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GÊNESE DO ESTADO ENQUANTO ORGANIZAÇÃO POLÍTICA SOCIAL A primeira menção do termo “Estado”, se deu a partir de Maquiavel (20-? p.30), em sua obra “O Príncipe”, escrita no séc. XVI, fazendo referência às Cidades conquistadas que já possuíam uma organização básica de leis. No entanto, apesar desta primeira nomenclatura, segundo Dallari (1998, n.p.), o termo, entendido devidamente enquanto organização política, para alguns autores, não surgiu antes do séc. XVII. Dallari (1998, I. 24) afirmou sobre três posições, relacionadas ao período em que se originou o termo, que podem resumir sobre as diversas teorias quanto à sua origem: a) Para muitos autores, o Estado, assim como a própria sociedade, existiu sempre, pois desde que o homem vive sobre a Terra acha-se integrado numa organização social, dotada de poder e com autoridade para determinar o comportamento de todo o grupo. Entre os que adotam essa posição destacam-se EDUARD MEYER, historiador das sociedades antigas, e WILHELM KOPPERS, etnólogo, ambos afirmando que o Estado é um elemento universal da organização social da Humanidade, considerando-o, por isso, onipresente na sociedade humana. b) Uma segunda ordem de autores admire que a sociedade humana existiu sem o Estado durante um certo período. Depois, por motivos diversos, que serão indicados quando tratarmos das causas que levaram à formação do Estado, este foi constituído para atender às necessidades ou às conveniências dos grupos sociais. Segundo esses autores, que, no seu conjunto, representam ampla maioria, não houve concomitância na formação do Estado em diferentes lugares, uma vez que este foi aparecendo de acordo com as condições concretas do lugar. EDUARD MEYER expõe seu pensamento a respeito deste assunto em sua História da Antiguidade, publicada entre 1921 e 1925. (...) c) A terceira posição é que já foi referida: a dos autores que só admitem como Estado a sociedade política dotada de certas características muito bem definidas. Justificando seu ponto de vista, um dos adeptos dessa tese, KARL SCHMIDT, diz que o conceito de Estado não é um conceito geral válido para todos os tempos, mas é um conceito histórico concreto, que surge quando nascem a ideia e a prática da soberania, o que só ocorreu no século VXII. (...) Ainda segundo o entendimento do autor, o surgimento do Estado possui causas determinantes, e frisa acerca das teorias não-contratualistas, como sendo as mais expressivas, e podendo ser agrupadas em ordem específica, se tratando de um modelo organizacional, Origem familial ou patriarcal. Estas teorias situam o núcleo social fundamental na família. Segundo essa explicação, defendida principalmente por ROBERT FILMER, cada família primitiva se ampliou e deu origem a um Estado. Origem em atos de força, de violência ou de conquista. Com pequenas variantes, essas teorias sustentam, em síntese, que a superioridade de força de um grupo social permitiu-lhe submeter um grupo mais fraco, nascendo o Estado dessa conjunção de dominantes e dominados. Entre os adeptos dessa teoria situa-se OPPENHEIMER, que, afirmando ter sido criado o Estado para regular as relações entre vencedores e vencidos, acrescenta que essa dominação teve por finalidade a exploração econômica do grupo vencido pelo vencedor. Origem em causas econômicas ou patrimoniais. Há quem pretenda que essa teoria tenha sido a origem indicada por PLATÃO, quando nos “Diálogos”, no Livro II de “A República”, assim se expressa: “Um Estado nasce das necessidades dos homens; ninguém basta a si mesmo, mas todos nós precisamos de muitas coisas”. E logo depois: como temos muitas necessidades e fazem-se mister numerosas pessoas para supri-las, cada um vai recorrendo à ajuda deste para tal fim e daquele para tal outro; e quando esses associados e auxiliares se reúnem todos numa só habitação, o conjunto dos habitantes recebe o nome de cidade ou Estado”. Dessa forma, o Estado teria sido formado para se aproveitarem os benefícios da divisão do trabalho, integrando-se as diferentes atividades profissionais, caracterizando- se, assim, o motivo econômico. Nessa mesma ordem de ideias coloca-se HELLER, dizendo que a posse da terra gerou o poder e a propriedade gerou o Estado, e PREUSS, sustentando que a característica fundamento do Estado é a soberania territorial. Posição muito semelhante é sustentada por LUDWIG GUMPLOWICZ, nos Précis de Sociologie. (...) Origem no desenvolvimento interno da sociedade. De acordo com estas teorias, cujo o principal representante é ROBERT LOWIE, o Estado é um germe, uma potencialidade, em todas as sociedades humanas, as quais, todavia, prescindem dele enquanto se mantem simples e