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Dor Abdominal, Diarréia, Vômitos e Icterícia Graduando do curso de Medicina pelo Centro Universitário Tiradentes - UNIT/AL: Artur Bruno Silva Gomes E-mail Institucional: artur.bruno@souunit.com.br TUTORA: Problema 5: Pancreatite Objetivos: 1. Descrever a etiologia e fisiopatologia da pancreatite aguda e crônica 2. Reconhecer as complicações, epidemiologia e quadro clínico da pancreatite 3. Caracterizar o diagnóstico clínico e laboratorial da pancreatite incluir os critérios:balthazar e ranson) 4. Citar a conduta clínica e cirúrgica da pancreatite aguda e crônica PANCREATITE AGUDA Quadro de abdome agudo decorrente de um insulto inflamatório do tecido pancreático por autodigestão, com envolvimento variável dos tecidos peripancreáticos e possíveis repercussões sistêmicas. Fisiopatogenia Insulto inflamatório leva à colonização de grânulos de zimogênio, contendo tripsinogênio, com lisossomos repletos de catepsina B. Ocorre a transformação de tripsinogênio em tripsina e liberação de catepsina B no citosol. Inicia-se uma cascata inflamatória, culminando em necrose e apoptose celular. Etiologias ● Biliar (40 a 50%); ● Alcoólica (10 a 40%); ● Hipertrigliceridemia (1 a 4% dos quadros agudos); ● Hipercalcemia; mailto:artur.bruno@souunit.com.br ● Pós- CPRE (3 a 25% dos casos); ● Medicamentosa; Pós-infecciosa: ● Virais (caxumba, coxsackie, hepatite B, CMV, varicela-zóster, herpes simples, HIV); ● Bacterianas (Mycoplasma, Legionella, Leptospira, Salmonella); ● Fúngicas (Aspergillus); ● Parasitárias (Toxoplasma, Cryptosporidium, Ascaris); Associada a doenças vasculares: ● Vasculites (principalmente lúpus eritematosos sistêmico e poliarterite nodosa); ● Ateroembolismo, hipotensão intraoperatória, choque hemorrágico; Associada a malformações congênitas: Pâncreas divisum; ● Mutações genéticas; Trauma; Autoimune; Acidente escorpiônico; Neoplasias (císticas pancreáticas); Idiopática (10 a 25%). Epidemiologia ❏ Incidência de 5 a 35 casos por 100.000 pessoas. ❏ Mortalidade média de 3 a 17%. ❏ A forma leve do quadro é a mais comum. ❏ A forma grave é menos frequente (10 a 20%), independente da causa, pode atingir de 25 a 45% de morbimortalidade. ❏ Cerca de 21% apresentam episódios recorrentes de pancreatite e, desses, 8% evoluem com pancreatite crônica. ❏ Tabagismo - fator de risco independente para pancreatite aguda e crônica. ❏ Colelitíase e etilismo constituem 80% das etiologias de pancreatite aguda. Apresentação Clínica Dor abdominal: ● Em andar superior do abdome, tipo barra com irradiação para o dorso; ● Alívio ao assumir posição genupeitoral ("posição de prece maometana"); A característica evolutiva da dor pode sugerir a etiologia subjacente de pancreatite: ● Pancreatite biliar: dor bem localizada de início súbito, atingindo intensidade máxima em 10-20 minutos; ● Pancreatite alcoólica/metabólica: dor surda, mal localizada, de início gradual; Náuseas e vômitos; Sinais de gravidade: síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS): Febre alta (≥ 38,5 °C); Taquicardia e hipotensão, podendo evoluir para choque hipovolêmico mais distributivo. Até 5 a 10% dos pacientes com pancreatite aguda grave apresentam hipotensão e síndrome da resposta inflamatória sistêmica; Taquipneia (podendo evoluir para síndrome do desconforto respiratório agudo); Rebaixamento do nível de consciência. Fatores de risco Histórico de litíase biliar; de etilismo crônico; Libação alcoólica; Hipercalcemia; Hipertrigliceridemia (triglicerídeos séricos > 1.000 mg/dL); Uso de pancreatotóxicos; Trauma abdominal; Hipovolemia; Procedimento intervencionista recente na árvore biliar (principalmente CPRE). Exame Físico Dor à palpação abdominal; Icterícia (achado incomum - sugere coledocolitíase ou edema de cabeça de pâncreas); Taquicardia, taquipneia; Hipotensão; Febre; Rebaixamento do nível de consciência; Redução do murmúrio vesicular abolido em base esquerda por derrame pleural; Sinais de irritação peritoneal podem estar presentes; Distensão abdominal com peristalse débil por íleo paralítico secundário ao processo inflamatório intra-abdominal; Retinopatia de Purtscher (perda súbita da visão, rara complicação da pancreatite); Sinal de Grey-Turner: equimose em flancos; Sinal de Cullen: equimose periumbilical; Sinal de Fox: