18 brumário” 
(1997), sua estrutura é burguesa, representando os interesses da classe dominante. Ou seja, o 
Estado está estruturado, nas sociedade capitalistas, em função do capital. 
 
 Exposto, ainda que de forma breve os argumentos de Marx e os argumentos dos 
Contratualistas, notamos que há uma clara divergência entre as preposições relacionada a 
origem do Estado e a sua função. 
 
4. O trabalho como mercadoria e produção de mais-valia 
 As práticas comerciais constituem a base para que os homens se relacionem entre si, 
constituindo a sociedade. Com o desenvolvimento industrial a partir do século XVIII, as 
relações de trabalho sofreram profundas transformações. Na sociedade capitalista o trabalho 
se organiza a partir da propriedade privada dos meios de produção e do trabalho assalariado. 
O trabalho humano transformado em força de trabalho2, se tornando uma mercadoria que 
pode ser comprada e vendida. O trabalhador vende sua força de trabalho porque não tem 
instrumentos para trabalhar por conta própria. 
 O trabalho assalariado é a única mercadoria capaz de criar valor. Onde não há trabalho 
humano incorporado não há valor. Karl Marx afirma que o valor de uma mercadoria é dado 
pelo tempo de trabalho socialmente necessário para sua produção. Quanto mais trabalho há 
em uma mercadoria, maior será seu valor. 
 Ao estabelecer relação entre salário e produtividade, Marx observa que o empresário, 
ao pagar o salário aos trabalhadores, nunca paga o que eles realmente produzem. A partir de 
então, formula o conceito de mais-valia. 
 A mais-valia significa que o trabalhador, ao assinar seu contrato de trabalho, colocará 
ao longo de sua jornada de oito horas (ou mais) diárias, a sua disposição física e mental a 
serviço da empresa. Porém a riqueza que o trabalhador produz no decorrer de sua jornada é 
bem superior ao que ele recebe em forma de salário. Digamos que em quatro horas de 
trabalho um trabalhador produza a riqueza que paga seu salário daquele dia. As outras quatro 
é como se o trabalhador estivesse trabalhando gratuitamente para o empresário. Essa 
 
2 Força de trabalho é como Karl Marx chama a capacidade humana de trabalhar, que em uma sociedade 
marcada pelo trabalho assalariado é vendida como uma mercadoria qualquer em troca de salário. 
15 
 
diferença entre o que o trabalhador recebe como salário e a riqueza que ele produz é que 
Marx denomina mais-valia. 
 Por mais-valia entende-se a diferença entre o preço de custo da força de trabalho(salário) e o valor da mercadoria produzida. Em outras palavras, é o valor excedente produzido 
pelo trabalhador que fica com o capitalista. 
 
5. O fetiche da mercadoria 
 Para Marx, há uma distinção entre as coisas tal como aparecem e tal como são na 
realidade, ou seja, há diferença entre a aparência e a essência das coisas. No cotidiano, não 
vemos as mercadorias como expressão do trabalho humano e materialização da exploração do 
trabalho. Somos induzidos a pensar que as mercadorias têm qualidades próprias. 
 Este “olhar” para a mercadoria é visto por Marx como inversão do seu sentido e foi 
denominado como fetiche da mercadoria. Esse fetiche da mercadoria resulta na 
sobrevalorização das coisas em detrimento das relações sociais. Desse modo, a mercadoria 
adquire valor superior ao homem, pois são privilegiadas as relações entre as coisas e não entre 
os seres humanos. Os objetos adquirem existência autônoma, e os trabalhadores se 
transformam em coisas, uma mercadoria qualquer. Tal inversão conduz à adoração de 
fetiches, como ídolos, objetos e dinheiro. 
 
6. Classes sociais 
 Em oposição ao pensamento liberal que concebe que todos os homens são iguais na 
esfera pública, Marx identifica na base econômica a formação das desigualdades sociais. É a 
forma como os homens se relacionam com os meios de produção que indica a classe social a 
que pertencem, ou seja, se são proprietários ou assalariados. 
 Para que os trabalhadores constituam sua classe social, não basta que vivam a mesma 
condição de exploração econômica, é preciso que adquiram consciência do seu papel na 
estrutura econômica e na natureza conflituosa das relações sociais no capitalismo. 
 Assim, são constituídos agrupamentos com interesses políticos específicos, que 
passam a se organizar para a luta política com o objetivo de conquistar o poder político do 
Estado. 
16 
 
 Porém, o desenvolvimento do capitalismo ao longo do século XX tomou caminhos não 
previstos por Karl Marx, surgindo, no seio da classe trabalhadora, trabalhadores autônomos e, 
entre os burgueses, a condição de assalariados. Na atualidade, pertencer a uma classe social 
resulta das relações concretas que os indivíduos mantêm com a vida social. A burguesia 
lutando pela ampliação de seus lucros e os trabalhadores lutando por melhores condições de 
vida, eis o que Karl Marx compreende por luta de classes. 
 
7. Alienação e ideologia 
 Segundo Marx, o capitalismo, ao instaurar uma divisão social do trabalho e o sistema 
de propriedade privada dos meios de produção, leva os trabalhadores a não se verem como os 
verdadeiros produtores da riqueza. O produto do trabalho não pertence ao trabalhador, logo, 
o trabalho não realiza o homem como pessoa, e constitui-se em um instrumento de alienação: 
“em lugar de reconhecer-se em suas próprias criações, o ser humano sente-se ameaçado por 
elas, em lugar de libertar-se, acaba se enrolando em novas opressões” (KONDER, 1995, p.30) 
 Por alienação entende-se a perda da consciência da realidade concreta. Antes da 
industrialização, o trabalho se organizava como um processo global, na forma de artesanato. 
Os mestres dominavam o processo total da produção de um bem. Com o advento da indústria, 
surgiu a especialização e a fragmentação do trabalho, no qual cada operário é responsável por 
um único procedimento, repetido exaustiva e mecanicamente, perdendo a dimensão do todo. 
 A ideia de alienação significa a perda da consciência de si e o domínio da sua vontade 
pela do outro, que o conduz à perda da capacidade de decisão. É quando o homem deixa de 
ser consciente de si, capaz de tomar suas decisões, para se tornar uma coisa, um objeto. 
 Não há na obra de Marx uma definição precisa do termo ideologia, esta é concebida 
com um sistema de inversão da realidade, no qual as ideias produzidas pela classe dominante 
aparecem como as ideias dominantes em uma época. 
 Sendo assim, a classe dominante, a burguesia, domina também ideologicamente, 
colocando suas ideias como se fossem as de toda a sociedade, com se observa abaixo: 
“As ideias da classe dominante são as ideias dominantes em cada época: em outros 
termos, a classe que exerce o poder material dominante na sociedade é, ao mesmo 
tempo, seu poder espiritual dominante” (ENGELS; MARX, 1987, p.62) 
 
17 
 
 A ideologia se manifesta como um conjunto articulado e coerente de ideias, conceitos 
e valores que têm como objetivo atuar como norma de conduta que seguimos em nossas vidas 
cotidianas. Desse modo, a ideologia molda nossa visão de como a sociedade dever ser. Na 
atualidade, cabe aos meios de comunicação de massa difundir a ideologia dominante. 
 Para Marx, a ciência deveria assumir um papel crítico em relação à sociedade 
capitalista, devendo ser, ao mesmo tempo, um instrumento de compreensão da realidade e de 
transformação radical dela. Desse modo, caberia ao cientista social participar ativamente dos 
atos de transformação dessa realidade. 
 