pouco desenvolvidas. Mas aquelas sociedades que atingem maior grau de desenvolvimento e alcançam uma forma complexa tem absoluta necessidade do Estado, e então ele se constitui. Não há, portanto, a influência de interesses de indivíduos ou de grupos, mas é o próprio desenvolvimento espontâneo da sociedade que dá origem ao Estado (DALLARI, 1998, I.24. grifo do autor). O autor elencou então sobre o comum processo de formação de Estado, sendo respectivamente o de núcleo na família; o da superioridade de um grupo que conquistou outros; do surgimento do Estado para que houvesse benefício econômico; e por último, a teoria de que o Estado é o direto desenvolvimento social que dá origem ao Estado. A visão majoritária atualmente é o de formação derivada. Concluindo nesses aspectos que a origem do Estado, em termos diretos, se deu por conta da interação social, onde não existe unicamente um interesse envolvido. Para o filósofo político Norberto Bobbio: O Estado é estudado em si mesmo, em sua estrutura, funções, elementos constitutivos, mecanismos, órgãos etc., como um sistema complexo considerado em si mesmo e nas relações com os demais sistemas contíguos. (BOBBIO, 1987, p. 55) Assim, compreende-se Estado, para desenvolvimento lógico da presente pesquisa, conforme a segunda posição dominante na doutrina, apontada por Dallari (1998), e o caracteriza como produto da sociedade, passou a existir após o homem em suas necessidades. 3.1 Da separação entre o Estado e a religião A separação entre estado e religião tem como pioneira a cultura judaico- cristã. Esta sociedade específica está inserida num contexto em que a figura divina se sobrepunha ao líder político de modo incisivo. Nenhum rei de Israel considerava-se de fato o supremo titular da Verdade absoluta, ou uma figura divina. Nesse preceito, ele não possuía poderes ilimitados, e nem um governo que exigia do povo o alvo em que direcionariam sua fé e crenças. Era concernente ao entendimento deles que a liderança se estabelecia conforme ao que Deus queria, e este Deus possuía caráter atemporal, transcendendo as gerações judaico-cristãs. Tal como é narrado no contexto bíblico, livro de Deuteronômio cap. 6 Vers. 4; 5; 6 e 7 (Bíblia, 2002, p. 266) Ouve, ó Israel: Iaweh nosso Deus é o único Iahweh! Portanto, amarás a Iahweh teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua força. Que estas palavras que hoje te ordeno estejam em teu coração! Tu as inculcarás aos teus filhos, e delas falarás sentado em tua casa e andando em teu caminho, deitado e de pé. (grifo nosso) Essa cultura foi historicamente marcada pelo surgimento da figura do “Messias”, que se estimava ao próprio Deus deste povo na forma humana. Jesus, como foi chamado, trouxe um marco expressivo, e de extrema importância dentro do entendimento de Estado e Religião. O “Messias” esperado pela religião judaica seria um líder político que viria para derrubar o governo Romano, e estabelecer um Reino teocrático, que beneficiava sobremodo os Judeus. No entanto, Jesus não se comportou como alguém que buscava liderar uma era política enquanto homem. O mesmo foi confrontado por um grupo de religiosos que visavam definir, de fato,que espécie de “ameaça” era a liderança dele, e o questionaram quanto ao pagamento de impostos a César, sendo este o título dado ao imperador romano. Conforme o texto bíblico encontrado no livro de Marcos (Biblia, 2002, p.), a resposta de Jesus se limitou a “o que é de César, dai a César: o que é de Deus a Deus”. Jesus estabeleceu, diretamente, que o respeito devido à liderança política de César, sendo este o dever de pagar impostos, não se confundia com a autoridade, e verdade absoluta que se dava à figura divina. De tal modo, a igreja poderia ter a sua verdade, sem de fato precisar estabelecer, ou confundir-se ao Estado. Após a estruturação de uma religião organizada a partir dos ensinamentos de Cristo, iniciou-se uma perseguição a todo e qualquer que declarasse a fé cristã como sua verdade. Ainda que a religião cristã fosse pautada no pensamento que Estado e Religião não se confundem, o curso até que fosse reconhecida essa separação ficou marcado por incontáveis mortes. 