equimose em base de pênis; Necrose de gordura subcutânea (paniculite); Xantomas e xantelasmas (etiologia hiperlipidêmica); Aumento de parótidas (etiologia alcoólica). Abordagem Diagnóstica Exige a presença de dois entre três critérios diagnósticos: ● Dor epigástrica ou em andar superior de abdome, grave, persistente, com irradiação para o dorso; ● Amilase ou lipase maior que três vezes o limite superior da normalidade; ● Exame de imagem sugestivo (TC e RM). Exames Laboratoriais Hemograma completo: Leucocitose com desvio à esquerda (até 20.000 leucócitos/mm3), e aumento de hemoglobina e hematócrito (hemoconcentração); Eletrólitos (incluindo o cálcio): Distúrbios hidroeletrolíticos são muito comuns, devido aos vômitos repetidos e a perda volêmica para o terceiro espaço, assim como o consumo de cálcio pelo próprio processo fisiopatológico. Alterações mais comuns são: hiponatremia, hipocalemia e hipocalcemia. Ureia e creatinina: Alterados em vigência de choque e quadros de sequestro líquido grave para terceiro espaço, configurando injúria renal aguda pré-renal, podendo evoluir para necrose tubular aguda, caso reposição volêmica seja insuficiente para restaurar perfusão renal; ➢ Uréia: para cada aumento de 10,8 mg/dL durante as primeiras 24 horas, a mortalidade é 2,2 vezes maior; ➢ Creatinina: elevada dentro das primeiras 48 horas pode prever o desenvolvimento de necrose pancreática; Glicemia; Amilase e lipase: Elevação de amilase e/ou lipase maior que três vezes o limite superior; Lipase > 450 e amilase > 500 são limiares que apresentam maior especificidade diagnóstica para pancreatite aguda; ➢ A lipase é mais específica e se mantém positiva por mais tempo (7-10 dias); Amilase sérica: eleva-se em 6-12 horas após o início do quadro e mantém-se positiva em até 3-5 dias. Em 20% dos casos de pancreatite alcoólica e 50% de hipertrigliceridemia, pode não haver esse aumento; Lipase sérica: eleva-se em 4-8 horas após o início do quadro e mantém-se positiva por 8-14 dias; As enzimas pancreáticas não são marcadores de prognóstico ou gravidade; Hepatograma: Alterações sugestivas de pancreatite biliar incluem aumento de transaminases, enzimas canaliculares e hiperbilirrubinemia, com predomínio de direta, caracterizando colestase pela litíase ou microlitíase biliar; TGP (ALT) > 150 é um limiar que apresenta maior especificidade para pancreatite biliar (< 150, porém, não afasta o diagnóstico); Proteína C reativa: Se > 150 mg/dL, indica pancreatite aguda grave; Desidrogenase lática (LDH); Lactato; Gasometria arterial: quadros mais leves, na presença de vômitos, apresentam-se com alcalose metabólica. Quadros mais graves com disfunção renal e síndrome da resposta inflamatória sistêmica se apresentam com acidose metabólica; Proteínas totais e albumina sérica; Na ausência de etiologia óbvia, solicita-se ainda triglicérides e IgG4. Exames de Imagem Não estão indicados de rotina. Reserva-se aos casos duvidosos, em que os critérios diagnósticos não estão fechados, ou na presença de qualquer sinal de gravidade, em que o exame de imagem apresenta importância na avaliação prognóstica e na adoção de medidas terapêuticas. Radiografia simples de abdome e tórax: Indicada na exclusão de outras causas de abdome agudo; Achados: distensão de alças, alça sentinela (delgado) ou sinal do cut off (cólon distal); elevação de hemicúpula diafragmática, derrame pleural, atelectasia basal, infiltrado pulmonar ou síndrome da angústia respiratória aguda. Ultrassonografia abdominal: Diagnóstico diferencial, bem como definição etiológica para quadros biliares; Revela aumento difuso do pâncreas e a presença de cálculos biliares na vesícula e no ducto biliar comum; A distensão de alças de delgado dificultaa visualização difícil; Líquido peripancreático pode ser revelado como coleção anecoica. Tomografia computadorizada de abdome com contraste: Aumento focal ou difuso do pâncreas com edema intersticial (pancreatite edematosa); A falta de captação de contraste indica as áreas de necrose pancreática (pancreatite necrosante); Litíase biliar pode eventualmente ser detectada pela TC; A partir do 3º ou 4º dia de doença, TC de abdome com contraste pode estabelecer a presença e extensão de necrose pancreática e complicações locais e predizer a gravidade do quadro; Essencial para a