No filme Tempos Modernos, o personagem interpretado por Chaplin é, inicialmente, um operário que enlouquece tamanho nível de mecanização do trabalho e da vida humana nas grandes fábricas. O resto do filme o personagem busca simplesmente sobreviver e ser feliz, não necessariamente ser livre. Há um debate no filme a respeito do que é a liberdade. Em um dado momento o operário é preso por acidente, durante o período na prisão é, também acidentalmente, considerado um herói. O tempo em que passou preso foi também o período mais feliz e livre da vida do personagem, mas, por se um herói decidiram devolver a ‘liberdade’ a ele. Os tempos modernos que o filme busca retratar são aqueles onde o capitalismo selvagem impera, onde o lucro torna a vida do operário uma existência mecânica, e quando algo fora do padrão acontece apenas é possível mediante uma patologia (operário enlouqueceu) ou um acidente (um operário se tornar herói), e a sociedade que se mostra aparentemente tão racional, com suas maquinas, classes e instituições, não faz sentido algum quando se trata da sobrevivência dos substratos mais baixos da população, do operariado enlouquecido, acidentado, refém da instituição (cadeia) ou da fome. Liberdade e felicidade não passam de conceitos inatingíveis, uma fantasia, não passa de um momento em que o personagem principal e uma miserável menina órfã brincam de família em um casebre abandonado. O que provoca a distopia narrada pelo filme, é uma irracionalidade travestida de racionalidade, e sobre este conjunto de elementos que Horkheimer se debruça.
O livro Eclipse da razão, de Horkheimer, tem como “objetivo investigar o conceito de racionalidade subjacente à nossa cultura industrial contemporânea, a fim de descobrir se esse conceito não contém defeitos que o viciam em sua essência” (HORKHEIMER, 2015: 7). Segundo o autor, a conjuntura sociológica é composta por “um sentimento universal de medo e desilusão. As esperanças do gênero humano parecem estar mais distantes de sua realização hoje do que nas hesitantes épocas em que elas foram formuladas pela primeira vez por humanistas. Parece que enquanto o conhecimento técnico expande o horizonte do pensamento e da atividade do homem, sua autonomia como um indivíduo, sua capacidade de resistir ao crescente aparato de manipulação de massas, seu poder de imaginação, seu juízo independente são aparentemente reduzidos. O avanço nos meios técnicos de esclarecimento é acompanhado por um processo de desumanização. Assim, o processo ameaça anular o próprio objetivo que ele supostamente deveria realizar – a ideia de homem. Se essa situação é uma fase necessária na ascensão geral da sociedade como um todo ou se ela levará a uma reemergência vitoriosa do neolarbarismo [nazismo, fascismo] recentemente derrotado no campo de batalha, isso depende, pelo menos em parte, da nossa capacidade de interpretar corretamente as profundas mudanças que agora ocorrem na mentalidade simbólica.” (HORKHEIMER, 2015: 7-8).
Referências bibliográficas:
HORKHEIMER, Max. Eclipse da razão. São Paulo, Editora Unesp, 2015.
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