18 
 
ÉMILE DURKHEIM (1858-1917) 
 
 
1. Aspectos gerais 
 Durkheim contagiou a sociologia com seu esforço por defini-la como ciência, 
implicando a observação dos cânones das ciências da natureza, sobretudo da biologia e da 
física. 
 Da primeira, ele trouxe: o modelo orgânico, a noção de função (como o desempenho 
de uma parte do organismo que converge para o funcionamento do todo); as noções de 
fisiologia, como dinâmica de funcionamento articulado dos órgão e em equilíbrio saudável, e 
de anatomia como descrição das “partes” do organismo em repouso; as noções de normal, 
com estado frequente e observável, e de patológico, como ruptura sistemática ou eventual, 
com a “normalidade”; a noção de método experimental indireto ou comparativo. 
 Da física, ele trouxe a noção de lei, com relações de causa e efeito, passíveis de 
investigação, de quantificação e comprovação, entre forças ou fatores presentes nos 
fenômenos observados. 
 Em geral, esses aspectos são apontados como condições da objetividade científica, 
qualificativo pretendido por Durkheim para a sociologia, assim como integram a desejada 
caracterização de um “objeto” próprio de estudos. Todavia, Durkheim insiste na peculiaridade 
de seu “objeto” de estudo , o social, que para ele não é apenas a densidade material do 
comportamento observável, ao contrário, o social se mostra na complexa relação de coisas e 
ideias, é isso que ele afirma ao insistir na necessidade de focalizar os fatos sociais como 
“coisas”. 
 No seu esforço de sistematizar e classificar os fenômenos abrangidos no objeto da 
nova ciência, ele distingue: 
a) Aqueles que integram o conteúdo de ideias que as sociedades transmitem de uma 
geração para outra, assegurando a continuidade da vida coletiva (lendas, religiões, 
tradições políticas, linguagem, etc, constituindo uma psicologia social); 
b) Julgamentos admitidos pela totalidade dos cidadãos visando à prática, à conduta 
considerada ideia (são proposições de caráter moral, abrangidas no campo de uma 
19 
 
ciência da moral, tendo por objeto estudar as máximas e as crenças morais como 
fenômenos naturais dos quais busca as causas e as leis); 
c) As máximas que adquirem caráter obrigatório, tornando-se fórmulas jurídicas, 
constituindo uma ciência do direito propriamente dito e o direito penal ou, mais 
precisamente, criminologia; 
d) As práticas ou fenômenos econômicos. 
 
 
2. Fatos sociais 
 Fatos sociais compreendem “toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer 
sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, que é geral na extensão de uma sociedade 
dada, apresentando uma existência própria (e anterior aos indivíduos), independentemente 
das consciências individuais”. 
 Assim, portanto, o fato social é algo dotado de vida própria, externo aos membros da 
sociedade e que exerce sobre seus corações e mentes uma autoridade que os leva a agir, a 
pensar e a sentir de determinadas maneiras. 
 
 Três característicasprincipais: 
(1) Coercitividade; 
(2) Exterioridade; 
(3) Generalidade. 
 
 A primeira regra da metodologia sociológica é tratar os fatos sociais como coisas, isto 
é, como “objetos” que se apresentam ao conhecimento do observador e que, portanto, devem 
ser considerados desconhecidos a priori. 
 A segunda regra do método sociológico é justamente “descartar as pré-noções”. A 
noção de “fato social”, que define o objeto da sociologia na concepção de Durkheim, opõe-se 
logicamente a todo o psicologismo, por focar a “exterioridade” e a “coercitividade” do fato 
coletivo, em oposição direta aos fatos psicológicos individuais. 
 A metodologia da nova ciência sociológica impõe o primado da “objetividade” em face 
das impressões subjetivas do pesquisador. Para garantir que as observações sejam tão 
objetivas quanto possível, é preciso que os fatos sociais sejam observados nas suas 
manifestações mais separadas das experiências meramente individuais. 
20 
 
 Por isso, Durkheim toma as “formas jurídicas” e a “orientação religiosa” como 
indicadores da qualidade da solidariedade social, em vez de buscá-los, por exemplo, na 
observação direta do comportamento em família. 
 
3. A sociologia de Durkheim: abordagem e campo teórico 
 A sociedade constitui um todo formado por partes, órgãos ou organismos integrados. 
As propriedades desse todo são mais complexas que as decorrentes da soma das propriedades 
das partes. 
 Por isso, o modelo correspondente a essa concepção de sociedade é orgânico: assim 
com um organismo vivo é constituído de parte (cada órgão cumprindo sua função distinta), 
assim também a sociedade seria constituída de partes, grupos e instituições, por exemplo, 
família, religião, etc, que exercem pressão (coerção) sobre o indivíduo e entre si. 
 
 
Figura 1: Esquema teórico. 
 
• Consciência coletiva: normalidade. A partir do normal, Durkheim analisa o patológico. 
Para ele, as sociedades modernas são doentes porque sofrem de anomia. 
 
• Anomia: é a situação de desintegração das normas que regem a conduta da sociedade, 
não havendo mais garantias da ordem social. É causada pelos altos níveis de 
21 
 
desemprego, desesperança de muitos em relação ao futuro, ausência e ausência do 
Estado nas questões cruciais da população (saúde, educação, segurança, moradia, 
emprego, etc), sensação de insegurança e impunidade. 
 
• Solidariedade: é a situação em que um grupo social vive em comunhão de atitudes e 
sentimentos, construindo uma unidade sólida. Divide-se em: 
a) Solidariedade mecânica: ocorre nas sociedades tradicionais. Os indivíduos que as 
integram aceitam sem questionamento todos os valores, tradições e costumes da 
tribo; o grupo compartilha os mesmos valores e crenças, o que assegura a coesão 
social. É uma sociedade mais conservadora. 
b) Sociedade orgânica: ocorre nas sociedades modernas complexas, onde há 
diferenças de valores, crenças e costumes. Características: consciência e interesses 
individuais, divisão do trabalho e cosmopolitismo. A coesão social ocorre de duas 
maneiras: através da divisão do trabalho e através das regras de conduta que 
estabelecem direitos e deveres. 
 
• Suicídio: Durkheim estava convencido que podia explicar boa parte dos 
comportamentos como fatos sociais. Para tanto, ele toma como objeto de estudo 
aquele ato que, em aparência, seria o mais individual possível: o suicídio. 
a) Suicídio altruísta: sacrifício por uma ideologia ou crença. Ex: Haraquiri (Japão); 
b) Suicídio egoísta: depressão, melancolia, etc; 
c) Suicídio anômico: queda de status social, desesperança, anomia (desequilíbrio). 
“Quanto menos limitados nos sentimos, tanto mais toda limitação nos parece 
intolerável”. 
 