definição do Escore prognóstico tomográfico de Balthazar (Índice de Gravidade na Pancreatite Aguda, 1990), indicando quadro grave de soma ≥ 6; Forte associação entre necrose; Ressonância magnética de abdome: Exame mais sensível para o diagnóstico precoce de pancreatite e para a detecção de necrose pancreática e complicações; Para o diagnóstico de coledocolitíase, é comparável a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE); Alternativa à tomografia computadorizada em pacientes que não devem ser expostos a radiação (gestantes) e para avaliação de necrose pancreática em pacientes com insuficiência renal (com contraindicação de uso de contraste na TC). Escores Prognósticos Avaliação da gravidade do quadro, dentre eles :clássico Escore de Ranson, o SAPS II , e o escore de Balthazar. Escore de Ranson Consiste em onze critérios clínico-laboratoriais, sendo cinco avaliados na admissão e seis avaliados dentro de 48 horas de internação, que determinam prognóstico. Há variação nos valores segundo etiologia (não biliar ou biliar). Interpretação: ➢ Ranson < 3: Pancreatite leve (0-3 % de mortalidade); ➢ Ranson ≥ 3: Pancreatite grave (11-15 % de mortalidade); ➢ Ranson ≥ 6: Pancreatite muito grave (40 % de mortalidade). Atlanta Revisada Pancreatite aguda leve; Pancreatite aguda moderada; Pancreatite aguda grave. Índice de Gravidade Tomográfico (CTSI) Inflamação pancreática: Necrose pancreática (em %): 0 Pontos: pâncreas normal; 0 Pontos: Ausente; 1 Ponto: Irregularidades focais ou difusas; 2 Ponto: < 30%; 2 Pontos: Inflamação peripancreática com anormalidades intrínsecas; 4 Pontos: > 30% a < 50%; 3 Pontos: Coleções intra ou extrapancreáticas; 6 Pontos: > 50%. 4 Pontos: Duas ou mais coleções (com presença de gás) no pâncreas ou retroperitôneo. Classificação 0 a 3: pancreatite aguda leve; 4 a 6: pancreatite aguda moderada; 7 a 10: pancreatite aguda grave. Definições Atlanta Revisados Quanto à Gravidade ● Leve: Sem falência orgânica ou complicações locais ou sistêmicas; ● Moderada: Falência de órgãos que se resolve em 48 horas ou complicações locais ou sistêmicas; ● Grave: Falência de órgãos sustentada por mais de 48 horas; A definição de falência orgânica é feita pelo escore de Marshall Modificado (2 ou mais pontos). Quanto à Apresentação Pancreatite intersticial edematosa ➢ Compreende 85% dos casos; ➢ Aumento focal ou difuso do pâncreas sem a presença de necrose; ➢ Mais branda, com resolução na maioria dos casos na primeira semana; Pancreatite necrosante ➢ Compreende 15% dos casos; ➢ Forma com pior prognóstico; ➢ Inflamação com consequente necrose de tecido pancreático ou peripancreático. Quanto às Fases da Doença Fase inicial: ➢ Cursa com síndrome de resposta inflamatória sistêmica intensa; ➢ A falência de órgãos é o principal determinante de gravidade; ➢ Geralmente se encerra na primeira semana, embora possa se estender até o final da segunda semana; Fase tardia: ➢ Caracterizada pela persistência de sinais inflamatórios ou aparecimento de complicações locais; ➢ Só ocorre na pancreatite moderada a grave; ➢ A falência de órgãos continua sendo o principal determinante de gravidade. Quanto às Complicações ➢ Coleções peripancreáticas agudas (< 4 semanas); ➢ Coleções necróticas agudas (< 4 semanas); ➢ Pseudocisto (> 4 semanas); ➢ Necrose pancreática murada ou isolada — walled-off (> 4 semanas); ➢ Necrose infectada; ➢ Trombose venosa portoesplenomesentérica. Descrição das imagens: Tomografia computadorizada do abdome com contraste venoso, evidenciando pâncreas com espessura e densidade normais (asteriscos pretos); Setas brancas evidenciam pâncreas de volume aumentado e densificação/infiltração da gordura peripancreática. Observar nos asteriscos brancos a presença de duas coleções fluidas no espaço pararrenal à direita e goteria parietocólica à esquerda. Classificação da pancreatite aguda (Balthazar): É importante enfatizar que a avaliação da pancreatite aguda inicial, ou seja, nas primeiras 72 horas, deve ser feita com base na história clínica e exames laboratoriais. A TC do abdome deve ser realizada numa fase mais tardia (após 72 horas), com o objetivo de avaliar possíveis complicações. O estudo deve ser realizado antes e após o contraste venoso. Achados: ➢ Pâncreas normal (figura 1); ➢ Pâncreas com aumento do volume (densidade, realce