3.1.2 Breve história do início da religião cristã até a fase vivida na Revolução Francesa Conforme cita Ives Gandra da Silva Martins no prefácio de introdução ao livro Direito Religioso: É de se lembrar que o clássico direito público e direito privado dos romanos sucedeu o direito civil e penal da antiguidade, pois não se discutiam, no período anterior, as diversas dimensões do direito público, como se percebe ao ler o que sobrou, por exemplo, dos Códigos de Shulgi, Hamurabi, Ur- nammu, Lipit-Ishtar, nas leis de Manu ou de Amon. O poder exercido por reis, imperadores e faraós era intocável. Detinham um direito de caráter divino, que permaneceu em muitas das civilizações antigas em suas primeiras legislações escrita. Essa evolução gradativa, sempre tomando por base a expansão de Roma, não arrefeceu nem durante a Idade Média. (MARTINS, 2019, p. 35) Em seu artigo acerca do tema, Silvia Sgroi Brandão, pontua sobre o governo romano ter visualizado no cristianismo uma ameaça real à toda a estrutura de Roma, por possuir princípios sociais, morais, éticos em si, e ser contrário ao paganismo. E como mencionado, a perseguição durou até o momento em que Constantino, por volta do ano de 313, através do Edito de Milão, liberou a prática do cristianismo. Apesar da perseguição, a religião cristã havia crescido de forma absurda, e após o Edito de Milão, na estrutura do poderio romano, continuou se propagando de forma incontrolável. O historiador Jaime Pinsky (2013, n.p.) em seu artigo “Religião e Poder: Uma relação perigosa” expôs sobre o momento em que o cristianismo passou então, nesse contexto, a ser usado como uma ferramenta, perdendo a essência proposta: pobres, viúvas, órfãos e escravos, se tornando um poder em si mesmo, onde os detentores do monopólio estatal precisavam se achegar para conseguirem controle. Ivis Gandra da Silva Martins (2019, p. 38), pontuou: “Mesmo durante a Idade Média, o direito romano continuou influenciando todas as nações que nasceram dos povos bárbaros vitoriosos, ainda sob o forte impulso da religião cristã, tornada oficial em Roma, desde 315 d.C., por Constantino.” E assim, a igreja, em seu clero, passou a ser vista como a representação da vontade de Deus na terra. Não só um templo religioso para exercício da fé, mas aquela que legisla, que julga, que revela Deus, e que orienta sobre quem deve estar no poder político. Este fortalecimento do Poder Religiosa ganhou força até meados do século XVI, quando ocorreu a Reforma Religiosa, onde a dogmática da igreja foi veementemente contestada por uma série de fatores, dos quais: os abusos e imoralidade na parte do clero, como: venda de indulgências, venda de relíquias sagradas, venda de cargos eclesiásticos. O Poder Religioso ainda caminhou um certo tempo com o Poder Político, quando em razão do enfraquecimento do comércio, cessou. Ressalta ainda Pinsky: Essa aliança resiste ao fim do sistema feudal e da Idade Média, como podemos verificar na França monárquica e, mais ainda, na Península Ibérica, onde a Inquisição prejudicou o desenvolvimento do capitalismo comercial, como explica Antônio José Saraiva no seu belíssimo livro Inquisição e cristãos-novos. Esta aliança custaria aos ibéricos a perda da hegemonia – que chegaram a ter no Atlântico e nas Américas – para os holandeses. Estes não misturavam religião e poder. (PISNKY, 2019, n.p.) Em resposta à insatisfação social do período, iniciou-se uma gama de fatores que nortearam os eventos dos quais a sociedade está devidamente familiarizada, a Revolução Francesa. Um grande marco, que é essencial para tratar do assunto, e que antecedeu a Revolução Francesa, foi a Declaração dos Direitos da Virgínia, se deu por volta do ano de 1776. Se tratou da luta pela independência dos Estados Unidos da América. O documento trazia um teor devidamente humano O documento trazia um teor devidamente humano. O documento, em seu Art. XVI declarava que cabia ao indivíduo o livre exercício e convicção de fé. Em meados do século XVIII, uma série de fatores, inspirados em ideais iluministas, desencadearam a Revolução na França. A população francesa vivia em um domínio monárquico extremamente desumano, e desigual. Enquanto a miséria dominava a população, os nobres (monarquia e clero), possuíam uma vida regada de luxo. O principal anseio do povo era em razão de um Estado que os representasse, enquanto os burgueses promoviam uma revolta, paralela ao anseio da população, para com os tributos absurdos que lhes cobravam. Tais foram ditames pleiteados na Revolução Francesa, pelo Iluminismo, que é o grande aparato de associação à separação entre Estado e Igreja, traçando um grande caminho pleiteando a Liberdade, Igualdade e Fraternidade, contra o absolutismo imposto à França. E sendo adotado não só por alguns países europeus, mas ao redor do mundo. A primeira medida foi a invasão de Bastilha, que era uma espécie de prisão política. E em razão da mesma, a Assembleia Constituinte cancelou os direitos feudais, promulgando, no dia 26 de agosto de 1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Documento que se comprometia aos princípios em razão da Dignidade Humana, rompendo com o sistema político francês.
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