 
22 
 
MAX WEBER (1864-1920) 
 
 
1. O método compreensivo de Max Weber 
 Para Weber, a sociologia visa entender a ação social, que se apresenta dotada 
de regularidade, mas cuja explicação não pode ser baseada em relações de causa e 
efeito, como nas ciências físicas e naturais: nas ciências sociais, as “causas” aparecem 
diluídas sob a forma de condições de natureza diversa (históricas, econômicas, 
políticas, etc). Weber realiza o abandono do modelo clássico de explicação causal e a 
passagem para um esquema de explicação que já não é causal, mas condicional. 
 As uniformidades do comportamento não são “leis” no sentido atribuído pelos 
positivistas, mas são uniformidades empíricas comprováveis e expressadas em forma 
de tipos ideais. É importante reter a ideia de que a ação social não é o comportamento 
individual observado, mas o “modelo social” que fundamenta o comportamento 
individual. 
 A ação social, portanto, é uma ação em que o sentido mentalizado por um 
sujeito, ou por sujeitos, está referido à conduta dos outros, orientando-se por ela em 
seu desenvolvimento. Está implícito nessa afirmação de Weber o conceito de 
reciprocidade, que é muito importante para entender a sua obra. É fácil perceber o 
quanto esse conceito de reciprocidade está presente nas práticas cotidianas, nos 
cumprimentos, agradecimentos, etc. 
 A sociologia compreensiva de Weber se caracteriza pela busca do sentido social 
das ações, de modo a compreender as práticas dos sujeitos. 
 
2. Ação social 
 Em princípio, Weber (1977, vol.I, p.18) conceitua ação social nos seguintes termos: 
“A ação social (incluindo tolerância ou omissão) se orienta pelas ações dos outros, 
as quais podem ser passadas, presentes ou esperadas como futuras (vingança, 
réplica). Os ‘outros’ podem ser individualizados e conhecidos ou uma pluralidade 
de indivíduos indeterminados e completamente conhecidos (o dinheiro, por 
23 
 
exemplo, significa um bem – de troca – que o agente admite na transação porque 
sua ação está orientada pela expectativa de que os outros (...) desconhecidos, 
estarão dispostos a aceitá-lo também por seu lado, [em uma] troca futura)”. 
 
 Mas nem toda ação é social, embora se dê em sociedade e seja exteriorizada. Por 
exemplo, o consumo de um bem qualquer só será social se, ao realizar a aquisição, ou para 
realizar a aquisição, o sujeito (consumidor) levar em consideração o efeito de sua ação sobre 
os outros, tanto no momento quanto no futuro. A moda é um exemplo significativo dessa 
dimensão social da ação individual. 
 Todavia, essa racionalidade da ação social pode ser diferenciada: 
1) Uma ação social é racional com relação aos fins, na medida em que na ação social o 
sujeito antecipa o efeito que ele produzirá aos outros e age conforme essas 
expectativas, tomando-as como “condições” ou “meios” para alcançar seus próprios 
fins. A gestão financeira de uma empresa exemplifica essa modalidade. Outro exemplo 
são os candidatos em entrevista de emprego, procurando corresponder à imagem 
corporativa de eficiência; 
2) A ação social é racional com relação aos valores quando ela se pauta por crenças 
religiosas, estéticas ou éticas, mas essas crenças não estão objetivamente relacionadas 
com o resultado almejado pelo sujeito. Alguns alunos se benzem com o sinal da cruz 
antes da prova, apesar de o sinal religioso não ter nenhuma relação racional com a 
prova; 
3) A ação social pode ser racional com relação aos afetos e emoções, por isso maridos e 
namorados compram flores para presentear as parceiras no dia 12 de junho, ainda que 
as flores não resolvam os problemas de relacionamento; 
4) A ação social pode ser racional com relação à tradição quando diz respeito a certos 
padrões instalados na cultura e hábitos arraigados. Um exemplo seria o vestido de 
noiva branco, representando a união por amor e a pureza da noiva. 
 
3. Tipos ideais 
 Para entender determinada realidade social, é preciso resgatar o significado cultural 
que lhe atribuíram aqueles sujeitos que dela fizeram parte no passado, e também em 
conformidade com as categorias e valores dos que dela fazem parte no presente. 
 Isso porque, de fato, são as ideias que interessam às ciências sociais, sãoelas que 
portam o sentido das ações e as condicionam. Isso significa que as conexões causais que serão 
investigadas e encontradas em pesquisa não serão conexões entre as coisas, mas conexões de 
sentido entre determinada configuração social dotada de significado cultural (isto é, com 
24 
 
ideias de valor) e outra configuração social dotada de significação; portanto são conexões 
entre conceitos e não entre coisas. 
 Aqui há uma questão relevante: quanto mais importante tenha sido na história uma 
ideia e mais tenha orientado a conduta humana, maior a diversificação de versões que 
apresenta, portanto, para compreender essa ideia com rigor conceitual, será preciso proceder 
a uma abstração do tipo ideal. Em outras palavras, será preciso construir um instrumento que 
seja uma síntese daquela ideia que possa ser utilizada como modelo para comparação com a 
evidência empírica fornecida pela realidade em estudo. 
 Essa abstração (o tipo ideal) é construída pelo pesquisador. O sentido teórico 
conceitual de um tipo ideal tem consistência lógica, mas também sentido pragmático, porque 
ao permitir comparar, indiretamente permite avaliar facetas e fragmentos da realidade 
empírica em análise. 
 Os tipos ideais são, grosso modo, generalizações em que predomina a racionalidade. 
Princípios como o cristianismo, o feudalismo, o capitalismo são conceitos que unem situações 
totalmente díspares, abstraindo elementos comuns que são levados ao extremo. Na medida 
em que o tipo ideal remete à racionalidade extremada de uma determinada ação ou 
configuração, os desvios empíricos desse modelo possibilitam ao sociólogo compreender a 
especificidade da ação ou configuração em foco, em seus aspectos racionais e não racionais, 
Construir tipos ideais, portanto, é um instrumento central à sociologia compreensiva de 
Weber, o qual figura como meio e recurso de método. 
 Enfim, o tipo ideal é uma ferramenta para analisar uma realidade ou para se aproximar 
de um conteúdo. Como a realidade tem múltiplas formas é impossível escrever sobre em sua 
totalidade. Assim, tipo ideal é uma construção mental de uma realidade em que o pesquisador 
vai selecionando um determinado número de características do objeto estudado a fim de 
construir um “todo” tangível, ou seja, um tipo. 
 Exemplo: o “homem cordial” de Sérgio Buarque de Holanda é um tipo ideal do povo 
brasileiro, é um parâmetro de estudo. 
 
4. Estruturas típicas de dominação 
 Weber define três tipos puros de dominação legítima: tradicional, carismática e 
racional legal. Por dominação entenda-se o exercício do poder, porém não necessariamente 
autoritário, mas com assentimento do outro. Não se trata apenas de “obediência”, mas de 
uma relação social que pressupõe reciprocidade. 
25 
 
a) Estrutura tradicional ou patriarcal caracteriza-se pelo poder exercido em nome da 
tradição, do senhor. Trata-se do poder exercido pela autoridade da posição, tem 
características autoritárias, mas pode combinar o convencimento pela afetividade. 
b) Estrutura carismática vem da crença em qualidades excepcionais de alguém para 
dirigir um grupo social. 
c) Estrutura burocrática ou racional legal, segundo Weber a forma de dominação mais 
adequada ao Estado e à empresa. Ela encontra legitimidade na crença da justiça da lei 
e no reconhecimento de sua necessidade; o povo obedece às leis porque crê que elas 
são decretadas segundo procedimentos corretos. 
 