pelo contraste e gordura adjacente são normais); ➢ Infiltração extensa da gordura peripancreática; ➢ Coleção fluida peripancreática (acúmulo de líquido homogêneo e sem paredes); ➢ Duas ou mais coleções fluidas peripancreáticas (figura 2) Abordagem Terapêutica Analgesia, hidratação e acompanhamento, bem como para avaliação de antibioticoterapia e proposta de desbridamento cirúrgico. Pacientes com critérios de gravidade ou com escore prognóstico indicativo de pancreatite grave devem ser monitorados em terapia intensiva. Em linhas gerais, o tratamento se baseia em suporte clínico. O uso rotinerio de profilaxia para hemorragia digestiva não é indicado. Hidratação: Hidratação endovenosa com taxa de 5 a 10 mL/kg/hora com cristaloides (solução salina isotônica ou solução de Ringer lactato, está contraindicado na hipercalcemia) para todos os pacientes, exceto cardiopatas e renais crônicos; Analgesia: É essencial, sendo a dor tratada de acordo com a sua intensidade, utilizando-se desde analgésicos não narcóticos até os derivados opioides, conforme recomendação da OMS; A via preferencial de administração é a intravenosa; Opioides: Morfina também pode ser utilizada (não há estudos demonstrando que possa agravar ou causar pancreatite por aumento na pressão do esfíncter de Oddi); Meperidina classicamente é utilizada pela teórica não interferência no esfíncter de Oddi no entanto, possui elevado grau de adição. Deve-se atentar para o acúmulo do metabólito normeperidina, relacionado a efeitos colaterais neuromusculares e convulsões. Fentanil apresenta o melhor perfil de segurança. Correção de distúrbios hidroeletrolíticos: Hipocalcemia deve ser corrigida se o cálcio ionizado estiver baixo ou sinais de irritabilidade neuromuscular (sinais de Chvostek ou Trousseau); Magnésio reduzido também pode causar hipocalcemia e deve ser corrigido; Nutrição: Nos quadros leves, a dieta oral pode ser mantida desde que leve e pobre em lipídeos e havendo controle álgico adequado, independentemente dos níveis de lipase, desde clinicamente tolerável. Na impossibilidade de ingestão por via oral a nutrição enteral é preferencial em relação à parenteral, devendo ser iniciada (24 a 72 horas da admissão); Presença de coleções líquidas ou enzimas pancreáticas elevadas não são necessariamente uma contra-indicação ao início da dieta oral ou enteral; Tradicionalmente, os quadros graves era tratados com jejum e nutrição parenteral exclusiva, baseando-se no argumento de que se permitiria o repouso do pâncreas exócrino; A via de nutrição preferencial é a enteral, independentemente da gravidade do quadro, sendo segura e superior à parenteral. Promovendo manutenção do trofismo intestinal, diminuição da disbiose e manutenção da adequada atividade imunológica, com menor risco de translocação bacteriana e perpetuação da resposta inflamatória sistêmica; Não se observam diferenças de desfecho entre vias nasogástrica e nasojejunal, sendo a primeira a de eleição e a segunda reservada para intolerância digestiva; Suporte nutricional é indicado nos quadros gravese deve ser precocemente instituído: Pacientes com pancreatite aguda devem ser considerados de moderado a alto risco nutricional, sendo submetidos a triagem nutricional quando quadros leves a moderados e definidos como alto risco quando quadros graves; Dieta enteral preferencial (sem obrigatoriedade de cateter nasoenteral pós-pilórico); Somente deve ser instituído após a adequada reanimação volêmica; Não há necessidade de fórmulas semielementares; Em pacientes com pressão intra-abdominal < 15 mm Hg; aqueles submetidos à necrossectomia mínimamente invasiva (após estabilização em 24 horas do procedimento) ou peritoneostomia (mesmo que em baixo volume de dieta) não há contraindicações absolutas à via de alimentação enteral; Em casos de aumento da pressão intraabdomianal > 20 mmHg a dieta enteral deve ser suspensa Dieta parenteral: preferencialmente não exclusiva e sim suplementar Não tolerem a via enteral seja por dor ou piora dos marcadores inflamatórios; Incapacidade de obtenção da meta nutricional com a terapia enteral exclusiva dentro de 48-72 horas; Contraindicações da via enteral; Íleo importante ou vômitos repetidos; Coleções com efeito de massa impedindo o adequado trânsito gastrointestinal; Presença de abscesso pancreático