5. Sociologia jurídica 
 Para Weber, a dogmática analisaria o sentido normativo logicamente correto de uma 
formação verbal que se apresenta como norma jurídica, ao passo que a sociologia do direito 
pergunta o que de fato ocorre em uma comunidade em razão dos homens considerarem 
subjetivamente como válida determinada norma e orientarem por ela sua prática, suas ações. 
 Ou seja, a primeira estuda as normas internamente e a segunda se preocupa coma 
eficácia social das ditas normas e como os indivíduos orientam suas condutas por elas. 
• Método: 
a) Sociologia do Direito → empírico-causal. 
b) Dogmática → lógico-formal. 
c) Fim da Sociologia do Direito → o comportamento dos sujeitos diante da ordem 
jurídica; 
d) Fim da Dogmática Jurídica → a coerência das proposições jurídicas. 
“[...] a ordem jurídica ideal da teoria do direito (leia-se aqui dogmática jurídica) não 
tem diretamente nada a ver com o cosmos das ações [...] efetivas (objeto da 
sociologia jurídica), uma vez que ambos se encontram em planos diferentes: a 
primeira, no plano ideal de vigência pretendida; a segunda, no dos acontecimentos 
reais” (Weber). 
 
Weber distingue três tipos de normas de conduta, em seu estudo sociológico sobre o direito, 
quais são: 
a) Norma jurídica – imposta coercitivamente, sendo garantida pela probabilidade de 
reação, física ou psíquica, exercida por um quadro de indivíduos instituídos; 
26 
 
b) Convenção – chamada por outros autores de “uso social”, corresponde à conduta 
socialmente obrigatória, que não é protegida por nenhuma restrição oficial, mas sim 
pela reprovação do próprio grupo. 
c) Costume – é o simples hábito, que não contém obrigatoriedade nem a probabilidade 
de reprovação do grupo. 
 
27 
 
FUNDAMENTOS DA SOCIOLOGIA DO DIREITO E PÓS-MODERNIDADE 
 
 
1. Conceitos 
 A Sociologia é uma ciência que estuda os modos de criação e organização das relações 
e instituições sociais, abordando as conexões recíprocas entre os indivíduos e a sociedade. 
Parte da premissa da sociabilidade inerente à condição humana, pois o ser humano é um 
animal social. 
 A sociologia do direito estuda como os fatores econômicos, políticos e ideológicos da 
realidade social influenciam o funcionamento das instituições jurídicas (por exemplo, Poder 
Legislativo, Poder Executivo, Poder Judiciário, Polícia, Advocacia, etc) e a criação das diversas 
normas jurídicas (por exemplo, leis, atos administrativos, decisões judiciais, contratos, 
doutrina, costumes), bem como examina como a ordem jurídica, enquanto complexo 
institucional e normativo de regulação da vida social, interfere na configuração das relações 
humanas em sociedade. 
 A sociologia do direito enfoca dois problemas fundamentais. De um lado, o problema 
da sociedade no direito, isto é, dos comportamentos sociais conforme ou disformes em 
relação às normas da considerada realidade jurídica efetiva, que pode funcionar como um 
indicador de um direito livre, latente, vivente ou em formação. Por outro lado, o problema do 
direito na sociedade, ou seja, trata-se de um saber que busca posição, função e objetivo do 
direito na sociedade vista em seu conjunto. 
 Trata-se, portanto, de um ordenamento jurídico que busca investigar a influência da 
sociedade na formação do ordenamento jurídico, bem como o influxo do ordenamento 
jurídico no campo das relações sociais. 
 A sociologia do direito pode ser caracterizada como um saber científico, empírico, 
zetético e causal: 
• Científico, porque a sociologia do direito se apresenta como um conhecimento 
racional, sistemático e metódico das conexões existentes entre o fenômeno jurídico e 
a realidade social; 
28 
 
• Empírico, porque procura estudar o fenômeno jurídico como um fato social, inserido 
na realidade concreta das interações comportamentais, afastando-se de uma 
abordagem idealista ou metafísica; 
• Zetético, porque busca refletir criticamente sobre as relações mantidas entre o 
ordenamento jurídico e a sociedade, através de constantes questionamentos para a 
formulação de suas leis científicas, não se coadunando com a abordagem dogmática, 
que se revela refratária às indagações acerca do mundo circundante; 
• Causal, porque se vale da causalidade (lógica do ser: dado A, é B) para o 
estabelecimento dos liames entre o fenômeno jurídico e a realidade social e posterior 
formulação de seus modelos teóricos, porém sem o rigor determinístico que a 
causalidade apresenta no terreno das Ciências Naturais. Pode-se dizer que acausalidade empregada pela sociologia do direito apresenta uma natureza 
probabilística, ao enunciar tendências de realização de determinadas condutas no 
mundo social e jurídico. 
 
2. A efetividade da norma jurídica como tema da sociologia do direito 
 Um dos grandes campos temáticos da sociologia do direito é o estudo acerca da 
eficácia social ou efetividade das normas jurídicas, o qual permite explorar a dimensão fática 
da própria experiência jurídica. 
 Quando uma norma jurídica se apresenta efetiva, os dispositivos normativos são 
assimilados concretamente pelos sujeitos de direito. Por sua vez, não haverá efetividade a 
norma que estiver em dissonância com a realidade social, não sendo cumprida pelos 
destinatários da ordem jurídica. 
 Exemplo: A Lei das Contravenções Penais (DL-003.688-1941) carece de efetividade, 
porquanto, no artigo 58, tipifica o jogo do bicho como contravenção penal. Não obstante a 
existência de proibição legal expressa, o jogo do bicho é explorado e praticado livremente por 
parcelas significativas da sociedade brasileira, sem que os contraventores venham a sofrer 
quaisquer sanções pelas autoridades constituídas. 
 
3. Métodos da sociologia do direito 
 Métodos são procedimentos intelectuais que permitem ao sujeito a apreensão dos 
objetos do conhecimento. Dentre os métodos utilizados pela sociologia do direito, merecem 
destaque os seguintes: indutivo, dedutivo, positivista, compreensivo, dialético, estruturalista, 
funcionalista e desconstrucionista. 
29 
 
a) O método indutivo está baseado na observação e na posterior sistematização dos 
dados particulares para a construção de modelos conceituais genéricos. Em outras 
palavras, significa dizer que através da indução o cientista parte da observação de 
situações particulares parra a formulação de leis ou teorias dotadas de generalidade e, 
portanto, de aplicação universal; 
b) O método dedutivo está baseado na aplicação dos modelos conceituais genéricos para 
experiências sociais particulares, utilizando-se assim o raciocínio inverso da 
metodologia indutiva; 
c) O método positivista busca descrever objetivamente a realidade social, propiciando a 
exatidão do conhecimento sociológico, através da preservação do distanciamento 
entre sujeito e objeto, bem como através da neutralidade valorativa e axiológica; 
d) O método compreensivo está baseado na apreensão dos significados das ações e 
instituições sociais existentes em cada cultura. Nesse sentido, ao contrário da 
abordagem positivista, defende-se um conhecimento baseado na proximidade do 
pesquisador social com a sociedade e aberto às valorizações sociais de cada cultura; 
e) O método dialético busca apreender a sociedade a partir da ótica dos conflitos 
existentes entre grupos sociais, examinando como essas contradições interferem na 
configuração normativa e institucional da ordem jurídica; 
f) O método estruturalista parte da premissa de que haveria uma estrutura única e 
imodificável de papéis ou funções sociais, a qual se repetiria nas mais diversas 
sociedades, embora com diversas fisionomias culturais; 
g) O método funcionalista busca examinar as conexões entre o direito e a sociedade a 
partir da ideia de consenso. A ordem jurídica é então concebida como um instrumento 
normativo e institucional de pacificação e resolução dos conflitos sociais, enfatizando-
se a harmonia, a segurança e a estabilidade das expectativas comportamentais na rede 
de interações humanas; 
h) O método desconstrutivista busca desmistificar os discursos ideológicos de justificação 
e legitimação das estruturas de poder social. Nesse sentido, procura evidenciar a 
incoerência das concepções ideológicas que influenciam a fisionomia normativa e a 
atuação institucional no âmbito do ordenamento jurídico. 
 
 
30 
 
4. A nova vertente da sociologia do direito 
 Ao longo do século XX, a sociologia do direito sofreu novos aperfeiçoamentos em 
contato com as mais recentes contribuições das ciências sociais. O exemplo mais emblemático 
continua sendo o funcionalismo sociológico, que encontra sua mais acabada expressão na 
teoria dos sistemas preconizada por Nickas Luhmann, para quem o direito se afigura como um 
subsistema social, comunicativo e dotado de natureza autopoiética. 
 Segundo Nickas Luhmann (2002, p.380), a teoria de sistemas deve poder tudo explicar 
(universalidade), inclusive o próprio ato de teorizar (reflexividade), o que faz explicando tudo 
como sendo sistema (autorreferência) e o que não configura esse sistema – o ambiente. Por 
sua vez, o sistema autopoiético é autônomo porque o que nele se passa não é determinado 
por nenhum componente do meio circundante, mas por sua própria organização sistêmica. 
 O sistema jurídico se propõe a reduzir a complexidade do ambiente, absorvendo a 
contingência da intersubjetividade e garantindo a generalização congruente de expectativas 
comportamentais, a fim de fornecer uma imunização simbólica de expectativas contra outras 
possibilidades sociais de conduta. 
 Conforme Willis Guerra (1997, p.63), o sistema jurídico integra o sistema imunológico 
das sociedades, imunizando-as de conflitos surgidos já em outros sistemas sociais. Isto não é 
feito pela negação dos conflitos, mas com os conflitos, assim como os sistemas vivos se 
imunizam das doenças com seus germes. Para tanto, a complexidade da vida social, com sua 
extrema contingência, é reduzida pela construção de uma para-realidade, codificada a partir 
do esquema binário Direito/Não Direito (lícito/não lícito). 
 O direito é para Luhmann um instrumento de coesão social e é também, por assim 
dizer, um instrumento que, através de uma congruente generalização de expectativas de 
comportamento, coordena num nível altamente generalizado e abstrato todos os mecanismos 
de integração e de controle das interações humanas em sociedade. 
 Dentro da visão sistêmica do direito preconizada por Niklas Luhmann, a justiça só pode 
ser considerada a partir do interior do sistema jurídico. Dessa forma, trata-se, pelo lado 
externo, da abertura cognitiva adequada aos elementos morais, econômicos, políticos do meio 
ambiente e, pelo lado interno, da capacidade de reprodução autopoiética do sistema jurídico, 
através da permanente busca pela consistência dos processos decisórios. 
 
31 
 
PÓS-MODERNIDADE 
 
 
1. O que é pós-modernidade? 
 Nesta palestra, o professor Juremir Machado tenta explicar o conceito de pós-
modernidade. O que é pós-modernidade? Pós-modernidade, segundo o professor, pode ser 
descrita como o momento em que (tomando Lyotard como influência) todas as grandes 
narrativas entram em crise. 
 As grandes narrativas são as grandes explicações sobre o mundo, sobre a história, 
sobre a vida e sobre o futuro, entre as mais influentes: o marxismo, o cristianismo (e as 
religiões em geral), o iluminismo com o sonho da sociedade racional e etc e etc. Essas 
narrativas só podem ser chamadas de narrativas na percepção da pós-modernidade, pois para 
si, elas são o fundamento do mundo, a estrutura última da realidade – a teoria da história 
marxista não é somente uma narrativa, mas uma tentativa de explicação universal da história, 
da mesma forma, o projeto iluminista visava a universalização da razão e o cristianismo a 
universalização de seu próprio Deus. 
 Desta forma, segundo Juremir Machado, o núcleo da pós-modernidade (em resumo) é 
a negação de qualquer fundação. Não há um “real realmente real”, mas unicamente narrativas 
que estruturam a realidade. Sendo assim, toda e qualquer visão de mundo, quando tenta ser 
verdade, se coloca em uma posição totalitária em relação àqueles que estão sendo sujeitados 
por ela. 
 Essas narrativas – visões de mundo – que indicam um caminho para o futuro, 
um projeto utópico, é aquilo que é negado pela pós-modernidade. A falta da certeza nas 
grandes narrativas indica a impossibilidade de se prever o futuro com certeza filosófico-científica, portanto, o que nos resta é o presente. O presente precisa ser modificado e vivido, 
seja ele bom ou ruim. 
 Juremir Machado explica que, não havendo uma estrutura verdadeira baseada naquilo 
que é real, a pós-modernidade nega a materialidade como definição daquilo que de fato é o 
real, mas atribui a realidade ao sentido que os sujeitos podem dar às coisas. A forma como 
https://youtu.be/bUBAXx8Np3g
http://colunastortas.com.br/2016/02/21/livro-da-semana-a-condicao-pos-moderna-jean-francois-lyotard/
http://colunastortas.com.br/marxismo/
http://colunastortas.com.br/2014/08/19/o-sujeito-castrado-e-a-igreja/
http://pt.wikipedia.org/wiki/Utopia
32 
 
esse sentido é dado é variada e cada linha de pensamento tem sua própria maneira de explicar 
a construção da realidade, mas o fundamental é essa experiência do mundo como algo que 
precisa de sentido, pois nele mesmo não há nenhum. 
 Sem a prisão em narrativas legitimadoras, não há prisão em maneiras de ser para o 
sujeito, o que o torna dono de sua própria liberdade (mas isso não deve ser visto como algo 
bom, tomando uma visão liberal-filosófica – Bauman nos ensina muito sobre os males desta 
suposta liberdade). 
2. O que é pós-modernidade? Resumo da tragédia 
 Caso tentássemos explicar o que é pós-modernidade de maneira rápida, em resumo 
poderíamos dizer que é a: 
a) Crise da ideia da filosofia como construtora da verdade; 
b) Crise da ideia de certeza; 
c) Crise das Utopias. 
 Segundo Juremir, ao falar sobre uma suposta universalidade ou convergência no 
pensamento pós-moderno, “quando a gente diz ‘a pós-modernidade diz…’, essa é uma frase 
profundamente falsa, a pós-modernidade não diz nada, não é uma plataforma política, não é 
um grupo que se reuniu em algum lugar para criar o manifesto pós-moderno, assentar as 
bases da pós-modernidade, eleger a direção da pós-modernidade. A pós-modernidade é uma 
série de discursos sobre um momento”. 
3. Lyotard e a grande narrativa 
 O que é pós-modernidade? Para Lyotard, essa condição de descrédito – própria deste 
período – às grandes narrativas se deu, além do desenvolvimento do capital, pela própria 
lógica interna da ciência (que seria o saber legitimador da contemporaneidade). O ceticismo 
interno faz com que a prova da prova não seja provada. É necessário um a priori, algo que não 
pode ser duvidado, e se é necessário um a priori, então a ciência não é mais do que um jogo de 
linguagem entre tantos outros. 
http://colunastortas.wordpress.com/2013/07/22/modernidade-liquida-o-que-e/
33 
 