ou fístula pancreática; Síndrome de hipertensão intra-abdominal ou pressão intra-abdominal > 20 mm Hg; Aspectos da terapia nutricional: ● Oferta energética quantificada por calorimetria indireta (padrão-ouro), equação de Harris-Benedict ou a fórmula de bolso (25 a 30 kcal/kg/dia), com 50% representado por carboidratos ● Teor proteico de 1.5 a 2 g/kg/dia (hiperproteico); ● Oferta lipídica < 30 a 35% do total de calorias (0,8 a 1,5 g/kg/dia). Podendo ser excluída no caso de hipertrigliceridemia (> 500 mg/dL); ● A maioria dos pacientes tolera dieta polimérica; ● Monitorização obrigatória dos eletrólitos, glicemia e triglicerídeos; ● L- glutamina (0,2 g/kg/dia) é indiciada como suplemento à dieta parenteral para imunomodulação em casos selecionados nos quais há contraindicação/intolerância à dieta enteral; ● Probióticos não são indicados em quadros graves; ● Suplementação de enzimas pancreáticas não está indicada exceto em casos de clara insuficiência pancreática exócrina. Antibioticoterapia: Até 20% dos doentes com pancreatite aguda podem desenvolver uma infecção extrapancreática e estão associadas com um aumento da mortalidade; Indicação: suspeita de infecção ● Necrose pancreática ou extrapancreática que evoluem com piora do estado geral e/ou de critérios infecciosos laboratoriais; ● Ausência de melhora clínica após 7 a 10 dias de internação hospitalar; ● Tomografia de abdome com presença de gás em área necrótica ● Antibioticoterapia deve ser iniciada com esquema empíricos inicial; ● A maioria das infecções é monomicrobiana (geralmente por E. coli, Enterobacter cloacae, Enterococcus faecalis, Bacteroides fragilis, Klebsiella); ● Realizada por 3 a 4 semanas, ajustando-se conforme a resposta clínico-laboratorial; Esquemas antimicrobianos empíricos: ● Meropeném 1 g EV de 8/8 horas (primeira escolha); ● Imipeném + Cilastatina 500 mg a 1 g EV de 8/8 horas; ● Cefepima 1-2 g EV de 8/8 horas + Metronidazol 500 mg EV de 8/8 de horas; ● Ciprofloxacino 400 mg EV de 12/12 horas + Metronidazol 500 mg EV de 8/8 horas; Punção por agulha fina guiada pela tomografia pode ser utilizada para coleta de material para cultura, permitindo, assim, o ajuste da antibioticoterapia; Pacientes que não respondam à antibioticoterapia mesmo que guiada ou que evoluam para maior gravidade podem necessitar de intervenção cirúrgica/ endoscópica/ percutânea adicional para controle do foco infeccioso. Abordagem Intervencionista Intervenção endoscópica/percutânea: ➢ Drenagem percutânea/endoscópica pode ser tentada com objetivo de remover o líquido que circunda a necrose pancreática, podendo controlar a infecção, sem necessidade de necrosectomia; Intervenção cirúrgica: Necrosectomia Cirurgia na qual se realiza o debridamento das áreas de necrose pancreática; Podem ser necessárias diversas intervenções, com o emprego de peritoneostomia; Indicações: ➢ Necrose pancreática infectada especialmente em pacientes que não respondam à antibioticoterapia ou que evoluam com instabilidade hemodinâmica; ➢ Pancreatite com necrose estéril: ● Obstrução intestinal ou biliar, devido ao efeito de massa quatro a oito semanas após início da pancreatite aguda; ● Persistência de dor abdominal, náuseas, vômitos, anorexia ou perda de peso após 8 semanas do início da pancreatite aguda; ● Transecção completa do ducto pancreático com a persistência sintomática, associada a coleções com necrose após 8 semanas da pancreatite aguda. Especificidades da Pancreatite Aguda Biliar Colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE): ● Realizada dentro de 24 horas de internação; ● Indicações: ➢ Pancreatite aguda biliar ou colangite; ➢ Obstrução do ducto biliar comum com cálculo visível; ➢ Ducto biliar comum dilatado ou enzimas hepáticas em aumento crescente, na ausência de colangite; Colangioressonância e ressonância magnética de abdome superior podem ser realizados para avaliar a necessidade de CPRE em gestantes e pacientes com anatomia difícil. Colecistectomia: Deve ser realizada após a recuperação total da doença aguda nos pacientes com pancreatite biliar, idealmente na mesma internação hospitalar; Também indicada em pacientes com lama biliar, que é encontrada na ultrassonografia da vesícula biliar em 20-40% dos pacientes com pancreatite aguda sem qualquer outra causa óbvia; Preferencialmente realizada por (videolaparoscópica), associada com colangiografia intraoperatória e eventual exploração das vias biliares seja por método cirúrgico ou endoscópico associado, no mesmo tempo ou posteriormente; Sempre em contexto eletivo e não de urgência. PANCREATITE CRÔNICA Caracteriza-se pela fibrose progressiva do parênquima pancreático secundária a episódios inflamatórios recorrentes, culminando em insuficiência exócrina e endócrina do órgão. Fisiopatologia Pouco esclarecida. Aparenta ser multifatorial. Ocorre redução na secreção de bicarbonato e ativação de enzimas digestivas dentro do parênquima pancreático. Etiologia A PC é uma afecção complexa de etiologia diversa. No Ocidente, e especialmente no Brasil, predomina a etiologia alcoólica. O tabagismo aumenta o risco e acelera a progressão de todas as formas da doença. Principais causas: ● Alcoólica (maioria): ingestão de mais de 80 g de álcool por dia por pelo menos seis anos para desenvolvimento de pancreatite crônica; ● Autoimune; ● Hipertrigliceridemia; ● Fibrose cística; ● Hipercalcemia; ● Genéticas: mutações dos genes: CFTR; SPINK1; CPA1; CTRC; CASR; CEL; CLDN2; PRSS 1 e 2; ● Deficiência de alfa-1-antitripsina; Obstrutiva: Obstrução benigna do ducto pancreático; Estenose pós-pancreatite aguda; Estenose traumática; Estenose do esfíncter de Oddi; Pâncreas divisum; Obstrução periampular (divertículo e cisto de parede duodenal); Obstrução maligna de ducto pancreático; Adenocarcinoma de pâncreas, papila e duodeno; Idiopática; Tropical. A etiologia pode ser classificada por diversos sistemas: Marselha-Roma; TIGAR-O; classificação ABC; Manchester; Rosemont; M-ANNHEIM. Não existe consenso sobre a melhor escolha, mas a maioria dos guidelines recomenda utilizar o sistema TIGAR-O ou M-ANNHEIM. Sistema TIGAR-O: Toxic-Metabolic; Idiopathic; Genetic; Autoimmune; Recurrent and severe acute pancreatitis associated; Obstructive etiologic factor Apresentação Clínica Dor abdominal é o sintoma mais comum, sendo a primeira exteriorização clínica da doença. Relaciona-se à hipertensão ductal provocada pelas rolhas proteínas depositadas, cálculos e fibrose, tanto nos ductos pancreáticos secundários, quanto no ducto principal. Além disso, as inflamações perineural intra e peripancreática também contribuem para a intensidade álgica. Os Períodos de Acalmia variam de meses a anos, e os episódios são desencadeados pelo abusoalcoólico ou por alimentação gordurosa. Em geral, o paciente relata como fator de melhora do quadro doloroso a adoção da posição genupeitoral. A Redução do Peso Corpóreo é notada em quase todos os pacientes, pois não se alimentam durante as crises de dor e não voltam a se alimentar como antes. Com o avançar da Fibrose Pancreática, surgem a esteatorreia e o diabetes, que trazem perda de peso ainda maior. Estima-se que a esteatorreia só apareça quando a secreção de lipase pancreática se reduz a menos de 10% do basal. Diabetes Mellitus Decorrente da PC (tipo III-c), é caracterizado pela redução da insulina, pela hipoglucagonemia e pela consequente labilidade do controle glicêmico. Icterícia Clínica ou Laboratorial, geralmente fugaz e com baixos níveis de bilirrubina direta, ocorre em um quarto dos pacientes, aproximadamente. Isso se deve à compressão do colédoco distal por edema, nódulos fibróticos, cálculos pancreáticos ou pseudocistos, localizados na porção cefálica da glândula pancreática. Pode ocorrer Hematêmese ou Melena. Em geral, elas são causadas pela ruptura de varizes esôfago-gástricas, secundárias à compressão ou trombose da veia esplênica por um pseudocisto, ou pelo aumento do volume do pâncreas. Ascite - pode ser encontrada pela ruptura do ducto pancreático ou de pseudocisto. Há aumento do risco de nefrolitíase (cálculos de oxalato de cálcio), colelitíase, úlcera péptica e osteoporose. Apesar de se resolverem em quase 70% dos casos, os pseudocistos, presentes em cerca de um terço dos pacientes, podem gerar outras complicações, como: ➢ Compressões de órgãos ou estruturas vizinhas: Estômago; Cólon; Vesícula; Colédoco; Infecção: abscessos; ● Hemorragia; ● Fistulização para vísceras ocas ou para o peritônio livre. Pancreatite autoimune pode mimetizar neoplasia de pâncreas e se manifestar como pseudotumor. Abordagem Diagnóstica Fundamenta na suspeição clínica e presença