 Desta forma, a pragmática da pós-modernidade não é pautada em um fim teleológico 
ou em um bem maior (não se busca uma sociedade igualitária ou o paraíso), pois estes já não 
têm efeitos de verdade prática. Ela é pautada na maximização da eficiência, que pode ser 
traduzido em: mais poder. 
 Num mundo sem grandes narrativas, mas recheado de inúmeros jogos de linguagem (e 
mediado por estes jogos de linguagem unicamente, que funcionam como o vínculo social na 
pós-modernidade), é unicamente o aumento do poder e da eficiência que garantem a 
reprodução infinita de um sistema, que garante seu aumento de performance e sua eficácia. O 
que isso significa? Significa que quem tem mais dinheiro (que é uma boa representação 
material da possibilidade de movimentar relações de poder eficientemente) pode favorecer 
aquilo que lhe interessa, pois não existe mais uma verdade ou uma justiça quase 
transcendental a serem consideradas para realizar o julgamento do válido e do inválido. 
4. A pós-modernidade de Bauman 
 A abordagem de Bauman se difere de Lyotard na medida em que o pensador polonês 
procura explicar as relações sociais a partir (principalmente, mas não unicamente) da 
sociologia, deixando a análise discursiva, a linguagem, para segundo plano. 
 O autor prefere chamar o tempo em que vivemos de modernidade líquida, em vez de 
pós-modernidade. Não há uma clara ruptura, mas sim uma mudança na continuação da 
modernidade. 
 É necessário mudar o rótulo para não ser confundido com autores que, de uma forma 
ou de outra, dão aval para a situação global que encontramos. Afirma Bauman, 
Uma das razões pelas quais passei a falar em “modernidade líquida” em vez de 
“pós-modernidade” (meus trabalhos mais recentes evitam esse termo) é que fiquei 
cansado de tentar esclarecer uma confusão semântica que não distingue sociologia 
pós-moderna de sociologia da pós-modernidade, entre “pós-modernismo” e “pós-
modernidade”. No meu vocabulário, “pós-modernidade” significa uma sociedade 
(ou, se se prefere, um tipo de condição humana), enquanto que “pós-modernismo” 
se refere a uma visão de mundo que pode surgir, mas não necessariamente, da 
condição pós-moderna. 
Procurei sempre enfatizar que, do mesmo modo que ser um ornitólogo não significa 
ser um pássaro, ser um sociólogo da pós-modernidade não significa ser um pós-
34 
 
modernista, o que definitivamente não sou. Ser um pós-modernista significa ter 
uma ideologia, uma percepção do mundo, uma determinada hierarquia de valores 
que, entre outras coisas, descarta a ideia de um tipo de regulamentação normativa 
da comunidade humana e assume que todos os tipos de vida humana se equivalem, 
que todas as sociedades são igualmente boas ou más; enfim, uma ideologia que se 
recusa a fazer julgamentos e a debater seriamente questões relativas a modos de 
vida viciosos e virtuosos, pois, no limite, acredita que não há nada a ser debatido. 
Isso é pós-modernismo. 
 O autor pontua a modernidade líquida como um momento de exaltação da liberdade 
individual. Ao contrário da modernidade, em que a criação de uma ordem que teria poder de 
controle superior para manter o projeto de sociedade nos eixos da história, a liquidez é 
resultado (e também causa) da troca da segurança – presente em sistemas controlados – pela 
liberdade (que foi podada gradativamente quando a segurança passou a ter papel central na 
sociedade moderna). 
 A liberdade precisa de poder. Não de um poder proprietário, mas sim de um poder 
relacional. “A liberdade é uma relação – uma relação de poder. Sou livre se, e somente se, 
posso agir de acordo com a minha vontade e alcançar os resultados que pretendo alcançar”. 
 A segurança, por sua vez, tem relação direta com a previsibilidade. O que significa que 
a falta de segurança na modernidade líquida é, para além da possibilidade de se sofrer 
agressões físicas, a incapacidade de garantir a permanência dos sujeitos em suas posições 
sociais ou de garantir alguma ascensão social. A insegurança também se manifesta na 
constante angústia vivida que está tão mais presente em nossa vida quanto mais tentamos nos 
aproximar de alguma fixidez nos laços humanos. 
5. Resumo: o que é pós-modernidade? 
 A pós-modernidade é: 
a) Um conceito ainda debatido e de validade questionável; 
b) Época de incertezas; 
c) Época de destruição dos referenciais; 
d) Substituição das grandes narrativas pelos jogos de linguagem; 
e) Eficiência e poder como fim último; 
f) Aniquilamento da moral; 
g) Liberdade individual identificada como liberdade econômica. 
35 
 
SOCIOLOGIA DO CRIME 
 
1. O pensamento sobre o crime na antiguidade 
 Durante muito tempo acreditou-se que a ocorrência do crime se devia a fatores 
externos aos indivíduos, nomeadamente de origem sobrenatural e em larga medida 
inexplicáveis. Porém, desde cedo também existiu a preocupação de indagar se não existiam 
fatores intrínsecos ao ser humano que explicassem a propensão para a violação das regras da 
sociedade. Alguns autores se voltaram à busca da explicação para o comportamento criminal 
em traços de caráter dos indivíduos (maldade, imoralidade, egoísmo, irracionalidade), outros 
se voltaram sobre causas internas de caráter biológico. 
 Teríamos que esperar pelo século XIX para se iniciar a abordagem propriamente 
científica do comportamento criminoso. Mas já na antiguidade encontramos vestígios da 
reflexão em torno do crime e dabusca de fundamentação empírica de um pressuposto que 
tem acompanhado os estudos do crime e do criminoso até hoje: o de que o criminoso é 
necessariamente diferente e que essa diferença poderá explicar o motivo pelo qual 
determinados indivíduos cometem crimes e outros não. 
 Almeceon de Cretona, filósofo e médico grego do séc. VI a.C., contemporâneo de 
Hipócrates e considerado por muitos o pai fundador da patologia fisiológica, considerava que o 
homem tinha tanto de divino como de animal, pelo qual o delinquente (assim como o doente) 
representava um desequilíbrio que potenciava a faceta animalesca. 
 Enquanto Sócrates (469-399 a.C.) defendeu que a instrução e a formação de caráter 
possibilitavam reabilitar os criminosos, prevenindo a reincidência, o seu discípulo Platão (428-
347 a.C.) debruçou-se sobre os fatores políticos, econômicos e sociais que poderiam potenciar 
a criminalidade, elegendo na obra A República a ignorância, a miséria e a cobiça como as 
causas determinantes da ocorrência do crime. 
 Esta obra apresenta as principais matrizes de vários movimentos de reforma social que 
surgiram na modernidade: O que é um homem bom e como ele chega a ser o que é? O que é 
um Estado bom e por que é bom? Qual conhecimento o homem dever ter para ser bom? O 
que o Estado deve fazer para levar os homens à aquisição desse conhecimento, o qual é 
condição da virtude? 
36 
 
 As interrogações formuladas por Platão em A República são retomadas na sua obra 
final As Leis, a qual apresenta o crime como resultado de uma doença de causa que poderia 
ser tríplice: 
1) Fruto de “paixões” (inveja, cobiça, e cólera); 
2) Ignorância; e 
3) Busca desenfreada do prazer. 
 Nesse contexto, a pena deverá surgir não como castigo, mas como remédio 
para a doença, ou seja, como forma de libertar o delinquente do mal que o assolou. 
Assim, se a concepção platônica de Estado se funda na ideia de que este deve 
proporcionar ao homem as melhores condições para desenvolver as suas virtudes e 
eliminar os seus males, as penas assumirão uma vertente pedagógica, um papel 
educativo, destinado a conduzir o homem para o Bem (ideia suprema). Nunca, na 
perspectiva de Platão, o cumprimento das leis de uma sociedade dever ser feito por 
temor à punição, mas sim por vontade de manter a coesão social. 
 