de fatores de risco, associado à alteração do parênquima pancreático visualizada em exame de imagem, com ou sem insuficiência exócrina pancreática franca. ❏ Dosagens séricas de amilase e da lipase: têm baixa sensibilidade para a PC, embora, quando elevadas, nos induzam ao diagnóstico de agudização da PC ou de complicações, como pseudocisto. ❏ Dosagem fecal da elastase-1: Útil nos casos de insuficiência exócrina moderada ou grave, principalmente quando menor que 200 µg/g de fezes. Exame de triagem, porém uma proporção significativa de pacientes com pancreatite crônica não apresenta insuficiência exócrina. ❏ Quantificação da gordura fecal em fezes 24 ou 72 horas: Método para diagnóstico da esteatorreia, sendo considerada elevada a dosagem de gordura nas fezes maior que 7 g/dia, após dieta hiperlipídica. A determinação de esteatorreia somente indica má absorção de gordura, não definindo a causa dessa má absorção, porém pode indicar diminuição da lipase pancreática. Pode ser útil, em alguns casos específicos, para a avaliação da resposta à reposição exógena de enzimas. USG de abdome: Tem menor sensibilidade para detecção de PC em fases iniciais. ➢ Pode demonstrar: Atrofia glandular; Heterogeneidade parenquimatosa; Calcificações; Irregularidade e/ou dilatação ductal; ➢ Complicações, como: Formações císticas ou sólidas; Dilatação das vias biliares; Derrames intracavitários. Tomografia de abdome superior e a ressonância nuclear magnética com colangioressonância são os exames de primeira linha para avaliação de pacientes com alta suspeição de pancreatite crônica. Dada a disponibilidade, inicia-se a pesquisa pela tomografia de abdome superior. Tomografia computadorizada de abdome superior São achados e complicações detectáveis: ● Aumento ou atrofia do pâncreas; ● Dilatação do ducto pancreático principal; ● Presença de calcificações; ● Pseudocistos; ● Pseudoaneurismas; ● Obstrução do tubo digestivo; ● Espessamento de planos fasciais; ● Envolvimento dos ductos biliares. ❏ Ressonância Nuclear Magnética com Colangiorressonância: detectar e caracterizar alterações do parênquima pancreático e dos ductos pancreáticos na pancreatite crônica, inclusive em fases iniciais, porém não caracteriza tão bem calcificações como a TC de abdome. ❏ Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica: Tornou-se um método mais terapêutico que diagnóstico, sendo útil na extração de cálculos, tratamento de fístulas e estenoses. ❏ Ecoendoscopia Alta: Deve ser indicada para o diagnóstico de PC após o insucesso dos outros métodos de imagem. Método de maior sensibilidade, já que produz imagens detalhadas do pâncreas e possibilita realização de biópsias, embora seja mais invasivo. Possibilitando estadiar a PC, avalia critérios morfológicos: Parenquimatosos: Ductais: Focos e traves hiperecóicos Ectasia ductal principal e secundária Lobularidade glandular Irregularidade ductal Cistos Paredes ductais hiperecóicas Calcificações Calcificações Exames laboratoriais: Hemograma; Triglicérides; Cálcio total; Albumina; PTH; TGO; TGP; GGT; FA; Bilirrubinas; IgG4; Zinco; Magnésio; Coagulograma; Glicemia jejum; HBA1c; 25-OH-vitamina D; Vitamina A; EAS; Vitamina B12; Tiamina; Ácido fólico. Pacientes com diagnóstico antes dos 35 anos, pancreatite crônica idiopática ou com história familiar positiva devem ser submetidos a testes genéticos, excluída a história de etilismo. ➢ Avaliação dos seguintes genes: PRSS1; SPINK1; CPA1; CEL; CFTR; CTRC. Abordagem Terapêutica A cessação do tabagismo e a abstinência alcoólica devem ser estimuladas. Pacientes com PC devem ser rastreados para osteopenia/osteoporose. Na presença de osteopenia, recomenda-se repetir a densitometria óssea a cada dois anos. Prática de atividade física regular e aporte adequado de cálcio e vitamina D. Controle álgico: Tratamento analgésico medicamentoso escalonado, começando pelos analgésicos comuns (Dipirona e Paracetamol), em associação com Codeína e progredindo para os outros opióides. A resposta inadequada ao tratamento com opioides mais leves deve levar à utilização de analgésicos de ação central empregados no tratamento da dor crônica neuropática, sendo a Amitriptilina, a Gabapentina e a Pregabalina os mais indicados. O uso de antioxidantes pode ser considerado para auxiliar no controle álgico, com benefícios modestos. Ainda não existe definição da melhor combinação. Deve-se tentar realizar terapia endoscópica em pacientes com dor e obstrução/dilatação do ducto pancreático. A terapia endoscópica não tem papel no paciente assintomático não complicado. Em pacientes com cálculos radiopacos (≥ 5 mm) obstruindo o ducto pancreático, pode-se tentar litotripsia extracorpórea seguida de extração endoscópica dos fragmentos. Em pacientes com estenose dominante do ducto pancreático na cabeça do pâncreas e dilatação ductal a montante ≥ 6 mm, pode-se tentar colocação de stent de 8,5 a 10 Fr. ❏ Refratários ao tratamento clínico/endoscópico devem ser considerados candidatos para descompressão cirúrgica, incluindo os pacientes com pancreatite obstrutiva e dor intratável. ❏ Bloqueio neural do plexo celíaco deve ser reservado para pacientes com dor refratária, sem condições para outras técnicas cirúrgicas, sendo seus efeitos transitórios. ❏ Pancreatectomia total combinada com o autotransplante de ilhotas pode ser realizada em pacientes com dor intensa refratária a todas as medidas. ❏ Reposição enzimática: é indicada para pacientes com pancreatite crônica e insuficiência pancreática exócrina na presença de sinais clínico-laboratoriais de má-absorção (deficiência de nutrientes). Iniciar-se precocemente, quando a desnutrição de micro e macronutrientes se mostra evidente, mesmo na ausência de esteatorreia franca. O paciente não responsivo e com diarreia e/ou esteatorréia deve ser avaliado quanto ao supercrescimento bacteriano ou enteroparasitoses, como giardíase e estrongiloidíase. Na presença de esteatorréia, há restrição parcial de gorduras na dieta. ❏ Reposição de nutrientes: A suplementação de cálcio, magnésio, ácido fólico, vitaminas lipossolúveis e B12 dependeráda carência específica, avaliada quando de suas mensurações sanguíneas. ❏ Abordagem de pseudocistos: O risco de complicações graves em pseudocistos assintomáticos tem sido referido como menor que 10%. ❏ Drenagem percutânea ou endoscópica: nos casos sintomáticos em que não há comunicação da coleção com o ducto pancreático e com janela segura de drenagem. ❏ Drenagem endoscópica: primeira escolha no tratamento de pseudocistos sintomáticos, estando a cirurgia indicada nos casos de insucesso ou impossibilidade do tratamento endoscópico. ❏ Correção de glicemia: Avaliar a presença de insuficiência exócrina pela dosagem de glicemia em jejum e HBA1c. ❏ Insulinoterapia cuidadosa de acordo com os níveis glicêmicos dosados em períodos pré-prandiais pode ser empregada. Geralmente são necessárias doses baixas de insulina. Risco de hipoglicemia, devido à ausência contrarreguladora do glucagon. Pacientes devem possuir glucagon em casa para ser utilizado em caso de hipoglicemia grave. Tratamento Farmacológico Terapia escalonada: Escolher uma droga por classe conforme a necessidade e intensidade da dor. Classe A: Analgésicos não opioides: Se dor leve. Dipirona ou Paracetamol Classe B: Analgésicos opioides fracos: Se dor moderada. Codeína ou Tramadol Classe C: Analgésicos opioides fortes: Se dor forte. Morfina ou Metadona Tratamento Farmacológico Adjuvante Podem ser utilizados em conjunto com os analgésicos. 1. Antidepressivos tricíclicos: Amitriptilina (10 mg/cp, 25 mg/cp, 75 mg/cp) 10-25 mg VO à noite. Progredir dose em 25 mg a cada 15 dias, conforme resposta (dose máxima: 150 mg/dia); Nortriptilina (10 mg/cp, 25 mg/cp, 50 mg/cp, 75 mg/cp) 10-25 mg VO à noite. Progredir dose em 25 mg a cada 15 dias, conforme resposta (dose máxima: 150 mg/dia). 2. Anticonvulsivantes: Gabapentina (300 mg/cp) 300 mg VO até de 8/8 horas. Titular dose de acordo com resposta (dose máxima: 1200 mg/dia); Pregabalina (75 mg/cp) 75 mg VO até de 8/8 horas. Titular dose de acordo com resposta (dose máxima: 600 mg/dia). Orientações ao Prescritor ➢ Reposição de nutrientes: a suplementação de cálcio, magnésio, ácido fólico, vitaminas lipossolúveis e B12 dependerá da presença de carência em mensurações sanguíneas; ➢ Recomendar dieta hipolipídica ao paciente. Tratamento Farmacológico 1. Lipase (Pancreatina) (25.000 unidades/cp) 25.000-75.000 unidades por refeição. Tomar ao iniciar a alimentação. 2. Se paciente mantiver esteatorreia: Omeprazol (20 mg/cp) 20 mg VO pela manhã, em jejum.
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