2. A visão espiritual 
 Na idade média o crime é considerado um pecado e suscetível de punições 
cruéis e tortura para obter a confissão do ato. As causas do crime são procuradas em 
fatores sobrenaturais e a chamada “explicação espiritual” para a ocorrência do crime 
fundamentou a justiça criminal na Europa durante séculos. 
 As explicações de origem sobrenatural para a ocorrência do crime traduzem 
uma concepção do mundo e da sociedade que, em parte, vai ser refutada por São 
Tomás de Aquino (1226-1274), monge dominicano, filósofo e teólogo italiano, que 
procura conciliar a filosofia aristotélica com o cristianismo e apresenta os primeiros 
fundamentos da justiça distributiva (defesa da ideia de dar a cada um o que é seu, 
segundo uma lógica de relativa igualdade). 
 
 
37 
 
3. O Renascimento 
 Ao longo do século XV e XVI a concepção sobrenatural do crime vai coexistindo com o 
avanço lento de uma abordagem de outro tipo de causas explicativas para a ocorrência do 
crime. 
 Thomas More (1478-1535) considera o crime um reflexo da sociedade, apontando 
como causa dominante a opulência dos ricos, que atrai os pobres para a cobiça e roubo. Na 
cidade imaginária que idealizou, não existe crime e há apenas um mínimo de leis, por dois 
motivos: porque existe a comunhão de bens e instituiu-se a abolição da propriedade privada. 
Nesta sociedade, as pessoas viveriam sem luxos, trabalhando apenas o necessário para 
sobreviver, pelo que não haveria distinção entre ricos e pobres, fundamento da maioria dos 
atos criminosos. 
 Giovan Battista Della Porta (1535-1615) lança os fundamentos da frenologia (estudo da 
estrutura do crânio) e da fisiognomia (estudo que procura determinar o comportamento com 
base em características faciais). Os impactos dessa abordagem foram consideráveis nos 
primórdios da análise biológica dos criminosos (século XIX). Em particular nos trabalhos 
desenvolvidos por Lombroso, fundador da criminologia científica. 
 
4. A criminologia clássica 
 A característica fundamental da criminologia clássica é basear-se no pressuposto de 
que o crime resulta de um ato individual de livre vontade, de caráter racional e calculista, que 
se guia pelo princípio da obtenção máxima de prazer, procurando evitar o sofrimento. Assim, o 
criminoso realiza sempre a ato racional e livre de ponderar as vantagens e desvantagens de 
praticar o delito. 
 Um dos principais autores da criminologia clássica é Beccaria (1738-1794), mas as 
origens desta corrente de pensamento podem ser encontradas nos pensadores do “contrato 
social”, como Hobbes (1588-1678), Montesquieu (1689-1755), Voltaire (1694-1778) e 
Rousseau (1712-1778). 
 Neste contexto, o criminoso é entendido como alguém que não cumpre o contrato 
social, sendo legítima a ação pela força, da parte do Estado, para assegurar e manutenção da 
ordem social e punir a ação perturbadora da paz. 
 
38 
 
5. O positivismo criminológico 
 O início da publicação de estatísticas criminais anuais na França, em 1827, veio revelar 
alguns fatos sobre o fenômeno criminal que fragilizaram a tese da criminologia clássica, de que 
o ato criminal resulta de um ato de livre vontade: por um lado, as estatísticas evidenciaram a 
regularidade do crime e não sua variação; por outro lado, constatou-se que ao contrário das 
previsões otimistas dos teóricos do contrato social, o crime não estava a ser controlado 
socialmente, mas se assistia a um aumento da criminalidade. 
 No século XIX, vários condicionamentos sociais e históricos vão proporcionar o 
nascimento do denominado “positivismo criminológico”, cujos postulados principais são os 
seguintes: 
1) Negação do livre-arbítrio e crença no determinismo e previsibilidade dos fenômenos 
humanos; 
2) Crença na neutralidade axiológica e separação entre a ciência e a moral; 
3) Recurso privilegiado aos métodos experimentais e ao empirismo. 
 
 Foi sobretudo Cesare Lombroso (1835-1909), quem mais impulsionou os estudos da 
criminalidade no século XIX, com repercussões que se disseminaram ao longo do século XX e 
que, nos dias de hoje, continuam ainda a marcar as abordagens biopsíquicas dos estudos 
criminais mais ortodoxos e radicais. 
 As suas obras de destaque são O Homem Criminoso (1876) e O Crime, suas Causas e 
Soluções (1899). Nelas são lançados os fundamentos da sua proposta de “criminologia 
científica”, pela qual as causas do crime são procuradas pela observação empírica de traços 
físicos de criminosos, acreditando-se poder alcançar a determinação de leis que permitissem 
prever a ocorrência da criminalidade, segundo uma lógica pré-definida e determinada pelas 
características inatas dos indivíduos. 
 Com base em estudos genéticos e evolutivos influenciados pelo darwinismo, Lombroso 
defende que certos criminosos têm traços de “atavismo” físico e psíquico (reaparição de 
características que foram apresentadas somente em ascendentes distantes) de tipo 
hereditário, reminiscente de estágios mais primitivos da evolução humana e que se traduz em 
formas e dimensões anormais de crânio e da mandíbula e assimetrias da face. 
 A criminologia clássica e o positivismo criminológico assumem abordagens distintas 
sobre o crime e o criminoso, que servem de base a diferentes políticas criminais. Se o indivíduo 
possui livre vontade e guia a ação pela razão e pelo caçulo, adotando uma postura hedonista, 
pela qual procura maximizar o prazer e evitar a dor e o sofrimento, então o sistema de justiça 
criminal deverá punir o criminoso procurando evitar ou diminuir a prática do crime. Se o 
39 
 
comportamento criminoso resulta de fatores biológicose/ou psicológicos, então a opção será 
a sociedade eliminar o criminoso (entenda-se retirá-lo do convívio social e mantendo-o em 
prisões à margem da sociedade) ou então tratá-lo. 
 
6. Introdução às teorias sociológicas do crime 
 Marx, Durkheim e Weber apresentaram e desenvolveram os principais fundamentos 
das teorias sociológicas do crime e da justiça. Se os dois primeiros autores se debruçaram 
sobre o fenômeno criminal propriamente dito, Weber focou a sua atenção na moderna 
burocracia das sociedades industriais, lançando as bases da atual sociologia do direito e da 
administração da justiça. 
 Começaremos por contrapor as abordagens do fenômeno criminal apresentadas 
respectivamente por Marx e Durkheim, por corresponderem à conhecida antinomia consenso-
conflito. 
 A aplicação do modelo do conflito à análise do crime significa que este será abordado 
através das relações de poder subjacentes e que opõem classes sociais que ocupam posições 
econômicas e ideológicas diferentes. 
 O modelo de consenso irá abordar o crime como um comportamento que suscita de 
um modo generalizado uma reação coletiva negativa, sendo a ocorrência do crime um dos 
contextos privilegiados para o reforço da coesão social, na medida em que a reação social que 
desperta, fortemente emotiva, poderá reforçar os laços sociais. 
 A sociologia do crime apresenta duas principais vertentes: 
1) Vertente etiológico-explicativa; 
2) Vertente interacionista. 
 
 No conjunto das teorias etiológicas incluem-se as teorias funcionalistas, ecológicas e 
da subcultura e, em parte, as teorias de origem marxista. Elas têm em comum o fato de 
focarem a sua atenção única e exclusivamente no criminoso, procurando uma explicação para 
a questão fundamental: por que é que determinados indivíduos cometem crimes e outros não? 
 Por sua vez, as teorias interacionistas preocupam-se com a ordem social, pela qual os 
objetos, as pessoas e os eventos são identificados, arrumados e interpretados de forma a 
receberem um significado e um sentido. A questão fundamental dos interacionistas é: por que 
é que determinados indivíduos são classificados como criminosos e outros não? 
 
 
 
40 
 
7. Karl Marx e a visão do crime na sociedade capitalista 
 O autor centraliza a explicação da ocorrência do crime na natureza da sociedade 
capitalista, acreditando na redução sistemática do crime ou no seu desaparecimento depois de 
instaurado o socialismo e subsequente redução ou eliminação da desigualdade na distribuição 
da riqueza e consolidação da estabilidade econômica. 
 A perspectiva marxista do crime caracteriza-se por privilegiar o papel do sistema 
econômico tanto no plano da distribuição diferencial da criminalidade, como na gênese e 
especificidade da produção das leis criminais, decorrentes da evolução histórica das estruturas 
econômicas e dos conflitos sociais. 
 Segundo Marx, o crime produz um nicho de mercado que movimenta boa parte da 
economia: 
“Filósofo produz ideias, poetas poesias, pastor prédicas, professor compêndios e 
assim por diante. Um criminoso produz crimes. Se mais de perto observarmos o 
entrosamento deste último ramo de produção com a sociedade como um todo, 
libertar-nos-emos de muitos preconceitos. O criminoso não produz apenas crimes, 
mas também o direito criminal e, com este, o professor que produz preleções de 
direito criminal e, além disso, o indefectível compêndio em que lança no mercado 
geral mercadorias [...] O criminoso produz ainda toda a polícia e a justiça criminal.” 
( MARX, 1987, p.382, em Teorias da mais valia) 
 
 Em suma, na perspectiva marxista, o crime é um fenômeno social normal na sociedade 
capitalista, por advir da exploração do homem e das consequências daí decorrentes: miséria, 
desmoralização, isolamento, individualismo e guerras constantes em busca de lucro. Deste 
pressuposto básico advém a crença de que em uma sociedade socialista, sem classes, o crime 
desapareceria. 
 
8. O conceito de anomia e a tese da normalidade e da funcionalidade do crime em Durkheim 
 Émile Durkheim (1859-1917) abordou de modo sistemático a problemática do crime, 
começando por afirmar que o crime é normal em qualquer sociedade, afirmando que “não há 
fenômeno que apresente de maneira mais irrefutável todos os sintomas da normalidade, dado 
que aparece como estreitamente ligado às condições de qualquer vida coletiva” (Durkheim) 
 A abordagem de Durkheim sobre crime ancora-se no conceito de anomia (ausência de 
normas e falta de referência a regras práticas de vida em sociedade. A teoria da anomia 
procura apontar as tensões socialmente estruturadas que induzem a ocorrência do crime e a 
consequente adoção de soluções desviantes. Procura assim descobrir como é que o sistema 
social produz o crime e o faz como resultado normal (esperado e funcional) do seu próprio 
funcionamento. 
41 
 
 Convém precisar que em Durkheim este conceito assume um caráter 
macrossociológico, sendo a anomia entendida como a propriedade de um sistema social e não 
um “estado de espírito” deste ou daquele indivíduo dentro do sistema. 
 O conceito de anomia assume dois sentidos diferentes na obra de Durkheim: por um 
lado, o autor apresenta uma visão pessimista da anomia, entendendo-a como uma situação 
generalizada de desregramento do sistema, manifestada em uma sociedade carente de ordem 
normativa para controlar a força desintegradora dos instintos, dos interesses e das ambições 
individuais. 
 Por outro lado, a anomia é uma manifestação “anormal ou patológica” do sistema 
social, que traduz no essencial desajustamento entre órgãos sociais r normas associadas a 
determinados papéis ocupacionais. Deste modo, a concepção de anomia no quadro da 
abordagem que o autor faz da evolução das sociedades não assumirá tanto uma função 
desintegradora, como acontece no estudo sobre suicídio. Na realidade, 
Durkheim afirma que o normal será que a divisão do trabalho crie solidariedade social. Só que 
poderão ocorrer o que chama de perturbações anormais ou patológicas do sistema, 
decorrentes de conflitos entre o trabalho e o capital. Assim sendo, a anomia, e mais 
especificamente o crime, assumirá o papel de sintoma da perda da legitimidade das regras que 
antes comandavam as condutas, revelando a necessidade de renovação do sistema. 
 A anomia é apontada como a causa social do desvio, da não aplicação da norma social 
ou legal por parte de indivíduos socializados como desviantes. Nesse sentido a anomia é 
entendida como um problema de “desadaptação” das populações, em particular dos 
desviantes ou criminosos, às turbulências da vida moderna. Trata-se assim de procurar 
esclarecer como certas estruturas sociais exercem tensões sobre algumas pessoas da 
sociedade, no sentido de se envolverem em atividades criminosas ou desviantes. 
 Porém, Durkheim também concebe o crime como resultado normal do funcionamento 
do sistema social e da necessidade de atualização da força normativa dos seus valores. De fato, 
afirma Durkheim, que o crime é útil, não só para expressar a autoridade limitada da 
consciência coletiva, com por poder constituir um fator de mudança moral. 
 Durkheim afirma que nem todo crime é anômico: só o é quando o crime corresponde a 
uma crise de coesão social, em que as taxas de criminalidade se situam em valores acima do 
socialmente esperado e tolerável. Nesse sentido, o crime atingirá formas anormais ou 
mórbidas, incompatíveis com a vida social. 
 O autor apresenta uma abordagem do crime que se afasta do modelo médico e 
antropológico do estudo do criminoso e da criminalidade, dominante no século XIX, por dois 
motivos: 
42 
 
1) Pela ênfase que coloca nas estruturas sociais para explicar a ocorrência do crime, 
pondo de lado as causas do crime provocadas por fatores individuais; 
2) Por excluir qualquer ideia de diferença ou anomalia, na medida em que a sua tese 
principal é a de que o crime é o resultado do normal funcionamento

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